SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 100
USP ESALQ ANO7 JAN | ABR 2012
                                                                               10




                                                                                   ISSN 1806-6402
agricultura e
 sustentabilidade
 Legislação deve garantir agricultura produtiva e ambiente protegido

 NOVO CÓDIGO FLORESTAL   EDIÇÃO TRAZ OPINIÕES           USP/ESALQ CONTRIBUIU
 EXPÕE POLÍTICAS PARA    DE CONGRESSISTAS E             PARA ESCLARECER POLÊMICA
 PRESERVAÇÃO DA FLORA    DIRIGENTES DE ONGS             NO CONGRESSO NACIONAL
E D I TO R I A L




                                        H    oje em dia, o tema recorrente da sustentabilidade parece ser mais uma
                                        daquelas preocupações do mundo moderno que não é, necessariamente, bem
                                        discutida e avaliada nos ambientes de mercado e/ou acadêmico. A proposta
                                        da décima edição da Visão Agrícola direciona-se à seguinte pretensão: trazer
                                        aos leitores um conjunto diversificado de “visões” sobre a sustentabilidade no
                                        ambiente agroflorestal.
                                           Inicialmente, o ponto central da sustentabilidade está voltado para nosso
                                        futuro, e que este seja pautado por maior segurança para a vida em nosso
                                        planeta. Para tanto, precisamos planejar sempre à frente, focando em um
                                        ecossistema sustentável os nossos recursos naturais, que envolvem a fauna,
                                        a flora e, também, o ser humano, entendido como um ser ético e responsável
                                        pela valorização da qualidade de preservação da vida. Nesse sentido, a univer-
                                        sidade – ambiente favorável ao desenvolvimento das boas práticas de ensino,
                                        pesquisa e extensão – tem enorme responsabilidade e compromisso com a
                                        formação de seus quadros.
                                           Não tem sido suficiente apenas o compartilhamento dos estoques de conhe-
                                        cimentos; são fundamentais também o cuidado e o respeito ao nosso patrimô-
                                        nio quanto aos recursos naturais. O novo profissional, que será efetivamente
                                        reconhecido como um colaborador para uma sustentabilidade efetiva, por de-
                                        mais, depende dos bons exemplos que a instituição universitária possa vir a lhe
                                        oferecer. Este novo profissional será, de fato, diferenciado, por ter a humildade
                                        devida de reconhecer seus eventuais erros; por saber que poderá sempre contar
                                        com a sabedoria de sua família e, quem sabe, de seus antigos mestres, amigos e
                                        colegas para se levantar novamente e tomar uma nova decisão mais acertada.
                                        Essa nova cronologia irá nos demonstrar que os profissionais diferenciados
                                        errarão cada vez menos, em nome da sustentabilidade.

                                          José Vicente Caixeta Filho
                                          Diretor da USP/ESALQ




VISÃO AGRÍCOLA Nº 10   JAN | ABR 2012                                                                                   1
RODRIGO ESTEVAM MUNHOZ DE ALMEIDA
                                                                     ISSN 1806-6402
                                                   www.esalq.usp.br/visaoagricola
                                                        visaoagricola@esalq.usp.br




                                                                          SEÇÕES
                                                                      E D I TO R I A L                                       1
                                                                            FÓRUM                                            4
                                   Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
                                     André Meloni Nassar e Laura Barcellos Antoniazzi




                                                                           TEMAS
                                                                  VISÃO LEGAL
                  A política nacional de preservação e conservação do meio ambiente                                          8
                                                     João Carlos Cabrelon de Oliveira
            O Código Florestal na legislação: elementos condicionantes à agropecuária                                        10
                                                                      Leonardo Papp

                                                               VISÃO TÉCNICA
               Novos conceitos da pecuária para preservação das bacias hidrográficas                                         13
                                                                Walter de Paula Lima
         Reserva Legal pode ser boa oportunidade de negócios em propriedades rurais                                          18
        Pedro Henrique Santin Brancalion, Edson José Vidal da Silva e Carine Klauberg
           A adequação das propriedades agrícolas ao novo CódigoFlorestal brasileiro                                         22
                                                                   Rodrigo C. A. Lima
Caminhos e escolhas na revisão do Código Florestal: quando a compensação compensa?                                           25
                                                                       Gerd Sparovek
VISÃO POLÍTICA
31   Leis de gabinete apresentam distorções e desconsideram realidade
     Aldo Rebelo
34   Código Florestal carregasetenta e sete anos de desrespeito e impunidade
     João Paulo Ribeiro Capobianco
36   Código Florestal: fechar os olhos aos erros ou aprender a respeitar limites
     Raul Telles do Vale
39   Queremos ver nosso país na contramão da história?
     José Sarney Filho
42   Código Florestal é um dos pilares da sustentabilidade
     Blairo Borges Maggi
44   Limites na adequação de pequenas propriedades: eliminação ou convivência
     Marco Pavarino

     V I S Ã O S E TO R I A L
46   Sistema de Plantio Direto é opção de sustentabilidade
     Herbert Arnold Bartz, Marie Luise Carolina Bartz, Ivo Mello, Ricardo Ralisch
49   Agroecologia permitirá superar oposição entre produzir e conservar
     Carlos Armenio Kathounian
53   Cultura da cana-de-açúcar representa alternativa de energia renovável
     Edgar Gomes Ferreira de Beauclair
55   Cerrado brasileiro carece de mais investimentos em práticas sustentáveis
     Eros Artur Bohac Francisco e Claudinei Kappes
58   Líder em citros, Brasil ajusta setor às necessidades contemporâneas
     Lourival Carlos Mônaco
61   Sustentabilidade exige adoção de ferramentas adequadas
     Luiz Fernando do Amaral e Beatriz Stuart Secaf
64   Leis só efetivam sustentabilidade com união entre governo e sociedade
     Maria José Brito Zakia
67   Mato Grosso desenvolve cultivo de soja e milho de 2ª safra
     Ricardo Arioli Silva
70   O bom desempenho internacional do agronegócio brasileiro
     Marcos Antonio Matos e David Roquetti Filho
74   A ciência tem sido fundamental para uma pecuária sustentável
     Geraldo Bueno Martha Jr.
77   Experiência da certificação deve embasar debates sobre Código Florestal
     Luís Fernando Guedes Pinto e Maurício Voivodic


     VISÃO CRÍTICA
80   Código Florestal em tramitação retrocede na garantia de direitos fundamentais
     Pedro Henrique Santin Brancalion, José Leonardo de Moraes Gonçalves, Silvio Frosini de Barros Ferraz
83   Principais mudanças propostas
84   Problemas, contribuições e melhorias ao projeto de lei em tramitação
94   USP/ESALQ colaborou para esclarecer pontos polêmicos do novo Código Florestal
FÓRUM




Reforma do Código Florestal:
          uma visão equilibrada
          André Meloni Nassar e Laura Barcellos Antoniazzi*




          A reforma do Código Florestal se trans-    para os quais as exigências do Código
          formou em um dos mais contenciosos         são incompatíveis com sua capacidade
          temas em debate na sociedade brasileira.   de geração de renda ou com a estrutura
          As calorosas discussões no Congresso       das suas propriedades. Equivale às
          Nacional e por meio da mídia entre o       classes pobre e muito pobre definidas
          deputado Aldo Rebelo, relator do texto     por Alves (2011) – as quais representam
          aprovado na Câmara dos Deputados,          89% dos estabelecimentos rurais e 14%
          e a ex-ministra Marina Silva, principal    do valor da produção –, o cumprimento
          porta-voz daqueles que são contra a        das exigências de Reserva Legal (RL),
          reforma, mostram o quão difícil seria      e mesmo de áreas de preservação per-
          negociar uma reforma que, antes de ser     manente (APP), somente ocorrerá com
          apresentada para votação no Congresso,     subsídios governamentais. Foi pensan-
          fosse fruto de um consenso entre todas     do nesse grupo que o deputado Aldo
          as partes interessadas.                    (I) criou a consolidação da vegetação
            Três grandes interesses estão em jogo    remanescente para fins de regularização
          na reforma do Código Florestal Brasilei-   de RL nas propriedades de até 4 módulos
          ro. O primeiro, representado – sobre-      fiscais e (II) propôs um conjunto de al-
          tudo – pelo discurso do deputado Aldo      ternativas para viabilizar a consolidação
          Rebelo, é do contingente de produtores     de atividades produtivas nas APPs. E,


4
caso a recomposição seja necessária,             poderia gerar sobre a produção existente.     (2011), o estudo, pelo menos, mostra que o
                                    esta poderá ser de 15 metros, e não de 30          Uma parte desse grupo demonstra             déficit é generalizado e, nas propriedades
                                    metros, para os casos dos rios com até 10        resistência em investir na recomposição       de menor porte (abaixo de 4 módulos
                                    metros de calha regular.                         de APPs hídricas, sobretudo quando o          fiscais), mais relevante em relação à
                                       O segundo grupo interessado na refor-         passivo é elevado. Os dados de Sparovek       área total da propriedade (Nassar, 2011).
                                    ma é formado pelos produtores respon-            (2011) indicam que a grande maioria das       Assim, a regularização e a consolidação
                                    sáveis por grande parte da produção e da         áreas com APPs antropizadas são ocupa-        são igualmente importantes para ambos
                                    área utilizada. Fazendo novo paralelo com        das com pastagens. Considerando, ainda,       os grupos. No grupo dos pobres e muito
                                    a classificação de Alves (2011), eles repre-     que a recomposição de APPs na pecuária        pobres, é importante porque estes não
                                    sentam 11% dos estabelecimentos rurais e         implica dois custos – de plantio e manu-      são capazes de investir na recomposição.
                                    86% do valor da produção (médios e ricos         tenção das mudas e de cercamento das          No grupo dos médios e ricos, é fundamen-
                                    na classificação de renda bruta). A maior        áreas para impedir a entrada dos animais      tal para não levar a queda na produção.
                                    preocupação desse grupo é com regulari-          –, são os pecuaristas que se mostram             O terceiro grupo interessado na re-
                                    zação ambiental, porque são eles os mais         mais defensores da consolidação. Além         forma é composto pelos ambientalistas.
                                    visados pelo Ministério Público, sobretu-        disso, eles argumentam que pastagens          Eles avaliam que a reforma do Código
                                    do após a promulgação da lei de crimes           manejadas ajudam a conservar o solo e         traz perdas ambientais maiores do que
                                    ambientais e por conta dos potenciais im-        água, que são duas funções importantes        os benefícios econômicos e sociais da
                                    pactos negativos que a recomposição de RL        das APPs. Embora discordemos do mon-          consolidação proposta no texto apro-
                                    dentro da propriedade, e de certas APPs,         tante do déficit de RL estimado por IPEA      vado na Câmara. Os ambientalistas não




                                                                                                Vegetação nativa em Área de Preservação Permanente (APP): preservação é funda-
                                                                                                                                  mental para a sustentabilidade da agricultura
RODRIGO ESTEVAM MUNHOZ DE ALMEIDA




                                    VISÃO AGRÍCOLA Nº 10            JAN | ABR 2012                                                                                              5
                                                                                                           Colheita do consórcio milho com Brachiaria ruziziensis no oeste baiano
FÓRUM




reconhecem a necessidade da reforma          no Código atual) e se o Brasil possuir um      área produtiva, acarretando em perdas
para promover a regularização ambien-        ótimo cadastro ambiental das proprie-          econômicas para os consumidores e
tal, pois afirmam que esta deveria ocorrer   dades, viabilizando um cruzamento das          para as muitas regiões que dependem
por meio da recomposição dos passivos e      informações (outra situação inexistente        exclusivamente de atividades agrícolas.
com base nos instrumentos já existentes      no contexto do Código atual).                  Contrariamente ao afirmado por alguns
no Código atual. No entanto, as posições        O segundo argumento decorre do estu-        ambientalistas e cientistas, a reforma do
entre ambientalistas não são absoluta-       do de Sparovek (op. cit.). O autor mostra      Código não é defendida para liberar mais
mente homogêneas. Algumas ONGs, so-          que existem cerca de 60 milhões de ha          área para produção. Até porque o texto
bretudo aquelas que atuam em projetos        ocupados com pastagens que são aptas           aprovado na Câmara não altera em nada
de regularização ambiental de proprie-       para produção agrícola. Assim, toda a          as regras para abertura de novas áreas,
dades e de implementação dos cadastros       expansão futura previsível da produção         nem mesmo nas APPs. Ela é defendida
ambientais rurais (CAR), dão suporte à       agrícola poderia ocorrer nessas áreas de       porque o Código corrente tem enorme
reforma, mesmo não concordando com           pastagens, sem prejuízo da produção de         potencial de deslocar área produtiva,
partes do texto aprovado na Câmara. Em       carne e leite. Tal argumento é utilizado       resultando num efeito que ninguém quer:
linhas gerais, tais ONGs discordam da        por aqueles que contestam a necessidade        transformar em vegetação nativa áreas
consolidação de atividades produtivas        da reforma e assumem que seus propo-           aptas e já utilizadas para produção.
em APPs e áreas de uso restrito, querem      nentes a defendem porque o Código atual           A reforma é igualmente necessária
que a lei seja mais precisa para garantir    seria uma restrição à expansão da produ-       para reduzir a insegurança jurídica que
que o CAR vai funcionar e não apoiam a       ção. Conforme discutiremos a seguir, a         o Código atual traz aos produtores.
ideia de dar flexibilidade para os estados   reforma é necessária para regularizar as       Tendo em vista que o Código passou por
definirem as regras dos programas de re-     áreas consolidadas, e não para viabilizar      inúmeras mudanças e aprimoramentos
gularização ambiental (PRA), o que afeta     a abertura de novas áreas.                     desde sua promulgação em 1965, muitas
diretamente a consolidação nas APPs.            Somos favoráveis a uma reforma equi-        propriedades foram se tornando ilegais.
   Um quarto grupo que passou a se po-       librada do Código Florestal, que possa:        Como em nenhuma das mudanças se
sicionar mais tardiamente no processo        viabilizar a regularização dos produtores,     concebeu o conceito de área consolidada
abrange os cientistas. A realidade é que     permitir a consolidação de atividades          com ocupação antrópica, como estabe-
as posições públicas apresentadas pela       produtivas e exigir a recomposição ou re-      lecido pela versão aprovada na Câmara,
SBPC e ABC reforçam o posicionamento         generação de vegetação nativa em APPs,         qualquer ocupação da propriedade
dos ambientalistas quando enfatizam os       salvaguardadas algumas exceções (espé-         poderia torná-la ilegal caso possuísse
resultados das pesquisas que avaliaram       cies florestais, culturas lenhosas, perenes    déficit de RL. Ocupações antigas, ante-
impactos ambientais das atividades pro-      e de ciclo longo e agricultura de várzea). A   riores à promulgação da lei, ou mesmo
dutivas. As organizações praticamente        reforma do Código Florestal é necessária       na sua vigência, mas em épocas em que
não se posicionaram publicamente nas         porque trata-se de uma lei com baixa           o poder público pouco se importava com
questões econômicas e sociais e optaram      efetividade. Os déficits de APPs e RL são      a efetividade da lei, poderiam colocar os
apenas pela abordagem ambiental. Dois        elevados, quando, na vigência desta lei,       produtores na ilegalidade.
argumentos têm sido extensamente utili-      o Brasil bateu recordes de desmatamen-            Sem a reforma, a criação de um CAR
zados pelos cientistas e replicados pelos    to na Amazônia. É uma lei avançada do          é impraticável. O Estado brasileiro hoje
ambientalistas.                              ponto de vista das exigências de con-          desconhece o montante de RLs e de
   O primeiro é que a não conformidade       servação sobre os produtores mas, ao           APPs nas propriedades privadas. A única
dos produtores (ou déficit) em relação às    mesmo tempo, com muitas dificuldades           referência oficial das áreas de vegetação
RLs poderia ser resolvida no contexto da     de sair do papel. A primeira razão para        natural ainda existente nas propriedades
lei atual sem a necessidade da reforma,      sua reforma é transformá-la em uma lei         é o Censo Agropecuário. A informação
sobretudo recompondo vegetação nativa        que será cumprida efetivamente a partir        que consta do Censo, no entanto, é au-
em áreas consolidadas não aptas para         de sua promulgação.                            todeclaratória e certamente não espelha
produção agrícola (em geral, ocupadas           A reforma precisa ser feita porque o        a realidade. O Censo de 2006 indica que
com pastagens). Conceitualmente, tal         Código atual exige a recuperação das           existem 50 milhões de ha dedicados a RLs
argumento faz sentido desde que a            RL dentro das propriedades, ou a com-          e APPs nos estabelecimentos rurais. No
compensação de RL possa ocorrer em           pensação na mesma microbacia, o que            entanto, apenas 1 milhão de estabeleci-
um escopo geográfico mais amplo do           levaria, dado o passivo de RL existente        mentos informaram os dados relativos
que a microbacia (o que não é realidade      (Sparovek, op. cit.), a uma redução na         a RL e APP. Isso representa 1/5 do total



6
de estabelecimentos rurais do Brasil (o          RLs são colocadas como obrigação e,           no Código atual, a despeito dos louváveis
Censo aponta um total de 5,2 milhões de          consequentemente, vistas apenas como          esforços de algumas ONGs em mostrar
estabelecimentos). Mesmo que a infor-            custo pelos produtores. Uma reforma que       exemplos de sucesso de regularização,
mação esteja correta, ela cobre apenas           crie as condições para o desenvolvimen-       sempre será exceção. Defendemos uma
uma parcela pequena do universo de               to de um mercado florestal, via compen-       reforma equilibrada do Código Florestal
propriedades rurais.                             sação de RL através da chamada cota de        para que a conformidade seja a regra e a
   A ausência de tal informação coloca           reserva ambiental (como previsto pelo         fim de que possamos aliar conservação
o Brasil no escuro para entender qual o          Código aprovado na Câmara) e pagamen-         ambiental com produção agrícola.
nível de conformidade das propriedades           tos pelos serviços ambientais gerados
rurais ao Código Florestal, atual ou o           pelas APPs e RLs, mudará completamente
novo. E mesmo estudos independentes              a mentalidade dos produtores. A reforma
feitos com o objetivo de avaliar esse grau       pode criar um círculo virtuoso em que
de conformidade chegam a conclusões              produtores com vegetação nativa além
diferentes (ver Sparovek op. cit. e The          das suas necessidades de APP e RL pos-
Nature Conservancy). É o CAR que vai             sam comercializar tal excedente, e que
                                                                                               * André Meloni Nassar (amnassar@
sanar o nosso desconhecimento sobre o            produtores com déficit possam avaliar         iconebrasil.org.br) e Laura Barcellos
montante de vegetação natural existente          as vantagens da recomposição de RL vis-       Antoniazzi (lantoniazzi@iconebrasil.org.b)
nas propriedades e, por consequência, é          -à-vis à compensação.                         são pesquisadores do Instituto de Estudos
                                                    A visão equilibrada requer que a con-      do Comércio de Negociações Internacionais
o primeiro passo a fim de que elas sejam
                                                                                               (Icone) (www.iconebrasil.org.br) e da Rede de
regularizadas. Para o cadastro ser abran-        solidação de atividades produtivas em
                                                                                               Conhecimento do Agro Brasileiro (RedeAgro)
gente, ou seja, cobrir todas as proprieda-       APPs seja uma exceção, sobretudo nas          (www.redeagro.org.br).
des rurais brasileiras, é preciso viabilizar     matas ripárias. São inúmeros os estudos
a regularização ambiental destas. As             científicos que mostram os benefícios
experiências de estados que criaram o            ambientais desse tipo de vegetação e dos      REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
cadastro rural mostram que, se as exi-           corredores que elas criam, bem como o         ALVES, Eliseu. Um só agro. 26 de agosto de
gências de regularização são elevadas,           tipo de convivência aceitável entre ati-        2011. Disponível em: <www.redeagro.org.br/
                                                                                                 academicos/323-um-so-agro>. Acesso em:
os proprietários simplesmente optam              vidades produtivas e vegetação natural,
                                                                                                 12/12/2011
por não informar os dados, sobretudo             necessária para garantir conservação do
                                                                                               IPEA. Código Florestal: implicações do PL
aqueles que estão com baixa conformi-            solo, proteção da água e da biodiversi-          1876/99 nas áreas de Reserva Legal. Comu-
dade com a lei. O cadastro do estado do          dade. O código aprovado na Câmara, em            nicados do IPEA No 96. 8 de junho de 2011.
estado de Mato Grosso, por exemplo,              nossa opinião, endereça corretamente          Lei Nº 9.605 (12 de fevereiro de 1998) e Decreto Nº
                                                 as situações de atividades florestais,            6.514 (22 de julho de 2008) que a regulamenta.
possui cerca de 6,6 mil propriedades,
                                                                                               NASSAR, André. Reforma do Código Florestal:
totalizando apenas 15% de toda a sua área        culturas de espécies lenhosas, perenes
                                                                                                 onde o IPEA errou. 26 de julho de 2011. Dis-
passível de cadastramento.                       ou de ciclo longo, que hoje ocupam APPs         ponível em: <www.redeagro.org.br/artigo-
   O cadastro obrigatório, fundamental           e precisam ser regularizadas, bem como          -ambiental/262-reforma-do-codigo-florestal-
para se conhecer a situação ambiental            as situações de agricultura praticada em        -onde-o-ipea-errou>. Acesso em: 12/12/2011
das propriedades, jamais será abrangen-          várzeas, como o arroz. No entanto, diante     RODRIGUES, R. R.; LIMA, R. A. F.; GANDOLFIA, S.
                                                                                                 et al. On the restoration of high diversity
te se for utilizado como informação para         da dificuldade de acomodar outras con-
                                                                                                 forests: 30 years of experience in the Brazi-
impor sanções sobre os proprietários.            solidações porventura legítimas, o texto        lian Atlantic Forest. Biological Conservation,
Viabilizar a regularização ambiental das         acabou por flexibilizar demais, tornando        v. 142, n. 6, p. 1242–1251, 2009.
propriedades, portanto, é condição ne-           a possibilidade de consolidação disponí-      SPAROVEK, G., BARRETTO, A., KLUG, I. et al. A
cessária para implantação de um cadas-           vel para todas as atividades produtivas.         revisão do Código Florestal brasileiro. Novos
                                                                                                  Estudos, nº 89, Março de 2010.
tro que possa reunir informações cada               Quando compreendemos que 65% da
                                                                                               Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
vez mais detalhadas sobre áreas produ-           vegetação natural ainda existente no
                                                                                                  (SBPC) e da Academia Brasileira de Ciência
tivas, degradadas, com vegetação nativa          Brasil está em áreas privadas, reconhece-        (ABC). O Código Florestal e a Ciência: con-
e outras ações ligadas à regularização.          mos que é fundamental criar incentivos           tribuições para o diálogo. SBPC/ABC, 2011.
   O Código também precisa ser refor-            econômicos para estimular os proprie-         The Nature Conservancy. Código Florestal na real.
mado para viabilizar a valoração da              tários a conservar além das exigências           Maio de 2011. Disponível em: <www.nature.
                                                                                                  org/ourinitiatives/regions/southamerica/
vegetação nativa protegida dentro das            impostas pela lei. A regularização é o pri-
                                                                                                  brasil/destaques/codigo-florestal-na-real.
propriedades. No Código atual, APPs e            meiro passo. Regularizar os produtores           xml>. Acesso em: 25/11/2011.



VISÃO AGRÍCOLA Nº 10            JAN | ABR 2012                                                                                                  7
VISÃO LEGAL




    Constituição



A política nacional de
preservação e conservação
                do meio ambiente
João Carlos Cabrelon de Oliveira*




                                                                                                                                            RODRIGO ESTEVAM MUNHOZ DE ALMEIDA




Reserva legal e unidades de conservação: Área de Preservação Permanente (APP) é principal instituto jurídico visando proteger nossa flora



O debate sobre a reforma do Código Florestal Brasileiro traz à tona uma reflexão – que não pode ser ligeira nem leviana – sobre
a política nacional de preservação e conservação da flora. O Brasil ocupa uma posição privilegiada sobre o tema, considerando-
-se que a imensa extensão de suas florestas, bem como a extraordinária biodiversidade que elas abrigam, confere ao país uma
vantagem comparativa no cenário mundial. Do ponto de vista jurídico, a avaliação dessa política deve se iniciar pela Constituição
Federal, a qual proclama o direito de todos a um “meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida” (art. 225, caput). Para proteger esse direito, a Constituição condiciona o uso da propriedade
ao atendimento de sua função social (art. 5º, XXIII). Tal função é cumprida, no caso da propriedade rural, mediante a “utilização
adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente” (art. 186, II).
   Ante esses parâmetros, a legislação brasileira criou um tripé de institutos jurídicos visando proteger a flora de forma mais
intensa, cujos pontos principais são as áreas de preservação permanente, a reserva legal e as unidades de conservação.

8
UNIDADES PROTEGIDAS                                preservação e conservação de espaços          rígida, pois eles estarão autorizados, por
As áreas de preservação permanente                 naturais de maior relevância ecológica        exemplo, a implementar atividades “de
têm a função ambiental de “preservar os            e paisagística. Dois exemplos dessas          baixo impacto ambiental” nas áreas de
recursos hídricos, a paisagem, a estabili-         áreas são Yosemite, nos Estados Unidos,       preservação permanente, e de manejo
dade geológica, a biodiversidade, o fluxo          e Torres del Paine, no Chile.                 florestal sustentável, na reserva legal.
gênico de fauna e flora, proteger o solo              Por fim, a reserva legal, que, de acordo      A grande novidade do projeto do novo
e assegurar o bem-estar das populações             com o Código Florestal, é uma “área loca-     Código Florestal atende pelo nome de
humanas” (Código Florestal, art. 2º, § 2º, II).    lizada no interior de uma propriedade ou      “áreas consolidadas”. São áreas rurais
São extensões territoriais ambientalmente          posse rural, excetuada a de preservação       onde a flora foi explorada ilicitamente
sensíveis, como as matas ciliares e a vege-        permanente, necessária ao uso sustentá-       até 22 de julho de 2008. Pelo projeto
tação que recobre os topos de morros ou            vel dos recursos naturais, à conservação      de lei, haverá a concreta possibilidade
montanhas, assim como suas encostas. Da            e reabilitação dos processos ecológicos, à    de manutenção da exploração desses
conservação dessas áreas depende a pró-            conservação da biodiversidade e ao abrigo     territórios, sem obrigação de sua re-
pria viabilidade ecológica e econômica da          e proteção de fauna e flora nativas” (art.    composição. Assim, o proprietário será
terra, pois evita o esgotamento dos recur-         2º, § 2º, III).                               beneficiado com anistia das multas
sos hídricos e previne a erosão dos solos.            Trata-se de limitação administrativa, ou   aplicadas e extinção da punibilidade dos
   Por tais motivos, as áreas de preserva-         seja, de restrição ao uso da propriedade      respectivos crimes.
ção permanente são objeto de proteção na           rural que atinge um número indetermina-          Conclui-se que, ao invés de repensar a
maioria dos países. Como aponta Valverde           do de proprietários, em maior ou menor        política nacional para o setor, o projeto
(2010), na China são previstas as “flores-         extensão, de acordo com a localização         em questão instituirá um modelo iníquo,
tas de abrigo” em razão de sua função              geográfica do imóvel rural. Assim, na área    em que o proprietário rural que transgre-
hidrológica. Na Argentina, preservam-se            de reserva legal, é permitido o manejo flo-   dir a lei será anistiado e beneficiado com
áreas florestais de “alto valor biológico”         restal, mas não o corte raso da vegetação.    a manutenção indefinida da exploração
e de proteção de bacias; na Finlândia, as             É tarefa um tanto quanto ociosa compa-     de seu imóvel além dos limites legais.
florestas ripárias (matas contíguas a cursos       rar o regime de reserva legal praticado no    Em contrapartida, o proprietário que
de água). Na Austrália, há a “zona de prote-       Brasil com institutos semelhantes de ou-      cumpriu as normas ambientais se verá
ção” da mata nativa em ambos os lados das          tros países. A reserva legal, tal como con-   em situação de inferioridade, sem possi-
depressões ou cursos de água.                      cebida pelo Código Florestal, reveste-se de   bilidade de ampliar sua exploração além
   Nos Estados Unidos, Bass (1996) des-            originalidade. Ainda que sua localização      desses limites. É muito pouco do que se
taca na legislação federal a Lei da Água           deva observar critérios estabelecidos         esperaria de uma nova política legislativa
Limpa – instrumento de coibição de                 pelo Código Florestal – como proximidade      para a flora brasileira.
desmatamentos que afetem a qualidade               com áreas de preservação permanente
da água –, além de diversas legislações            ou de acordo com o indicado por planos        * João Carlos Cabrelon de Oliveira é juiz
                                                                                                 federal substituto da 3ª Vara Federal de
estaduais que, com maior ou menor                  de bacias hidrográficas ou zoneamentos
                                                                                                 Piracicaba,SP, Subseção Judiciária do Estado
intensidade, protegem áreas de preser-             ecológico-econômicos –, ela é instituída      de São Paulo (jccolive@jfsp.jus.br ).
vação permanente. No Canadá, Costa                 independentemente de se tratar de uma
(2008) noticia a proteção conferida pela           área de interesse específico de preserva-     REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
província de British Columbia às zonas             ção ambiental.                                BASS, Susan. Ferramentas legais para o geren-
ribeirinhas, divididas entre 1) zonas de                                                           ciamento de florestas nos Estados Unidos.
                                                                                                   Revista de Direito Ambiental. São Paulo:
gestão: mais distantes das margens dos             O QUE VAI MUDAR
                                                                                                   Editora Revista dos Tribunais. ano 1, n. 2, p.
rios e passíveis de manejo; e 2) zonas de          O projeto de Código Florestal, em gesta-        25-39, abr./jun. 1996.
reserva: próximas às margens, onde é               ção no Congresso Nacional, pouco mo-          COSTA, Leonardo Tropia. Estudo em direito
proibido o uso da terra.                           difica a política nacional de preservação       comparado para áreas de preservação per-
   Já as unidades de conservação, previs-          da flora: mantém as áreas de preservação        manente. Viçosa, 2008. Disponível em: <www.
                                                                                                   tede.ufv.br/tedesimplificado/tde_arquivos/4/
tas na Lei 9.985/2000, são constituídas de         permanente e de reserva legal, definindo-
                                                                                                   TDE-2010-01-27T065441Z-2134/Publico/
espaços territoriais com características           -as de forma praticamente idêntica. A           texto%20completo.pdf>. Acesso em: 7 set. 2011.
naturais relevantes, instituídas com obje-         extensão dessas áreas de preservação,         VALVERDE, Sebastião Renato (coord.). Estudo
tivo conservacionista e por ato do Poder           inclusive os percentuais de reserva legal,      comparativo da legislação florestal sobre
Público. Sob os mais variados formatos             tampouco variam de forma significativa.         áreas de preservação permanente e reserva
                                                                                                   legal. Viçosa, 2010. Disponível em: <www.
jurídicos, elas têm sido prestigiadas no             Contudo, a utilização dessas áreas
                                                                                                   abiape.com.br/newsletter/201004e01/file/
mundo inteiro como importante meio de              pelos proprietários rurais será menos           estudo.pdf>. Acesso em: 7 set. 2011.

VISÃO AGRÍCOLA Nº 10              JAN | ABR 2012                                                                                               9
VISÃO LEGAL




 Equidade



O Código Florestal na legislação:
       elementos condicionantes
à agropecuária
                                                             Leonardo Papp*




                                                                                          ROBERTO AMARAL




                                                                                                           As questões relativas à legislação am-
                                                                                                           biental – e, especificamente, ao Código
                                                                                                           Florestal – geram polêmica não apenas
                                                                                                           pelo grau de ideologização recorrente-
                                                                                                           mente envolvido no debate, mas também
                                                                                                           pela necessidade de buscar a conciliação
                                                                                                           entre valores que podem se revelar coli-
                                                                                                           dentes na prática: o desenvolvimento de
                                                                                                           atividades produtivas e a aplicação de
                                                                                                           medidas de preservação ambiental. Em
                                                                                                           resumo, trata-se do complexo desafio de
                                                                                                           buscar um marco legal que, concomitan-
                                                                                                           temente, promova equilíbrio ecológico,
                                                                                                           justiça social e viabilidade econômica,
                                                                                                           tal como aponta a Constituição Federal
                                                                                                           de 1988 ao indicar os fundamentos e
                                                                                                           objetivos da República. São alguns deles:
                                                                                                           dignidade da pessoa humana, valores
                                                                                                           sociais do trabalho e da livre iniciativa,
                                                                                                           desenvolvimento nacional etc.
Plantio de milho: o conceito de área rural consolidada visa a dar segurança jurídica às
áreas de atividades agropecuárias


10
A partir desse contexto, o escopo do         áreas rurais consolidadas até 22 de julho      das APPs fora dos limites previstos (30
presente artigo é apresentar alguns             e 2008” que estejam localizadas em Áre-        metros etc.), exceto quando ato do Poder
subsídios iniciais acerca do Projeto de         as de Preservação Permanente (APPs),           Público dispuser em contrário (art. 4º, §
Lei do Congresso (PLC 30/11), que propõe        “sendo exigidas nestes casos a adoção          3º), além de admitir o plantio de vazante
a revisão do atual Código Florestal Bra-        de técnicas de conservação do solo e           para algumas culturas – desde que não
sileiro. A fim de sistematizar a descrição      água que visem à mitigação dos eventuais       ocorram novas supressões de vegetação
proposta, as seções subsequentes são            impactos” (art. 8º caput c/c § 1º).            e que seja conservada a qualidade da
dedicadas a indicar dispositivos do texto          Ainda no que se refere à adequação das      água (art. 4º, § 5º).
do PLC 30/11 que estejam direcionados,          atividades desenvolvidas em áreas rurais          Nos topos de morros, bordas de tabu-
respectivamente, (i) à viabilização e           consolidadas, o PLC 30/11 cria o instituto     leiros, chapadas e em altitude superior
adequação de atividades produtivas no-          denominado Programas de Regularização          a 1800 metros, desde que não implique
tadamente consideradas consolidadas;            Ambiental (PRAs), em cuja regulamen-           conversão de novas áreas para uso al-
e (ii) à proteção dos remanescentes de          tação “a União estabelecerá normas de          ternativo do solo e que sejam adotadas
floresta e outras formas de vegetação,          caráter geral, incumbindo-se aos Estados       práticas conservacionistas do solo e da
especialmente no que se refere a brechas        e ao Distrito Federal o detalhamento, por      água, o PLC 30/11 admite a manutenção de
para desmatamento.                              meio da edição de normas de caráter es-        atividades florestais, culturas de espécies
   Deixe-se explicitado desde logo que a        pecífico, em razão de suas peculiaridades      lenhosas (perenes ou de ciclo longo),
pretensão não é formular qualquer con-          territoriais, climáticas, históricas, cultu-   pastoreio extensivo e a infraestrutura
clusão ou impor qualquer ponto de vista,        rais, econômicas e sociais, conforme pre-      associada ao desenvolvimento de tais ati-
tampouco realizar uma análise exaustiva         ceitua o art. 24 da Constituição Federal”      vidades (art. 10). Mecanismo semelhante
do mencionado Projeto de Lei. O que se          (art. 33, caput e § 1º). Para além do regime   está previsto para as áreas com inclina-
busca é apenas e tão somente fomentar           jurídico das áreas rurais consolidadas e       ção entre 25º e 45º, consideradas de uso
a reflexão sobre a adequação ou não             dos PRA’s, sob a ótica do desenvolvimento      restrito, nas quais não seria permitida a
do PLC 30/11 na busca da conciliação            de atividades produtivas, também podem         supressão de vegetação, mas admitidas:
entre atividade produtiva e preservação         ser indicadas outras inovações inseridas       a manutenção de culturas de espécie
ambiental. Para tanto, tomar-se-á como          no texto do PLC 30/11.                         lenhosa (perene ou de ciclo longo), as
base a redação mais recente do PLC                 Ao longo de cursos de água, as APPs         atividades silvicultoras, ou outras ativi-
30/11, aquela contida no Substitutivo           passam a ser definidas a partir do leito       dades, excetuadas aquelas realizadas em
apresentado à Comissão de Constituição          menor, assim entendido como o canal            áreas de risco e sendo vedada a expansão
e Justiça do Senado Federal, em 31de            por onde correm regularmente as águas          dos locais atingidos (art. 12). Ainda como
agosto de 2011.                                 durante o ano (art. 4º, ), ao contrário do     área de uso restrito, o PLC 30/11 destina
                                                critério atual (maior nível da cheia sazo-     dispositivo específico para a planície
ATIVIDADES PRODUTIVAS                           nal), considerado pouco objetivo e inse-       pantaneira, na qual se admitiria a ex-
Diversas das propostas contidas no PLC          guro. No que se refere a topos de morros,      ploração ecologicamente sustentável,
30/11 conferem mais segurança às áreas          montanhas e serras, embora continuem           devendo considerar as recomendações
atualmente utilizadas para atividades           inseridos na lista de APPs, o PLC 30/11        técnicas dos órgãos de pesquisa (art. 11).
agropecuárias. É o que se verifica, por         propõe utilizar uma nova conceituação             Embora o PLC 30/11 (art. 13) mantenha
exemplo, com a instituição do conceito          (art. 4º, VIII), tida como mais adequada       os mesmos percentuais concernentes à
de área rural consolidada, bem como por         à realidade fática. Nos reservatórios de       Reserva Legal (RL) atualmente previstos
sua previsão de tratamento diferenciado.        d’água artificiais que não decorram de         pela Lei 4.771/65, nas propriedades rurais
Entende-se por esse termo a “área do            barramento ou represamento de cursos           com área de até 4 módulos fiscais que
imóvel rural com ocupação antrópica             d’água, o texto sob análise no Congresso       possuam remanescentes de vegetação
preexistente a 22 de julho de 2008, com         Nacional propõe que não se exija faixa de      nativa em percentual inferior ao previsto
edificações, benfeitorias ou atividades         preservação permanente (art. 4º, § 1º). O      em Lei (20%, 35% ou 80%), a RL seria cons-
agrossilvopastoris, admitidas, nesse úl-        mesmo ocorre em relação às acumula-            tituída pela vegetação nativa existente
timo caso, a adoção do regime de pousio”        ções naturais ou artificiais de água com       em 22 de julho de 2008 – vedadas novas
(art. 3º). Em tais situações, o PLC 30/11       área de até 1 hectare (art. 4º, § 4º).         conversões para uso alternativo do solo
autoriza, “exclusivamente, a continui-             Para além disso, no PLC 30/11 fica          (art. 13, § 7º).
dade das atividades agrossilvopastoris,         esclarecido que as áreas de várzeas,              Ainda no que se refere à RL, o texto do
de ecoturismo ou de turismo rural em            salgados e apicuns não são considera-          PLC 30/11 propõe que o protocolo da do-



VISÃO AGRÍCOLA Nº 10           JAN | ABR 2012                                                                                          11
cumentação exigida para análise da sua           (art. 35). Dessa forma, consubstancia-se          f) como regra, é vedada a conversão
localização impeça que o produtor seja           modalidade específica de adequação,                  de novas áreas para uso alternativo
multado em razão da não formalização da          independentemente da adesão a Progra-                do solo em topo de morros, veredas,
RL (art. 15, § 2º). Além disso, o Substitutivo   mas de Regularização Ambiental. Por fim,             chapadas e altitudes superiores a 1800
em tramitação no Congresso Nacional              pode-se destacar no PLC 30/11 a previsão,            metros (art. 10), assim como em locais
permite computar a APP no cálculo da RL          ainda que de forma bastante singela, de              com inclinação entre 25º e 45º (art. 12);
desde que atendidos os seguintes requisi-        mecanismos econômicos, inclusive pa-              g) é vedada a conversão de novas áreas
tos: (i) não implicar a conversão de novas       gamento por serviços ambientais, como                para uso alternativo do solo, nas pro-
áreas para uso alternativo do solo; (ii) a       medidas de estímulo ao cumprimento da                priedades com até 4 módulos fiscais
área a ser computada estar conservada            legislação ambiental (art. 48 a 50).                 que não tinham remanescentes de
ou em processo de recuperação; (iii) o                                                                vegetação suficientes em 22 de julho
imóvel estar no Cadastro Ambiental               A QUESTÃO DO DESMATAMENTO                            de 2008 (art. 13, § 7º);
Rural (art. 16). De mais a mais, a inscrição     Da leitura do PLC 30/11 também é possível         h) a possibilidade de computar APP no
da RL passaria a ser feita diretamente           identificar a previsão de dispositivos des-          cálculo da RL não poderá implicar
no Cadastro Ambiental Rural, mantido             tinados à proteção de áreas de floresta              conversão de novas áreas para uso
pelo órgão ambiental, por meio de pro-           e vegetação naturais ainda existentes                alternativo do solo (art. 16, I);
cedimento simplificado, e não mais no            no País, tendo em vista a inclusão de             i) o regime de proteção da RL não se al-
Cartório de Registro de Imóveis (art. 19).       diversos dispositivos que demonstram a               tera nos casos de transmissão, a qual-
   Argumentando ser necessário obser-            preocupação de não estimular a realiza-              quer título, ou de desmembramento do
var a irretroatividade temporal das impo-        ção de desmatamentos ilegais, dentre os              imóvel rural (art. 19);
sições contidas na legislação ambiental,         quais se destacam:                                j) não é permitida a conversão de vege-
o PLC 30/11 determina que, para fins de          a) a expressa previsão de que as infrações           tação nativa para uso alternativo do
recomposição da Reserva Legal, quando               à legislação serão sancionadas penal,             solo no imóvel rural que possuir área
necessário, passam a ser aplicados os               civil e administrativamente (art. 2º, § 2º);      abandonada (art. 29);
percentuais da legislação que estava em          b) regra explícita que não admite a su-           k) as obrigações relativas à RL são trans-
vigor na época em que foi realizada a               pressão de novas áreas de vegetação               mitidas para o sucessor em caso de
supressão de vegetação, ainda que atu-              nativa no caso de agricultura de vazan-           transferência do domínio ou posse do
almente os percentuais sejam maiores.               te (art. 4º, § 5º);                               imóvel rural (art. 38);
Assim, o proprietário que tenha observa-         c) a determinação no sentido de que,              l) a definição de áreas prioritárias para a
do a legislação vigente na época em que             tendo ocorrido novas supressões de                compensação de RL deve buscar favo-
iniciou suas atividades será beneficiado            vegetação nativa em área de preser-               recer, entre outros, a recuperação de
(art. 39). Nos casos em que for necessário          vação permanente, o proprietário ou               bacias hidrográficas excessivamente
destinar novas áreas para atender às                possuidor é obrigado a promover a re-             desmatadas, a criação de corredores
exigências de RL, o PLC 30/11 amplia as             composição da vegetação, ressalvados              ecológicos, a conservação de grandes
alternativas de compensação em outras               os usos autorizados em Lei (art. 7º § 1º);        áreas protegidas, a conservação ou re-
propriedades, admitindo-se a utilização          d) no caso de desmates não autorizados,              cuperação de ecossistemas ou espécies
de áreas fora da bacia hidrográfica ou              realizados após 22 de julho de 2008,              ameaçados (art. 38, § 7º);
mesmo do Estado (desde que seja o mes-              veda-se a concessão de novas autoriza-         m) estabelece normas para o controle do
mo bioma). Também permite que os Es-                ções de supressão, enquanto não for re-           desmatamento, entre as quais a impo-
tados criem fundos de regularização fun-            cuperada a área desmatada (art. 7º, 3º);          sição de sanções e embargos, além da
diária de unidades de conservação como           e) deixa explicitamente consignado que               divulgação de dados da propriedade
forma de compensar obrigações relativas             novas intervenções e supressões em                embargada (art. 58).
à Reserva Legal (art. 38). No que se refere         APPs somente poderão ser admitidas
às áreas rurais consolidadas às margens             em situações excepcionais, conside-
de cursos de água com até 10 m de largu-            radas de utilidade pública, de interesse
ra, o PLC 30/11 admite a manutenção de              social ou de baixo impacto, bem como
                                                                                                   * Leonardo Papp é doutorando em Direito
atividades agrossilvopastoris, desde que            reafirma vedação à expansão de ati-
                                                                                                   Econômico e Socioambiental (PUC-PR),
sejam recompostos, no mínimo, 15 m de               vidades consolidadas realizadas em             mestre em Direito Ambiental (UFSC) e
vegetação e sejam observados critérios              áreas de preservação permanente                professor de Direito Ambiental da Católica de
técnicos de conservação do solo e água              (art. 8º);                                     Santa Catarina. (leonardo@papp.adv.br)




12
VISÃO TÉCNICA




                                              Estratégias




                                            Novos conceitos da pecuária para
                                                      preservação das bacias
                                                   hidrográficas
                                                                                    Walter de Paula Lima*




                                                                                    Apesar de a água ser um dos elementos
CENTRO DE MÉTODOS QUANTITATIVOS ESALQ/USP




                                                                                    essenciais para a vida, o ser humano nun-
                                                                                    ca se preocupou muito com a sua preser-
                                                                                    vação, em razão de sua aparente inesgo-
                                                                                    tabilidade. Porém, estudos têm indicado
                                                                                    que um dos problemas mais críticos que
                                                                                    a humanidade enfrentará nos próximos
                                                                                    anos será a indisponibilidade de água. A
                                                                                    consciência quanto à importância dessa
                                                                                    substância, contudo, ainda não chegou
                                                                                    ao cidadão comum e, tampouco, induziu
                                                                                    ao estabelecimento de políticas públicas
                                                                                    voltadas à sua conservação.
                                                                                       Preservar a água é um processo com-
                                                                                    plexo, pois depende, fundamentalmente,
                                                                                    da conservação dos outros recursos
                                                                                    naturais existentes no planeta. O com-
                                                                                    portamento da água em sua superfície,
                                                                                    ou seja, como a fase terrestre do ciclo
                                                                                    hidrológico se manifesta, é um reflexo
                                                                                    direto das condições e do uso do local
                                                                                    por onde ela emana. A alteração da pai-
                                                                                    sagem e a degradação do solo reduzem
                                                                                    a produtividade de água e afetam sua
                                                                                    disponibilidade e sua qualidade (Bossio
                                                                                    et al, 2010).




                                                                                    Vista aérea de área de produção: atividade
                                                                                    agropecuária é produção da água, componen-
                                                                                    tes essenciais da vida



                                            VISÃO AGRÍCOLA Nº 10   JAN | ABR 2012                                          13
VISÃO TÉCNICA




   Quando o assunto é abordado, a maio-      de córregos, assim como da alteração              A atividade agropecuária ocupa cerca
ria das pessoas pensa apenas na “água        da qualidade da água – em grande parte         de 40% da superfície terrestre e a altera-
visível”, ou seja, naquela que pode ser      causada pela manipulação da paisagem           ção da paisagem – resultado da expansão
usada diretamente para os mais varia-        pelo homem –, tem muito mais implica-          da agricultura – foi, sem dúvida, um dos
dos fins. E é justamente ela que está se     ções para a saúde da biosfera como um          fatores responsáveis pela modificação
esgotando. Poucos se dão conta de que o      todo do que para o abastecimento da            do ciclo hidrológico, tanto em termos
ciclo hidrológico é o sistema circulatório   população.                                     quantitativos quanto qualitativos (Gor-
da biosfera, o qual proporciona a geração                                                   don et al, 2011). Em termos quantitativos,
dos chamados serviços ambientais –           AGROPECUÁRIA X ÁGUA                            o padrão da evapotranspiração global
fundamentais para a sobrevivência da         Falar sobre a relação entre atividade          mudou, diminuindo nas áreas desmata-
humanidade. A diminuição da disponi-         agropecuária e água requer, evidente-          das e aumentando em áreas irrigadas. O
bilidade de água está também afetando        mente, muita responsabilidade e em-            elevado uso consumptivo de água para a
os processos ecológicos da biosfera,         basamento, já que dois componentes             irrigação, por sua vez, reduz o fluxo dos
responsáveis pelos chamados serviços         essenciais para a vida são o resultado         rios e ribeirões. Já o aumento da erosão
ambientais (Gordon et al, 2010).             dessa discussão: alimento e água. O tema       e a degradação da matéria orgânica do
   Os serviços ambientais podem ser clas-    fica ainda mais complexo em razão de           solo, ao longo dos ciclos de produção,
sificados em quatro categorias:              a agricultura, principalmente pela irri-       tornam menor a escala de produtivi-
a) produção: de alimentos, de grãos, de      gação, ser responsável por 70% de todo         dade de água, principalmente devido à
   fibras, de carne etc.;                    o consumo de água pela humanidade.             diminuição da infiltração, ao aumento
b) regulação: controle de pragas, polini-    Além disso, a manipulação da paisagem          do escoamento superficial e à redução
   zação, clima;                             visando preparar a área para o desen-          da capacidade de seu armazenamento
c) culturais: valores recreacionais, espi-   volvimento da agricultura resulta em           (Bossio et al, 2011). E parece inevitável a
   rituais e estéticos;                      mudanças nos processos hidrológicos            necessidade de aumento da área agrícola,
d) suporte: processos ecológicos básicos,    de superfície; isso reduz a produtivida-       previsto inclusive de ocorrer a uma taxa
   como formação do solo, proteção           de de água. Assim, uma carga maior de          de 0,8% ao ano, o que equivaleria a um
   da superfície do solo e da infiltração    nutrientes, agroquímicos e sedimentos          aumento do consumo de água da ordem
   pela cobertura vegetal, produção de       pode chegar aos cursos de água e, dessa        de 30% a 40% até 2050 (Gordon et al, 2011);
   oxigênio, absorção de gás carbônico,      forma, alterar sua qualidade (Figura 1).       (Figura 2).
   desnitrificação, dispersão de semen-
   tes, polinização.
   Mesmo com a implementação de
práticas adequadas de manejo do solo
                                             FIGURA 1. ÁREA DE TOPOGRAFIA ONDULADA COM PREPARO RECENTE PARA PLANTIO*
que visam à produção agropecuária,




                                                                                                                                          WALTER DE PAULA LIMA
não é tarefa fácil evitar o aumento do
escoamento superficial e da erosão, que
arrastam nutrientes, matéria orgânica
e sedimentos para os cursos de água e
lagos, alterando a qualidade da água e o
funcionamento do ecossistema aquático.
Nesse sentido, o chamado ecossistema
ripário – resultado da interação da ve-
getação ciliar evolutivamente adaptada
às áreas ribeirinhas saturadas – desem-
penha papel fundamental para o controle
desses possíveis efeitos. Tal ecossistema
tem, também, papel decisivo na perma-
nência da biota aquática. Desta maneira,
a crise da água, principalmente quando
se trata da diminuição da vazão e altera-
ção do regime de rios e ribeirões, da seca   *Os processos hidrológicos de superfície são alterados após alterações na paisagem.




14
FIGURA 2. ÁREA DESMATADA E TRANSFORMADA EM PASTAGEM*                                                            Assim, é necessário garantir a preser-




                                                                                      WALTER DE PAULA LIMA
                                                                                                             vação da água, a qualidade ambiental
                                                                                                             e a produção de alimentos – e estas
                                                                                                             são metas que têm de ser abordadas de
                                                                                                             forma integrada. Tratar cada uma sepa-
                                                                                                             radamente causa conflitos e prejuízos
                                                                                                             para todos (Falkenmark & Folke, 2002).
                                                                                                             A água, em termos de suas demandas e
                                                                                                             funções, é o componente fundamental
                                                                                                             que possibilita relacionar o uso da terra
                                                                                                             (visando à produção) com os impactos
                                                                                                             ambientais decorrentes. Esse conceito
                                                                                                             deve ser a base para o planejamento
                                                                                                             de ações de manejo que busquem a
                                                                                                             sustentabilidade. Por exemplo, quando
                                                                                                             direciona-se melhor o uso da água, pro-
*A expansão das fronteiras agropecuárias é responsável por mudanças na evapo-
transpiração, assim como nos processos hidrológicos de superfície.
                                                                                                             cedimento fundamental para a busca da
                                                                                                             agricultura sustentável, a degradação
                                                                                                             da área é evitada. Há estimativas de que
   Outro fator que também é muito im-            ramento dos cursos de água, tão comum                       cerca de 40% da área agrícola mundial
portante na avaliação dos efeitos das            em áreas rurais, também é responsável                       encontram-se moderadamente degra-
atividades agropecuárias sobre a água            pela ruptura da chamada conectividade                       dadas, enquanto que cerca de 9% estão já
diz respeito ao planejamento da ocupa-           hidrológica, ou seja, a propriedade que                     em forte estado de deterioração (Bossio
ção dos espaços produtivos da paisagem           reflete a eficácia do fluxo de água entre os                et al, 2011). E a destruição da terra, como
visando à produção agropecuária. Não é           elementos do ecossistema, que, por sua                      já afirmado, afeta tanto a produtividade
fácil tentar incutir a necessidade de prote-     vez, afeta a geração de serviços ambien-                    agrícola quanto a disponibilidade de
ção das áreas ripárias onde há a presença        tais (Creed et al, 2011); (Figura 3).                       água (Figura 4).
da vegetação ciliar, que em nosso país,
por força do novo Código Florestal, ficou
restrita a uma largura arbitrária fixa e si-
métrica ao longo dos córregos e ribeirões,
assim como ao redor de nascentes.
   Mas na natureza a ocorrência dessas           FIGURA 3. CABECEIRA DE DRENAGEM DE UMA MICROBACIA EM UMA PROPRIEDADE RURAL*
áreas, denominadas hidrologicamente

                                                                                                                                                       WALTER DE PAULA LIMA
sensíveis, não guarda nenhuma simetria,
sendo função da heterogeneidade natu-
ral da paisagem, em termos de geologia,
geomorfologia, solos e clima. Além disso,
também pode haver áreas saturadas nas
partes mais elevadas do terreno, e não
apenas nas margens e cabeceiras dos
cursos de água. Em ambos os casos, são
áreas de descarga ou de afloramento dos
fluxos subsuperficiais de água. Por essa
razão, devem ser protegidas, e não dre-
nadas ou usadas. Nenhuma microbacia
hidrográfica é exatamente igual à outra
e, portanto, não há como estabelecer
prescrições generalizadas para realizar          *Já são visíveis os sinais de degradação hidrológica, resultado da destruição da vegetação ciliar
seu mapeamento. Por outro lado, o bar-           e do uso intensivo pela pecuária



VISÃO AGRÍCOLA Nº 10            JAN | ABR 2012                                                                                                       15
VISÃO TÉCNICA




FIGURA 4. ÁREA RURAL DEGRADADA*




                                                                                                                                          WALTER DE PAULA LIMA
*A destruição da terra pode ser evitada com correto manejo da água, fun-damental na busca da agropecuária sustentável.




DESAFIOS
A sustentabilidade ocorre em diferentes        discussão. Levando em conta a relação           Assim, a microbacia constitui a base
dimensões e escalas. A conceituação            produção agropecuária e água, a Figura        sólida para o estabelecimento de estraté-
proposta é fundamental para o estabe-          5 fornece uma visão prática dessas dife-      gias sustentáveis de manejo, pois permite
lecimento de estratégias sustentáveis          rentes escalas. A escala macro represen-      estabelecer práticas sustentáveis de ma-
de manejo agropecuário. Por exemplo, é         ta as imposições e limitações, naturais       nejo adaptadas às especificidades locais.
essencial que a dimensão econômica da          e legais, que devem nortear o estabe-         Pela mesma razão, possibilita, também,
sustentabilidade, inerente à produção          lecimento de um sistema de produção           a materialização do conceito de manejo
agropecuária, possa abranger também a          agropecuária. No outro extremo, há a          integrado, conforme ilustra a Figura 6
dimensão ecológica. Nesse sentido, uma         escala micro, que é a própria unidade         (adaptada de Falkenmark & Folke, 2002).
estratégia que vem ganhando apoio está         de produção, a propriedade rural, onde        Em cada microbacia, as fontes de água
relacionada com o chamado pagamento            as ações de manejo são implementadas.         são as chuvas, que podem ser dissipadas
por serviços ambientais. Trata-se de polí-     No meio é representada a escala da mi-        em “água verde”, ou evapotranspiração,
tica pública questionável, no mínimo, por      crobacia hidrográfica, unidade natural        que faz as plantas crescerem e possibilita
várias razões. A principal delas reside no     da paisagem. A microbacia é a escala da       a produção agropecuária, e “água azul”,
fato de que ações isoladas – como reve-        água. As imposições naturais determi-         que é a água superficial, visível e respon-
getação da área ciliar – não são, por si só,   nam sua estrutura e seu funcionamento         sável por abastecer a humanidade e gerar
garantia de inclusão de toda a dimensão        hidrológico, ao mesmo tempo em que as         os serviços ambientais. O manejo susten-
ecológica envolvida na conservação am-         imposições legais, como a das Áreas de        tável tem necessariamente de manter o
biental. Outro argumento diz respeito ao       Preservação Permanentes (APPs), visam         equilíbrio entre estes dois fluxos de água.
alcance do manejo sustentável que, por         a protegê-la. Do outro lado, as conse-
definição, requer mudanças de compor-          quências das ações de manejo visando
tamentos em diversos âmbitos, princi-          à produção agropecuária, conforme já
palmente culturais, o que é diferente de       comentado, podem afetá-la tanto em
                                                                                             * Walter de Paula Lima é professor titular
se remunerar uma boa ação.                     termos de diminuição do fluxo de água,
                                                                                             permissionário LCF USP/ESALQ (wplima@
   A questão das escalas da sustenta-          quanto de alteração da qualidade e dos        esalq.usp.br).
bilidade tem papel importante nessa            serviços ambientais.


16
FIGURA 5. ESCALAS DA SUSTENTABILIDADE HIDROLÓGICA*



                       NACIONAL                                               REGIONAL                                              UNIDADE DE MANEJO


                       Disponibilidade de água                                Saúde da microbacia                                   Práticas de manejo adaptativo
                       Precipitação                                           Planejamento de uso                                   Espécies
                       Evapotranspiração potencial                            Demanda de água                                       Espaçamento
                       Balanço hídrico climático                              Balanço hídrico                                       Rotação
                       Legislação ambiental                                   Regime de vazão                                       Cultivo mínimo
                       Produtividade do solo                                  Assoreamento                                          Plantio direto
                                                                              Ecossistema aquático                                  Práticas de conservação do solo
                                                                              Desenho das estradas                                  Eficiência na irrigação
                                                                              Áreas ripárias (mata ciliar)                          Colheita
                                                                              Hidrologia do solo


          * Forma integrada para a análise das diferentes escalas envolvidas na conservação do solo e da água, a fim de orientar a busca do manejo
          sustentável.




                                                                                                                         REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
                                                                                                                         BOSSIO, D.; Geheb, K.; Critchley, W., Managing
                                                                                                                           water by managing land: Addressing land
                                                                                                                           degradation to improve water productivity
                                                                                                                           and rural livelihoods. Agricultural Water
                                                                                                                           Management, 2011. 97: 536-542.
                                                                                                                         CREED, I. F.; Sass, G. Z.; Buttle, J. M. et al, Hydro-
                   FIGURA 6. BALANÇO HÍDRICO DA MICROBACIA HIDROGRÁFICA*
                                                                                                                           logical principles for sustainable mana-
                                                                                                                           gement of forest ecosystems. Hydrological
WALTER DE PAULA LIMA




                                                            CHUVA                                                          Processes, 2011. 25: 2152-2160.
                                                                                                                         FALKENMARK, M.; Folke, C. The ethics of socio-
                                                                                                                            -hydrological catchment management:
                                                                                                                            towards hydrosolidarity. Hydrology and
                                                                                                FLUXO DE ÁGUA VERDE         Earth System Sciences, 2002. 6: 1-9.
                                                                                                                         GORDON, L. J.; Finlayson, C. M.; Falkenmark, M.
                                                                                                                           Managing water in agriculture for food pro-
                                                                                                                           duction and other ecosystem services. Agri-
                                                                                                                           -cultural Water Management, 2011. 97: 512-519.




                                                                                                    FLUXO DE ÁGUA AZUL



                                                                  DIVISOR TIPOGRÁFICO


                             MONTANTE                                               JUSANTE


                       * O manejo sustentável busca o equilíbrio entre os fluxos de “água verde” e “água azul”.




          VISÃO AGRÍCOLA Nº 10                         JAN | ABR 2012                                                                                                      17
VISÃO TÉCNICA




   Vantagens


Reserva Legal pode ser boa
       oportunidade de negócios
em propriedades rurais
Pedro Henrique Santin Brancalion, Edson José Vidal da Silva e Carine Klauberg*



JOÃO LUÍS F. BATISTA

                                                               Diante dos recentes debates sobre as
                                                               mudanças no Código Florestal, a Reserva
                                                               Legal (RL) tem sido frequentemente clas-
                                                               sificada como um ônus para o produtor,
                                                               uma obrigação que não lhe trará nada
                                                               em troca, exceto a regularização legal.
                                                               Apesar dos desafios para consolidar
                                                               o manejo da RL como opção econô-
                                                               mica, já existem inúmeros exemplos
                                                               que apontam essa possibilidade. Neste
                                                               artigo, serão apresentados alguns deles
                                                               evidenciando que o percentual da pro-
                                                               priedade rural a ser destinado como RL
                                                               não implica necessariamente perda de
                                                               áreas produtivas.




                                                               Reserva florestal ao lado de área agricultável:
                                                               rendimentos lucros de atividades florestais
                                                               podem ser, em alguns casos, maiores que de
                                                               atividades agropecuárias


18
Nenhuma propriedade agrícola é for-          Considerando os valores médios apli-             trado nas várzeas, já existem variedades
mada exclusivamente por áreas aptas             cados para madeira em tora e madeira             de sequeiro que podem ser usadas em
para a agropecuária, principalmente em          serrada na Amazônia Legal, verifica-se           modelos de recomposição da RL. No
se tratando de culturas que envolvam a          que as possibilidades de uso econômico           caso da castanha-do-brasil (Bertholletia
colheita mecanizada. No caso de culturas        da RL são bastante atrativas, e poderiam         excelsa), que tem uma ocorrência de 1 a
agrícolas anuais e perenes, a totalidade        ser mais bem exploradas caso a RL fosse          5 árvores por hectare, a produção por
de áreas aptas para cultivo normalmen-          respeitada, conforme indica a Tabela 1.          árvore é de cerca de 30 kg, sendo este
te não ultrapassa 70% da propriedade               Quando comparados aos rendimentos             um dos produtos mais valorizados da
agrícola. Assim, se for considerada a           de outras atividades atualmente esta-            floresta, atingindo de R$ 2,50 a R$ 5,00
demanda de área para o cumprimento do           belecidas, muitas das quais são ilegais          por litro dessa semente com casca. A pu-
atual Código Florestal (com exceção da          do ponto de vista ambiental, os lucros           punha (Bactris gasipaes) é outra espécie
Amazônia Legal), representada por 20%           provenientes de atividades florestais            de interesse, podendo produzir de 4 a 10
de RL e aproximadamente 10% de Áreas            podem ser maiores. Além disso, são ativi-        t de frutos/ha, que são vendidos na faixa
de Preservação Permanente, verifica-se          dades que se mantêm ao longo do tempo,           de preço entre R$ 10,00 e R$ 25,00 por kg.
que cumprir a RL não seria um obstáculo         diferentemente do uso de pastagens               Além de outros produtos alimentícios
tão grande se houvesse um planejamento          extensivas em várias regiões amazônicas,         de relevância na economia regional,
racional de uso e ocupação do solo.             as quais não sustentam níveis satisfató-         como o cupuaçu (Theobroma grandiflo-
   Ao avaliar essa questão em mais de           rios de produtividade pouco tempo após           rum) e o taperebá (Spondias mombin),
500 mil ha de usinas sucroalcooleiras do        a conversão da área. Afora a madeira,            a Floresta Amazônica oferece inúmeras
estado de São Paulo, onde o cenário para        os chamados produtos florestais não              possibilidades de aproveitamento de
o cumprimento da lei é mais drástico, a         madeireiros são outra opção atrativa e           plantas medicinais, tais como a andiroba
recomposição da RL resultaria no deslo-         participam ativamente da economia de             (Carapa guianensis), o breu (Protium sp.)
camento médio de apenas 6,4% de áreas           muitas famílias rurais no Norte do país.         e a copaíba (Copaifera spp.), que estão
cultivadas com cana-de-açúcar, ao invés                                                          cada vez mais despertando o interesse
de 20% (Brancalion & Rodrigues, 2010). Em       RL: OPORTUNIDADE DE NEGÓCIOS                     de empresas nacionais e internacio-
se tratando de áreas em uso pela silvicul-      Cerca de 98% da produção de frutos do            nais. Todas essas oportunidades de uso
tura ou pecuária, a situação é ainda mais       açaí são oriundos da atividade extrati-          econômico, sem falar nas modalidades
favorável para o cumprimento do código.         vista em florestas. Com a adoção de boas         de pagamento por serviços ambientais,
Se fosse conduzida uma avaliação mais           práticas de manejo, o açaí-do-amazonas           como a venda de créditos de carbono,
rigorosa, certamente mais áreas seriam          (Euterpe precatoria) pode produzir de 6          são possíveis na RL, mas deixam de ser
abandonadas por problemas de inapti-            mil a 10 mil kg de frutos/ha/ano, tendo de       uma opção quando ocorre a conversão de
dão agrícola e poderiam ser recompostas         200 a 500 plantas/ha. Para o açaí-do-pará        áreas para uso alternativo do solo, como
no processo de adequação ambiental.             (Euterpe oleracea), a produção pode va-          pode ser observado na Figura 1.
Embora o cumprimento da RL possa não            riar de 6 mil a 12 mil kg de frutos/ha/ano,         Apesar de o manejo da RL em frag-
deslocar áreas de produção agrícola, é          com 300 a 500 plantas/ha. Considerando           mentos remanescentes ser especial-
preciso também avaliar se o uso susten-         que a lata com 14 kg de frutos é vendida         mente recomendado para a Amazônia,
tável delas constitui uma opção rentável        hoje entre R$ 18,00 e R$ 40,00, verifica-se      outros biomas, como o Cerrado, também
para o produtor rural.                          que essa é uma ótima atividade econômi-          apresentam ótimas oportunidades de
   No caso do manejo de remanescentes           ca. Embora o manejo do açaí seja concen-         negócios. Por exemplo, a exploração de
de vegetação nativa, as perspectivas
são muito favoráveis, e ressalta-se a
importância socioeconômica do manejo
da floresta. Para a Amazônia Legal, é           TABELA 1. PREÇOS MÉDIOS (R$/M³) POR CLASSE DE VALOR ECONÔMICO DE MADEIRAS EXPLO-
                                                RADAS NA AMAZÔNIA LEGAL, 2009*
permitida a exploração de madeira nativa
na RL de até 30 m³ de toras/ha, no caso         Forma de comercialização      Alto valor      Médio valor     Baixo valor      Valor Médio
                                                                              econômico       econômico       econômico
de ciclos mínimos de 35 anos, e de 10 m³
                                                Madeira em tora               283             173             130              195
de toras/ha, com ciclos de 10 anos (IN nº
                                                Madeira serrada               1090            658             517              754
05/06). A madeira gerada na RL pode ser
tanto utilizada para suprir as demandas         Fonte: Adaptado de Pereira et al. (2010).
da propriedade como para gerar renda.           * Taxa de conversão: US$ 1,00 = R$ 1,60.




VISÃO AGRÍCOLA Nº 10           JAN | ABR 2012                                                                                           19
VISÃO TÉCNICA




pequi em Goiás pode apresentar margem           SUSTENTABILIDADE NA RL
bruta superior à da soja (Sant’Anna, 2011).     No entanto, tais opções de manejo de             madeira nativa no mercado devido à
Para exemplificar, em áreas onde há 10          remanescentes nativos podem não ser              redução do desmatamento na Amazônia
pequizeiros/ha, o proprietário poderá           viáveis em regiões do país onde a degra-         e ao aumento da demanda interna, a
ter uma margem bruta de R$ 200,00 a R$          dação foi mais intensa, predominando             produção de madeira nativa na RL – via
600,00 por hectare. No mesmo período            fragmentos florestais pequenos e frágeis         recomposição ou manejo – será uma
e região, a margem bruta para a soja foi        ecologicamente. Nesse contexto, há uma           atividade cada vez mais vantajosa, mais
de R$ 430/ha/ano (Sant’Anna, 2011). Além        demanda maior pela recomposição da RL.           até do que vários sistemas de produção
do pequi, há ainda quase 60 espécies de         Mesmo nessa situação, já existem mode-           agropecuária. No estado de São Paulo,
fruteiras nativas usadas pela população,        los econômicos de uso da RL em recupe-           por exemplo, há um decreto estadual
que poderiam vir a ter uso econômico e          ração que oferecem ótimas perspectivas           que regulamenta o uso temporário de
ser comercializadas. Assim, existem inú-        de retorno financeiro ao produtor, como          eucalipto intercalado com espécies
meras oportunidades de negócios em se           no caso da área retratada na Figura 2.           nativas para a recomposição da RL. Só
tratando do manejo da RL na propriedade           Por exemplo, a implantação de mode-            a colheita de eucalipto nesse sistema
rural, mas são poucos os projetos que           los voltados à exploração madeireira de          poderia render ao produtor cerca de R$
aproveitam hoje esse potencial. Com             espécies nativas pode apresentar uma             3.500,00/ha de lucro líquido ao final de
o avanço da pesquisa, novas espécies            margem bruta de mais de R$ 350,00/ha/            um ciclo de produção de sete anos. Esse
passarão a ter uso na indústria, e a ex-        ano (Fasiaben, 2010), contra os usuais R$        valor poderia ajudar a cobrir os custos
ploração de espécies nativas na RL será         150,00/ha/ano obtidos com pastagens ex-          com a implantação do projeto, já que o
ainda mais vantajosa, superando, em             tensivas e pouco tecnificadas – ocupação         plantio de eucalipto é mais barato que o
muitos casos, os sistemas de produção           predominante de áreas de baixa aptidão           de espécies nativas, e a exploração pos-
agropecuária.                                   agrícola. Dada a escassez crescente de           terior de produtos florestais madeireiros




FIGURA 1. POSSIBILIDADES DE MANEJO SUSTENTÁVEL DA RESERVA LEGAL NA AMAZÔNIA*


                                                                                                                  PEDRO HENRIQUE SANTIM BRANCALION




*São inúmeras as que possibilitariam retorno econômico satisfatório ao produtor rural, mas o processo preda-
tório de conversão de florestas para uso alternativo do solo tem desperdiçado esse potencial em troca de lucros
rápidos e insustentáveis no tempo.



20
FIGURA 2. REFLORESTAMENTO DE ESPÉCIES NATIVAS VISANDO À EXPLORAÇÃO MADEIREIRA; QUATRO ANOS DE PLANTIO; CAMPINAS, SP*




                                                                                                                                                  PEDRO HENRIQUE SANTIM BRANCALION
* Dadas as perspectivas mais favoráveis de retorno econômico dessa atividade em comparação com a pecuária extensiva, o proprietário optou
por converter toda a área de pastagem em reflorestamentos comerciais de espécies nativas.




e não madeireiros de espécies nativas,           dade de suas culturas de interesse.          larização ambiental e uso sustentável dos
bem como o pagamento por serviços                   Assim, uma estratégia promissora para     recursos naturais sob sua tutela. Mudar a
ambientais, comporiam o lucro da RL.             estimular o cumprimento do Código Flo-       legislação não resolve esse desafio.
Contudo, tais modelos econômicos de              restal é o fomento do manejo sustentável
                                                                                              * Pedro Henrique Santin Brancalion
recomposição da RL não podem se des-             da RL em áreas com ainda grandes esto-
                                                                                              (pedrob@usp.br) e Edson José Vidal da
vincular de sua função de conservação            ques de ecossistemas nativos, como em        Silva (edson.vidal@usp.br) são professores
da biodiversidade (Metzger, 2010), o que         várias partes da Amazônia e do Cerrado,      do Departamento de Ciências Florestais da
poderia ser comprometido pelo uso per-           e a viabilização de modelos econômicos       USP/ESALQ, e Carine Klauberg (klauberg@
                                                                                              hotmail.com) é graduanda do Programa de
manente de espécies exóticas, tal como           de recomposição da RL para as demais
                                                                                              Pós-Graduação em Recursos Florestais da
proposto muitas vezes.                           partes do país, agregando múltiplas          USP/ESALQ.
   Além das vantagens econômicas diretas,        alternativas de geração de renda. Trata-
obtidas por meio do manejo sustentável           -se de resgatar os objetivos inicialmente    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
dos recursos naturais, a RL apresenta inú-       propostos para a RL, os quais foram des-     BRANCALION, P. H. S.; Rodrigues, R. R. Implica-
meras vantagens para a propriedade rural         caracterizados com o tempo. No entanto,        ções do cumprimento do Código Florestal
                                                                                                vigente na redução de áreas agrícolas: um
que nem sempre são facilmente mensurá-           isso só será atingido com mais pesquisa
                                                                                                estudo de caso da produção canavieira no
veis. Por exemplo, a produção da maioria         aplicada, políticas públicas, linhas de        Estado de São Paulo. Biota Neotropica, 2010.
das culturas agrícolas é dependente, ou se       financiamento adequadas, desenvol-             v. 10, p. 63-66.
beneficia da atividade de agentes poliniza-      vimento de mercados e envolvimento           FASIABEN, M. C. R. Impacto econômico de Reser-
dores, os quais habitam os remanescentes         dos órgãos ambientais e de extensão             va Legal Florestal sobre diferentes tipos de
                                                                                                 unidade de produção agropecuária. (Tese
de vegetação nativa e usam as áreas agrí-        agropecuária. É preciso também não só
                                                                                                 de doutorado em desenvolvimento, espaço
colas para coleta de pólen e néctar. Além        descobrir as vantagens da RL – muitas           e meio ambiente.) Universidade Estadual de
desses agentes, há também inúmeros               das quais já são plenamente conhecidas          Campinas: Campinas, 2010.
inimigos naturais de pragas agrícolas que        pela ciência –, mas também divulgá-las       METZGER, J. P. O código florestal tem base
habitam esses remanescentes prestando            de forma mais efetiva aos agricultores.        científica? Natureza & Conservação, 2010.
                                                                                                v. 8, p. 1-5.
serviços ambientais que, se mensurados,          Diante desse desafio, é imprescindível
                                                                                              SANT’ANNA, A. C. O uso econômico da reserva
resultariam na economia de muito di-             que os produtores rurais, no papel de ver-
                                                                                                legal no Cerrado: uma simulação do extra-
nheiro na compra de defensivos químicos.         dadeiros gerentes dos recursos naturais,       tivismo sustentável do pequi. 129f. (Disser-
Assim, muitas das vantagens da RL não são        sejam envolvidos nesse processo não só         tação de Mestrado em Economia Aplicada.) Es-
nem conhecidas pelos produtores rurais,          pelas obrigações impostas pela lei, mas        cola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”.
                                                                                                Universidade de São Paulo: Piracicaba, 2011.
apesar de fundamentais para a produtivi-         também por políticas de incentivo à regu-


VISÃO AGRÍCOLA Nº 10            JAN | ABR 2012                                                                                             21
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada
Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada

Semana de meio ambiente
Semana de meio ambienteSemana de meio ambiente
Semana de meio ambienteRomulo Coco
 
Sustentabilidade ambiental
Sustentabilidade ambientalSustentabilidade ambiental
Sustentabilidade ambiental-
 
Apostila Do Educador Agroflorestal Arboreto
Apostila Do Educador Agroflorestal ArboretoApostila Do Educador Agroflorestal Arboreto
Apostila Do Educador Agroflorestal ArboretoFlávia Cremonesi
 
Manual recupareas degradadas
Manual recupareas degradadasManual recupareas degradadas
Manual recupareas degradadasMarlos Nogueira
 
Manual recuperação áreas degradadas
Manual recuperação áreas degradadasManual recuperação áreas degradadas
Manual recuperação áreas degradadasJorge Henrique Silva
 
Manual de consumo sustentavel
Manual de consumo sustentavelManual de consumo sustentavel
Manual de consumo sustentavelkarlawilla
 
Manual de compras sustentáveis ifmt (1)
Manual de compras sustentáveis ifmt (1)Manual de compras sustentáveis ifmt (1)
Manual de compras sustentáveis ifmt (1)Reenops
 
Lei crimes ambientais
Lei crimes ambientaisLei crimes ambientais
Lei crimes ambientaiscelikennedy
 
Lei crimes ambientais
Lei crimes ambientaisLei crimes ambientais
Lei crimes ambientaisblancasju
 
Lei crimes ambientais cartilha
Lei crimes ambientais cartilhaLei crimes ambientais cartilha
Lei crimes ambientais cartilhaDayana Miranda
 
Innovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - Brazil
Innovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - BrazilInnovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - Brazil
Innovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - BrazilGeraldo Eugenio
 
Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...
Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...
Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...institutopeabiru
 

Semelhante a Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada (20)

Semana de meio ambiente
Semana de meio ambienteSemana de meio ambiente
Semana de meio ambiente
 
Manual RMC-SP
Manual RMC-SPManual RMC-SP
Manual RMC-SP
 
Sustentabilidade ambiental
Sustentabilidade ambientalSustentabilidade ambiental
Sustentabilidade ambiental
 
Tcc
TccTcc
Tcc
 
Apostila Do Educador Agroflorestal Arboreto
Apostila Do Educador Agroflorestal ArboretoApostila Do Educador Agroflorestal Arboreto
Apostila Do Educador Agroflorestal Arboreto
 
Manual recupareas degradadas
Manual recupareas degradadasManual recupareas degradadas
Manual recupareas degradadas
 
Manual recuperação áreas degradadas
Manual recuperação áreas degradadasManual recuperação áreas degradadas
Manual recuperação áreas degradadas
 
Manual de consumo sustentavel
Manual de consumo sustentavelManual de consumo sustentavel
Manual de consumo sustentavel
 
Responsabilidade Social no Agronegôcio
Responsabilidade Social no AgronegôcioResponsabilidade Social no Agronegôcio
Responsabilidade Social no Agronegôcio
 
2269
22692269
2269
 
Manual de compras sustentáveis ifmt (1)
Manual de compras sustentáveis ifmt (1)Manual de compras sustentáveis ifmt (1)
Manual de compras sustentáveis ifmt (1)
 
Lei crimes ambientais
Lei crimes ambientaisLei crimes ambientais
Lei crimes ambientais
 
Lei crimes ambientais
Lei crimes ambientaisLei crimes ambientais
Lei crimes ambientais
 
Lei crimes ambientais
Lei crimes ambientaisLei crimes ambientais
Lei crimes ambientais
 
Lei crimes ambientais cartilha
Lei crimes ambientais cartilhaLei crimes ambientais cartilha
Lei crimes ambientais cartilha
 
e-Book 2.pdf
e-Book 2.pdfe-Book 2.pdf
e-Book 2.pdf
 
Innovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - Brazil
Innovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - BrazilInnovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - Brazil
Innovation with Suatainablity - Geraldo Eugênio - CGEE - Brazil
 
Sustentabilidade o que_e
Sustentabilidade o que_eSustentabilidade o que_e
Sustentabilidade o que_e
 
Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...
Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...
Ecoturismo: o equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade soc...
 
Consumo sustentavel
Consumo sustentavelConsumo sustentavel
Consumo sustentavel
 

Mais de AgroTalento

Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...
Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...
Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...AgroTalento
 
Palestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker Neto
Palestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker NetoPalestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker Neto
Palestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker NetoAgroTalento
 
Ativos Pecuária de Corte
Ativos Pecuária de CorteAtivos Pecuária de Corte
Ativos Pecuária de CorteAgroTalento
 
Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...
Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...
Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...AgroTalento
 
Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...
Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...
Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...AgroTalento
 
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani..."Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani...AgroTalento
 
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com..."Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com...AgroTalento
 
O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...
O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...
O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...AgroTalento
 
Criando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e Finanças
Criando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e FinançasCriando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e Finanças
Criando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e FinançasAgroTalento
 
[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...
[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...
[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...AgroTalento
 
[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...
[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...
[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...AgroTalento
 
[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...
[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...
[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...AgroTalento
 
[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live Day
[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live Day[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live Day
[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live DayAgroTalento
 
[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...
[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...
[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...AgroTalento
 
Valorização do bezerro atrai atenção para a cria
Valorização do bezerro atrai atenção para a criaValorização do bezerro atrai atenção para a cria
Valorização do bezerro atrai atenção para a criaAgroTalento
 
Avanços da raça angus americana beefpoint - marcelo selistre
Avanços da raça angus americana   beefpoint - marcelo selistreAvanços da raça angus americana   beefpoint - marcelo selistre
Avanços da raça angus americana beefpoint - marcelo selistreAgroTalento
 
Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014
Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014
Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014AgroTalento
 
Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014
Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014
Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014AgroTalento
 
CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...
CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...
CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...AgroTalento
 
140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - Fabiano
140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - Fabiano140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - Fabiano
140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - FabianoAgroTalento
 

Mais de AgroTalento (20)

Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...
Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...
Palestra "Como conciliar várias escolas e estratégias no Marketing Digital" c...
 
Palestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker Neto
Palestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker NetoPalestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker Neto
Palestra Merial BeefPoint - Antonio Chaker Neto
 
Ativos Pecuária de Corte
Ativos Pecuária de CorteAtivos Pecuária de Corte
Ativos Pecuária de Corte
 
Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...
Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...
Web Série: Controle do complexo respiratório bovino - Maurício Morais - Você ...
 
Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...
Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...
Web série: Controle do Complexo Respiratório Bovino - Daniel Rodrigues - O pr...
 
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani..."Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Prof. Enrico Ortolani...
 
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com..."Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com...
"Web Série: Controle do Completo Respiratório Bovino" - Sebastião Faria - Com...
 
O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...
O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...
O que o produtor brasileiro precisa saber antes de entrar no CAR - Palestra A...
 
Criando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e Finanças
Criando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e FinançasCriando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e Finanças
Criando Valor - Gestão Integrada de Estratégia e Finanças
 
[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...
[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...
[Palestra] Diede Loureiro: Aditivos melhoradores de performance: uma nova fer...
 
[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...
[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...
[Palestra] Pablo Paiva: Qual a tendência de utilização de endectocidas após I...
 
[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...
[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...
[Palestra] Lucas Souto: Confiança e tecnologia para praticidade e resultado n...
 
[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live Day
[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live Day[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live Day
[Palestra] Rodrigo Meirelles: O que suplementar? - 2º BeefPoint Live Day
 
[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...
[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...
[Palestra] Mauro Meneghetti: IATF: como obter resultados acima da média (Dado...
 
Valorização do bezerro atrai atenção para a cria
Valorização do bezerro atrai atenção para a criaValorização do bezerro atrai atenção para a cria
Valorização do bezerro atrai atenção para a cria
 
Avanços da raça angus americana beefpoint - marcelo selistre
Avanços da raça angus americana   beefpoint - marcelo selistreAvanços da raça angus americana   beefpoint - marcelo selistre
Avanços da raça angus americana beefpoint - marcelo selistre
 
Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014
Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014
Roteiro Viagem Tecnica BeefPoint California EUA 2014
 
Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014
Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014
Confira o roteiro da viagem técnica BeefPoint à Califórnia - EUA 2014
 
CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...
CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...
CRV Lagoa - Palestra: O impacto da fertilidade dos touros sobre os resultados...
 
140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - Fabiano
140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - Fabiano140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - Fabiano
140801- carne bovina desafios e tendências - Minerva - Fabiano
 

Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada

  • 1. USP ESALQ ANO7 JAN | ABR 2012 10 ISSN 1806-6402 agricultura e sustentabilidade Legislação deve garantir agricultura produtiva e ambiente protegido NOVO CÓDIGO FLORESTAL EDIÇÃO TRAZ OPINIÕES USP/ESALQ CONTRIBUIU EXPÕE POLÍTICAS PARA DE CONGRESSISTAS E PARA ESCLARECER POLÊMICA PRESERVAÇÃO DA FLORA DIRIGENTES DE ONGS NO CONGRESSO NACIONAL
  • 2.
  • 3. E D I TO R I A L H oje em dia, o tema recorrente da sustentabilidade parece ser mais uma daquelas preocupações do mundo moderno que não é, necessariamente, bem discutida e avaliada nos ambientes de mercado e/ou acadêmico. A proposta da décima edição da Visão Agrícola direciona-se à seguinte pretensão: trazer aos leitores um conjunto diversificado de “visões” sobre a sustentabilidade no ambiente agroflorestal. Inicialmente, o ponto central da sustentabilidade está voltado para nosso futuro, e que este seja pautado por maior segurança para a vida em nosso planeta. Para tanto, precisamos planejar sempre à frente, focando em um ecossistema sustentável os nossos recursos naturais, que envolvem a fauna, a flora e, também, o ser humano, entendido como um ser ético e responsável pela valorização da qualidade de preservação da vida. Nesse sentido, a univer- sidade – ambiente favorável ao desenvolvimento das boas práticas de ensino, pesquisa e extensão – tem enorme responsabilidade e compromisso com a formação de seus quadros. Não tem sido suficiente apenas o compartilhamento dos estoques de conhe- cimentos; são fundamentais também o cuidado e o respeito ao nosso patrimô- nio quanto aos recursos naturais. O novo profissional, que será efetivamente reconhecido como um colaborador para uma sustentabilidade efetiva, por de- mais, depende dos bons exemplos que a instituição universitária possa vir a lhe oferecer. Este novo profissional será, de fato, diferenciado, por ter a humildade devida de reconhecer seus eventuais erros; por saber que poderá sempre contar com a sabedoria de sua família e, quem sabe, de seus antigos mestres, amigos e colegas para se levantar novamente e tomar uma nova decisão mais acertada. Essa nova cronologia irá nos demonstrar que os profissionais diferenciados errarão cada vez menos, em nome da sustentabilidade. José Vicente Caixeta Filho Diretor da USP/ESALQ VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 1
  • 4. RODRIGO ESTEVAM MUNHOZ DE ALMEIDA ISSN 1806-6402 www.esalq.usp.br/visaoagricola visaoagricola@esalq.usp.br SEÇÕES E D I TO R I A L 1 FÓRUM 4 Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada André Meloni Nassar e Laura Barcellos Antoniazzi TEMAS VISÃO LEGAL A política nacional de preservação e conservação do meio ambiente 8 João Carlos Cabrelon de Oliveira O Código Florestal na legislação: elementos condicionantes à agropecuária 10 Leonardo Papp VISÃO TÉCNICA Novos conceitos da pecuária para preservação das bacias hidrográficas 13 Walter de Paula Lima Reserva Legal pode ser boa oportunidade de negócios em propriedades rurais 18 Pedro Henrique Santin Brancalion, Edson José Vidal da Silva e Carine Klauberg A adequação das propriedades agrícolas ao novo CódigoFlorestal brasileiro 22 Rodrigo C. A. Lima Caminhos e escolhas na revisão do Código Florestal: quando a compensação compensa? 25 Gerd Sparovek
  • 5. VISÃO POLÍTICA 31 Leis de gabinete apresentam distorções e desconsideram realidade Aldo Rebelo 34 Código Florestal carregasetenta e sete anos de desrespeito e impunidade João Paulo Ribeiro Capobianco 36 Código Florestal: fechar os olhos aos erros ou aprender a respeitar limites Raul Telles do Vale 39 Queremos ver nosso país na contramão da história? José Sarney Filho 42 Código Florestal é um dos pilares da sustentabilidade Blairo Borges Maggi 44 Limites na adequação de pequenas propriedades: eliminação ou convivência Marco Pavarino V I S Ã O S E TO R I A L 46 Sistema de Plantio Direto é opção de sustentabilidade Herbert Arnold Bartz, Marie Luise Carolina Bartz, Ivo Mello, Ricardo Ralisch 49 Agroecologia permitirá superar oposição entre produzir e conservar Carlos Armenio Kathounian 53 Cultura da cana-de-açúcar representa alternativa de energia renovável Edgar Gomes Ferreira de Beauclair 55 Cerrado brasileiro carece de mais investimentos em práticas sustentáveis Eros Artur Bohac Francisco e Claudinei Kappes 58 Líder em citros, Brasil ajusta setor às necessidades contemporâneas Lourival Carlos Mônaco 61 Sustentabilidade exige adoção de ferramentas adequadas Luiz Fernando do Amaral e Beatriz Stuart Secaf 64 Leis só efetivam sustentabilidade com união entre governo e sociedade Maria José Brito Zakia 67 Mato Grosso desenvolve cultivo de soja e milho de 2ª safra Ricardo Arioli Silva 70 O bom desempenho internacional do agronegócio brasileiro Marcos Antonio Matos e David Roquetti Filho 74 A ciência tem sido fundamental para uma pecuária sustentável Geraldo Bueno Martha Jr. 77 Experiência da certificação deve embasar debates sobre Código Florestal Luís Fernando Guedes Pinto e Maurício Voivodic VISÃO CRÍTICA 80 Código Florestal em tramitação retrocede na garantia de direitos fundamentais Pedro Henrique Santin Brancalion, José Leonardo de Moraes Gonçalves, Silvio Frosini de Barros Ferraz 83 Principais mudanças propostas 84 Problemas, contribuições e melhorias ao projeto de lei em tramitação 94 USP/ESALQ colaborou para esclarecer pontos polêmicos do novo Código Florestal
  • 6. FÓRUM Reforma do Código Florestal: uma visão equilibrada André Meloni Nassar e Laura Barcellos Antoniazzi* A reforma do Código Florestal se trans- para os quais as exigências do Código formou em um dos mais contenciosos são incompatíveis com sua capacidade temas em debate na sociedade brasileira. de geração de renda ou com a estrutura As calorosas discussões no Congresso das suas propriedades. Equivale às Nacional e por meio da mídia entre o classes pobre e muito pobre definidas deputado Aldo Rebelo, relator do texto por Alves (2011) – as quais representam aprovado na Câmara dos Deputados, 89% dos estabelecimentos rurais e 14% e a ex-ministra Marina Silva, principal do valor da produção –, o cumprimento porta-voz daqueles que são contra a das exigências de Reserva Legal (RL), reforma, mostram o quão difícil seria e mesmo de áreas de preservação per- negociar uma reforma que, antes de ser manente (APP), somente ocorrerá com apresentada para votação no Congresso, subsídios governamentais. Foi pensan- fosse fruto de um consenso entre todas do nesse grupo que o deputado Aldo as partes interessadas. (I) criou a consolidação da vegetação Três grandes interesses estão em jogo remanescente para fins de regularização na reforma do Código Florestal Brasilei- de RL nas propriedades de até 4 módulos ro. O primeiro, representado – sobre- fiscais e (II) propôs um conjunto de al- tudo – pelo discurso do deputado Aldo ternativas para viabilizar a consolidação Rebelo, é do contingente de produtores de atividades produtivas nas APPs. E, 4
  • 7. caso a recomposição seja necessária, poderia gerar sobre a produção existente. (2011), o estudo, pelo menos, mostra que o esta poderá ser de 15 metros, e não de 30 Uma parte desse grupo demonstra déficit é generalizado e, nas propriedades metros, para os casos dos rios com até 10 resistência em investir na recomposição de menor porte (abaixo de 4 módulos metros de calha regular. de APPs hídricas, sobretudo quando o fiscais), mais relevante em relação à O segundo grupo interessado na refor- passivo é elevado. Os dados de Sparovek área total da propriedade (Nassar, 2011). ma é formado pelos produtores respon- (2011) indicam que a grande maioria das Assim, a regularização e a consolidação sáveis por grande parte da produção e da áreas com APPs antropizadas são ocupa- são igualmente importantes para ambos área utilizada. Fazendo novo paralelo com das com pastagens. Considerando, ainda, os grupos. No grupo dos pobres e muito a classificação de Alves (2011), eles repre- que a recomposição de APPs na pecuária pobres, é importante porque estes não sentam 11% dos estabelecimentos rurais e implica dois custos – de plantio e manu- são capazes de investir na recomposição. 86% do valor da produção (médios e ricos tenção das mudas e de cercamento das No grupo dos médios e ricos, é fundamen- na classificação de renda bruta). A maior áreas para impedir a entrada dos animais tal para não levar a queda na produção. preocupação desse grupo é com regulari- –, são os pecuaristas que se mostram O terceiro grupo interessado na re- zação ambiental, porque são eles os mais mais defensores da consolidação. Além forma é composto pelos ambientalistas. visados pelo Ministério Público, sobretu- disso, eles argumentam que pastagens Eles avaliam que a reforma do Código do após a promulgação da lei de crimes manejadas ajudam a conservar o solo e traz perdas ambientais maiores do que ambientais e por conta dos potenciais im- água, que são duas funções importantes os benefícios econômicos e sociais da pactos negativos que a recomposição de RL das APPs. Embora discordemos do mon- consolidação proposta no texto apro- dentro da propriedade, e de certas APPs, tante do déficit de RL estimado por IPEA vado na Câmara. Os ambientalistas não Vegetação nativa em Área de Preservação Permanente (APP): preservação é funda- mental para a sustentabilidade da agricultura RODRIGO ESTEVAM MUNHOZ DE ALMEIDA VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 5 Colheita do consórcio milho com Brachiaria ruziziensis no oeste baiano
  • 8. FÓRUM reconhecem a necessidade da reforma no Código atual) e se o Brasil possuir um área produtiva, acarretando em perdas para promover a regularização ambien- ótimo cadastro ambiental das proprie- econômicas para os consumidores e tal, pois afirmam que esta deveria ocorrer dades, viabilizando um cruzamento das para as muitas regiões que dependem por meio da recomposição dos passivos e informações (outra situação inexistente exclusivamente de atividades agrícolas. com base nos instrumentos já existentes no contexto do Código atual). Contrariamente ao afirmado por alguns no Código atual. No entanto, as posições O segundo argumento decorre do estu- ambientalistas e cientistas, a reforma do entre ambientalistas não são absoluta- do de Sparovek (op. cit.). O autor mostra Código não é defendida para liberar mais mente homogêneas. Algumas ONGs, so- que existem cerca de 60 milhões de ha área para produção. Até porque o texto bretudo aquelas que atuam em projetos ocupados com pastagens que são aptas aprovado na Câmara não altera em nada de regularização ambiental de proprie- para produção agrícola. Assim, toda a as regras para abertura de novas áreas, dades e de implementação dos cadastros expansão futura previsível da produção nem mesmo nas APPs. Ela é defendida ambientais rurais (CAR), dão suporte à agrícola poderia ocorrer nessas áreas de porque o Código corrente tem enorme reforma, mesmo não concordando com pastagens, sem prejuízo da produção de potencial de deslocar área produtiva, partes do texto aprovado na Câmara. Em carne e leite. Tal argumento é utilizado resultando num efeito que ninguém quer: linhas gerais, tais ONGs discordam da por aqueles que contestam a necessidade transformar em vegetação nativa áreas consolidação de atividades produtivas da reforma e assumem que seus propo- aptas e já utilizadas para produção. em APPs e áreas de uso restrito, querem nentes a defendem porque o Código atual A reforma é igualmente necessária que a lei seja mais precisa para garantir seria uma restrição à expansão da produ- para reduzir a insegurança jurídica que que o CAR vai funcionar e não apoiam a ção. Conforme discutiremos a seguir, a o Código atual traz aos produtores. ideia de dar flexibilidade para os estados reforma é necessária para regularizar as Tendo em vista que o Código passou por definirem as regras dos programas de re- áreas consolidadas, e não para viabilizar inúmeras mudanças e aprimoramentos gularização ambiental (PRA), o que afeta a abertura de novas áreas. desde sua promulgação em 1965, muitas diretamente a consolidação nas APPs. Somos favoráveis a uma reforma equi- propriedades foram se tornando ilegais. Um quarto grupo que passou a se po- librada do Código Florestal, que possa: Como em nenhuma das mudanças se sicionar mais tardiamente no processo viabilizar a regularização dos produtores, concebeu o conceito de área consolidada abrange os cientistas. A realidade é que permitir a consolidação de atividades com ocupação antrópica, como estabe- as posições públicas apresentadas pela produtivas e exigir a recomposição ou re- lecido pela versão aprovada na Câmara, SBPC e ABC reforçam o posicionamento generação de vegetação nativa em APPs, qualquer ocupação da propriedade dos ambientalistas quando enfatizam os salvaguardadas algumas exceções (espé- poderia torná-la ilegal caso possuísse resultados das pesquisas que avaliaram cies florestais, culturas lenhosas, perenes déficit de RL. Ocupações antigas, ante- impactos ambientais das atividades pro- e de ciclo longo e agricultura de várzea). A riores à promulgação da lei, ou mesmo dutivas. As organizações praticamente reforma do Código Florestal é necessária na sua vigência, mas em épocas em que não se posicionaram publicamente nas porque trata-se de uma lei com baixa o poder público pouco se importava com questões econômicas e sociais e optaram efetividade. Os déficits de APPs e RL são a efetividade da lei, poderiam colocar os apenas pela abordagem ambiental. Dois elevados, quando, na vigência desta lei, produtores na ilegalidade. argumentos têm sido extensamente utili- o Brasil bateu recordes de desmatamen- Sem a reforma, a criação de um CAR zados pelos cientistas e replicados pelos to na Amazônia. É uma lei avançada do é impraticável. O Estado brasileiro hoje ambientalistas. ponto de vista das exigências de con- desconhece o montante de RLs e de O primeiro é que a não conformidade servação sobre os produtores mas, ao APPs nas propriedades privadas. A única dos produtores (ou déficit) em relação às mesmo tempo, com muitas dificuldades referência oficial das áreas de vegetação RLs poderia ser resolvida no contexto da de sair do papel. A primeira razão para natural ainda existente nas propriedades lei atual sem a necessidade da reforma, sua reforma é transformá-la em uma lei é o Censo Agropecuário. A informação sobretudo recompondo vegetação nativa que será cumprida efetivamente a partir que consta do Censo, no entanto, é au- em áreas consolidadas não aptas para de sua promulgação. todeclaratória e certamente não espelha produção agrícola (em geral, ocupadas A reforma precisa ser feita porque o a realidade. O Censo de 2006 indica que com pastagens). Conceitualmente, tal Código atual exige a recuperação das existem 50 milhões de ha dedicados a RLs argumento faz sentido desde que a RL dentro das propriedades, ou a com- e APPs nos estabelecimentos rurais. No compensação de RL possa ocorrer em pensação na mesma microbacia, o que entanto, apenas 1 milhão de estabeleci- um escopo geográfico mais amplo do levaria, dado o passivo de RL existente mentos informaram os dados relativos que a microbacia (o que não é realidade (Sparovek, op. cit.), a uma redução na a RL e APP. Isso representa 1/5 do total 6
  • 9. de estabelecimentos rurais do Brasil (o RLs são colocadas como obrigação e, no Código atual, a despeito dos louváveis Censo aponta um total de 5,2 milhões de consequentemente, vistas apenas como esforços de algumas ONGs em mostrar estabelecimentos). Mesmo que a infor- custo pelos produtores. Uma reforma que exemplos de sucesso de regularização, mação esteja correta, ela cobre apenas crie as condições para o desenvolvimen- sempre será exceção. Defendemos uma uma parcela pequena do universo de to de um mercado florestal, via compen- reforma equilibrada do Código Florestal propriedades rurais. sação de RL através da chamada cota de para que a conformidade seja a regra e a A ausência de tal informação coloca reserva ambiental (como previsto pelo fim de que possamos aliar conservação o Brasil no escuro para entender qual o Código aprovado na Câmara) e pagamen- ambiental com produção agrícola. nível de conformidade das propriedades tos pelos serviços ambientais gerados rurais ao Código Florestal, atual ou o pelas APPs e RLs, mudará completamente novo. E mesmo estudos independentes a mentalidade dos produtores. A reforma feitos com o objetivo de avaliar esse grau pode criar um círculo virtuoso em que de conformidade chegam a conclusões produtores com vegetação nativa além diferentes (ver Sparovek op. cit. e The das suas necessidades de APP e RL pos- Nature Conservancy). É o CAR que vai sam comercializar tal excedente, e que * André Meloni Nassar (amnassar@ sanar o nosso desconhecimento sobre o produtores com déficit possam avaliar iconebrasil.org.br) e Laura Barcellos montante de vegetação natural existente as vantagens da recomposição de RL vis- Antoniazzi (lantoniazzi@iconebrasil.org.b) nas propriedades e, por consequência, é -à-vis à compensação. são pesquisadores do Instituto de Estudos A visão equilibrada requer que a con- do Comércio de Negociações Internacionais o primeiro passo a fim de que elas sejam (Icone) (www.iconebrasil.org.br) e da Rede de regularizadas. Para o cadastro ser abran- solidação de atividades produtivas em Conhecimento do Agro Brasileiro (RedeAgro) gente, ou seja, cobrir todas as proprieda- APPs seja uma exceção, sobretudo nas (www.redeagro.org.br). des rurais brasileiras, é preciso viabilizar matas ripárias. São inúmeros os estudos a regularização ambiental destas. As científicos que mostram os benefícios experiências de estados que criaram o ambientais desse tipo de vegetação e dos REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS cadastro rural mostram que, se as exi- corredores que elas criam, bem como o ALVES, Eliseu. Um só agro. 26 de agosto de gências de regularização são elevadas, tipo de convivência aceitável entre ati- 2011. Disponível em: <www.redeagro.org.br/ academicos/323-um-so-agro>. Acesso em: os proprietários simplesmente optam vidades produtivas e vegetação natural, 12/12/2011 por não informar os dados, sobretudo necessária para garantir conservação do IPEA. Código Florestal: implicações do PL aqueles que estão com baixa conformi- solo, proteção da água e da biodiversi- 1876/99 nas áreas de Reserva Legal. Comu- dade com a lei. O cadastro do estado do dade. O código aprovado na Câmara, em nicados do IPEA No 96. 8 de junho de 2011. estado de Mato Grosso, por exemplo, nossa opinião, endereça corretamente Lei Nº 9.605 (12 de fevereiro de 1998) e Decreto Nº as situações de atividades florestais, 6.514 (22 de julho de 2008) que a regulamenta. possui cerca de 6,6 mil propriedades, NASSAR, André. Reforma do Código Florestal: totalizando apenas 15% de toda a sua área culturas de espécies lenhosas, perenes onde o IPEA errou. 26 de julho de 2011. Dis- passível de cadastramento. ou de ciclo longo, que hoje ocupam APPs ponível em: <www.redeagro.org.br/artigo- O cadastro obrigatório, fundamental e precisam ser regularizadas, bem como -ambiental/262-reforma-do-codigo-florestal- para se conhecer a situação ambiental as situações de agricultura praticada em -onde-o-ipea-errou>. Acesso em: 12/12/2011 das propriedades, jamais será abrangen- várzeas, como o arroz. No entanto, diante RODRIGUES, R. R.; LIMA, R. A. F.; GANDOLFIA, S. et al. On the restoration of high diversity te se for utilizado como informação para da dificuldade de acomodar outras con- forests: 30 years of experience in the Brazi- impor sanções sobre os proprietários. solidações porventura legítimas, o texto lian Atlantic Forest. Biological Conservation, Viabilizar a regularização ambiental das acabou por flexibilizar demais, tornando v. 142, n. 6, p. 1242–1251, 2009. propriedades, portanto, é condição ne- a possibilidade de consolidação disponí- SPAROVEK, G., BARRETTO, A., KLUG, I. et al. A cessária para implantação de um cadas- vel para todas as atividades produtivas. revisão do Código Florestal brasileiro. Novos Estudos, nº 89, Março de 2010. tro que possa reunir informações cada Quando compreendemos que 65% da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência vez mais detalhadas sobre áreas produ- vegetação natural ainda existente no (SBPC) e da Academia Brasileira de Ciência tivas, degradadas, com vegetação nativa Brasil está em áreas privadas, reconhece- (ABC). O Código Florestal e a Ciência: con- e outras ações ligadas à regularização. mos que é fundamental criar incentivos tribuições para o diálogo. SBPC/ABC, 2011. O Código também precisa ser refor- econômicos para estimular os proprie- The Nature Conservancy. Código Florestal na real. mado para viabilizar a valoração da tários a conservar além das exigências Maio de 2011. Disponível em: <www.nature. org/ourinitiatives/regions/southamerica/ vegetação nativa protegida dentro das impostas pela lei. A regularização é o pri- brasil/destaques/codigo-florestal-na-real. propriedades. No Código atual, APPs e meiro passo. Regularizar os produtores xml>. Acesso em: 25/11/2011. VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 7
  • 10. VISÃO LEGAL Constituição A política nacional de preservação e conservação do meio ambiente João Carlos Cabrelon de Oliveira* RODRIGO ESTEVAM MUNHOZ DE ALMEIDA Reserva legal e unidades de conservação: Área de Preservação Permanente (APP) é principal instituto jurídico visando proteger nossa flora O debate sobre a reforma do Código Florestal Brasileiro traz à tona uma reflexão – que não pode ser ligeira nem leviana – sobre a política nacional de preservação e conservação da flora. O Brasil ocupa uma posição privilegiada sobre o tema, considerando- -se que a imensa extensão de suas florestas, bem como a extraordinária biodiversidade que elas abrigam, confere ao país uma vantagem comparativa no cenário mundial. Do ponto de vista jurídico, a avaliação dessa política deve se iniciar pela Constituição Federal, a qual proclama o direito de todos a um “meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (art. 225, caput). Para proteger esse direito, a Constituição condiciona o uso da propriedade ao atendimento de sua função social (art. 5º, XXIII). Tal função é cumprida, no caso da propriedade rural, mediante a “utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente” (art. 186, II). Ante esses parâmetros, a legislação brasileira criou um tripé de institutos jurídicos visando proteger a flora de forma mais intensa, cujos pontos principais são as áreas de preservação permanente, a reserva legal e as unidades de conservação. 8
  • 11. UNIDADES PROTEGIDAS preservação e conservação de espaços rígida, pois eles estarão autorizados, por As áreas de preservação permanente naturais de maior relevância ecológica exemplo, a implementar atividades “de têm a função ambiental de “preservar os e paisagística. Dois exemplos dessas baixo impacto ambiental” nas áreas de recursos hídricos, a paisagem, a estabili- áreas são Yosemite, nos Estados Unidos, preservação permanente, e de manejo dade geológica, a biodiversidade, o fluxo e Torres del Paine, no Chile. florestal sustentável, na reserva legal. gênico de fauna e flora, proteger o solo Por fim, a reserva legal, que, de acordo A grande novidade do projeto do novo e assegurar o bem-estar das populações com o Código Florestal, é uma “área loca- Código Florestal atende pelo nome de humanas” (Código Florestal, art. 2º, § 2º, II). lizada no interior de uma propriedade ou “áreas consolidadas”. São áreas rurais São extensões territoriais ambientalmente posse rural, excetuada a de preservação onde a flora foi explorada ilicitamente sensíveis, como as matas ciliares e a vege- permanente, necessária ao uso sustentá- até 22 de julho de 2008. Pelo projeto tação que recobre os topos de morros ou vel dos recursos naturais, à conservação de lei, haverá a concreta possibilidade montanhas, assim como suas encostas. Da e reabilitação dos processos ecológicos, à de manutenção da exploração desses conservação dessas áreas depende a pró- conservação da biodiversidade e ao abrigo territórios, sem obrigação de sua re- pria viabilidade ecológica e econômica da e proteção de fauna e flora nativas” (art. composição. Assim, o proprietário será terra, pois evita o esgotamento dos recur- 2º, § 2º, III). beneficiado com anistia das multas sos hídricos e previne a erosão dos solos. Trata-se de limitação administrativa, ou aplicadas e extinção da punibilidade dos Por tais motivos, as áreas de preserva- seja, de restrição ao uso da propriedade respectivos crimes. ção permanente são objeto de proteção na rural que atinge um número indetermina- Conclui-se que, ao invés de repensar a maioria dos países. Como aponta Valverde do de proprietários, em maior ou menor política nacional para o setor, o projeto (2010), na China são previstas as “flores- extensão, de acordo com a localização em questão instituirá um modelo iníquo, tas de abrigo” em razão de sua função geográfica do imóvel rural. Assim, na área em que o proprietário rural que transgre- hidrológica. Na Argentina, preservam-se de reserva legal, é permitido o manejo flo- dir a lei será anistiado e beneficiado com áreas florestais de “alto valor biológico” restal, mas não o corte raso da vegetação. a manutenção indefinida da exploração e de proteção de bacias; na Finlândia, as É tarefa um tanto quanto ociosa compa- de seu imóvel além dos limites legais. florestas ripárias (matas contíguas a cursos rar o regime de reserva legal praticado no Em contrapartida, o proprietário que de água). Na Austrália, há a “zona de prote- Brasil com institutos semelhantes de ou- cumpriu as normas ambientais se verá ção” da mata nativa em ambos os lados das tros países. A reserva legal, tal como con- em situação de inferioridade, sem possi- depressões ou cursos de água. cebida pelo Código Florestal, reveste-se de bilidade de ampliar sua exploração além Nos Estados Unidos, Bass (1996) des- originalidade. Ainda que sua localização desses limites. É muito pouco do que se taca na legislação federal a Lei da Água deva observar critérios estabelecidos esperaria de uma nova política legislativa Limpa – instrumento de coibição de pelo Código Florestal – como proximidade para a flora brasileira. desmatamentos que afetem a qualidade com áreas de preservação permanente da água –, além de diversas legislações ou de acordo com o indicado por planos * João Carlos Cabrelon de Oliveira é juiz federal substituto da 3ª Vara Federal de estaduais que, com maior ou menor de bacias hidrográficas ou zoneamentos Piracicaba,SP, Subseção Judiciária do Estado intensidade, protegem áreas de preser- ecológico-econômicos –, ela é instituída de São Paulo (jccolive@jfsp.jus.br ). vação permanente. No Canadá, Costa independentemente de se tratar de uma (2008) noticia a proteção conferida pela área de interesse específico de preserva- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS província de British Columbia às zonas ção ambiental. BASS, Susan. Ferramentas legais para o geren- ribeirinhas, divididas entre 1) zonas de ciamento de florestas nos Estados Unidos. Revista de Direito Ambiental. São Paulo: gestão: mais distantes das margens dos O QUE VAI MUDAR Editora Revista dos Tribunais. ano 1, n. 2, p. rios e passíveis de manejo; e 2) zonas de O projeto de Código Florestal, em gesta- 25-39, abr./jun. 1996. reserva: próximas às margens, onde é ção no Congresso Nacional, pouco mo- COSTA, Leonardo Tropia. Estudo em direito proibido o uso da terra. difica a política nacional de preservação comparado para áreas de preservação per- Já as unidades de conservação, previs- da flora: mantém as áreas de preservação manente. Viçosa, 2008. Disponível em: <www. tede.ufv.br/tedesimplificado/tde_arquivos/4/ tas na Lei 9.985/2000, são constituídas de permanente e de reserva legal, definindo- TDE-2010-01-27T065441Z-2134/Publico/ espaços territoriais com características -as de forma praticamente idêntica. A texto%20completo.pdf>. Acesso em: 7 set. 2011. naturais relevantes, instituídas com obje- extensão dessas áreas de preservação, VALVERDE, Sebastião Renato (coord.). Estudo tivo conservacionista e por ato do Poder inclusive os percentuais de reserva legal, comparativo da legislação florestal sobre Público. Sob os mais variados formatos tampouco variam de forma significativa. áreas de preservação permanente e reserva legal. Viçosa, 2010. Disponível em: <www. jurídicos, elas têm sido prestigiadas no Contudo, a utilização dessas áreas abiape.com.br/newsletter/201004e01/file/ mundo inteiro como importante meio de pelos proprietários rurais será menos estudo.pdf>. Acesso em: 7 set. 2011. VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 9
  • 12. VISÃO LEGAL Equidade O Código Florestal na legislação: elementos condicionantes à agropecuária Leonardo Papp* ROBERTO AMARAL As questões relativas à legislação am- biental – e, especificamente, ao Código Florestal – geram polêmica não apenas pelo grau de ideologização recorrente- mente envolvido no debate, mas também pela necessidade de buscar a conciliação entre valores que podem se revelar coli- dentes na prática: o desenvolvimento de atividades produtivas e a aplicação de medidas de preservação ambiental. Em resumo, trata-se do complexo desafio de buscar um marco legal que, concomitan- temente, promova equilíbrio ecológico, justiça social e viabilidade econômica, tal como aponta a Constituição Federal de 1988 ao indicar os fundamentos e objetivos da República. São alguns deles: dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, desenvolvimento nacional etc. Plantio de milho: o conceito de área rural consolidada visa a dar segurança jurídica às áreas de atividades agropecuárias 10
  • 13. A partir desse contexto, o escopo do áreas rurais consolidadas até 22 de julho das APPs fora dos limites previstos (30 presente artigo é apresentar alguns e 2008” que estejam localizadas em Áre- metros etc.), exceto quando ato do Poder subsídios iniciais acerca do Projeto de as de Preservação Permanente (APPs), Público dispuser em contrário (art. 4º, § Lei do Congresso (PLC 30/11), que propõe “sendo exigidas nestes casos a adoção 3º), além de admitir o plantio de vazante a revisão do atual Código Florestal Bra- de técnicas de conservação do solo e para algumas culturas – desde que não sileiro. A fim de sistematizar a descrição água que visem à mitigação dos eventuais ocorram novas supressões de vegetação proposta, as seções subsequentes são impactos” (art. 8º caput c/c § 1º). e que seja conservada a qualidade da dedicadas a indicar dispositivos do texto Ainda no que se refere à adequação das água (art. 4º, § 5º). do PLC 30/11 que estejam direcionados, atividades desenvolvidas em áreas rurais Nos topos de morros, bordas de tabu- respectivamente, (i) à viabilização e consolidadas, o PLC 30/11 cria o instituto leiros, chapadas e em altitude superior adequação de atividades produtivas no- denominado Programas de Regularização a 1800 metros, desde que não implique tadamente consideradas consolidadas; Ambiental (PRAs), em cuja regulamen- conversão de novas áreas para uso al- e (ii) à proteção dos remanescentes de tação “a União estabelecerá normas de ternativo do solo e que sejam adotadas floresta e outras formas de vegetação, caráter geral, incumbindo-se aos Estados práticas conservacionistas do solo e da especialmente no que se refere a brechas e ao Distrito Federal o detalhamento, por água, o PLC 30/11 admite a manutenção de para desmatamento. meio da edição de normas de caráter es- atividades florestais, culturas de espécies Deixe-se explicitado desde logo que a pecífico, em razão de suas peculiaridades lenhosas (perenes ou de ciclo longo), pretensão não é formular qualquer con- territoriais, climáticas, históricas, cultu- pastoreio extensivo e a infraestrutura clusão ou impor qualquer ponto de vista, rais, econômicas e sociais, conforme pre- associada ao desenvolvimento de tais ati- tampouco realizar uma análise exaustiva ceitua o art. 24 da Constituição Federal” vidades (art. 10). Mecanismo semelhante do mencionado Projeto de Lei. O que se (art. 33, caput e § 1º). Para além do regime está previsto para as áreas com inclina- busca é apenas e tão somente fomentar jurídico das áreas rurais consolidadas e ção entre 25º e 45º, consideradas de uso a reflexão sobre a adequação ou não dos PRA’s, sob a ótica do desenvolvimento restrito, nas quais não seria permitida a do PLC 30/11 na busca da conciliação de atividades produtivas, também podem supressão de vegetação, mas admitidas: entre atividade produtiva e preservação ser indicadas outras inovações inseridas a manutenção de culturas de espécie ambiental. Para tanto, tomar-se-á como no texto do PLC 30/11. lenhosa (perene ou de ciclo longo), as base a redação mais recente do PLC Ao longo de cursos de água, as APPs atividades silvicultoras, ou outras ativi- 30/11, aquela contida no Substitutivo passam a ser definidas a partir do leito dades, excetuadas aquelas realizadas em apresentado à Comissão de Constituição menor, assim entendido como o canal áreas de risco e sendo vedada a expansão e Justiça do Senado Federal, em 31de por onde correm regularmente as águas dos locais atingidos (art. 12). Ainda como agosto de 2011. durante o ano (art. 4º, ), ao contrário do área de uso restrito, o PLC 30/11 destina critério atual (maior nível da cheia sazo- dispositivo específico para a planície ATIVIDADES PRODUTIVAS nal), considerado pouco objetivo e inse- pantaneira, na qual se admitiria a ex- Diversas das propostas contidas no PLC guro. No que se refere a topos de morros, ploração ecologicamente sustentável, 30/11 conferem mais segurança às áreas montanhas e serras, embora continuem devendo considerar as recomendações atualmente utilizadas para atividades inseridos na lista de APPs, o PLC 30/11 técnicas dos órgãos de pesquisa (art. 11). agropecuárias. É o que se verifica, por propõe utilizar uma nova conceituação Embora o PLC 30/11 (art. 13) mantenha exemplo, com a instituição do conceito (art. 4º, VIII), tida como mais adequada os mesmos percentuais concernentes à de área rural consolidada, bem como por à realidade fática. Nos reservatórios de Reserva Legal (RL) atualmente previstos sua previsão de tratamento diferenciado. d’água artificiais que não decorram de pela Lei 4.771/65, nas propriedades rurais Entende-se por esse termo a “área do barramento ou represamento de cursos com área de até 4 módulos fiscais que imóvel rural com ocupação antrópica d’água, o texto sob análise no Congresso possuam remanescentes de vegetação preexistente a 22 de julho de 2008, com Nacional propõe que não se exija faixa de nativa em percentual inferior ao previsto edificações, benfeitorias ou atividades preservação permanente (art. 4º, § 1º). O em Lei (20%, 35% ou 80%), a RL seria cons- agrossilvopastoris, admitidas, nesse úl- mesmo ocorre em relação às acumula- tituída pela vegetação nativa existente timo caso, a adoção do regime de pousio” ções naturais ou artificiais de água com em 22 de julho de 2008 – vedadas novas (art. 3º). Em tais situações, o PLC 30/11 área de até 1 hectare (art. 4º, § 4º). conversões para uso alternativo do solo autoriza, “exclusivamente, a continui- Para além disso, no PLC 30/11 fica (art. 13, § 7º). dade das atividades agrossilvopastoris, esclarecido que as áreas de várzeas, Ainda no que se refere à RL, o texto do de ecoturismo ou de turismo rural em salgados e apicuns não são considera- PLC 30/11 propõe que o protocolo da do- VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 11
  • 14. cumentação exigida para análise da sua (art. 35). Dessa forma, consubstancia-se f) como regra, é vedada a conversão localização impeça que o produtor seja modalidade específica de adequação, de novas áreas para uso alternativo multado em razão da não formalização da independentemente da adesão a Progra- do solo em topo de morros, veredas, RL (art. 15, § 2º). Além disso, o Substitutivo mas de Regularização Ambiental. Por fim, chapadas e altitudes superiores a 1800 em tramitação no Congresso Nacional pode-se destacar no PLC 30/11 a previsão, metros (art. 10), assim como em locais permite computar a APP no cálculo da RL ainda que de forma bastante singela, de com inclinação entre 25º e 45º (art. 12); desde que atendidos os seguintes requisi- mecanismos econômicos, inclusive pa- g) é vedada a conversão de novas áreas tos: (i) não implicar a conversão de novas gamento por serviços ambientais, como para uso alternativo do solo, nas pro- áreas para uso alternativo do solo; (ii) a medidas de estímulo ao cumprimento da priedades com até 4 módulos fiscais área a ser computada estar conservada legislação ambiental (art. 48 a 50). que não tinham remanescentes de ou em processo de recuperação; (iii) o vegetação suficientes em 22 de julho imóvel estar no Cadastro Ambiental A QUESTÃO DO DESMATAMENTO de 2008 (art. 13, § 7º); Rural (art. 16). De mais a mais, a inscrição Da leitura do PLC 30/11 também é possível h) a possibilidade de computar APP no da RL passaria a ser feita diretamente identificar a previsão de dispositivos des- cálculo da RL não poderá implicar no Cadastro Ambiental Rural, mantido tinados à proteção de áreas de floresta conversão de novas áreas para uso pelo órgão ambiental, por meio de pro- e vegetação naturais ainda existentes alternativo do solo (art. 16, I); cedimento simplificado, e não mais no no País, tendo em vista a inclusão de i) o regime de proteção da RL não se al- Cartório de Registro de Imóveis (art. 19). diversos dispositivos que demonstram a tera nos casos de transmissão, a qual- Argumentando ser necessário obser- preocupação de não estimular a realiza- quer título, ou de desmembramento do var a irretroatividade temporal das impo- ção de desmatamentos ilegais, dentre os imóvel rural (art. 19); sições contidas na legislação ambiental, quais se destacam: j) não é permitida a conversão de vege- o PLC 30/11 determina que, para fins de a) a expressa previsão de que as infrações tação nativa para uso alternativo do recomposição da Reserva Legal, quando à legislação serão sancionadas penal, solo no imóvel rural que possuir área necessário, passam a ser aplicados os civil e administrativamente (art. 2º, § 2º); abandonada (art. 29); percentuais da legislação que estava em b) regra explícita que não admite a su- k) as obrigações relativas à RL são trans- vigor na época em que foi realizada a pressão de novas áreas de vegetação mitidas para o sucessor em caso de supressão de vegetação, ainda que atu- nativa no caso de agricultura de vazan- transferência do domínio ou posse do almente os percentuais sejam maiores. te (art. 4º, § 5º); imóvel rural (art. 38); Assim, o proprietário que tenha observa- c) a determinação no sentido de que, l) a definição de áreas prioritárias para a do a legislação vigente na época em que tendo ocorrido novas supressões de compensação de RL deve buscar favo- iniciou suas atividades será beneficiado vegetação nativa em área de preser- recer, entre outros, a recuperação de (art. 39). Nos casos em que for necessário vação permanente, o proprietário ou bacias hidrográficas excessivamente destinar novas áreas para atender às possuidor é obrigado a promover a re- desmatadas, a criação de corredores exigências de RL, o PLC 30/11 amplia as composição da vegetação, ressalvados ecológicos, a conservação de grandes alternativas de compensação em outras os usos autorizados em Lei (art. 7º § 1º); áreas protegidas, a conservação ou re- propriedades, admitindo-se a utilização d) no caso de desmates não autorizados, cuperação de ecossistemas ou espécies de áreas fora da bacia hidrográfica ou realizados após 22 de julho de 2008, ameaçados (art. 38, § 7º); mesmo do Estado (desde que seja o mes- veda-se a concessão de novas autoriza- m) estabelece normas para o controle do mo bioma). Também permite que os Es- ções de supressão, enquanto não for re- desmatamento, entre as quais a impo- tados criem fundos de regularização fun- cuperada a área desmatada (art. 7º, 3º); sição de sanções e embargos, além da diária de unidades de conservação como e) deixa explicitamente consignado que divulgação de dados da propriedade forma de compensar obrigações relativas novas intervenções e supressões em embargada (art. 58). à Reserva Legal (art. 38). No que se refere APPs somente poderão ser admitidas às áreas rurais consolidadas às margens em situações excepcionais, conside- de cursos de água com até 10 m de largu- radas de utilidade pública, de interesse ra, o PLC 30/11 admite a manutenção de social ou de baixo impacto, bem como * Leonardo Papp é doutorando em Direito atividades agrossilvopastoris, desde que reafirma vedação à expansão de ati- Econômico e Socioambiental (PUC-PR), sejam recompostos, no mínimo, 15 m de vidades consolidadas realizadas em mestre em Direito Ambiental (UFSC) e vegetação e sejam observados critérios áreas de preservação permanente professor de Direito Ambiental da Católica de técnicos de conservação do solo e água (art. 8º); Santa Catarina. (leonardo@papp.adv.br) 12
  • 15. VISÃO TÉCNICA Estratégias Novos conceitos da pecuária para preservação das bacias hidrográficas Walter de Paula Lima* Apesar de a água ser um dos elementos CENTRO DE MÉTODOS QUANTITATIVOS ESALQ/USP essenciais para a vida, o ser humano nun- ca se preocupou muito com a sua preser- vação, em razão de sua aparente inesgo- tabilidade. Porém, estudos têm indicado que um dos problemas mais críticos que a humanidade enfrentará nos próximos anos será a indisponibilidade de água. A consciência quanto à importância dessa substância, contudo, ainda não chegou ao cidadão comum e, tampouco, induziu ao estabelecimento de políticas públicas voltadas à sua conservação. Preservar a água é um processo com- plexo, pois depende, fundamentalmente, da conservação dos outros recursos naturais existentes no planeta. O com- portamento da água em sua superfície, ou seja, como a fase terrestre do ciclo hidrológico se manifesta, é um reflexo direto das condições e do uso do local por onde ela emana. A alteração da pai- sagem e a degradação do solo reduzem a produtividade de água e afetam sua disponibilidade e sua qualidade (Bossio et al, 2010). Vista aérea de área de produção: atividade agropecuária é produção da água, componen- tes essenciais da vida VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 13
  • 16. VISÃO TÉCNICA Quando o assunto é abordado, a maio- de córregos, assim como da alteração A atividade agropecuária ocupa cerca ria das pessoas pensa apenas na “água da qualidade da água – em grande parte de 40% da superfície terrestre e a altera- visível”, ou seja, naquela que pode ser causada pela manipulação da paisagem ção da paisagem – resultado da expansão usada diretamente para os mais varia- pelo homem –, tem muito mais implica- da agricultura – foi, sem dúvida, um dos dos fins. E é justamente ela que está se ções para a saúde da biosfera como um fatores responsáveis pela modificação esgotando. Poucos se dão conta de que o todo do que para o abastecimento da do ciclo hidrológico, tanto em termos ciclo hidrológico é o sistema circulatório população. quantitativos quanto qualitativos (Gor- da biosfera, o qual proporciona a geração don et al, 2011). Em termos quantitativos, dos chamados serviços ambientais – AGROPECUÁRIA X ÁGUA o padrão da evapotranspiração global fundamentais para a sobrevivência da Falar sobre a relação entre atividade mudou, diminuindo nas áreas desmata- humanidade. A diminuição da disponi- agropecuária e água requer, evidente- das e aumentando em áreas irrigadas. O bilidade de água está também afetando mente, muita responsabilidade e em- elevado uso consumptivo de água para a os processos ecológicos da biosfera, basamento, já que dois componentes irrigação, por sua vez, reduz o fluxo dos responsáveis pelos chamados serviços essenciais para a vida são o resultado rios e ribeirões. Já o aumento da erosão ambientais (Gordon et al, 2010). dessa discussão: alimento e água. O tema e a degradação da matéria orgânica do Os serviços ambientais podem ser clas- fica ainda mais complexo em razão de solo, ao longo dos ciclos de produção, sificados em quatro categorias: a agricultura, principalmente pela irri- tornam menor a escala de produtivi- a) produção: de alimentos, de grãos, de gação, ser responsável por 70% de todo dade de água, principalmente devido à fibras, de carne etc.; o consumo de água pela humanidade. diminuição da infiltração, ao aumento b) regulação: controle de pragas, polini- Além disso, a manipulação da paisagem do escoamento superficial e à redução zação, clima; visando preparar a área para o desen- da capacidade de seu armazenamento c) culturais: valores recreacionais, espi- volvimento da agricultura resulta em (Bossio et al, 2011). E parece inevitável a rituais e estéticos; mudanças nos processos hidrológicos necessidade de aumento da área agrícola, d) suporte: processos ecológicos básicos, de superfície; isso reduz a produtivida- previsto inclusive de ocorrer a uma taxa como formação do solo, proteção de de água. Assim, uma carga maior de de 0,8% ao ano, o que equivaleria a um da superfície do solo e da infiltração nutrientes, agroquímicos e sedimentos aumento do consumo de água da ordem pela cobertura vegetal, produção de pode chegar aos cursos de água e, dessa de 30% a 40% até 2050 (Gordon et al, 2011); oxigênio, absorção de gás carbônico, forma, alterar sua qualidade (Figura 1). (Figura 2). desnitrificação, dispersão de semen- tes, polinização. Mesmo com a implementação de práticas adequadas de manejo do solo FIGURA 1. ÁREA DE TOPOGRAFIA ONDULADA COM PREPARO RECENTE PARA PLANTIO* que visam à produção agropecuária, WALTER DE PAULA LIMA não é tarefa fácil evitar o aumento do escoamento superficial e da erosão, que arrastam nutrientes, matéria orgânica e sedimentos para os cursos de água e lagos, alterando a qualidade da água e o funcionamento do ecossistema aquático. Nesse sentido, o chamado ecossistema ripário – resultado da interação da ve- getação ciliar evolutivamente adaptada às áreas ribeirinhas saturadas – desem- penha papel fundamental para o controle desses possíveis efeitos. Tal ecossistema tem, também, papel decisivo na perma- nência da biota aquática. Desta maneira, a crise da água, principalmente quando se trata da diminuição da vazão e altera- ção do regime de rios e ribeirões, da seca *Os processos hidrológicos de superfície são alterados após alterações na paisagem. 14
  • 17. FIGURA 2. ÁREA DESMATADA E TRANSFORMADA EM PASTAGEM* Assim, é necessário garantir a preser- WALTER DE PAULA LIMA vação da água, a qualidade ambiental e a produção de alimentos – e estas são metas que têm de ser abordadas de forma integrada. Tratar cada uma sepa- radamente causa conflitos e prejuízos para todos (Falkenmark & Folke, 2002). A água, em termos de suas demandas e funções, é o componente fundamental que possibilita relacionar o uso da terra (visando à produção) com os impactos ambientais decorrentes. Esse conceito deve ser a base para o planejamento de ações de manejo que busquem a sustentabilidade. Por exemplo, quando direciona-se melhor o uso da água, pro- *A expansão das fronteiras agropecuárias é responsável por mudanças na evapo- transpiração, assim como nos processos hidrológicos de superfície. cedimento fundamental para a busca da agricultura sustentável, a degradação da área é evitada. Há estimativas de que Outro fator que também é muito im- ramento dos cursos de água, tão comum cerca de 40% da área agrícola mundial portante na avaliação dos efeitos das em áreas rurais, também é responsável encontram-se moderadamente degra- atividades agropecuárias sobre a água pela ruptura da chamada conectividade dadas, enquanto que cerca de 9% estão já diz respeito ao planejamento da ocupa- hidrológica, ou seja, a propriedade que em forte estado de deterioração (Bossio ção dos espaços produtivos da paisagem reflete a eficácia do fluxo de água entre os et al, 2011). E a destruição da terra, como visando à produção agropecuária. Não é elementos do ecossistema, que, por sua já afirmado, afeta tanto a produtividade fácil tentar incutir a necessidade de prote- vez, afeta a geração de serviços ambien- agrícola quanto a disponibilidade de ção das áreas ripárias onde há a presença tais (Creed et al, 2011); (Figura 3). água (Figura 4). da vegetação ciliar, que em nosso país, por força do novo Código Florestal, ficou restrita a uma largura arbitrária fixa e si- métrica ao longo dos córregos e ribeirões, assim como ao redor de nascentes. Mas na natureza a ocorrência dessas FIGURA 3. CABECEIRA DE DRENAGEM DE UMA MICROBACIA EM UMA PROPRIEDADE RURAL* áreas, denominadas hidrologicamente WALTER DE PAULA LIMA sensíveis, não guarda nenhuma simetria, sendo função da heterogeneidade natu- ral da paisagem, em termos de geologia, geomorfologia, solos e clima. Além disso, também pode haver áreas saturadas nas partes mais elevadas do terreno, e não apenas nas margens e cabeceiras dos cursos de água. Em ambos os casos, são áreas de descarga ou de afloramento dos fluxos subsuperficiais de água. Por essa razão, devem ser protegidas, e não dre- nadas ou usadas. Nenhuma microbacia hidrográfica é exatamente igual à outra e, portanto, não há como estabelecer prescrições generalizadas para realizar *Já são visíveis os sinais de degradação hidrológica, resultado da destruição da vegetação ciliar seu mapeamento. Por outro lado, o bar- e do uso intensivo pela pecuária VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 15
  • 18. VISÃO TÉCNICA FIGURA 4. ÁREA RURAL DEGRADADA* WALTER DE PAULA LIMA *A destruição da terra pode ser evitada com correto manejo da água, fun-damental na busca da agropecuária sustentável. DESAFIOS A sustentabilidade ocorre em diferentes discussão. Levando em conta a relação Assim, a microbacia constitui a base dimensões e escalas. A conceituação produção agropecuária e água, a Figura sólida para o estabelecimento de estraté- proposta é fundamental para o estabe- 5 fornece uma visão prática dessas dife- gias sustentáveis de manejo, pois permite lecimento de estratégias sustentáveis rentes escalas. A escala macro represen- estabelecer práticas sustentáveis de ma- de manejo agropecuário. Por exemplo, é ta as imposições e limitações, naturais nejo adaptadas às especificidades locais. essencial que a dimensão econômica da e legais, que devem nortear o estabe- Pela mesma razão, possibilita, também, sustentabilidade, inerente à produção lecimento de um sistema de produção a materialização do conceito de manejo agropecuária, possa abranger também a agropecuária. No outro extremo, há a integrado, conforme ilustra a Figura 6 dimensão ecológica. Nesse sentido, uma escala micro, que é a própria unidade (adaptada de Falkenmark & Folke, 2002). estratégia que vem ganhando apoio está de produção, a propriedade rural, onde Em cada microbacia, as fontes de água relacionada com o chamado pagamento as ações de manejo são implementadas. são as chuvas, que podem ser dissipadas por serviços ambientais. Trata-se de polí- No meio é representada a escala da mi- em “água verde”, ou evapotranspiração, tica pública questionável, no mínimo, por crobacia hidrográfica, unidade natural que faz as plantas crescerem e possibilita várias razões. A principal delas reside no da paisagem. A microbacia é a escala da a produção agropecuária, e “água azul”, fato de que ações isoladas – como reve- água. As imposições naturais determi- que é a água superficial, visível e respon- getação da área ciliar – não são, por si só, nam sua estrutura e seu funcionamento sável por abastecer a humanidade e gerar garantia de inclusão de toda a dimensão hidrológico, ao mesmo tempo em que as os serviços ambientais. O manejo susten- ecológica envolvida na conservação am- imposições legais, como a das Áreas de tável tem necessariamente de manter o biental. Outro argumento diz respeito ao Preservação Permanentes (APPs), visam equilíbrio entre estes dois fluxos de água. alcance do manejo sustentável que, por a protegê-la. Do outro lado, as conse- definição, requer mudanças de compor- quências das ações de manejo visando tamentos em diversos âmbitos, princi- à produção agropecuária, conforme já palmente culturais, o que é diferente de comentado, podem afetá-la tanto em * Walter de Paula Lima é professor titular se remunerar uma boa ação. termos de diminuição do fluxo de água, permissionário LCF USP/ESALQ (wplima@ A questão das escalas da sustenta- quanto de alteração da qualidade e dos esalq.usp.br). bilidade tem papel importante nessa serviços ambientais. 16
  • 19. FIGURA 5. ESCALAS DA SUSTENTABILIDADE HIDROLÓGICA* NACIONAL REGIONAL UNIDADE DE MANEJO Disponibilidade de água Saúde da microbacia Práticas de manejo adaptativo Precipitação Planejamento de uso Espécies Evapotranspiração potencial Demanda de água Espaçamento Balanço hídrico climático Balanço hídrico Rotação Legislação ambiental Regime de vazão Cultivo mínimo Produtividade do solo Assoreamento Plantio direto Ecossistema aquático Práticas de conservação do solo Desenho das estradas Eficiência na irrigação Áreas ripárias (mata ciliar) Colheita Hidrologia do solo * Forma integrada para a análise das diferentes escalas envolvidas na conservação do solo e da água, a fim de orientar a busca do manejo sustentável. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOSSIO, D.; Geheb, K.; Critchley, W., Managing water by managing land: Addressing land degradation to improve water productivity and rural livelihoods. Agricultural Water Management, 2011. 97: 536-542. CREED, I. F.; Sass, G. Z.; Buttle, J. M. et al, Hydro- FIGURA 6. BALANÇO HÍDRICO DA MICROBACIA HIDROGRÁFICA* logical principles for sustainable mana- gement of forest ecosystems. Hydrological WALTER DE PAULA LIMA CHUVA Processes, 2011. 25: 2152-2160. FALKENMARK, M.; Folke, C. The ethics of socio- -hydrological catchment management: towards hydrosolidarity. Hydrology and FLUXO DE ÁGUA VERDE Earth System Sciences, 2002. 6: 1-9. GORDON, L. J.; Finlayson, C. M.; Falkenmark, M. Managing water in agriculture for food pro- duction and other ecosystem services. Agri- -cultural Water Management, 2011. 97: 512-519. FLUXO DE ÁGUA AZUL DIVISOR TIPOGRÁFICO MONTANTE JUSANTE * O manejo sustentável busca o equilíbrio entre os fluxos de “água verde” e “água azul”. VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 17
  • 20. VISÃO TÉCNICA Vantagens Reserva Legal pode ser boa oportunidade de negócios em propriedades rurais Pedro Henrique Santin Brancalion, Edson José Vidal da Silva e Carine Klauberg* JOÃO LUÍS F. BATISTA Diante dos recentes debates sobre as mudanças no Código Florestal, a Reserva Legal (RL) tem sido frequentemente clas- sificada como um ônus para o produtor, uma obrigação que não lhe trará nada em troca, exceto a regularização legal. Apesar dos desafios para consolidar o manejo da RL como opção econô- mica, já existem inúmeros exemplos que apontam essa possibilidade. Neste artigo, serão apresentados alguns deles evidenciando que o percentual da pro- priedade rural a ser destinado como RL não implica necessariamente perda de áreas produtivas. Reserva florestal ao lado de área agricultável: rendimentos lucros de atividades florestais podem ser, em alguns casos, maiores que de atividades agropecuárias 18
  • 21. Nenhuma propriedade agrícola é for- Considerando os valores médios apli- trado nas várzeas, já existem variedades mada exclusivamente por áreas aptas cados para madeira em tora e madeira de sequeiro que podem ser usadas em para a agropecuária, principalmente em serrada na Amazônia Legal, verifica-se modelos de recomposição da RL. No se tratando de culturas que envolvam a que as possibilidades de uso econômico caso da castanha-do-brasil (Bertholletia colheita mecanizada. No caso de culturas da RL são bastante atrativas, e poderiam excelsa), que tem uma ocorrência de 1 a agrícolas anuais e perenes, a totalidade ser mais bem exploradas caso a RL fosse 5 árvores por hectare, a produção por de áreas aptas para cultivo normalmen- respeitada, conforme indica a Tabela 1. árvore é de cerca de 30 kg, sendo este te não ultrapassa 70% da propriedade Quando comparados aos rendimentos um dos produtos mais valorizados da agrícola. Assim, se for considerada a de outras atividades atualmente esta- floresta, atingindo de R$ 2,50 a R$ 5,00 demanda de área para o cumprimento do belecidas, muitas das quais são ilegais por litro dessa semente com casca. A pu- atual Código Florestal (com exceção da do ponto de vista ambiental, os lucros punha (Bactris gasipaes) é outra espécie Amazônia Legal), representada por 20% provenientes de atividades florestais de interesse, podendo produzir de 4 a 10 de RL e aproximadamente 10% de Áreas podem ser maiores. Além disso, são ativi- t de frutos/ha, que são vendidos na faixa de Preservação Permanente, verifica-se dades que se mantêm ao longo do tempo, de preço entre R$ 10,00 e R$ 25,00 por kg. que cumprir a RL não seria um obstáculo diferentemente do uso de pastagens Além de outros produtos alimentícios tão grande se houvesse um planejamento extensivas em várias regiões amazônicas, de relevância na economia regional, racional de uso e ocupação do solo. as quais não sustentam níveis satisfató- como o cupuaçu (Theobroma grandiflo- Ao avaliar essa questão em mais de rios de produtividade pouco tempo após rum) e o taperebá (Spondias mombin), 500 mil ha de usinas sucroalcooleiras do a conversão da área. Afora a madeira, a Floresta Amazônica oferece inúmeras estado de São Paulo, onde o cenário para os chamados produtos florestais não possibilidades de aproveitamento de o cumprimento da lei é mais drástico, a madeireiros são outra opção atrativa e plantas medicinais, tais como a andiroba recomposição da RL resultaria no deslo- participam ativamente da economia de (Carapa guianensis), o breu (Protium sp.) camento médio de apenas 6,4% de áreas muitas famílias rurais no Norte do país. e a copaíba (Copaifera spp.), que estão cultivadas com cana-de-açúcar, ao invés cada vez mais despertando o interesse de 20% (Brancalion & Rodrigues, 2010). Em RL: OPORTUNIDADE DE NEGÓCIOS de empresas nacionais e internacio- se tratando de áreas em uso pela silvicul- Cerca de 98% da produção de frutos do nais. Todas essas oportunidades de uso tura ou pecuária, a situação é ainda mais açaí são oriundos da atividade extrati- econômico, sem falar nas modalidades favorável para o cumprimento do código. vista em florestas. Com a adoção de boas de pagamento por serviços ambientais, Se fosse conduzida uma avaliação mais práticas de manejo, o açaí-do-amazonas como a venda de créditos de carbono, rigorosa, certamente mais áreas seriam (Euterpe precatoria) pode produzir de 6 são possíveis na RL, mas deixam de ser abandonadas por problemas de inapti- mil a 10 mil kg de frutos/ha/ano, tendo de uma opção quando ocorre a conversão de dão agrícola e poderiam ser recompostas 200 a 500 plantas/ha. Para o açaí-do-pará áreas para uso alternativo do solo, como no processo de adequação ambiental. (Euterpe oleracea), a produção pode va- pode ser observado na Figura 1. Embora o cumprimento da RL possa não riar de 6 mil a 12 mil kg de frutos/ha/ano, Apesar de o manejo da RL em frag- deslocar áreas de produção agrícola, é com 300 a 500 plantas/ha. Considerando mentos remanescentes ser especial- preciso também avaliar se o uso susten- que a lata com 14 kg de frutos é vendida mente recomendado para a Amazônia, tável delas constitui uma opção rentável hoje entre R$ 18,00 e R$ 40,00, verifica-se outros biomas, como o Cerrado, também para o produtor rural. que essa é uma ótima atividade econômi- apresentam ótimas oportunidades de No caso do manejo de remanescentes ca. Embora o manejo do açaí seja concen- negócios. Por exemplo, a exploração de de vegetação nativa, as perspectivas são muito favoráveis, e ressalta-se a importância socioeconômica do manejo da floresta. Para a Amazônia Legal, é TABELA 1. PREÇOS MÉDIOS (R$/M³) POR CLASSE DE VALOR ECONÔMICO DE MADEIRAS EXPLO- RADAS NA AMAZÔNIA LEGAL, 2009* permitida a exploração de madeira nativa na RL de até 30 m³ de toras/ha, no caso Forma de comercialização Alto valor Médio valor Baixo valor Valor Médio econômico econômico econômico de ciclos mínimos de 35 anos, e de 10 m³ Madeira em tora 283 173 130 195 de toras/ha, com ciclos de 10 anos (IN nº Madeira serrada 1090 658 517 754 05/06). A madeira gerada na RL pode ser tanto utilizada para suprir as demandas Fonte: Adaptado de Pereira et al. (2010). da propriedade como para gerar renda. * Taxa de conversão: US$ 1,00 = R$ 1,60. VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 19
  • 22. VISÃO TÉCNICA pequi em Goiás pode apresentar margem SUSTENTABILIDADE NA RL bruta superior à da soja (Sant’Anna, 2011). No entanto, tais opções de manejo de madeira nativa no mercado devido à Para exemplificar, em áreas onde há 10 remanescentes nativos podem não ser redução do desmatamento na Amazônia pequizeiros/ha, o proprietário poderá viáveis em regiões do país onde a degra- e ao aumento da demanda interna, a ter uma margem bruta de R$ 200,00 a R$ dação foi mais intensa, predominando produção de madeira nativa na RL – via 600,00 por hectare. No mesmo período fragmentos florestais pequenos e frágeis recomposição ou manejo – será uma e região, a margem bruta para a soja foi ecologicamente. Nesse contexto, há uma atividade cada vez mais vantajosa, mais de R$ 430/ha/ano (Sant’Anna, 2011). Além demanda maior pela recomposição da RL. até do que vários sistemas de produção do pequi, há ainda quase 60 espécies de Mesmo nessa situação, já existem mode- agropecuária. No estado de São Paulo, fruteiras nativas usadas pela população, los econômicos de uso da RL em recupe- por exemplo, há um decreto estadual que poderiam vir a ter uso econômico e ração que oferecem ótimas perspectivas que regulamenta o uso temporário de ser comercializadas. Assim, existem inú- de retorno financeiro ao produtor, como eucalipto intercalado com espécies meras oportunidades de negócios em se no caso da área retratada na Figura 2. nativas para a recomposição da RL. Só tratando do manejo da RL na propriedade Por exemplo, a implantação de mode- a colheita de eucalipto nesse sistema rural, mas são poucos os projetos que los voltados à exploração madeireira de poderia render ao produtor cerca de R$ aproveitam hoje esse potencial. Com espécies nativas pode apresentar uma 3.500,00/ha de lucro líquido ao final de o avanço da pesquisa, novas espécies margem bruta de mais de R$ 350,00/ha/ um ciclo de produção de sete anos. Esse passarão a ter uso na indústria, e a ex- ano (Fasiaben, 2010), contra os usuais R$ valor poderia ajudar a cobrir os custos ploração de espécies nativas na RL será 150,00/ha/ano obtidos com pastagens ex- com a implantação do projeto, já que o ainda mais vantajosa, superando, em tensivas e pouco tecnificadas – ocupação plantio de eucalipto é mais barato que o muitos casos, os sistemas de produção predominante de áreas de baixa aptidão de espécies nativas, e a exploração pos- agropecuária. agrícola. Dada a escassez crescente de terior de produtos florestais madeireiros FIGURA 1. POSSIBILIDADES DE MANEJO SUSTENTÁVEL DA RESERVA LEGAL NA AMAZÔNIA* PEDRO HENRIQUE SANTIM BRANCALION *São inúmeras as que possibilitariam retorno econômico satisfatório ao produtor rural, mas o processo preda- tório de conversão de florestas para uso alternativo do solo tem desperdiçado esse potencial em troca de lucros rápidos e insustentáveis no tempo. 20
  • 23. FIGURA 2. REFLORESTAMENTO DE ESPÉCIES NATIVAS VISANDO À EXPLORAÇÃO MADEIREIRA; QUATRO ANOS DE PLANTIO; CAMPINAS, SP* PEDRO HENRIQUE SANTIM BRANCALION * Dadas as perspectivas mais favoráveis de retorno econômico dessa atividade em comparação com a pecuária extensiva, o proprietário optou por converter toda a área de pastagem em reflorestamentos comerciais de espécies nativas. e não madeireiros de espécies nativas, dade de suas culturas de interesse. larização ambiental e uso sustentável dos bem como o pagamento por serviços Assim, uma estratégia promissora para recursos naturais sob sua tutela. Mudar a ambientais, comporiam o lucro da RL. estimular o cumprimento do Código Flo- legislação não resolve esse desafio. Contudo, tais modelos econômicos de restal é o fomento do manejo sustentável * Pedro Henrique Santin Brancalion recomposição da RL não podem se des- da RL em áreas com ainda grandes esto- (pedrob@usp.br) e Edson José Vidal da vincular de sua função de conservação ques de ecossistemas nativos, como em Silva (edson.vidal@usp.br) são professores da biodiversidade (Metzger, 2010), o que várias partes da Amazônia e do Cerrado, do Departamento de Ciências Florestais da poderia ser comprometido pelo uso per- e a viabilização de modelos econômicos USP/ESALQ, e Carine Klauberg (klauberg@ hotmail.com) é graduanda do Programa de manente de espécies exóticas, tal como de recomposição da RL para as demais Pós-Graduação em Recursos Florestais da proposto muitas vezes. partes do país, agregando múltiplas USP/ESALQ. Além das vantagens econômicas diretas, alternativas de geração de renda. Trata- obtidas por meio do manejo sustentável -se de resgatar os objetivos inicialmente REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS dos recursos naturais, a RL apresenta inú- propostos para a RL, os quais foram des- BRANCALION, P. H. S.; Rodrigues, R. R. Implica- meras vantagens para a propriedade rural caracterizados com o tempo. No entanto, ções do cumprimento do Código Florestal vigente na redução de áreas agrícolas: um que nem sempre são facilmente mensurá- isso só será atingido com mais pesquisa estudo de caso da produção canavieira no veis. Por exemplo, a produção da maioria aplicada, políticas públicas, linhas de Estado de São Paulo. Biota Neotropica, 2010. das culturas agrícolas é dependente, ou se financiamento adequadas, desenvol- v. 10, p. 63-66. beneficia da atividade de agentes poliniza- vimento de mercados e envolvimento FASIABEN, M. C. R. Impacto econômico de Reser- dores, os quais habitam os remanescentes dos órgãos ambientais e de extensão va Legal Florestal sobre diferentes tipos de unidade de produção agropecuária. (Tese de vegetação nativa e usam as áreas agrí- agropecuária. É preciso também não só de doutorado em desenvolvimento, espaço colas para coleta de pólen e néctar. Além descobrir as vantagens da RL – muitas e meio ambiente.) Universidade Estadual de desses agentes, há também inúmeros das quais já são plenamente conhecidas Campinas: Campinas, 2010. inimigos naturais de pragas agrícolas que pela ciência –, mas também divulgá-las METZGER, J. P. O código florestal tem base habitam esses remanescentes prestando de forma mais efetiva aos agricultores. científica? Natureza & Conservação, 2010. v. 8, p. 1-5. serviços ambientais que, se mensurados, Diante desse desafio, é imprescindível SANT’ANNA, A. C. O uso econômico da reserva resultariam na economia de muito di- que os produtores rurais, no papel de ver- legal no Cerrado: uma simulação do extra- nheiro na compra de defensivos químicos. dadeiros gerentes dos recursos naturais, tivismo sustentável do pequi. 129f. (Disser- Assim, muitas das vantagens da RL não são sejam envolvidos nesse processo não só tação de Mestrado em Economia Aplicada.) Es- nem conhecidas pelos produtores rurais, pelas obrigações impostas pela lei, mas cola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”. Universidade de São Paulo: Piracicaba, 2011. apesar de fundamentais para a produtivi- também por políticas de incentivo à regu- VISÃO AGRÍCOLA Nº 10 JAN | ABR 2012 21