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Assistentes Pessoais Virtuais e o Infomediário
Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

E se imaginássemos a internet como um oráculo com o qual nossa interação fosse verbal e
interativa tal qual com outro ser humano? É inegável que à medida que os sistemas
computacionais crescem em complexidade e em acesso a mais e mais recursos, tanto locais
quanto distribuídos, aumenta a oferta de serviços para os quais o modelo tradicional de
interação “clique-e-execute” não mais se apresenta como o mais adequado. A tendência é que
aplicativos complexos se comportem como assistentes pessoais aos quais não apenas
consultas são submetidas, mas também tarefas são delegadas. Por exemplo, quando se deseja
buscar na internet por um restaurante, ao invés de navegar por diversos sítios retornados por
um engenho de busca, um comando de voz no estilo “reserve uma mesa para dois às 22hs no
restaurante japonês mais próximo” poderia ser submetido ao assistente pessoal. A resposta
viria com o nome e o endereço do estabelecimento juntamente com a confirmação da reserva,
ou sob forma de uma pergunta do tipo “dado que o mais próximo está indisponível, serve esse
outro aqui?”. A bem da verdade, uma ampla classe de problemas demandam as aptidões de
um assistente inteligente, um software que pode se comunicar com humanos, entender a
situação mapeando os dados à sua disposição num modelo, agir para produzir comportamento
útil, e interagir através da produção apropriada de conteúdo comunicante.

Descrito em 1987 pelo então CEO da Apple, John Sculley, em seu livro “Odissey” (em co-
autoria com John A. Byrne, e publicado pela Harpercollins), o “Knowledge Navigator” é um
conceito de dispositivo futurista que pode acessar um enorme repositório de dados sob forma
de hipertexto em rede, e usa agentes de software para assistir na busca por informações bem
como na realização de tarefas. À época a Apple produziu alguns videoclips demonstrando a
idéia, todos eles exibindo um computador no estilo “tablet” e com diversas aptidões
avançadas incluindo excelente compreensão e síntese da fala, além de uma interface por
multi-toque. Trata-se do precursor do conceito de assistente virtual que começam a aparecer
como uma realidade dos dias de hoje.

Os chamados “Assistentes Pessoais Virtuais” (em inglês, “Virtual Personal Assistants”, abrev.
VPA) representam o paradigma de interação da próxima geração para a internet. No
paradigma atual, seguimos os apontadores produzidos pelos engenhos de busca. Com um VPA,
no entanto, interagimos sob forma de uma conversação. Emitimos uma solicitação verbal ao
assistente, e este se encarrega de empregar os serviços necessários para a realização da tarefa.
Além do mais, tal qual um verdadeiro assistente, um VPA é pessoal, e portanto utiliza as
informações sobre as preferências, a localização e a história de interação do usuário para levar
a bom termo a solicitação recebida, acumulando conhecimento ao longo do processo.

Lançado no início de 2010 e recentemente adquirido pela Apple, o Siri, que produz o aplicativo
de mesmo nome para o iPhone, é o que se pode chamar de “engenho do fazer”, ao invés de
“engenho de busca”. Ao processar sua solicitação verbal disparando requisições aos melhores
serviços disponíveis na internet por meio de API’s (“Application Programming Interface”), de
modo a cumprir o papel de assistente da melhor forma possível, o VPA se vale de um núcleo
de tecnologia de inteligência artificial que tem tudo para produzir um enorme impacto no
futuro da internet. Constituído de três componentes essenciais para o bom desempenho de
assistente pessoal virtual (uma interface conversacional, um módulo de consciência do
contexto pessoal, e um agente de delegação de serviços), o Siri permite a conversação
bidirecional através da fala, de palavras e frases digitadas, e de uma interface gráfica.
Verdadeiramente impressionante é seu conjunto (patenteado) de algoritmos de delegação de
serviços: combina diversos atributos sobre cada provedor de serviços, incluindo escores de
qualidade, classificações refinadas para aptidões específicas, medidas de velocidade, bem
como limitações geográficas, com vistas a planejar e executar uma estratégia ótima para lidar
com a solicitação do usuário.

Concebido como um subproduto do projeto CALO (“Cognitive Assistant that Learns and
Organizes”) realizado pelo SRI International, com financiamento da Agência DARPA do
Ministério da Defesa dos EUA, e considerado como o maior esforço de pesquisa em
Inteligência artificial da história do país, o Siri tem sido citado como uma das indicações dos
rumos da busca na internet: o desafio de criar um assistente digital eficaz e verdadeiramente
útil na medida em que é capaz de entender exatamente o que o usuário deseja, e exigindo o
mínimo de esforço de comunicação da parte do usuário.

É fato que há uma relação direta entre simplicidade e o engajamento do usuário na internet.
Menos cliques significa mais usuários. Quando combinados com ferramentas cada vez mais
acessíveis como smartphones, os chamados “assistentes virtuais” deverão levar a interação
com o usuário em direção a um comércio eletrônico, um consumo, e um modelo de
colaboração com bem mais fluidez. Mais cedo do que imaginamos, vamos poder pegar o
telefone e começar a pedir ao assistente virtual coisas como “me leve ao portal da
Globo.com”, “mande um exemplar do último livro de Stephenie Meyer para minha sobrinha”,
“avise a Paulo que vou chegar 20 minutos atrasado”, e assistiremos a isso tudo acontecer. O
fato é que à medida que a interação fica mais fácil e natural, diminuem as barreiras para a
utilização do aparelho celular para realizar tarefas complexas. Além do mais, a conectividade e
a velocidade de transmissão de dados das redes de telefonia móvel deverão possibilitar ao
aparelho celular repassar as tarefas que requerem maior inteligência e maior poder
computacional a servidores remotamente localizados, sem prejudicar a viabilidade da resposta
ao usuário em tempo hábil.

Levando-se em consideração que o aparelho celular tende a estar sempre em nosso poder, a
combinação de simplicidade, oportunidade de impulso, contexto, e preferência deverá dar
origem à mais explosiva oportunidade de mercado em décadas. E nesse mercado
praticamente todos se beneficiarão: se por um lado os usuários clicam menos pois a
comunicação oral prevalece, levando a uma interação de melhor qualidade, por outro lado, os
provedores de serviços são mais solicitados e processam mais transações.

Por outro lado, ao cidadão resta saber se vale a pena deixar que o assistente pessoal virtual
saiba tanto sobre si a ponto de atingir o máximo de eficácia com o mínimo de esforço de
comunicação. Afinal de contas, permitir um grau de intimidade com qualquer assistente, ainda
que digital, deverá demandar do cidadão a entrega de uma tremenda quantidade de
informações pessoais, o que traz à tona a questão da confiança. A quem deveríamos confiar
informações sensíveis sobre nós mesmos?
Em seu livro “Net Worth” (Harvard Business Press, 1999) John Hagel III e Marc Singer
introduzem o conceito de “infomediário”, alguém a quem você confia informações privadas
sobre você, e que agiria tanto como uma espécie de porteiro quanto como um tipo de filtro
nas suas futuras escolhas de consumo. Tal qual já o fizeram Hagel e Singer em 1999, vale a
pena especular sobre que tipo de organização pode emergir como o infomediário. Talvez, dada
a promessa de facilitar a vida do cidadão contemporâneo, os aplicativos baseados nas nuvens
que dão suporte aos assistentes pessoais virtuais, serão os mais fortes candidatos a assumir
esse papel.

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Assistentes virtuais e o infomediário

  • 1. Assistentes Pessoais Virtuais e o Infomediário Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE E se imaginássemos a internet como um oráculo com o qual nossa interação fosse verbal e interativa tal qual com outro ser humano? É inegável que à medida que os sistemas computacionais crescem em complexidade e em acesso a mais e mais recursos, tanto locais quanto distribuídos, aumenta a oferta de serviços para os quais o modelo tradicional de interação “clique-e-execute” não mais se apresenta como o mais adequado. A tendência é que aplicativos complexos se comportem como assistentes pessoais aos quais não apenas consultas são submetidas, mas também tarefas são delegadas. Por exemplo, quando se deseja buscar na internet por um restaurante, ao invés de navegar por diversos sítios retornados por um engenho de busca, um comando de voz no estilo “reserve uma mesa para dois às 22hs no restaurante japonês mais próximo” poderia ser submetido ao assistente pessoal. A resposta viria com o nome e o endereço do estabelecimento juntamente com a confirmação da reserva, ou sob forma de uma pergunta do tipo “dado que o mais próximo está indisponível, serve esse outro aqui?”. A bem da verdade, uma ampla classe de problemas demandam as aptidões de um assistente inteligente, um software que pode se comunicar com humanos, entender a situação mapeando os dados à sua disposição num modelo, agir para produzir comportamento útil, e interagir através da produção apropriada de conteúdo comunicante. Descrito em 1987 pelo então CEO da Apple, John Sculley, em seu livro “Odissey” (em co- autoria com John A. Byrne, e publicado pela Harpercollins), o “Knowledge Navigator” é um conceito de dispositivo futurista que pode acessar um enorme repositório de dados sob forma de hipertexto em rede, e usa agentes de software para assistir na busca por informações bem como na realização de tarefas. À época a Apple produziu alguns videoclips demonstrando a idéia, todos eles exibindo um computador no estilo “tablet” e com diversas aptidões avançadas incluindo excelente compreensão e síntese da fala, além de uma interface por multi-toque. Trata-se do precursor do conceito de assistente virtual que começam a aparecer como uma realidade dos dias de hoje. Os chamados “Assistentes Pessoais Virtuais” (em inglês, “Virtual Personal Assistants”, abrev. VPA) representam o paradigma de interação da próxima geração para a internet. No paradigma atual, seguimos os apontadores produzidos pelos engenhos de busca. Com um VPA, no entanto, interagimos sob forma de uma conversação. Emitimos uma solicitação verbal ao assistente, e este se encarrega de empregar os serviços necessários para a realização da tarefa. Além do mais, tal qual um verdadeiro assistente, um VPA é pessoal, e portanto utiliza as informações sobre as preferências, a localização e a história de interação do usuário para levar a bom termo a solicitação recebida, acumulando conhecimento ao longo do processo. Lançado no início de 2010 e recentemente adquirido pela Apple, o Siri, que produz o aplicativo de mesmo nome para o iPhone, é o que se pode chamar de “engenho do fazer”, ao invés de “engenho de busca”. Ao processar sua solicitação verbal disparando requisições aos melhores serviços disponíveis na internet por meio de API’s (“Application Programming Interface”), de modo a cumprir o papel de assistente da melhor forma possível, o VPA se vale de um núcleo de tecnologia de inteligência artificial que tem tudo para produzir um enorme impacto no
  • 2. futuro da internet. Constituído de três componentes essenciais para o bom desempenho de assistente pessoal virtual (uma interface conversacional, um módulo de consciência do contexto pessoal, e um agente de delegação de serviços), o Siri permite a conversação bidirecional através da fala, de palavras e frases digitadas, e de uma interface gráfica. Verdadeiramente impressionante é seu conjunto (patenteado) de algoritmos de delegação de serviços: combina diversos atributos sobre cada provedor de serviços, incluindo escores de qualidade, classificações refinadas para aptidões específicas, medidas de velocidade, bem como limitações geográficas, com vistas a planejar e executar uma estratégia ótima para lidar com a solicitação do usuário. Concebido como um subproduto do projeto CALO (“Cognitive Assistant that Learns and Organizes”) realizado pelo SRI International, com financiamento da Agência DARPA do Ministério da Defesa dos EUA, e considerado como o maior esforço de pesquisa em Inteligência artificial da história do país, o Siri tem sido citado como uma das indicações dos rumos da busca na internet: o desafio de criar um assistente digital eficaz e verdadeiramente útil na medida em que é capaz de entender exatamente o que o usuário deseja, e exigindo o mínimo de esforço de comunicação da parte do usuário. É fato que há uma relação direta entre simplicidade e o engajamento do usuário na internet. Menos cliques significa mais usuários. Quando combinados com ferramentas cada vez mais acessíveis como smartphones, os chamados “assistentes virtuais” deverão levar a interação com o usuário em direção a um comércio eletrônico, um consumo, e um modelo de colaboração com bem mais fluidez. Mais cedo do que imaginamos, vamos poder pegar o telefone e começar a pedir ao assistente virtual coisas como “me leve ao portal da Globo.com”, “mande um exemplar do último livro de Stephenie Meyer para minha sobrinha”, “avise a Paulo que vou chegar 20 minutos atrasado”, e assistiremos a isso tudo acontecer. O fato é que à medida que a interação fica mais fácil e natural, diminuem as barreiras para a utilização do aparelho celular para realizar tarefas complexas. Além do mais, a conectividade e a velocidade de transmissão de dados das redes de telefonia móvel deverão possibilitar ao aparelho celular repassar as tarefas que requerem maior inteligência e maior poder computacional a servidores remotamente localizados, sem prejudicar a viabilidade da resposta ao usuário em tempo hábil. Levando-se em consideração que o aparelho celular tende a estar sempre em nosso poder, a combinação de simplicidade, oportunidade de impulso, contexto, e preferência deverá dar origem à mais explosiva oportunidade de mercado em décadas. E nesse mercado praticamente todos se beneficiarão: se por um lado os usuários clicam menos pois a comunicação oral prevalece, levando a uma interação de melhor qualidade, por outro lado, os provedores de serviços são mais solicitados e processam mais transações. Por outro lado, ao cidadão resta saber se vale a pena deixar que o assistente pessoal virtual saiba tanto sobre si a ponto de atingir o máximo de eficácia com o mínimo de esforço de comunicação. Afinal de contas, permitir um grau de intimidade com qualquer assistente, ainda que digital, deverá demandar do cidadão a entrega de uma tremenda quantidade de informações pessoais, o que traz à tona a questão da confiança. A quem deveríamos confiar informações sensíveis sobre nós mesmos?
  • 3. Em seu livro “Net Worth” (Harvard Business Press, 1999) John Hagel III e Marc Singer introduzem o conceito de “infomediário”, alguém a quem você confia informações privadas sobre você, e que agiria tanto como uma espécie de porteiro quanto como um tipo de filtro nas suas futuras escolhas de consumo. Tal qual já o fizeram Hagel e Singer em 1999, vale a pena especular sobre que tipo de organização pode emergir como o infomediário. Talvez, dada a promessa de facilitar a vida do cidadão contemporâneo, os aplicativos baseados nas nuvens que dão suporte aos assistentes pessoais virtuais, serão os mais fortes candidatos a assumir esse papel.