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ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA
PONTOS SISTEMÁTICOS DA OBRA
‘ANTROP. FIL. I’ de H. C. de LIMA VAZ
I. HISTÓRIA DAS CONCEPÇÕES DE HOMEM NA FILOSOFIAOCIDENTAL
A. Concepção Clássica do Homem
A concepção clássica do homem começa bem antes de Platão e Aristóteles. Ela se forma em
seus elementos essenciais por volta dos séculos VIII e VII a.c. Desde essa época ela se organizará
como um universo espiritual coerente, harmônico e com uma riqueza extraordinária. O encontro com a
cultura romana, com seus elementos específicos, resultará no que se veio a chamar ‘cultura clássica
greco-romana’. Esta forneceu à civilização ocidental a primeira e permanente constelação de ideais e
valores.
Quanto à concepção de homem, a cultura clássica, de um modo geral, pôs em relevo dois
traços fundamentais:
- o homem como um ser que fala e discorre(zôonlogikón)
- o homem como ser político(zôonpolitikón).
Esses traços se relacionam intimamente porque:
- Só enquanto dotado de Logos o homem é capaz de entrar em relação consensual com seu semelhante
e constituir a comunidade política(Pólis);
- A vida política(biospolitikós), vida humana por excelência, se exerce pela livre submissão ao logos
estruturado em leis justas.
Disso resulta que o homem possui duas atividades dotadas de finalidades específicas:
- a atividade de contemplação(theoria);
- a atividade do agir moral e político(práxis).
A interação entre essas duas atividades é um dos problemas que a concepção clássica do homem, sob
diversas formas, procurou resolver.
1. O Homem na Cultura arcáicagrega(traços):
- Traço Teológico-Religioso: há uma oposição e divisão entre o mundo dos deuses e o mundo
dos mortais. Os deuses são imortais e felizes; os homens efêmeros e infelizes. O homem pretende
igualar-se aos deuses, mas sucumbe nas malhas implacáveis do destino(moira), provocando o desfecho
trágico na vida humana. A mitologia grega, especialmente com Hesíodo, narra longamente esta
questão . Daí os preceitos de moderação provindos dos templos de Apolo e Delfos: ‘nada em
excesso’, ‘conhece-te a ti mesmo’. Com isto, de nada adianta ao homem ser orgulhoso(hybris).
- Traço Cosmológico: trata-se da contemplação da ordem do cosmos e de admiração diante
dessa ordem e beleza do Kosmos. Dessa admiração, segundo Platão e Aristóteles, ter-se-ía originado a
filosofia ou a vida teorética. Haveria uma correspondência, uma homologia entre a ordem do Kosmos
e a ordem humana representada pela Pólis: há uma Justiça no universo; a pólis deve ser regida por leis
justas. O homem é pensado como um microcosmo dentro do macrocosmos, donde o homem recebe
vida e movimento, e se realiza como homem se conformar sua vida com a justeza do cosmos. Daí
nasce a idéia de uma Ciência do agir humano, no que a pólis ocupa um lugar fundamental: é a
mediação por excelência. Este segundo traço cruza-se com o teológico e forma o conceito de
Necessidade, inscrita na ordem do mundo e a ela se submetem homens e deuses. Daí o problema da
conciliação entre Necessidade cósmica e Liberdade humana.
- Traço Antropológico: aqui entra em primeiro lugar a oposição entre o apolíneo e o
dionisíaco. É do que trata Ésquilo nas ‘Eumênidas’ e Eurípedes nas ‘Bacantes’. O apolíneo designa o
lado luminoso, a presença ordenadora do logos na vida humana, orientando para a clareza do
pensamento e para a ação razoável. O dionisíaco designa o lado obscuro, das forças de Eros, do
desejo, da paixão(Platão celebrizará isto no Banquete e terá uma presença marcante no pensamento de
Nietzsche). Em segundo lugar, aparece o tema da Alma(psyché), sopro, o correlato do corpo. Em
Homero, ela vai viver em sombras no Hades; no orfismo, a alma é uma entidade separada do corpo
reencarnando-se em várias existências. Em terceiro lugar, aparece a imagem do Herói, da
excelência(areté) guerreira; depois, do fundador da cidade e também da excelência do rude trabalho
nos campos(cf. Hesíodo em ‘Os trabalhos e os Dias’).
O ponto de intersecção entre esses traços é o temeroso tema do Destino(moira). Sobre ele se
desenvolveram duas posições:
- Por um lado, o pessimismo: o destino é inexorável, acentua o desamparo do homem, a impotência
humana ao tentar escapar de sua determinação;
- Por outro, o moralismo: é a descoberta da responsabilidade pessoal, do poder de escolha. Esta
posição prevalecerá desde a ‘Odisséia’ de Homero.
2. O Homem na Filosofia Pré-Socrática:
Diógenes é um dos primeiros a representar um pensamento antropológico claramente definido,
na filosofia da physis. Exalta a superioridade do homem sobre os animais o que se manifesta na
posição vertical e na marcha, no olhar voltado para o alto, para a contemplação dos astros. Celebra a
agilidade das mãos, obreiras da téchne, e exalta a prerrogativa da linguagem, manifestação do
pensamento. O homem é, pois, um ente corpóreo-espiritual, cuja natureza se manifesta na cultura. É
um ser ordenado finalisticamente em si mesmo e para o qual se ordena a própria ordem do cosmos: um
microcosmo dentro do macrocosmos, o que será aprofundado pelos pensadores da physis. Nos
Pitagóricos, encontramos a correspondência entre a estrutura matemática do universo e a estrutura
matemática da alma, harmonia, sobre o que se deve basear toda educação.
No séc. Va. c., o problema antropológico vai se sobrepondo ao cosmológico sob a influência
das transformações da sociedade grega, as guerras pérsicas, a consolidação do regime democrático em
Atenas e outras cidades. Subjacentes à interrogação sobre o homem aparecem dois grandes problemas,
interligados entre si:
- o problema da Educação(Paideía), que gira em torno de uma nova forma de areté política exigida
pela vida democrática ;
- o problema da Sabedoria, não mais fundada na tradição mas na Razão e na téchne.
Esses problemas já se encontram em Heráclito, em seguida, no pensamento Sofista. Para os
sofistas, e posteriormente na época áurea, o problema maior é o da Cultura. Para eles, a origem e
desenvolvimento da cultura são pensados segundo dois modelos:
- O modelo da decadência: regido pelo mito de uma idade de ouro primitiva;
- O modelo do progresso: pressupõe um primitivo estado de barbárie, ultrapassado pela fundação das
cidades e pela invenção das técnicas.
Os sofistas levam a efeito a inflexão antropológica grega: o homem e suas capacidades tornam-se o
objeto objeto principal da filosofia, com algumas características que se tornarão definitivas:
- o conceito de uma natureza humana(geral);
- o conceito de narração histórica pela investigação e consciência da pluralidade das culturas;
- oposição entre convenção(nómos) e natureza(physis) na organização da cidade e nas normas do agir
individual(convencionalismo jurídico e ético);
- individualismo relativista e posição cética quanto à verdade;
- afirmação de um desenvolvimento progressivo da cultura;
- o homem como um ser de necessidade e carência;
- o homem como ser dotado de logos, capaz de demonstrar e persuadir.
3. A Transição Socrática:
É a época da crise ateniense: guerra do Peloponeso, idéias sofistas, luta pelo poder e
participação política. Com Sócrates emerge uma nova concepção de homem que comporá a imagem
do homem clássico a nós transmitida, em seus traços fundamentais.
Seu grande tema: ‘o que é propriamente o humano?’ O humano deve referir-se a um princípio
interior presente em cada homem: a ALMA.
O que é a Alma? Ela é a sede de uma areté que vai desde a excelência física e a coragem até a
excelência como habilidade aprendida segundo regras. É a sede de uma areté que permite medir o
homem segundo a dimensão interior, na qual reside a verdadeira grandeza humana. É o lugar da opção
entre o justo e o injusto; ela é a essência do homem. É a idéia de personalidade moral: sobre ela se
assenta todo o edifício da ética e do direito.
A partir daí, os traços do homem:
- A teleologia do Bem e do melhor como via de acesso para compreender o mundo e o homem e sobre
a qual se funda a natureza ética da psyché;
- A valorização ética do homem expressa no preceito ‘conhece-te a ti mesmo’, mediante investigação
metódica: ironia, indução, maiêutica, para chegar à Sabedoria=Virtude=Ciência;
- A primazia da faculdade intelectual que conduz e estabelece a relação fundamental, i.é, a relação
Dialógica.
4. Antropologia Platônica:
É a mais poderosa e influente concepção ainda hoje. É uma síntese na qual se fundem tradição
pré-socrática, tradição sofística e herança socrática.
A herança cosmológica é assumida numa perspectiva antropológica, do finalismo da
inteligência como imanente ao movimento cósmico: a alma move-se a si mesma; o homem é
considerado como alma e corpo, com prioridade da alma na definição do homem, pois nela estaria o
finalismo do inteligível, é ela que harmoniza os movimentos interiores.
O corpo pertence ao mundo sensível e deve sua vida à alma bem como suas capacidades de
operação; ele não é tanto o receptáculo da alma, mas como algo que está em oposição a ela, chegando
a ser comparado, como lemos no Górgias, a um ‘cárcere’, um túmulo. Quando morre o corpo é
libertação da alma, pois ele é a raiz do mal, fonte de amores insensatos, paixões, ignorância, loucura...
Já na ética, Platão não é tão dualista.
No Fédon lemos que a alma deve fugir sempre mais do corpo. A alma não morre, a morte é só
do corpo. A morte do corpo traz grande benefício à alma, pois permite a ela unir-se diretamente ao
inteligível, ao bom e verdadeiro. O sábio deve fugir também do mundo, porquanto este representa um
afastamento do inteligível, o que é o mal da alma. A fuga do corpo e a fuga do mundo se efetiva pela
virtude e pelo conhecimento; praticar a virtude e dedicar-se ao conhecimento é, como lemos nas Leis,
assemelhar-se a Deus, medida de todas as coisas.
Assim, o cuidado da alma é a suprema missão moral do homem. E cuidar significa purificar,
orientando a alma para o inteligível, afastando-a do sensível, através do conhecimento do que é eterno
e daí a virtude. A dialética é conversão progressiva da alma na direção da Luz=Bem(cf. A República).
Aqui se põe decisivamente a importância da Filosofia da Educação e da Filosofia Política
platônicas(duas grandes mediações para formar a alma). E como se lê no Timeu, as almas foram
geradas pelo Demiurgo e possuem em sua natureza uma afinidade com as coisas imutáveis e eternas,
não estando sujeitas à morte ou à dissolução. Mas se não existir a dimensão meta-empírica da
realidade, então cairia também a tese da imortalidade da alma. Enquanto pertence ao mundo sensível,
o homem é um ser de carências e está referido essencialmente aos outros; é por isso que os homens
constróem as cidades: ninguém consegue prover-se de tudo aquilo que precisa para viver; e na cidade,
cada um com suas capacidades específicas cumpre funções que são importantes para todos.
5. Antropologia Aristotélica:
Aristóteles é o fundador da antropologia como ciência e tentou uma síntese científico-
filosófica em sua concepção de homem. Fez um longo trajeto: de um platonismo da psyché(com a
tendência dualista do Fédon) a um monismo hilemórfico(alma como forma na matéria-corpo).
Trata-se de uma nova tentativa de síntese da mesma herança utilizada por Platão. O centro de
sua concepção de homem é a Physis animada pelo dinamismo teleológico da forma, que lhe é
imanente, e que, como forma ou eidos, é o seu núcleo inteligível. Aristóteles traz para dentro da physis
a inteligibilidade que, em Platão, pertencia ao mundo das idéias. Daí alguns traços antropológicos:
- Estrutura biopsíquica do homem ou teoria da psyché: Psyché é o princípio vital, o ato, a perfeição de
todo ser vivo, a capacidade de mover-se a si mesmo. A psyché é o ato do corpo organizado. A função
intelectiva é específica do homem. Se todo ser vivo possui alma, então percebemos a sua tripartição:
alma vegetativa, alma sensitiva(com apetite e movimento), alma intelectiva(fonte do conhecimento
racional).
- O homem como ZôonLogikón: o homem pertence à physis, mas se distingue dos outros seres por seu
Lógos(linguagem, fala, sentido, discurso, pensamento), transcendendo por ele a natureza. Por isto o
homem não é um ser ‘natural’. O Lógos é receptivo e ativo, tem como Fim a Verdade(theoria), o
Bem(práxis), a Utilidade e o Prazer(poíesis), codifica a forma do pensamento teórico e prático(lógica).
- O homem como ZôonPolitikón e ético: a dimensão éticopolítica é um domínio específico da
racionalidade. O homem é essencialmente destinado à vida em comum na pólis e somente aí se realiza
como ser racional. A vida ética e a vida política são artes de viver segundo a razão. As virtudes que a
Ética estuda só encontram o campo de seu pleno exercício na vida política.
- O Homem como ser de Paixão e Desejo(pathé e órexis): paixão e desejo incidem decisivamente na
práxis ética e política e na poíesis. É o lado do ‘irracional’, do prazer.
Junto com a visão platônica de homem, esta é decisiva para a civilização ocidental.
6. Antropologias Helenísticas(IIIa.c. - Ia.c.):
É o advento do Indivíduo como centro da reflexão; é o declínio da pólis grega, da comunidade
integradora dos cidadãos. Trata-se de um individualismo específico: o indivíduo deve inventar outras
formas de vida associativa que possam garantir a eudaimonia. Não há mais a pólis; tem-se que criar
novo espaço. De um modo geral, a eudaimonia passa a ser concebida como a plena satisfação das
carências e desejos propriamente humanos, de acordo com a razão.
No Epicurismo, a eudaimonia é a busca e a conquista do Prazer verdadeiro(hedoné). A
essência do homem é material e seu bem também é material: o bem é o prazer. O verdadeiro prazer é a
ausência de dor no corpo(aponía) e a falta de perturbação na alma(ataraxia). O verdadeiro prazer está
naquilo que é natural e necessário; deve-se limitar aquilo que é natural e não necessário e fugir daquilo
que não é nem nem outro. A morte não deve ser temida porque é a total dissolução do homem, não
restando nada dele, portanto, a paz enfim. Há uma desvalorização da vida política(pertence aos
prazeres nem naturais nem necessários) e uma importância à vida escondida, com amizades.
No Estoicismo(Zenão de Cítio), o indivíduo também é o centro. A condição principal para a
eudaimonia é a autarkéia(senhorio de si mesmo). Há um logos universal que une todos os seres numa
simpatia universal(providência cósmica). O homem deve conformar-se ao cosmos e obedecer ao logos
a ele imanente. Razão e paixão se fundem: a paixão é um juízo da razão. O Bem é aquilo que
incrementa o ser, o logos; o mal, o que o diminui e danifica. O homem é cidadão do
mundo(cosmopolita). Se o homem julga erroneamente suas paixões, lhe advém a perturbação. A
felicidade está na ausência de toda paixão; a felicidade é apatia e impassibilidade. O sábio nem deve se
comover, nem se envolver; daí o estóico não ser um entusiasta pela vida.
7. Antropologia Neoplatônica(II. - III d.c.):
É o estágio final da antropologia clássica. Recolhe os seus principais elementos e já vai
abrindo um novo ideal de humanidade, dilatado e aprofundado pela proposta cristã.
A unificação do império romano, a mistura das culturas e raças, a ascensão do cristianismo... o
ocidente vive um pouco de ‘paz’. Com Plotino, temos o último clarão da filosofia clássica. Seu
esquema é o da ‘processão e do retorno’, que posteriormente será de enorme utilidade para St.
Agostinho. Porque o UNO deseja e quer, ele gera o Nous(espírito), a Alma universal e daí as almas
particulares que diferenciarão os seres no mundo. Assim como tudo procede do Uno e dele recebe o
seu princípio de intelgibilidade e de ser, tudo também retorna a Ele, como o fim imanente de cada
coisa.
Com isso, os sentidos colaboram no processo de conhecimento; a estrutura do homem reflete a
realidade superior; a alma humana está voltada para o que lhe é superior e para o que lhe é inferior; a
descida da alma no corpo é algo natural(o Uno quer); o homem é uno na pluralidade; o homem possui
o pensamento e a liberdade para transcender a physis e elevar-se a uma união extática com o Uno; o
homem se realiza na socialidade por uma vida virtuosa, desligando-se das coisas ‘aqui de baixo’ e
buscando as ‘lá de cima’, de onde o homem procede.
B. A Concepção Cristão-Medieval do Homem
Esta concepção torna-se predominante a partir do séc VI ao séc XV, em nossa civilização,
influenciando-a até hoje. Trata-se de uma concepção teológica, aproveitando o arsenal conceptual da
filosofia grega. São duas as fontes desta concepção: tradição bíblica e tradição filosófica grega. Da
tradição bíblica vêm a normatividade, a instância última de referência, os valores, a forma de ação, o
horizonte de compreensão da história. Esta normatividade vive em permanente tensão com a filosofia;
esta tensão é o fio condutor para a compreensão das antropologias emergentes nessa época.
1. Concepção Bíblica do Homem:
Entre a concepção bíblica e a concepção clássica existe uma comunhão temática, fundada na
universalidade da experiência humana e seus conteúdos fundamentais. Por exemplo, os temas: o
homem e o divino, o homem e o destino, a unidade do homem. Mas a concepção bíblica tem suas
especificidades, a começar pela sua formulação numa linguagem religiosa, a da Revelação. O discurso
sobre o homem supõe uma fonte transcendente, com uma teologia implícita,e é referido a um
fundamento de sua Verdade. Com os conceitos e métodos do pensamento filosófico, clássico e
medieval, aparecerá uma teologia explícita e em seguida uma filosofia cristã.
Dentre os traços fundamentais da antropologia bíblica podemos destacar:
- A unidade radical do Ser do homem, definida pela relação constitutiva que o ordena à Escuta da
Palavra. Essa unidade se põe dentro de uma História de Salvação. O desígnio de salvação é, por parte
de Deus, DOM; por parte do homem, RESPOSTA- Aceitação. Recusar o dom implica na perda da
unidade do homem. Daí os temas da criação-queda-promessa-aliança-vida com Deus. O homem é
compreendido nas vicissitudes de suas situações concretas de existência, sem dualismo ontológico. O
homem é Carne, enquanta se experimenta frágil e com uma existência contingente(transitória); o
homem é Alma, enquanto compensa a fragilidade pelo vigor de sua vitalidade; o homem é
Espírito(ruah) ou manifestação superior do conhecimento e da vida, podendo entrar em relação com
Deus; o homem é Coração, enquanto o interior profundo, raiz sa inteligência e da vontade, séde das
paixões e afetos, onde tem lugar o pecado e a conversão.
- A manifestação progressiva do ser e do destino do homem aparece no desenrolar da história da
salvação. A concepção bíblica não é uma teoria conceptual demonstrativa; ela é antes a narrativa de
uma história, de uma história da Revelação e dos gestos de Deus que revelam progressivamente o
homem a si mesmo. Esse processo se consuma com o Evento-Cristo como arquétipo e norma absoluta
do homem.
- O Novo Testamento prolonga e aprofunda os temas da antropologia do AT. Agora a perspectiva é
Cristológica, como é o caso dos escritos paulinos e joaninos, onde também já aparece uma
terminologia grega transformada em seu conteúdo: soma,psyché, pneuma; ou as oposições
existenciais(não-ontológicas): carne/espírito, homem velho/homem novo, trevas/luz, mentira/verdade,
morte/vida.
Os autores Giovanni Reale e Dario Antiseriapontam a seu modo os elementos específicos do
horizonte teocêntrico bíblico, em especial a partir do advento da proposta cristã. O primeiro elemento
seria o monoteísmo, como uma afirmação histórica, cultural e religiosa da época específica de um
povo, cujo referencial foi a bíblia; Deus aparece como uno e único e o resto é idolatria.
Em segundo lugar estaria o criacionismo. Em oposição à eternidade, ciclicidade temporal,
destino e necessidade(moira e ananké) pertencentes ao cosmos, tomam lugar o mundo e o homem
como obras temporais de um ato inaugural que cria do nada, obra de uma Liberdade Absoluta
Transcendente, mas que se faz presente na imanência da história como Amor e Providência. Deus
seria o Ser por excelência e a criação na sua totalidade participaria do Ser e a partir dessa relação é que
o homem e o mundo são compreendidos.
Em terceiro lugar, a afirmação de um Deus nomoteta e a lei como Mandamento. Se para os
gregos a lei moral e política havia sido entendida como o prolongamento do dinamismo do cosmos no
âmbito humano, dinamismo ao qual estavam submetidos homens e deuses, já não é o que acontece no
novo horizonte. O Deus bíblico dá a lei ao homem como mandamento, não como algo imposto ou
seguido impreterivelmente, mas como condição da felicidade e salvação do homem. A virtude, tão
tematizada pela filosofia grega, é chamada a coincidir com a santidade, cujo critério é a prática vivida
do amor gratuito. Deus é Amor e espera que o homem, em liberdade, se decida e responda pelo amor;
isto é fazer a vontade de deus, obedecer ao mandamento como o bem do homem, conformando assim
a vontade humana com o querer de Deus. E este processo se dá a partir do coração.
Em quarto lugar, a afirmação de uma Providência Pessoal. Se parte da filosofia grega chegou a
falar de Providência, como é caso dos estóicos, tal conceito se aproximaria mais da noção de destino
do que de um Deus pessoal. Além de um Deus pessoal, o Deus bíblico se dirige ao criado em geral, se
importa com a criação em geral, se dirige aos homens individuais, especialmente para os mais
necessitados, humildes e, quase que incompreensivelmente, para os pecadores. Ao homem cabe a
preocupação em viver o amor de cada dia e é vã a preocupação com a própria vida, porquanto o
homem nada pode garantir em definitivo a seu respeito. Para quem ama e mesmo para quem não ama,
sempre haveria um ‘olhar amoroso’ de Deus.
Em quinto lugar, a introdução da temática e da experiência do pecado. Segundo o próprio mito
adâmico, o primeiro e grande pecado do homem teria sido o de ter pretendido ser Deus, não aceitando
a sua condição criatural. Daíteria ficado na história humana o estigma, a mancha de uma
desobediência que praticamente teria subvertido o sentido da própria criação. No mundo mítico grego
também teria havido ‘alguém’ que roubou o fogo dos deuses e por isso recebeu um ‘certo’ castigo,
mas com uma incidência de caráter mais pessoal e não com conseqúências para todo o gênero humano
ao longo do tempo, como é o caso bíblico. Por si só o homem não conseguiria se salvar; mas ao longo
da história de um povo eleito, Deus fez muitas vezes aliança com esse povo, até mandar o Seu
Filhoque, com sua morte e ressurreição resgatou a todos.
Em sexto lugar, a nova dimensão da fé e do espírito. A filosofia grega havia subestimado o
valor da fé e da crença(pístis), pois pertenceriam ao reino da opinião (doxa) e favorecido a epistéme; o
conhecimento, a contemplaçào seria a virtude suprema do homem. Já a mensagem bíblica põe a fé
acima da episteme e a prática acima da contemplação de caráter cognoscitivo. Então se compreende
porque a Cruz significou um escândalo para os próprios judeus e uma loucura para os gregos. A
sabedoria já não está necessariamente no homem que julga ‘conhecer muito’, mas naquele que em
amando muito, pode vir a incluir a presença da cruz em sua vida. A vida segundo o espírito é a
participação no divino através da fé, mediada pela Escuta da Palavra e a transformação dessa escuta
em Vida.
Em sétimo lugar, a diferença entre Eros grego e Agápe cristão. Platão elaborou, especialmente
em O Banquete, a admirável teoria de eros. Eros não seria Deus, porque é desejo de perfeição, é uma
tensão mediadora que torna possível a elevação do sensível ao supra-sensível, força que tende a
conquistar a dimensão do divino, a luz da beleza. Já o amor bíblico não seria subida do homem, mas
descida de Deus na direção dos homens, não é conquista mas Dom, não está motivado pelo valor do
objeto ao qual se dirige, mas sim algo espontâneo e gratuito. No horizonte teocêntrico, é sobretudo
Deus quem ama; e se o homem ama, é Graça de Deus no homem que aceita em liberdade assemelhar
sua vida à de Deus. Deus não precisa do amor do homem, por isso seu amor é infinito em gratuidade;
mas Deus, porque ama, espera que os homens se amem e assim voltem a participar da vida de Deus. É
por isso que o NT resume, aprofunda e condensa toda a proposta bíblica no mandamento do amor. É
daí que se afirma também uma nova Ética, bem entendida, a ‘Ética da Caridade’(muito distante do
‘fazer caridade’).
Em oitavo lugar, a revolução de valores. Para o próprio Nietzsche, um dos maiores críticos da
civilização ocidental, a proposta cristã significou, em relação ao mundo grego, a total subversão dos
valores antigos. A apresentação programática desses valores estaria no Sermão da Montanha. Segundo
o novo quadro, seria preciso retornar à simplicidade e pureza da criança, à mansidão, à ‘pobreza’
espiritual, à sede de justiça, à misericórdia, ser amante da paz, querer bem mesmo aos que nos tratam
como inimigos... A busca dariqueza aparece como empecilho para a realização humana, o poder só se
justifica como serviço, o homem está referido à comunidade e se realiza na partilha gratuita, já não há
mais servos nem senhores no mundo humano, mas todos têm um valor incondicional, uma igualdade
de filhos de Deus e é afirmada a írmanação universal.
Em nono lugar, imortalidade e/ou ressurreição. Os gregos já haviam afirmado a imortalidade
da alma. A nova proposta afirma mais: a ressurreição da alma E do corpo, porquanto não há dualismo
e sim a unidade fundamental do homem. E o destino eterno teria a ver com a qualidade da vida de
cada homemaos olhos e à luz dos critérios de Deus: o afastamento definitivo de Deus ou a participação
da própria vida(amor) de Deus.
Por fim,o novo sentido da história. Os gregos não tiveram um sentido preciso da história, por
causa de seu próprio horizonte cíclico eterno. A concepção bíblica é retilínea: no transcorrer do tempo
verficam-se eventos que são irrepetíveis, como etapas que destacam o sentido da história. Há um
começo, um meio e um fim, que se desdobra escatologicamente dentro da eternidade. E assim o
homem se compreende: sabe de onde vem, onde está e onde é chamado a chegar. O cristão se realiza
na comunidade de irmãos e não na pólis, embora a vida política pode ser uma mediação importante
para a expansão do Reino de Deus.
2. Antropologia Patrística:
Nos dois primeiros séculos, o grande problema foi o Gnosticismo. Este aprofunda o dualismo
da tradição grega: implica numa condenação da Matéria como obra do princípio do mal, o que
questiona uma das verdades centrais do anúncio cristão; o ‘fazer-se carne’. A Gnose afirmou-se como
uma forma específica de conhecimento místico, articulando elementos do paganismo tardio(greco-
romano) e de algumas seitas tidas como heréticas de inspiração cristã. A Gnose seria uma nova
maneira de conhecer Deus, um conhecimento não mais fundado na razão, mas uma espécie de
iluminação direta, sendo assim uma espécie de revelação. Os homens são divididos em três categorias:
os pneumáticos(nos quais predomina o Espírito), psíquicos(nos quais predomina a alma), hílicos(nos
quais predomina a matéria, hyle). Os últimos são destinados à morte, os primeiros à salvação e os
segundos têm a possibilidade de salvação se seguirem as indicações dos primeiros. Este mundo é mau,
obra de um demiurgo mau; Cristo é o salvador, mas teria um corpo só aparente; Cristo teria revelado a
verdade só a poucos: daí uma entidade secreta. A gnose trouxe muitos problemas para os chamados
Santos Padres.
A Patrística se desenvolve totalmente à luz do Mistério da Encarnação, concretizando o tema
do ‘à imagem e semelhança’. O primeiro grande teólogo, crítico da gnose foi santo Irineu, no séc. II.
O pensamento patrístico divide-se em duas grandes correntes, embora o fundo seja comum:
- Patrística grega: a filosofia grega tem grande influência; acentua o caráter ontológico da concepção
do homem, gerando problemas para o caráter histórico da visão bíblica. O grande expoente foi
Orígenes e depois Gregório de Nissa. Aí aparecem temas como: a assimilação a Deus, pré-existência
da alma(numa interpretação de cunho cristão), subsistência(hypóstasis), pessoa, natureza,
essência(ousia), vontade.
- Patrística latina: O grande expoente é Santo Agostinho. Em sua concepção de homem há a
confluência de três fontes: o neoplatonismo(que é a base de sua formação filosófica), a antropologia
paulina(uma visão salvífica do homem, aprofundando os temas do pecado original, da graça, da
liberdade, do livre-arbítrio), a antropologia da narração bíblica da criação(que o seu tema preferido; aí
entra o tema do homem-imagem, elaborado a partir da própria experiência e processos existenciais).
Traços de sua antropologia:
* O homem como ser Uno: a unidade do homem é assegurada pela referência ao horizonte teológico;
* O homem como ser itinerante: a itinerância é um aspecto da concepção do tempo como caminho
para a eternidade que se faz dentro da própria vida humana. Um itinerário da vida ordenada a Deus,
passando pela conversão; itinerário da mente(inquietude do coração na busca de Deus); itinerário da
vontade(livre-arbítrio e ação da Graça, como itinerário da beatitude); esse seria o itinerário da
humanidade num tempo retilíneo;
* O homem como ser para Deus: por sua estrutura(memória, inteligência, vontade), por sua
participação histórica na dialética das Duas Cidades, segundo o Amor que o move.
A antropologia agostiniana é uma transposição genial da tradição platônica nas linhas
temáticas da tradição bíblica, especialmente cristã, já levando em conta os esforços da Patrística
anterior. Ela é a matriz da concepção medieval do homem e influencia até hoje a visão de Si do
homem ocidental.
3. Antropologia Medieval:
Três são suas fontes de inspiração:
- A Sagrada Escritura(sacra pagina): autoridade maior;
- Os Padres da Igreja: especialmente Santo Agostinho;
- Os filósofos e escritores gregos e latinos(principalmente Aristóteles).
Nesse tempo medieval, há uma surpreendente riqueza de vertentes e elementos que
engendrarão os tempos modernos, como o advento de um novo tempo que teve suas condições de
possibilidade históricas.
No campo filosófico-teológico, Agostinho predomina até o séc. XII, com forte tom platônico.
Daí em diante, dentre os clássicos, Aristóteles será proeminente, mas sempre em tensão com o
agostinismo.
Na antropologia medieval, duas questões têm principal importância: a questão da historicidade
e a questão da corporalidade do homem. No primeiro caso, a natureza humana aparece inserida numa
situação histórica determinante dos destinos dos indivíduos; no segundo caso, a compreensão do corpo
na unidade de essência do homem permanece uma exigência fundamental da doutrina da criação e da
encarnação. A maior síntese antropológica é a de Santo Tomás, onde se consegue um maior equilíbrio
entre as teses da antropologia clássica e da antropologia bíblico-cristã. Nessa síntese há três
coordenadas:
* O homem como ser racional(clássica)
* O homem como ser na fronteira entre o espiritual e o corporal(neoplatônica)
* O homem como criatura, imagem e semelhança de Deus.
Quanto à contribuição clássica, o grande problema de Tomás é o da unidade do homem(alma-
corpo). A alma é a forma(enteléquia) do corpo que o integra na perfeição essencial do ser-homem; e
desta unicidade deriva a unidade do agir e fazer humanos(faculdades). A alma é o princípio primeiro
da unidade e perfeição do homem. O Racional é a diferença específica do homem designando: a razão
discursiva como forma do conhecimento intelectual inferior à inteligência, própria dos espíritos puros
e da qual o homem participa. É pela racionalidade, com um significado teórico e prático, que o homem
pode buscar o seu fim, o qual se abre ao sobrenatural. O homem, por seu corpo e por sua
racionalidade, encontra-se entre o tempo e a eternidade, numa relação com o cosmos, com o tempo,
com a história.
A idéia de imagem se liga à de perfeição: o homem como participante da perfeição absoluta,
da qual decorre a capacidade de conhecer a verdade e de agir moralmente. O homem está aberto à
iniciativa de Deus e dela é partícipe(analogia). Há uma intrínseca inteligibilidade do existir da criatura
na sua dependência do Existir absoluto de Deus. O tema da imagem é o centro dessa antropologia, ao
redor da qual se articulam os três estados da existência humana: a natureza, a graça e a glória.
Posteriormente, seguem-se outras antropologias, como o voluntarismo(Duns Escoto), o
nominalismo, etc, que desembocarão na moderna concepção do homem.
C. Antroplogia Moderna
A concepção moderna do homem vai sendo lentamente gestada nos últimos séculos medievais
e já é perceptível na Renascença,firma-se no séc. XV e se completa no século XVIII. O homem passa
a ocupar o centro da história. o lugar hermenêutico da compreensão da realidade, sendo a matriz das
divergentes e plurais antropologias contemporâneas.
A complexidade da história vai se tornado maior; a civilização ocidental amplia as suas bses
materiais e vai experimentando um processo de universalização; a unidade cultural e religiosa da
imagem do homem e do mundo é desfeita pelas novas descobertas, pelo encontro com a diversidade
das culturas e dos tipos humanos; as ciências vão se desvinculando da filosofia e da autoridade
religiosa e experimentam significativos avanços. Dentre outros fatores, isto gera uma complexidade
crescente nas concepções do homem, resultando numa pluralidade antropológica sem os pontos
fundamentais de uma nova unidade.
1. O Homem no Humanismo:
A Renascença(XIV - XV) foi assinalada por transformações múltiplas na Europa, originando
um momento civilizatório brilhante; é a idade do Humanismo:
- É uma nova sensibilidade em face do homem;
- É a redescoberta e a exaltação da cultura clássica, sobretudo latina(proliferação do livro impresso);
- É a ênfase na dignidade do homem(como no caso de Nicolau de Cusa);
- É a ênfase no homem universal.
O nominalismo da Escolástica representa a dissolução dos fundamentos metafísicos, do
mundo ideal. A renascença tenta recuperar esses fundamentos em três direções:
- Revitalização do pensamento medieval com a Segunda Escolástica(XVI);
- Tendência panteísta(Giordano Bruno e depois Spinoza);
- Tendência panenteísta(Nicolau de Cusa): ênfase à imanência do divino no mundo e à individualidade
humana.
Reaparece o homem como aquele que contempla(theoria) e age:
Homo - contemplari Superioridade
- operari Nisto:Grandeza do Homem
Dignidade
Retoma-se em novos patamares a consciência de humanidade: o homem com suas
características essenciais universais, não mais limitado pelas particularidades civis, servis, crente,m
pagão. Põe-se, então, o problema da unidade e igualdade da natureza humana. Reaparece o problema
do direito natural e da tolerância religiosa. Vai-se rompendo, pois, a imagem medieval do homem e
também vai se firmando uma visão racionalista do homem.
2. Antropologia Racionalista(XVII - XVIII):
No começo do século XVII anuncia-se um novo modo de pensar e sentir, influenciado pela
Renascença, pelos grandes moralistas franceses que apregoavam a lei natural e a defesa da natureza
como guia das ações, bem como a observação de si mesmo(especialmente Michel de Montaigne). O
Racionalismo prolonga a tradição do ZôonLogikón, dando-lhe um novo conteúdo, baseado no modelo
da máquina, que explicará a vida e o homem.
O Paradigma da nova antropologia está em Descartes. Este privilegia o Método como ponto de
partida do saber: o saber segue as regras do método. Em primeiro lugar, o método aplica-se ao
problema do Fundamento último dacerteza, conduzindo diretamente à metafísica, da qual se deduz a
Física(inversão cartesiana). Quanto ao homem, o método conduz ao fundamento indubitável do
Cogito. Há uma inadequação entre a certeza de ser do Cogito e a Verdade do Mundo. Para a certeza da
última, é preciso recorrer à existência de Deus, seguindo a teoria das IdéiasInatas.Há problema com
relação ao corpo.
Traços da concepção racionalista:
- A subjetividade do espírito como Res Cogitans e consciência-de-Si;
- A exterioridade do Corpo(Res Extensa) por relação ao espírito.
O dualismo cartesiano é diferente do clássico: a res cogitans separa-se do corpo não para
contemplar as Idéias, mas para melhor conhecer e dominar o mundo. Essa antropologia fica dividida
entre uma ‘metafísica do espírito’ e uma ‘física do corpo’: cada uma das substâncias pode subsistir
sem a outra.
Isto mostra o aparecimento de uma nova idéia de Razão, centrada na idéia de método,
seguindo o modelo matemático(‘Discurso sobre o Método’). O mundo não é mais a physis com um
princípio imanente de movimento qualitativo, mas a grande máquina que pode ser analisada pela razão
e por ela reproduzida na forma de um modelo matemático. O homem se assume como o senhor
eminente do mundo, a fonte última do sentido das coisas e dos seres que pertencem à realidade. O
corpo humano é integrado entre os artefatos e as máquinas; só a presença do espírito, que se manifesta
como razão e linguagem, separa o homem do animal máquina.
3. O Homem na Idade Cartesiana:
A Revolução cartesiana, na filosofia, e a revolução galileana, na ciência, originaram uma nova
idéia de razão, que transforma profundamente a autocompreensão do homem e, posteriormente, abrirá
espaço para as ciências humanas.
Pascal é representante da experiência dramática do homem moderno, dividido entre dois
abismos:
- De um lado, contempla o infinitamente grande e o infinitamente pequeno na natureza;
- De outro, o homem é chamado a conhecer sua miséria, expressa na corrupção de sua natureza e na
operação de suas faculdades.
Em Pascal, o Cogito não se volta para a dominação do mundo, mas para a descoberta das regras
morais, da responsabilidade pelo destino de si mesmo,da situação do homem, do lado trágico dessa
situação, contra o otimismo cartesiano e seus seguidores.
Hobbes aplica o racionalismo à compreensão do homem em sua relação com a sociedade, não
reconhecendo, porém, o estatuto ontológico do Cogito. Seu materialismo é radical e integral: só o
Corpo, ocupando o espaço, Existe; o próprio Deus seria corporal. A diferença dos homens por relação
aos outros seres está em ser o artífice de sua própria humanidade: isto exige que o homem saia do
estado de natureza e encaminhe-se para o estado civil, fazendo do Estado e da Sociedade o horizonte
de sua realização. E já é bem conhecida a relação entre: homem naturalmente violento, sociedade
necessária, pacto de sociedade, alienação de parte da liberdade natural, Estado como monopólio da
violênciaLeviatã).
Na Inglaterra, o que vai se firmando é o Empirismo, sob a influência de Hobbes e Bacon e que
será estruturado por Locke. Com Locke temos a estruturação do homem liberal ou do burguês, com
seu credo otimista e naturalistana bondade natural do homem(contra Hobbes) e na sociabilidade
natural e espontânea do homem a partir de um estado de natureza. Locke rejeita as idéias inatas: o
homem já tem em si todas as disposições naturais para, com suas próprias capacidades, conhecer
Deus, a natureza e a si mesmo como ser moral. Há a primazia do indivíduo sobre a sociedade, o que
servirá de fundamento para todo o pensamento político liberal.
4. Século XVII e as Ciências Humanas:(ver ‘O Grau Zero do Conhecimento’)
As ciências humanas nascem sob o paradigma do modelo mecanicista. os instrumentos desse
modelo são a observação e a medida, articulados por uma nova idéia de método, com regras definidas
para o ‘bem pensar’= bem conhecer. Por um lado, o racionalismo com a Dedução; por outro, o
empirismo com a Indução.
Há uma profunda transformação no espírito das ciências da vida, com a estruturação do
modelo do animal-máquina. Nascem novos instrumentos de observação(anatomia microscópica com
Malpighi), descoberta dos glóbulos vermelhos, bactérias(Leuvenhoek), reformulação da história
botânica e zoológica.
A antropologia empírica faz seus progressos em três domínios:
- da anatomia do corpo humano: aparecimento da anatomia comparada;
- da sistemática zoológica: inclusão do homem na classificação das espécies animais, noção de
raça(etnologia), investigação empírica da origem do homem;
- do estudo experimental do psiquismo, da pedagogia experimental(em especial a RatioStudiorum dos
jesuítas).
Na investigação empírica do homem, aparecem também as ciências da linguagem, tendo como
objetivo o Texto, e uma hermenêutica crítica, mais profunda do que uma filologia humanista.
Reaparece a filologia bíblica. Há uma forte preocupação com a própria linguagem, com uma gramática
geral, com os mecanismos elementares da linguagem, com uma língua universal. Inicia-se
propriamente a ciência histórica, nessa época com a historiografia eclesiástica, depois com a
historiografia crítica, levando a uma nova consciência histórica e à crise da ‘consciência européia’.
Também há uma preocupação científica com o Direito e com o Estado, como é o caso da aplicação do
modelo mecanicista ao Estado em Hobbes e a elaboração da ‘ideologia do individualismo’ em Locke.
5. O Homem no Iluminismo:
O iluminismo é um movimento de idéias e um ‘espírito’ que marcou toda uma época(+- 1680 -
1780), conferindo uma fisionomia própria a uma civilização. É com ele que se estrutura de vez o
horizonte moderno da subjetividade, do homem no centro e como foco de todo sentido da natureza, da
vida, do homem, da história. Como disse Kant, ‘O iluminismo é a saída do homem do estado de
minoridade que ele deve imputar a si mesmo. Minoridade é a incapacidade de valer-se de seu próprio
entendimento sem a guia de outro... Tem coragem de servir-te de tua própria inteligência! Esse é o
lema do iluminismo”. O projeto histórico da Ilustração é um desafio proposto à filosofia, à ciência, à
moral, à religião, à cultura ocidental, num caminho que se afasta decisivamente das concepções dos
séculos cristãos e da civilização clássica.
As influências provêm sobretudo de Locke, da mecãnica de Newton e do racionalismo,
articulando-se na questão fundamental do Conhecimento, onde se conjugam o poder da Razão e o
critério da possível Experiência. O método experimental-analítico-mecanicista torna-se o método;
Experiência é o critério e o limite da possibilidade do conhecimento; a Razão é una e universal e seu
intento é conquistar todos os campos da realidade, tornando-se norma da pedagogia que deve
extender-se a toda a humanidade; a história é lida segundo os progressos da razão: o progresso técnico
é o eixo epistemológico que orienta a direção da história; a idéia de progresso funda-se na certeza
teórica da infalibilidade da razão, articulada com um desígnio poiético de levar a termo as obras da
razão, começando pela própria sociedade; o progresso implica mudanças segundo ‘fins’ racionais
medida pelo critério do melhor-útil. Como diria Voltaire, ‘Algum dia tudo será melhor - eis a nossa
esperança’.
Com isso, o programa ilumista, segundo Adorno e Horkheimer, ‘ ...era o de libertar o mundo
da magia. ele se propunha dissolver os mitos e derrubar a imaginação com a ciência... perseguiu o
objetivo de acabar com o medo dos homens e torná-los senhores’(A Dialética do Iluminismo).
Sucintamente podemos dizer que as idéias fundamentais da Ilustração são:
- Humanidade: este conceito assume um conceito secularizado e nào mais cristão. Há um otimismo,
um movimento de re-apropriação do homem como matriz de inteligibilidade e de valor. A relação com
o divino, quando afirmada, não tem mais aquela primazia anterior; Deus não é objeto de fé, mas de
razão(deísmo); ele é o grande relojoeiro do universo e só isto. A primazia está na relação entre
indivíduo e sociedade. O homem é o centro do sistema do saber.
- Civilização: ela é um fato e um valor. designa um estágio avançado, verificável e mensurável, da
história de um grupo humano no campo do pensamento e da atividade prático-técnica, uma atitude de
otimismo e um ideal de progresso em face da história futura. É a verificação da passagem da Natureza
à Cultura e desta à Civilização.
- Tolerância: embora, por um lado, a razão exige a afirmação de Deus, por outro, Deus não é passível
de conhecimento nos limites da experiência, do verificável. Assim, diz Voltaire, temos de ser
tolerantes uns com os outros no campo das religiões, pois não há como decidir quem tem razão. Além
do mais, a tolerância no campo moral e religioso é fundamental para o progresso.
- Revolução: a instauração progressivade uma nova idade da humanidade, de progresso e bem-
estar(promessa!).
6. O Homem em Kant:
Kant representa as diversas correntes da Ilustração, aproveitando elementos das várias
posições modernas, mas já apresenta traços do Idealismo, que marcará época. Apresenta traços
também de influência pietista e de Rousseau que, para Voltaire, foi um herege.
Em Kant aparecem duas linhas na concepção do homem:
- Linha Crítica
- Linha antropológica, submetida à primeira.
Com isto são dois os panos epistemológicos de sua concepção de homem:
* o plano de uma ciência da observação: utiliza o procedimento analítico para unificar dados da
observação, por meio de uma teoria das faculdades em que o núcleo é Eu, expresso na consciência-de-
si;
* o plano de uma ciência a priori(ética e metafísica): determinação da essência do homem.
Kant conserva o dualismo antropológico; na CRPu há o dualismo entre
Sensibilidade(receptividade) e Entendimento(espontaneidade). Na CRPr, dualismo entre caráter
empírico(necessidades, paixões) e caráter inteligível(domínio da liberdade). Traços do homem
kantiano:
- Estrutura sensitivo-racional, que acompanha o homem como ser cognoscente. Como ser da natureza,
o homem situa-se no espaço e tempo do mundo; como ser racional, é capaz de formular as idéias de
Alma, Mundo e Deus.
- Estrutura físico-pragmática: acompanha o homem como ser natural mundano. Físico é o que a
natureza opera no homem; pragmático é o que o homem faz de si mesmo e também a capacidade de
responder à interrogação a respeito do agir moral.
- Estrutura histórica: acompanha o homem em duas direções: religiosa, que aponta para o fim último
do homem; pedagógico-política, que aponta para o ordenamento da liberdade no indivíduo e na
comunidade, dentro da história(com a presença de uma teleologia que a habita).
Kant ainda tentou a unificação dos dualismos mediante a hipótese de uma teleologia da
natureza e uma teleologia da natureza, que num certo momento da história se encontrariam: dois
caminhos de uma mesma Razão.
D. As Concepções do Homem na Filosofia Contemporânea
A filosofia contemporânea compreende as correntes emergentes nos séculos XIX e XX, dos
tempos pós-kantianos ao nosso tempo. Duas razões para isto:
* teórica: a maior parte dos problemasdo início daquele século continuam até hoje;
* histórica: as condições para o exercício da filosofia, de lá para cá, continuam praticamente as
mesmas(cultura universitária)
1. O Homem e o Idealismo Alemão:
Esta vertente abre a filosofia contemporânea. É uma confluência de correntes: Aufklärung e
Kant, o Romantismo, a Tologia protestante, o Direito Natural moderno, reencontro da Ética e Política
clássicas.
Na questão do homem influi mais o romantismo, um movimento de Sensibilidade que foi
chamado o outro lado do século XVIII. Este possui dois traços essenciais:
- resistência à Ilustração, ao mecanicismo, ao empirismo de Locke;
- primazia do sentimento sobre a razão, do Eu Sensível sobre o Cogito, do senso íntimo sobre a
universalidade lógica(contra o classicismo).
A antropologia romântica valoriza no homem o Particular, como se exprime na sensibilidade,
nas emoções, na paixão, que encaminham o homem para o Universal: integrar-se numa totalidade
orgânica cuja mediação é a arte; pelo sentimento comunga-se com o todo. A filosofia da história não
se baseia no progresso, mas na presença do Absoluto que se particulariza e se manifesta nos povos e
culturas. Aí está a presença de Goethe, Schiller e o grande pedagogo Pestalozzi. Mas quem antecipa
essa antropologia seria Rousseau e Herder, no século anterior.
A idéia de homem é o centro da obra de Rousseau. Ela se liga à sua própria experiência
existencial; o Sentimento é o centro, cuja séde é o coração ou a consciência moral; mas Rousseau
trabalha isto com extremo rigor racional. O homem era naturalmente bom, a sociedade o corrompeu; é
preciso um novo pacto. Suas grandes questões: qual o caminho que levou o homem do estado de
natureza ao estado de sociedade? por que o estado de sociedade troxe ao homem a corrupção e a perda
da bondade inata? Rousseau rejeita toda ideonomia(Platão) e toda teonomia medieval; defende a
imanência absoluta da natureza, fonte de todo bem e valor. Daí viria a nova humanidade(seguir a
natureza, cf O Emílio).
Em Herder, o que define o homem é a Linguagem; tenta unir razão e sensibilidade; a
linguagem é uma criação humana e não um dom divino, é a forma humana da racionalidade: por ela o
homem tem um mundo propriamente humano.
O idealismo elabora filosoficamente as idéias que alimentavam a visão romântica. No caso de
Fichte e Schelling, eles se caracterizam como filósofos da liberdade, tentando colocar-se para além dos
dualismos kantianos e sendo um referencial para a obra hegeliana.
2. A Concepção Hegeliana:
Hegel constrói um sistema comparável ao de Aristóteles. Nele estão dialeticamente articulados
os momentos da Natureza, do Espírito Subjetivo(individual), do Espírito Objetivo(o Espírito na
História) e do Absoluto.
A concepção de homem se expressa por sua relação aos diversos níveis da realidade:
- Relação do homem com o mundo natural: este é o domínio da imediatidade, oposto ao mundo da
mediação, que é o mundo humano, que suprassume a natureza em Espírito, seja pelo agir subjetivo,
seja pelas obras objetivas.
- Relação do homem com a cultura: o indivíduo só é humano quando participa no movimento
constitutivo da história; tal processo prepara o indivíduo para o universal, a humanização(cultura).
- Relação do homem com a história: a história é o ‘progresso na consciência da liberdade’, o ser do
homem na progressiva manifestação; a história não é linear(fatos justapostos), mas dialética, um
crescendo qualitativo do sentido realizado da vida humana e a sua consciência.
- Relação com o Absoluto: a arte, a religião e a filosofia são as instâncias da manifestação do
Absoluto; na arte a intuição, na religião a representação, na filosofia o conceito. É pela filosofia que o
Absoluto se revela como Reconhecimento: A Razão na História é o progressivo Reconhecimento entre
as liberdades, o inclui a luta entre senhor e escravo.
3. O Homem Pós-Hegeliano:
Com a morte de Hegel, temos a direita e esquerda hegelianas. A esquerda utiliza Hegel para
uma crítica social e política, acabando por voltar-se contra o próprio Hegel: Feuerbach e Marx
principalmente. Feurbach critica sobretudo o Espírito Subjetivo de Hegel; Marx, o Espírito objetivo.
Em Feuerbach temos um antropocentrismo radical: o mundo do homem é a projeção do homem
natural dotado de sensibilidade e sentimento; é uma visão materialista do homem, o homem como ser-
sensível. Trata-se de uma desmitologização da teologia: a idéia de Deus é apenas uma projeção da
infinitude do homem; o homem é o único deus para o homem; a religião é a projeção da própria
essência do homem, que deve assumir-se diante de si. O Homem define-se por suas carências e, ao
relacionar-se com o mundo objetivo, é um ser genérico, aberto à relação com os outros. A relação
essencial é Eu-Tu, o fundamento da ‘religião do homem’.
Marx, na antropologia, se apoia significativamente em Feuerbach. A idéiamarxiana de homem
aparece mais nos ‘escritos da juventude’(1839-1849) e de modo bastante fragmentário. A sua
preocupação maior parece ser com a ação revolucionária, a análise econômica, a política... A
concepção marxiana de homem se relaciona com os seguintes tópicos: o homem e a natureza, a
natureza humana, as relações sociais, a filosofia da história.
O homem tem um fundo de características comum com os animais; sobre esse fundo se
destaca a sua especificidade. Homem e animal se definem pelo tipo de realção que os une à natureza,
como vivem sua vida. O animal é sua própria vida; o homem precisa produzir a sua. Essa produção vai
implicar a consciência-de-si, a linguagem, a fabricação de instrumentos, a cooperação gregária. As
duas primeiras seriam exclusivas do homem e modelariam as outras.
A questão da natureza humana está intimamente ligada à questão das necessidades humanas;
estas são necessidades pluriformes: biológicas, psicossociais e culturais, sendo o fundamento de um
desejo; a plena satisfação dessas necessidades, só numa sociedade comunista. junto com a questão das
necessidades e da satisfação está o problema da alienação, espiritual e social. Espiritual: deficiência de
ser por não alcançar a auto-realização; é a coisificação: haveria a possibilidade concreta dessa
satisfação, mas ela não ocorre. Social: é o domínio do produto sobre o produtor.
O homem como ser social tece a dialética entre necessidade e satisfação pelo Trabalho e na
relação com os outros na sociedade. A situação histórica do nível da alienação se mede pela dialética
entre forças produtivas e relações de produção. No capitalismo a inadequação é expressa pelo
fenômeno da fetichização das relações sociais que aparecem como propriedades naturais das coisas. A
alienação é um processo histórico, com seu auge no modo capitalista de produção, desdobrando-se em
profunda alienação espiritual: econômica, política, cultural, religiosa(da primeira procedem as outras).
O homem alienado produz entidades como se fossem reais(nas relações sociais) e
imaginárias(religião) que adquirem existência independente e dominam seus produtores.
A compreensão marxiana do homem se liga a uma filosofia da história. A história se divide
em épocas relacionadas dialeticamente; é o modo de produção dominante que distingue as quatro
épocas: modo asiático de produção, escravismo antigo, feudalismo, capitalismo moderno, que gera
necessariamente o socialismo como transição para o comunismo. A história tem uma face
escatológica: o fim necessário da história é o advento da sociedade sem classes; com isto, Marx estaria
saindo do âmbito daquilo que a razão pode garantir e se adentrando na trilha do mito.
4. Ciências Humanas - Filosofia - Século XIX:
No século XIX temos um rápido desenvolvimento das ciências humanas: da vida, da cultura,
da sociedade, do psiquismo, da economia; essas ciências incidirão fortemente na reflexão
antropológica. O espírito científico dessa época foi marcado pela idéia de Evolução, seguindo a esteira
de Darwin. É nessa época que predomina o positivismo, que tenta compreender o âmbito humano
segundo o modelo determinista-empírico das ciências naturais. É só nos lembrarmos da ‘física social’.
A análise da sociedade tem primazia sobre o indivíduo. Spencer e Durkheim dão continuidade e
Wundt leva adiante a psicologia experimental.
5. Origens da Antrop. Filosófica Contemporânea:
Fundamentalmente, Kierkegaard e Nietzsche são os refenciais da AF contemporânea.
Kierkegaard, o pensador protestante solitário legou vários conceitos que se tornaram referenciais,
como é o caso de sua noção de ‘Existência’ ou indivíduo, irredutível ao sistema(contra Hegel).
Em Nietzsche temos uma crítica radical à cultura ocidental e a proposição de uma nova visão
da vida humana. Há nele três questões fundamentais:
* o que foi o homem: sua aparição e sua aparição da natureza e da vida;
* o que o homem não é, desdecque atingido pela doença da cultura e pelo ressentimento ou vingança
contra a vida e o devir;
* o que o homem pode e deve ser: o homem em transição para o super-homem.
No plano metafísico, a idéia de homem se liga à Vontade de Poder e ao Eterno Retorno do
Mesmo. No plano da cultura, o tema do homem se liga ao Niilismo, como diagnose da cultura
ocidental, à genealogia da moral com a explicitação dos contravalores que estão em oposição à vida e
com o anúncio do super-homem. O homem nietzscheano está em oposição ao zôonlogikón e ao imago
Dei, rejeitando o conceito de alma espiritual. O Corpo é uma unidade superior, a totalidade do
indivíduo inserido no eterno retorno(posição imanentista).
As influências desse pensamento são enormes: em Bergson(filosofia da Vida), em M.
Scheler(fenomenologia afetiva), em Gehlen(biologicismo) e assim por diante.
6. Modelos da Antrop. Fil. Contemporânea:
Há diferentes modelos que servem de referente na composição da imagem do homem
contemporâneo.
a. Antropologia Existencial: a categoria central é a de ‘existência’. Em Kierkegaard, trata-se da
existência cristã que manifesta a singularidade irredutível do indivíduo à explicação lógica, ao lançar
sua liberdade no salto absurdo da fé. O principal herdeiro seria Karl Jaspers: este fala da situação-
limite na qual a existência humana é lançada, devendo dar conta de sua existência. Heidegger também
se situa nessa perpectiva, ao mesmo tempo que procura cavar no solo ontológico. O mais conhecido é
Sartre: o homem vive a tensão entre o Em Si e o Para Si, tendo a tarefa de conseguir um em-si; o
homem aparece como ser de projeto, ele é o seu próprio projeto.
b. Antropologia Personalista: É por essa vertende que a categoria de Pessoa tornou-se central no
discurso contemporâneo sobre o homem. A característica comum do personalismo cristão é a
afirmação do Deus pessoal transcendente como paradigma e fim último da pessoa; os principais
representantes são J. Maritain e E. Mounier. Há uma retomada do pensamento de Tomás e Agostinho.
c. Antropologias Materialistas: no geral, tais concepções se caracterizam pelo uso do procedimento
metodológico reducionista ou aquele que, ao interpretar o homem, prioriza o pólo da Natureza. Os
fatores naturais teriam privilégio diante dos culturais e simbólicos como princípios
explicativos(causantes ou condicionantes) na interpretação do homem. No geral, filiam-se ao ‘homem
produtor’ da concepção de Marx(homo faber). Destaque para Ernst Bloch. Essas antropologias tomam
como referência epistemológica uma certa ciência que passa a ser normativa; geralmente são
enfatizadas as ciências das origens, a biologia humana, psicologias, língüística, etnologia e sobretudo
as teorias da evolução. Estas também inspiraram antropologias espiritualistas, como a de Berson e T.
de Chardin.
7. O Ser Pluriversal Atual:
As diversas antropologias apontadas neste percurso têm como pressuposto o ‘homem como ser
Universal, reflexo ou receptáculo intencional de toda a realidade. Na cultura clássica, o homem é o
microcosmo dentro do macrocosmos, refletindo a este. Na modernidade, a universalidade do Cogito, o
a priori de Kant, o Espírito hegeliano, o ser genérico de Feuerbach e assim por diante. As
antropologias atuais preferem reconhecer a pluridimensionalidade do homem, dos sentidos que a
experiência em seu ser revela ao homem. O ponto de partida é sempre uma perspectiva tida como
privilegiada epor ela tentam construir um discurso englobante sobre a totalidade da experiência
humana; e daí uma pluralidade de discursos sobre a totalidade humana. Segundo Vaz, aí se insere o
pensamento de P. Ricoeur e André Jacob.
8. Alguns Problemas Atuais:
Lima Vaz, na esteira de G. Reale,aponta alguns problemas dos mais significativos que
envolvem o homem do nosso tempo, como problemas que exigem soluções e remédios. Segundo esses
autores, a linha que une os passos desorientados dos homens de hoje é identificada como sendo o
Niilismo, a atitude niilista que se estende, como premissa ou conseqüência, a todos os quadrantes da
cultura contemporânea; para onde quer que volvamos nosso olhar encontramos uma das faces do
niilismo. e daí a questão: o que seria uma sociedade do futuro construída sobre o vazio espiritual de
valores e fins?(recomendam a leitura da obra de A. Huxley ‘Brave New World’ e a de G. Orwell
‘1984’).
Nietzsche teria sido o profeta, o antecipador, o teórico da idade do niilismo: ‘O que narro é a
história dos próximos dois séculos. Descrevo o que acontecerá... o advento do niilismo’(Fragmentos
Póstumos). ‘niilismo: ausência de fim; ausência de resposta ao por quê? O que é o niilismo? A
desvalorização dos valores supremos’: Deus, a verdade, o ser, o bem, o fim último. O niilismo seria
ativo ou passivo. Ativo: força destrutiva dos valores nos quais até agora se acreditou; passivo:
exaustão da força do espírito que v^dissolverem-se sem remédio os valores fundamentais da vida. E
quando for abolido totalmente o supra-sensível, segundo Nietzsche, terá lugar o niilismo completo. Aí:
‘Deus está morto’. Estaríamos ainda num niilismo incompleto dominando o nosso tempo.
Os autores dizem que as faces do niilismo incompleto seriam mais exatamente máscaras, pois
seriam disfarces de valores perdidos, que a frágil memória histórica de uma cultura indiferente à
tradição não consegue recuperar e mesmo identificar. Vejamos algumas dessas faces:
1. O Cientismo e a redefinição da razão humana em termos de eficácia tecnológica. O valor perdido
seria aconcepção analógica da razão, faculdade do ser.
2. O Ideologismo e o esquecimento da verdade. A ideologia racionaliza os interesses particulares e
está a serviço do poder enquanto instrumento eficaza ser utilizado, encobrindo o QUE É com um véu.
O valor obscurecido é a verdade, aquilo que é patente à luz da razão, inclusive o interesse particular.
3. O praxismo e o produtivismo tecnológico. O fazer e o produzir são absolutizados em detrimento do
agir e do contemplar. Daí o declínio da Moral e da Política, o seu mascaramento no hedonismo,
utilitarismo e maquiavelismo de um lado e, de outro, na desligitimação do lazer contemplativo porque
não teria utilidade social. Para o indivíduo o que importa é o que fazer e não o que Ser. Perdeu-se a
consciência moral, a virtude e a contemplação geradora de ser.
4. O bem-estar material como substitutivo da felicidade. A equação mais usada éconsumo=felicidade.
De modo que alguns sempre serão mais ‘felizes’, conseqüência direta do fazer, produzir, possuir.
Perdeu-se a eudaimonia, obscureceu-se a justa medida e a hierarquia dos bens.
5. A inundação da violência. Segundo o próprio Nietzsche, o niilismo não apenas contempla o vazio
das coisas e não é apenas a convicção de que tudo deva ser destruído: é um pôr mãos à obra e tudo
destruir. Matar os seus semelhantes tornou-se para tantos o rito de passagemcapaz de marcar uma vida
vazia e sem sentido(os jovens e o índio em Brasília). Habitantes do nada concluem com uma lógica
irrefutável que a vida humana não vale nada. Lei do mais forte, complexo de Caim são norma e atitude
indiscutíveis para a era do vazio. Perdeu-se o valor do outro, da justiça, o respeito pelo ser humano.
6. A perda do sentido da forma. Nietzsche recusava-se a buscar a felidade na contemplação da beleza,
mesmo tendo suas raízes nela, pois segundo ele não é à felicidade que estamos destinados e sim à
afirmação da vida na vontade de poder. Ele era um cultor do belo. Hoje, podemos ainda falar de uma
função educadora da arte se na sua maior expressividade ela não nos eleva acima da banalidade do
cotidiano? Segundo os autores, a arte tem prezado o in-forme e o de-forme. Perdeu-se o poder da arte
de comunicação entre os seres, pela contemplação do ser expresso.
7. O esquecimento do amor. O niilismo existencialque mais adultera o humano resulta da identificação
do amor com a atividade sexual. Vivemos numa ‘civilização afrodisíaca’(cf.Bergson). O afrodisismo
desvairado e violento passou a ser a face mais agressiva de uma orgulhosa ‘civilização tecnológica’.
Perdeu-se o Eros como a busca de alguma plenitude, como intermediário entre, Eros decaiu, foi
condenado a abandonar-se ao mau infinito do desejo nunca satisfeito.
8. O individualismo nos limites do excesso. Este é um dos traços mais inconfundíveis do homem que
vive no niilismo. Há os que buscam compreender o homem firmados sobre o individualismo e caem
em contradição pela fragilidade da própria premissa e sua decorrência do niilismo. Matou-se, exclui-se
de novo o outro, a comunidade, as utopias, os projetos comuns, a ética, a pessoa.
9. Perda do sentido do fim. Segundo Nietzsche, a lógica do niilismo deve levar à abolição de todo tipo
de causa final, de toda representação de um universo ordenado. O niilista deve viver num mundo
caótico. Perdeu-se a noção de sentido, do sensato, mesmos que estejamos referidos a ele prá
percebermos que não há sentido.
10. Materialismo e esquecimento do ser. É um dos termos mais usados e suporta muitos sentidos. O
niilismo exige o sepultamento de instâncias supra-sensíveis e sua face se mostra como exigência de
materialismo. É o reino da imanência absoluta, do determinismo totalizante. Perdeu-se a liberdade,
matou-se a esperança, matou-se o poder de transcender do homem, morrerá também o super-homem:
no eterno retorno do mesmo(portanto também do niilismo) ou em algum tipo de lógica da
Necessidade. Eis a sabedoria do tempo.
II. OBJETO E MÉTODO DA ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA
Da história que vimos, a concepção do homem atual integra traços, fundamentalmente, da
tradição clássica e bíblico-cristã. Sinteticamente, o homem como portador de uma razão universal e
dotado de liberdade de escolha, que fundamentam a Ética e a Metafísica. A Antropologia está entre as
duas, interligando razão teórica e razão prática. “Hoje essa idéia do homem perdeu de modo
aparentemente definitivo a sua unidade” . Problema: como recuperar uma certaidéia unitária do
homem? Esta é uma das tarefas fundamentais, difíceis e atuais da Reflexão Antropológica. Para isto
precisa definir com rigor o seu próprio método.
Atualmente temos várias tentativas de definir tal método, seguindo diferentes inspirações
epistemológicas, utilizando uma certa ciência como paradigmática:
- método empírico-formal: sob o paradigma das ciências da natureza;
- método dialético: sob o paradigma das ciências históricas;
- método fenomenológico: sob o paradigma das ciências do psiquismo;
- método hermenêutico: sob o paradigma das ciências da cultura;
- método ontológico: sob o paradigma da ontologia clássica.
‘O discurso filosófico sobre o homem está sujeito ao risco permanente do reducionismo, na
medida em que um dos pólos epistemológicos fundamentais que definem o espaço da compreensão do
homem passa a imprimir uma direção privilegiada na ordem do discurso... esses polos são a Natureza,
o Sujeito e a Forma...’. A Antropologia deve coordenar esses três polos de forma equilibrada.
Ora, se o ‘objeto’ em questão é o homem, que também é sujeito, então precisamos levar em
conta a compreensão espontânea e natural que o homem tem de si mesmo e pela qual ele faz uma
imagem de si mesmo, segundo a tradiçãi cultural, com o estilo de vida por ele adotado, com os
símbolos do seu grupo humano, muitas vezes não codificados explicitamente. Trata-se da pré-
compreensão de si, anterior à compreensão fornecida pelas ciências humanas ou outros sistemas de
conhecimento formalizado(filosofias, teologias...). A pré-compreensão se enraíza no ‘mundo da
vida’(Lebenswelt - Husserl), com sua historicidade.
Com isto aparecem três níveis de conhecimento do homem que a AF deve levar em conta em
seu procedimento metódico para chegar a uma organização sistemática:
* nível da pré-compreensão: aí está a imagem espontânea do homem, formada a partir da experiência
natural da vida, expressa em representações, símbolos, crenças, etc;
* nível da compreensão explicativa: aí se situam as ciências humanas, com seus métodos e resultados;
* nível da compreensão filosófica ou transcendental: aí entra a busca das condições de possibilidade
da pré-compreensão e da compreensão explicativa. Trata-se da tematização da experiência
‘original’que o homem faz de si mesmo ‘como ser capaz de dar razão do seu próprio ser, ou seja,
capaz de formular uma resposta à pergunta: “o que é o homem?”’, expressa em categorias filosóficas.
Tais categorias devem ter um conteúdo preciso e ser articuladas num discurso sistemático.
1. Categorias Antropológicas e seu Sistema:
Na compreensão filosófica do homem Sujeito e objeto se entrecruzam(diferença do olhar da
ciência, distânciamento) epistemologicamente pois o que é tematizado e ‘objetivado’ é justamente o
conteúdo ontológico no qual está a resposta à pergunta sobre a possibilidade radical do Sujeito como
Sujeito. Tal compreensão não é uma compreensão sobre o sujeito, mas do Sujeito, enquanto se
conhece e se auto-compreende como Sujeito, que procura dar razão de si mesmo, o que o distingue
dos doutros seres. A compreensão filosófica sistemática precisa exprimir a nível conceptual-filosófico
o processo real e abrangente do auto-constituir-se como Ser-Homem do Sujeito. Nesse sentido o
filósofo seria o intérprete da humanidade.
2. As Dimensões da Experiência Antropológica:
A Antropologia Filosófica não busca o ser do homem como subjetividade abstrata do Eu
Penso, alcançada pela suspensão entre parênteses do mundo-da-vida. Trata-se de buscar o homem na
sua ‘experiência situada’, na sua finitude. As dimensões da experiência filosófica são as dimensões da
situação humana. A experiência humana é uma interpenetração de presenças: o homem é uma
presença-no mundo, um ser-com-os-outros, uma presença-a-si-mesmo. Natureza, Sociedade , EU
constituem o espaço fundamental da experiência antropológica; mas o homem tem também a
experiência de poder abrir-se ao Transcendente, como Presença ou como Ausência, diante do que o
discurso filosófico experimenta sua limitação.
3. Itinerário Metodológico da AF:
O itinerário proposto retoma Aristóteles e sua análise dos momentos do saber: do objeto, do
conceito e do discurso, isto é, o que é dado empiricamente, sua expressão noética(intencional) e sua
articulação discursiva.
* Momento do Objeto: o homem-Objeto e o homem-Sujeito, sujeito produtor de saber sobre si mesmo,
permanecendo sujeito ao objetivar-se pelo saber. É ao nível da compreensão filosófica que o sujeito é
tematizado como sujeito e nela são integradas a pré-compreensão e a compreensão explicativa.
* Momento do Conceito:a compreensão filosófica exprime o Objeto-Sujeito como Ser, na sua
inteligibilidade e na concretude do homem, aproveitando a contribuição das duas outras formas de
compreensão: uma praticamente empírica, a outra praticamente abstrata; aqui trata-se da concretude de
Ser).
* Momento do Discurso: as categorias que exprimem o Sujeito devem ser articuladas de modo a
manifestar o movimento ‘lógico’ da constituição do sujeito Enquanto sujeito, movimento que traduz a
experiência antropológica original. É uma articulação dialética na qual as categorias são
suprassumidas em níveis sempre mais profundos de integração da unidade do sujeito, até atingir o
sujeito enquanto Totalidade, que Vaz chama o ‘nível da pessoa’.
4. Estrutura do Sujeito na AF:
‘Desde o plano da pré-compreensão, o homem manifesta-se concretamente como movimento
dialético de passagem do dado à expressão ou da Natureza à Forma: movimento no qual o momento
mediador é, justamente, o homem como sujeito’(pp. 163). O sujeito estácomo mediação entre a pré-
compreensão e a compreensão filosófica, procurando a lógica dialética do seu ser(eu sinto, eu desejo,
eu penso, eu quero...).
O Eu do sujeito não é uma forma estáticanem fechada em si mesma, mas sofre e executa em si
mesmo um movimento de suprassunção do mundo das coisas no mundo do Sentido. A AF percorre as
formas desse movimento no sujeito ao nível transcendental e as ordena no discurso respondendo à
pergunta sobre o ser do homem.
O discurso filosófico é fundamental para distinguir os três níveis de mediação da constituição
do sujeito:
* Mediação empírica: âmbito da experiência natural, do mundo-da-vida, da pré-compreensão expressa
na linguagem ordinária onde aparece o pronome EU.
* Mediação abstrata: âmbito da compreensão explicativa, resultado de procedimentos operatórios da
observação metódica e da experimentação; os conceitos e o discurso da Ciência obedecem a regras
formais próprias de constituição; o sujeito da mediação abstrata é o sujeito metodologicamente
abstrato que está presente no conhecimento científico.
* Mediação transcendental: âmbito da compreensão filosófica, da objetivização do sujeito enquanto
sujeito(a sua manifestação como sujeito e sua experiência de sujeito). Isto é articulado nesta mediação
com categorias próprias, como veremos adiante. Aqui o sujeito é visto na sua subjetividade absoluta,
irredutível à Natureza e Sociedade, como consciência do mundo, do outro, de si e procurando dar
‘razão de’. É p âmbito da AF.
5. Estrutura da Conceptualização Filosófica:
A constituição das categorias da AF é um processo com alguns passos:
- o primeiro é o da determinação do objeto: ‘o que é’. Na AF o objeto é o próprio ser do homem; faz-
se mister levar em conta a história do desenvolvimento das diferentes abordagens e a problemática
atual, bem como o saber científico atual sobre o homem(é o momento aporético: aporética histórica e
aporética crítica, i.é, rememoração e atualidade).
- o segundo é da elaboração da categoria, cada qual exprimindo um aspecto fundamental do ser do
sujeito, por ex., ‘corpo próprio’( a experiência do, Eu sou meu corpo próprio). Pela mediação do Eu
transcendental, a aporética é suprassumida no concreto conceptual.
- o terceiro é o da dialética, ou do discurso articulado sobre as categorias. O discurso dialético implica
uma relação de oposição e de suprassunção progressiva dos termos, constituindo um discurso
ordenado e sistemático na forma de um todo.
6. Linhas Fundamentais da AF.:
‘A Antropologia filosófica vê aberto diante de si todo o imenso campo do saber sobre si
mesmo que o homem vem acumulando ao longo de sua história. Ao mesmo tempo esse saber lhe
revela toda a complexidade estrutural e dinâmica do fenômeno humano’(pp. 167). A AF deve traçar as
linhas ou direções do seu roteiro, acompanhando os esquemas básicos que organizam o saber do
homem sobre si mesmo. Essas linhas definem o espaço conceptual onde se inscreve o ser-homem;
neste caso, conceitos de Estrutura, Relação, Unidade.
- A nível de estrutura, ou níveis ontológicos, distinção entre: estrutura somática(corpo próprio),
estrutura psíquica(psiquismo), estrutura espiritual(espírito);
- A nível de relação: relação com o mundo(objetividade), com o outro(intersubjetividade), com o
Absoluto(transcendência);
- A nível da unidade: como unificação(realização), como ser-uno(essência), culminando no conceito
de Pessoa.
Daí: “O ser que eu-sou não é um conjunto de fenômenos empíricos mas um ser dado a si mesmo,
irredutível aos fenômenos da natureza, uma substância espiritual como espírito livre’ - C. Bruaire,
L’Être et L’Esprit.

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A concepção clássica do homem na Antropologia Filosófica

  • 1. ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA PONTOS SISTEMÁTICOS DA OBRA ‘ANTROP. FIL. I’ de H. C. de LIMA VAZ I. HISTÓRIA DAS CONCEPÇÕES DE HOMEM NA FILOSOFIAOCIDENTAL A. Concepção Clássica do Homem A concepção clássica do homem começa bem antes de Platão e Aristóteles. Ela se forma em seus elementos essenciais por volta dos séculos VIII e VII a.c. Desde essa época ela se organizará como um universo espiritual coerente, harmônico e com uma riqueza extraordinária. O encontro com a cultura romana, com seus elementos específicos, resultará no que se veio a chamar ‘cultura clássica greco-romana’. Esta forneceu à civilização ocidental a primeira e permanente constelação de ideais e valores. Quanto à concepção de homem, a cultura clássica, de um modo geral, pôs em relevo dois traços fundamentais: - o homem como um ser que fala e discorre(zôonlogikón) - o homem como ser político(zôonpolitikón). Esses traços se relacionam intimamente porque: - Só enquanto dotado de Logos o homem é capaz de entrar em relação consensual com seu semelhante e constituir a comunidade política(Pólis); - A vida política(biospolitikós), vida humana por excelência, se exerce pela livre submissão ao logos estruturado em leis justas. Disso resulta que o homem possui duas atividades dotadas de finalidades específicas: - a atividade de contemplação(theoria); - a atividade do agir moral e político(práxis). A interação entre essas duas atividades é um dos problemas que a concepção clássica do homem, sob diversas formas, procurou resolver. 1. O Homem na Cultura arcáicagrega(traços): - Traço Teológico-Religioso: há uma oposição e divisão entre o mundo dos deuses e o mundo dos mortais. Os deuses são imortais e felizes; os homens efêmeros e infelizes. O homem pretende igualar-se aos deuses, mas sucumbe nas malhas implacáveis do destino(moira), provocando o desfecho trágico na vida humana. A mitologia grega, especialmente com Hesíodo, narra longamente esta questão . Daí os preceitos de moderação provindos dos templos de Apolo e Delfos: ‘nada em excesso’, ‘conhece-te a ti mesmo’. Com isto, de nada adianta ao homem ser orgulhoso(hybris). - Traço Cosmológico: trata-se da contemplação da ordem do cosmos e de admiração diante dessa ordem e beleza do Kosmos. Dessa admiração, segundo Platão e Aristóteles, ter-se-ía originado a filosofia ou a vida teorética. Haveria uma correspondência, uma homologia entre a ordem do Kosmos e a ordem humana representada pela Pólis: há uma Justiça no universo; a pólis deve ser regida por leis justas. O homem é pensado como um microcosmo dentro do macrocosmos, donde o homem recebe vida e movimento, e se realiza como homem se conformar sua vida com a justeza do cosmos. Daí nasce a idéia de uma Ciência do agir humano, no que a pólis ocupa um lugar fundamental: é a mediação por excelência. Este segundo traço cruza-se com o teológico e forma o conceito de Necessidade, inscrita na ordem do mundo e a ela se submetem homens e deuses. Daí o problema da conciliação entre Necessidade cósmica e Liberdade humana. - Traço Antropológico: aqui entra em primeiro lugar a oposição entre o apolíneo e o dionisíaco. É do que trata Ésquilo nas ‘Eumênidas’ e Eurípedes nas ‘Bacantes’. O apolíneo designa o lado luminoso, a presença ordenadora do logos na vida humana, orientando para a clareza do pensamento e para a ação razoável. O dionisíaco designa o lado obscuro, das forças de Eros, do desejo, da paixão(Platão celebrizará isto no Banquete e terá uma presença marcante no pensamento de Nietzsche). Em segundo lugar, aparece o tema da Alma(psyché), sopro, o correlato do corpo. Em Homero, ela vai viver em sombras no Hades; no orfismo, a alma é uma entidade separada do corpo reencarnando-se em várias existências. Em terceiro lugar, aparece a imagem do Herói, da
  • 2. excelência(areté) guerreira; depois, do fundador da cidade e também da excelência do rude trabalho nos campos(cf. Hesíodo em ‘Os trabalhos e os Dias’). O ponto de intersecção entre esses traços é o temeroso tema do Destino(moira). Sobre ele se desenvolveram duas posições: - Por um lado, o pessimismo: o destino é inexorável, acentua o desamparo do homem, a impotência humana ao tentar escapar de sua determinação; - Por outro, o moralismo: é a descoberta da responsabilidade pessoal, do poder de escolha. Esta posição prevalecerá desde a ‘Odisséia’ de Homero. 2. O Homem na Filosofia Pré-Socrática: Diógenes é um dos primeiros a representar um pensamento antropológico claramente definido, na filosofia da physis. Exalta a superioridade do homem sobre os animais o que se manifesta na posição vertical e na marcha, no olhar voltado para o alto, para a contemplação dos astros. Celebra a agilidade das mãos, obreiras da téchne, e exalta a prerrogativa da linguagem, manifestação do pensamento. O homem é, pois, um ente corpóreo-espiritual, cuja natureza se manifesta na cultura. É um ser ordenado finalisticamente em si mesmo e para o qual se ordena a própria ordem do cosmos: um microcosmo dentro do macrocosmos, o que será aprofundado pelos pensadores da physis. Nos Pitagóricos, encontramos a correspondência entre a estrutura matemática do universo e a estrutura matemática da alma, harmonia, sobre o que se deve basear toda educação. No séc. Va. c., o problema antropológico vai se sobrepondo ao cosmológico sob a influência das transformações da sociedade grega, as guerras pérsicas, a consolidação do regime democrático em Atenas e outras cidades. Subjacentes à interrogação sobre o homem aparecem dois grandes problemas, interligados entre si: - o problema da Educação(Paideía), que gira em torno de uma nova forma de areté política exigida pela vida democrática ; - o problema da Sabedoria, não mais fundada na tradição mas na Razão e na téchne. Esses problemas já se encontram em Heráclito, em seguida, no pensamento Sofista. Para os sofistas, e posteriormente na época áurea, o problema maior é o da Cultura. Para eles, a origem e desenvolvimento da cultura são pensados segundo dois modelos: - O modelo da decadência: regido pelo mito de uma idade de ouro primitiva; - O modelo do progresso: pressupõe um primitivo estado de barbárie, ultrapassado pela fundação das cidades e pela invenção das técnicas. Os sofistas levam a efeito a inflexão antropológica grega: o homem e suas capacidades tornam-se o objeto objeto principal da filosofia, com algumas características que se tornarão definitivas: - o conceito de uma natureza humana(geral); - o conceito de narração histórica pela investigação e consciência da pluralidade das culturas; - oposição entre convenção(nómos) e natureza(physis) na organização da cidade e nas normas do agir individual(convencionalismo jurídico e ético); - individualismo relativista e posição cética quanto à verdade; - afirmação de um desenvolvimento progressivo da cultura; - o homem como um ser de necessidade e carência; - o homem como ser dotado de logos, capaz de demonstrar e persuadir. 3. A Transição Socrática: É a época da crise ateniense: guerra do Peloponeso, idéias sofistas, luta pelo poder e participação política. Com Sócrates emerge uma nova concepção de homem que comporá a imagem do homem clássico a nós transmitida, em seus traços fundamentais. Seu grande tema: ‘o que é propriamente o humano?’ O humano deve referir-se a um princípio interior presente em cada homem: a ALMA. O que é a Alma? Ela é a sede de uma areté que vai desde a excelência física e a coragem até a excelência como habilidade aprendida segundo regras. É a sede de uma areté que permite medir o homem segundo a dimensão interior, na qual reside a verdadeira grandeza humana. É o lugar da opção entre o justo e o injusto; ela é a essência do homem. É a idéia de personalidade moral: sobre ela se assenta todo o edifício da ética e do direito.
  • 3. A partir daí, os traços do homem: - A teleologia do Bem e do melhor como via de acesso para compreender o mundo e o homem e sobre a qual se funda a natureza ética da psyché; - A valorização ética do homem expressa no preceito ‘conhece-te a ti mesmo’, mediante investigação metódica: ironia, indução, maiêutica, para chegar à Sabedoria=Virtude=Ciência; - A primazia da faculdade intelectual que conduz e estabelece a relação fundamental, i.é, a relação Dialógica. 4. Antropologia Platônica: É a mais poderosa e influente concepção ainda hoje. É uma síntese na qual se fundem tradição pré-socrática, tradição sofística e herança socrática. A herança cosmológica é assumida numa perspectiva antropológica, do finalismo da inteligência como imanente ao movimento cósmico: a alma move-se a si mesma; o homem é considerado como alma e corpo, com prioridade da alma na definição do homem, pois nela estaria o finalismo do inteligível, é ela que harmoniza os movimentos interiores. O corpo pertence ao mundo sensível e deve sua vida à alma bem como suas capacidades de operação; ele não é tanto o receptáculo da alma, mas como algo que está em oposição a ela, chegando a ser comparado, como lemos no Górgias, a um ‘cárcere’, um túmulo. Quando morre o corpo é libertação da alma, pois ele é a raiz do mal, fonte de amores insensatos, paixões, ignorância, loucura... Já na ética, Platão não é tão dualista. No Fédon lemos que a alma deve fugir sempre mais do corpo. A alma não morre, a morte é só do corpo. A morte do corpo traz grande benefício à alma, pois permite a ela unir-se diretamente ao inteligível, ao bom e verdadeiro. O sábio deve fugir também do mundo, porquanto este representa um afastamento do inteligível, o que é o mal da alma. A fuga do corpo e a fuga do mundo se efetiva pela virtude e pelo conhecimento; praticar a virtude e dedicar-se ao conhecimento é, como lemos nas Leis, assemelhar-se a Deus, medida de todas as coisas. Assim, o cuidado da alma é a suprema missão moral do homem. E cuidar significa purificar, orientando a alma para o inteligível, afastando-a do sensível, através do conhecimento do que é eterno e daí a virtude. A dialética é conversão progressiva da alma na direção da Luz=Bem(cf. A República). Aqui se põe decisivamente a importância da Filosofia da Educação e da Filosofia Política platônicas(duas grandes mediações para formar a alma). E como se lê no Timeu, as almas foram geradas pelo Demiurgo e possuem em sua natureza uma afinidade com as coisas imutáveis e eternas, não estando sujeitas à morte ou à dissolução. Mas se não existir a dimensão meta-empírica da realidade, então cairia também a tese da imortalidade da alma. Enquanto pertence ao mundo sensível, o homem é um ser de carências e está referido essencialmente aos outros; é por isso que os homens constróem as cidades: ninguém consegue prover-se de tudo aquilo que precisa para viver; e na cidade, cada um com suas capacidades específicas cumpre funções que são importantes para todos. 5. Antropologia Aristotélica: Aristóteles é o fundador da antropologia como ciência e tentou uma síntese científico- filosófica em sua concepção de homem. Fez um longo trajeto: de um platonismo da psyché(com a tendência dualista do Fédon) a um monismo hilemórfico(alma como forma na matéria-corpo). Trata-se de uma nova tentativa de síntese da mesma herança utilizada por Platão. O centro de sua concepção de homem é a Physis animada pelo dinamismo teleológico da forma, que lhe é imanente, e que, como forma ou eidos, é o seu núcleo inteligível. Aristóteles traz para dentro da physis a inteligibilidade que, em Platão, pertencia ao mundo das idéias. Daí alguns traços antropológicos: - Estrutura biopsíquica do homem ou teoria da psyché: Psyché é o princípio vital, o ato, a perfeição de todo ser vivo, a capacidade de mover-se a si mesmo. A psyché é o ato do corpo organizado. A função intelectiva é específica do homem. Se todo ser vivo possui alma, então percebemos a sua tripartição: alma vegetativa, alma sensitiva(com apetite e movimento), alma intelectiva(fonte do conhecimento racional). - O homem como ZôonLogikón: o homem pertence à physis, mas se distingue dos outros seres por seu Lógos(linguagem, fala, sentido, discurso, pensamento), transcendendo por ele a natureza. Por isto o homem não é um ser ‘natural’. O Lógos é receptivo e ativo, tem como Fim a Verdade(theoria), o Bem(práxis), a Utilidade e o Prazer(poíesis), codifica a forma do pensamento teórico e prático(lógica).
  • 4. - O homem como ZôonPolitikón e ético: a dimensão éticopolítica é um domínio específico da racionalidade. O homem é essencialmente destinado à vida em comum na pólis e somente aí se realiza como ser racional. A vida ética e a vida política são artes de viver segundo a razão. As virtudes que a Ética estuda só encontram o campo de seu pleno exercício na vida política. - O Homem como ser de Paixão e Desejo(pathé e órexis): paixão e desejo incidem decisivamente na práxis ética e política e na poíesis. É o lado do ‘irracional’, do prazer. Junto com a visão platônica de homem, esta é decisiva para a civilização ocidental. 6. Antropologias Helenísticas(IIIa.c. - Ia.c.): É o advento do Indivíduo como centro da reflexão; é o declínio da pólis grega, da comunidade integradora dos cidadãos. Trata-se de um individualismo específico: o indivíduo deve inventar outras formas de vida associativa que possam garantir a eudaimonia. Não há mais a pólis; tem-se que criar novo espaço. De um modo geral, a eudaimonia passa a ser concebida como a plena satisfação das carências e desejos propriamente humanos, de acordo com a razão. No Epicurismo, a eudaimonia é a busca e a conquista do Prazer verdadeiro(hedoné). A essência do homem é material e seu bem também é material: o bem é o prazer. O verdadeiro prazer é a ausência de dor no corpo(aponía) e a falta de perturbação na alma(ataraxia). O verdadeiro prazer está naquilo que é natural e necessário; deve-se limitar aquilo que é natural e não necessário e fugir daquilo que não é nem nem outro. A morte não deve ser temida porque é a total dissolução do homem, não restando nada dele, portanto, a paz enfim. Há uma desvalorização da vida política(pertence aos prazeres nem naturais nem necessários) e uma importância à vida escondida, com amizades. No Estoicismo(Zenão de Cítio), o indivíduo também é o centro. A condição principal para a eudaimonia é a autarkéia(senhorio de si mesmo). Há um logos universal que une todos os seres numa simpatia universal(providência cósmica). O homem deve conformar-se ao cosmos e obedecer ao logos a ele imanente. Razão e paixão se fundem: a paixão é um juízo da razão. O Bem é aquilo que incrementa o ser, o logos; o mal, o que o diminui e danifica. O homem é cidadão do mundo(cosmopolita). Se o homem julga erroneamente suas paixões, lhe advém a perturbação. A felicidade está na ausência de toda paixão; a felicidade é apatia e impassibilidade. O sábio nem deve se comover, nem se envolver; daí o estóico não ser um entusiasta pela vida. 7. Antropologia Neoplatônica(II. - III d.c.): É o estágio final da antropologia clássica. Recolhe os seus principais elementos e já vai abrindo um novo ideal de humanidade, dilatado e aprofundado pela proposta cristã. A unificação do império romano, a mistura das culturas e raças, a ascensão do cristianismo... o ocidente vive um pouco de ‘paz’. Com Plotino, temos o último clarão da filosofia clássica. Seu esquema é o da ‘processão e do retorno’, que posteriormente será de enorme utilidade para St. Agostinho. Porque o UNO deseja e quer, ele gera o Nous(espírito), a Alma universal e daí as almas particulares que diferenciarão os seres no mundo. Assim como tudo procede do Uno e dele recebe o seu princípio de intelgibilidade e de ser, tudo também retorna a Ele, como o fim imanente de cada coisa. Com isso, os sentidos colaboram no processo de conhecimento; a estrutura do homem reflete a realidade superior; a alma humana está voltada para o que lhe é superior e para o que lhe é inferior; a descida da alma no corpo é algo natural(o Uno quer); o homem é uno na pluralidade; o homem possui o pensamento e a liberdade para transcender a physis e elevar-se a uma união extática com o Uno; o homem se realiza na socialidade por uma vida virtuosa, desligando-se das coisas ‘aqui de baixo’ e buscando as ‘lá de cima’, de onde o homem procede. B. A Concepção Cristão-Medieval do Homem Esta concepção torna-se predominante a partir do séc VI ao séc XV, em nossa civilização, influenciando-a até hoje. Trata-se de uma concepção teológica, aproveitando o arsenal conceptual da filosofia grega. São duas as fontes desta concepção: tradição bíblica e tradição filosófica grega. Da tradição bíblica vêm a normatividade, a instância última de referência, os valores, a forma de ação, o horizonte de compreensão da história. Esta normatividade vive em permanente tensão com a filosofia; esta tensão é o fio condutor para a compreensão das antropologias emergentes nessa época.
  • 5. 1. Concepção Bíblica do Homem: Entre a concepção bíblica e a concepção clássica existe uma comunhão temática, fundada na universalidade da experiência humana e seus conteúdos fundamentais. Por exemplo, os temas: o homem e o divino, o homem e o destino, a unidade do homem. Mas a concepção bíblica tem suas especificidades, a começar pela sua formulação numa linguagem religiosa, a da Revelação. O discurso sobre o homem supõe uma fonte transcendente, com uma teologia implícita,e é referido a um fundamento de sua Verdade. Com os conceitos e métodos do pensamento filosófico, clássico e medieval, aparecerá uma teologia explícita e em seguida uma filosofia cristã. Dentre os traços fundamentais da antropologia bíblica podemos destacar: - A unidade radical do Ser do homem, definida pela relação constitutiva que o ordena à Escuta da Palavra. Essa unidade se põe dentro de uma História de Salvação. O desígnio de salvação é, por parte de Deus, DOM; por parte do homem, RESPOSTA- Aceitação. Recusar o dom implica na perda da unidade do homem. Daí os temas da criação-queda-promessa-aliança-vida com Deus. O homem é compreendido nas vicissitudes de suas situações concretas de existência, sem dualismo ontológico. O homem é Carne, enquanta se experimenta frágil e com uma existência contingente(transitória); o homem é Alma, enquanto compensa a fragilidade pelo vigor de sua vitalidade; o homem é Espírito(ruah) ou manifestação superior do conhecimento e da vida, podendo entrar em relação com Deus; o homem é Coração, enquanto o interior profundo, raiz sa inteligência e da vontade, séde das paixões e afetos, onde tem lugar o pecado e a conversão. - A manifestação progressiva do ser e do destino do homem aparece no desenrolar da história da salvação. A concepção bíblica não é uma teoria conceptual demonstrativa; ela é antes a narrativa de uma história, de uma história da Revelação e dos gestos de Deus que revelam progressivamente o homem a si mesmo. Esse processo se consuma com o Evento-Cristo como arquétipo e norma absoluta do homem. - O Novo Testamento prolonga e aprofunda os temas da antropologia do AT. Agora a perspectiva é Cristológica, como é o caso dos escritos paulinos e joaninos, onde também já aparece uma terminologia grega transformada em seu conteúdo: soma,psyché, pneuma; ou as oposições existenciais(não-ontológicas): carne/espírito, homem velho/homem novo, trevas/luz, mentira/verdade, morte/vida. Os autores Giovanni Reale e Dario Antiseriapontam a seu modo os elementos específicos do horizonte teocêntrico bíblico, em especial a partir do advento da proposta cristã. O primeiro elemento seria o monoteísmo, como uma afirmação histórica, cultural e religiosa da época específica de um povo, cujo referencial foi a bíblia; Deus aparece como uno e único e o resto é idolatria. Em segundo lugar estaria o criacionismo. Em oposição à eternidade, ciclicidade temporal, destino e necessidade(moira e ananké) pertencentes ao cosmos, tomam lugar o mundo e o homem como obras temporais de um ato inaugural que cria do nada, obra de uma Liberdade Absoluta Transcendente, mas que se faz presente na imanência da história como Amor e Providência. Deus seria o Ser por excelência e a criação na sua totalidade participaria do Ser e a partir dessa relação é que o homem e o mundo são compreendidos. Em terceiro lugar, a afirmação de um Deus nomoteta e a lei como Mandamento. Se para os gregos a lei moral e política havia sido entendida como o prolongamento do dinamismo do cosmos no âmbito humano, dinamismo ao qual estavam submetidos homens e deuses, já não é o que acontece no novo horizonte. O Deus bíblico dá a lei ao homem como mandamento, não como algo imposto ou seguido impreterivelmente, mas como condição da felicidade e salvação do homem. A virtude, tão tematizada pela filosofia grega, é chamada a coincidir com a santidade, cujo critério é a prática vivida do amor gratuito. Deus é Amor e espera que o homem, em liberdade, se decida e responda pelo amor; isto é fazer a vontade de deus, obedecer ao mandamento como o bem do homem, conformando assim a vontade humana com o querer de Deus. E este processo se dá a partir do coração. Em quarto lugar, a afirmação de uma Providência Pessoal. Se parte da filosofia grega chegou a falar de Providência, como é caso dos estóicos, tal conceito se aproximaria mais da noção de destino do que de um Deus pessoal. Além de um Deus pessoal, o Deus bíblico se dirige ao criado em geral, se importa com a criação em geral, se dirige aos homens individuais, especialmente para os mais necessitados, humildes e, quase que incompreensivelmente, para os pecadores. Ao homem cabe a
  • 6. preocupação em viver o amor de cada dia e é vã a preocupação com a própria vida, porquanto o homem nada pode garantir em definitivo a seu respeito. Para quem ama e mesmo para quem não ama, sempre haveria um ‘olhar amoroso’ de Deus. Em quinto lugar, a introdução da temática e da experiência do pecado. Segundo o próprio mito adâmico, o primeiro e grande pecado do homem teria sido o de ter pretendido ser Deus, não aceitando a sua condição criatural. Daíteria ficado na história humana o estigma, a mancha de uma desobediência que praticamente teria subvertido o sentido da própria criação. No mundo mítico grego também teria havido ‘alguém’ que roubou o fogo dos deuses e por isso recebeu um ‘certo’ castigo, mas com uma incidência de caráter mais pessoal e não com conseqúências para todo o gênero humano ao longo do tempo, como é o caso bíblico. Por si só o homem não conseguiria se salvar; mas ao longo da história de um povo eleito, Deus fez muitas vezes aliança com esse povo, até mandar o Seu Filhoque, com sua morte e ressurreição resgatou a todos. Em sexto lugar, a nova dimensão da fé e do espírito. A filosofia grega havia subestimado o valor da fé e da crença(pístis), pois pertenceriam ao reino da opinião (doxa) e favorecido a epistéme; o conhecimento, a contemplaçào seria a virtude suprema do homem. Já a mensagem bíblica põe a fé acima da episteme e a prática acima da contemplação de caráter cognoscitivo. Então se compreende porque a Cruz significou um escândalo para os próprios judeus e uma loucura para os gregos. A sabedoria já não está necessariamente no homem que julga ‘conhecer muito’, mas naquele que em amando muito, pode vir a incluir a presença da cruz em sua vida. A vida segundo o espírito é a participação no divino através da fé, mediada pela Escuta da Palavra e a transformação dessa escuta em Vida. Em sétimo lugar, a diferença entre Eros grego e Agápe cristão. Platão elaborou, especialmente em O Banquete, a admirável teoria de eros. Eros não seria Deus, porque é desejo de perfeição, é uma tensão mediadora que torna possível a elevação do sensível ao supra-sensível, força que tende a conquistar a dimensão do divino, a luz da beleza. Já o amor bíblico não seria subida do homem, mas descida de Deus na direção dos homens, não é conquista mas Dom, não está motivado pelo valor do objeto ao qual se dirige, mas sim algo espontâneo e gratuito. No horizonte teocêntrico, é sobretudo Deus quem ama; e se o homem ama, é Graça de Deus no homem que aceita em liberdade assemelhar sua vida à de Deus. Deus não precisa do amor do homem, por isso seu amor é infinito em gratuidade; mas Deus, porque ama, espera que os homens se amem e assim voltem a participar da vida de Deus. É por isso que o NT resume, aprofunda e condensa toda a proposta bíblica no mandamento do amor. É daí que se afirma também uma nova Ética, bem entendida, a ‘Ética da Caridade’(muito distante do ‘fazer caridade’). Em oitavo lugar, a revolução de valores. Para o próprio Nietzsche, um dos maiores críticos da civilização ocidental, a proposta cristã significou, em relação ao mundo grego, a total subversão dos valores antigos. A apresentação programática desses valores estaria no Sermão da Montanha. Segundo o novo quadro, seria preciso retornar à simplicidade e pureza da criança, à mansidão, à ‘pobreza’ espiritual, à sede de justiça, à misericórdia, ser amante da paz, querer bem mesmo aos que nos tratam como inimigos... A busca dariqueza aparece como empecilho para a realização humana, o poder só se justifica como serviço, o homem está referido à comunidade e se realiza na partilha gratuita, já não há mais servos nem senhores no mundo humano, mas todos têm um valor incondicional, uma igualdade de filhos de Deus e é afirmada a írmanação universal. Em nono lugar, imortalidade e/ou ressurreição. Os gregos já haviam afirmado a imortalidade da alma. A nova proposta afirma mais: a ressurreição da alma E do corpo, porquanto não há dualismo e sim a unidade fundamental do homem. E o destino eterno teria a ver com a qualidade da vida de cada homemaos olhos e à luz dos critérios de Deus: o afastamento definitivo de Deus ou a participação da própria vida(amor) de Deus. Por fim,o novo sentido da história. Os gregos não tiveram um sentido preciso da história, por causa de seu próprio horizonte cíclico eterno. A concepção bíblica é retilínea: no transcorrer do tempo verficam-se eventos que são irrepetíveis, como etapas que destacam o sentido da história. Há um começo, um meio e um fim, que se desdobra escatologicamente dentro da eternidade. E assim o homem se compreende: sabe de onde vem, onde está e onde é chamado a chegar. O cristão se realiza na comunidade de irmãos e não na pólis, embora a vida política pode ser uma mediação importante para a expansão do Reino de Deus.
  • 7. 2. Antropologia Patrística: Nos dois primeiros séculos, o grande problema foi o Gnosticismo. Este aprofunda o dualismo da tradição grega: implica numa condenação da Matéria como obra do princípio do mal, o que questiona uma das verdades centrais do anúncio cristão; o ‘fazer-se carne’. A Gnose afirmou-se como uma forma específica de conhecimento místico, articulando elementos do paganismo tardio(greco- romano) e de algumas seitas tidas como heréticas de inspiração cristã. A Gnose seria uma nova maneira de conhecer Deus, um conhecimento não mais fundado na razão, mas uma espécie de iluminação direta, sendo assim uma espécie de revelação. Os homens são divididos em três categorias: os pneumáticos(nos quais predomina o Espírito), psíquicos(nos quais predomina a alma), hílicos(nos quais predomina a matéria, hyle). Os últimos são destinados à morte, os primeiros à salvação e os segundos têm a possibilidade de salvação se seguirem as indicações dos primeiros. Este mundo é mau, obra de um demiurgo mau; Cristo é o salvador, mas teria um corpo só aparente; Cristo teria revelado a verdade só a poucos: daí uma entidade secreta. A gnose trouxe muitos problemas para os chamados Santos Padres. A Patrística se desenvolve totalmente à luz do Mistério da Encarnação, concretizando o tema do ‘à imagem e semelhança’. O primeiro grande teólogo, crítico da gnose foi santo Irineu, no séc. II. O pensamento patrístico divide-se em duas grandes correntes, embora o fundo seja comum: - Patrística grega: a filosofia grega tem grande influência; acentua o caráter ontológico da concepção do homem, gerando problemas para o caráter histórico da visão bíblica. O grande expoente foi Orígenes e depois Gregório de Nissa. Aí aparecem temas como: a assimilação a Deus, pré-existência da alma(numa interpretação de cunho cristão), subsistência(hypóstasis), pessoa, natureza, essência(ousia), vontade. - Patrística latina: O grande expoente é Santo Agostinho. Em sua concepção de homem há a confluência de três fontes: o neoplatonismo(que é a base de sua formação filosófica), a antropologia paulina(uma visão salvífica do homem, aprofundando os temas do pecado original, da graça, da liberdade, do livre-arbítrio), a antropologia da narração bíblica da criação(que o seu tema preferido; aí entra o tema do homem-imagem, elaborado a partir da própria experiência e processos existenciais). Traços de sua antropologia: * O homem como ser Uno: a unidade do homem é assegurada pela referência ao horizonte teológico; * O homem como ser itinerante: a itinerância é um aspecto da concepção do tempo como caminho para a eternidade que se faz dentro da própria vida humana. Um itinerário da vida ordenada a Deus, passando pela conversão; itinerário da mente(inquietude do coração na busca de Deus); itinerário da vontade(livre-arbítrio e ação da Graça, como itinerário da beatitude); esse seria o itinerário da humanidade num tempo retilíneo; * O homem como ser para Deus: por sua estrutura(memória, inteligência, vontade), por sua participação histórica na dialética das Duas Cidades, segundo o Amor que o move. A antropologia agostiniana é uma transposição genial da tradição platônica nas linhas temáticas da tradição bíblica, especialmente cristã, já levando em conta os esforços da Patrística anterior. Ela é a matriz da concepção medieval do homem e influencia até hoje a visão de Si do homem ocidental. 3. Antropologia Medieval: Três são suas fontes de inspiração: - A Sagrada Escritura(sacra pagina): autoridade maior; - Os Padres da Igreja: especialmente Santo Agostinho; - Os filósofos e escritores gregos e latinos(principalmente Aristóteles). Nesse tempo medieval, há uma surpreendente riqueza de vertentes e elementos que engendrarão os tempos modernos, como o advento de um novo tempo que teve suas condições de possibilidade históricas. No campo filosófico-teológico, Agostinho predomina até o séc. XII, com forte tom platônico. Daí em diante, dentre os clássicos, Aristóteles será proeminente, mas sempre em tensão com o agostinismo.
  • 8. Na antropologia medieval, duas questões têm principal importância: a questão da historicidade e a questão da corporalidade do homem. No primeiro caso, a natureza humana aparece inserida numa situação histórica determinante dos destinos dos indivíduos; no segundo caso, a compreensão do corpo na unidade de essência do homem permanece uma exigência fundamental da doutrina da criação e da encarnação. A maior síntese antropológica é a de Santo Tomás, onde se consegue um maior equilíbrio entre as teses da antropologia clássica e da antropologia bíblico-cristã. Nessa síntese há três coordenadas: * O homem como ser racional(clássica) * O homem como ser na fronteira entre o espiritual e o corporal(neoplatônica) * O homem como criatura, imagem e semelhança de Deus. Quanto à contribuição clássica, o grande problema de Tomás é o da unidade do homem(alma- corpo). A alma é a forma(enteléquia) do corpo que o integra na perfeição essencial do ser-homem; e desta unicidade deriva a unidade do agir e fazer humanos(faculdades). A alma é o princípio primeiro da unidade e perfeição do homem. O Racional é a diferença específica do homem designando: a razão discursiva como forma do conhecimento intelectual inferior à inteligência, própria dos espíritos puros e da qual o homem participa. É pela racionalidade, com um significado teórico e prático, que o homem pode buscar o seu fim, o qual se abre ao sobrenatural. O homem, por seu corpo e por sua racionalidade, encontra-se entre o tempo e a eternidade, numa relação com o cosmos, com o tempo, com a história. A idéia de imagem se liga à de perfeição: o homem como participante da perfeição absoluta, da qual decorre a capacidade de conhecer a verdade e de agir moralmente. O homem está aberto à iniciativa de Deus e dela é partícipe(analogia). Há uma intrínseca inteligibilidade do existir da criatura na sua dependência do Existir absoluto de Deus. O tema da imagem é o centro dessa antropologia, ao redor da qual se articulam os três estados da existência humana: a natureza, a graça e a glória. Posteriormente, seguem-se outras antropologias, como o voluntarismo(Duns Escoto), o nominalismo, etc, que desembocarão na moderna concepção do homem. C. Antroplogia Moderna A concepção moderna do homem vai sendo lentamente gestada nos últimos séculos medievais e já é perceptível na Renascença,firma-se no séc. XV e se completa no século XVIII. O homem passa a ocupar o centro da história. o lugar hermenêutico da compreensão da realidade, sendo a matriz das divergentes e plurais antropologias contemporâneas. A complexidade da história vai se tornado maior; a civilização ocidental amplia as suas bses materiais e vai experimentando um processo de universalização; a unidade cultural e religiosa da imagem do homem e do mundo é desfeita pelas novas descobertas, pelo encontro com a diversidade das culturas e dos tipos humanos; as ciências vão se desvinculando da filosofia e da autoridade religiosa e experimentam significativos avanços. Dentre outros fatores, isto gera uma complexidade crescente nas concepções do homem, resultando numa pluralidade antropológica sem os pontos fundamentais de uma nova unidade. 1. O Homem no Humanismo: A Renascença(XIV - XV) foi assinalada por transformações múltiplas na Europa, originando um momento civilizatório brilhante; é a idade do Humanismo: - É uma nova sensibilidade em face do homem; - É a redescoberta e a exaltação da cultura clássica, sobretudo latina(proliferação do livro impresso); - É a ênfase na dignidade do homem(como no caso de Nicolau de Cusa); - É a ênfase no homem universal. O nominalismo da Escolástica representa a dissolução dos fundamentos metafísicos, do mundo ideal. A renascença tenta recuperar esses fundamentos em três direções: - Revitalização do pensamento medieval com a Segunda Escolástica(XVI); - Tendência panteísta(Giordano Bruno e depois Spinoza); - Tendência panenteísta(Nicolau de Cusa): ênfase à imanência do divino no mundo e à individualidade humana.
  • 9. Reaparece o homem como aquele que contempla(theoria) e age: Homo - contemplari Superioridade - operari Nisto:Grandeza do Homem Dignidade Retoma-se em novos patamares a consciência de humanidade: o homem com suas características essenciais universais, não mais limitado pelas particularidades civis, servis, crente,m pagão. Põe-se, então, o problema da unidade e igualdade da natureza humana. Reaparece o problema do direito natural e da tolerância religiosa. Vai-se rompendo, pois, a imagem medieval do homem e também vai se firmando uma visão racionalista do homem. 2. Antropologia Racionalista(XVII - XVIII): No começo do século XVII anuncia-se um novo modo de pensar e sentir, influenciado pela Renascença, pelos grandes moralistas franceses que apregoavam a lei natural e a defesa da natureza como guia das ações, bem como a observação de si mesmo(especialmente Michel de Montaigne). O Racionalismo prolonga a tradição do ZôonLogikón, dando-lhe um novo conteúdo, baseado no modelo da máquina, que explicará a vida e o homem. O Paradigma da nova antropologia está em Descartes. Este privilegia o Método como ponto de partida do saber: o saber segue as regras do método. Em primeiro lugar, o método aplica-se ao problema do Fundamento último dacerteza, conduzindo diretamente à metafísica, da qual se deduz a Física(inversão cartesiana). Quanto ao homem, o método conduz ao fundamento indubitável do Cogito. Há uma inadequação entre a certeza de ser do Cogito e a Verdade do Mundo. Para a certeza da última, é preciso recorrer à existência de Deus, seguindo a teoria das IdéiasInatas.Há problema com relação ao corpo. Traços da concepção racionalista: - A subjetividade do espírito como Res Cogitans e consciência-de-Si; - A exterioridade do Corpo(Res Extensa) por relação ao espírito. O dualismo cartesiano é diferente do clássico: a res cogitans separa-se do corpo não para contemplar as Idéias, mas para melhor conhecer e dominar o mundo. Essa antropologia fica dividida entre uma ‘metafísica do espírito’ e uma ‘física do corpo’: cada uma das substâncias pode subsistir sem a outra. Isto mostra o aparecimento de uma nova idéia de Razão, centrada na idéia de método, seguindo o modelo matemático(‘Discurso sobre o Método’). O mundo não é mais a physis com um princípio imanente de movimento qualitativo, mas a grande máquina que pode ser analisada pela razão e por ela reproduzida na forma de um modelo matemático. O homem se assume como o senhor eminente do mundo, a fonte última do sentido das coisas e dos seres que pertencem à realidade. O corpo humano é integrado entre os artefatos e as máquinas; só a presença do espírito, que se manifesta como razão e linguagem, separa o homem do animal máquina. 3. O Homem na Idade Cartesiana: A Revolução cartesiana, na filosofia, e a revolução galileana, na ciência, originaram uma nova idéia de razão, que transforma profundamente a autocompreensão do homem e, posteriormente, abrirá espaço para as ciências humanas. Pascal é representante da experiência dramática do homem moderno, dividido entre dois abismos: - De um lado, contempla o infinitamente grande e o infinitamente pequeno na natureza; - De outro, o homem é chamado a conhecer sua miséria, expressa na corrupção de sua natureza e na operação de suas faculdades. Em Pascal, o Cogito não se volta para a dominação do mundo, mas para a descoberta das regras morais, da responsabilidade pelo destino de si mesmo,da situação do homem, do lado trágico dessa situação, contra o otimismo cartesiano e seus seguidores. Hobbes aplica o racionalismo à compreensão do homem em sua relação com a sociedade, não reconhecendo, porém, o estatuto ontológico do Cogito. Seu materialismo é radical e integral: só o Corpo, ocupando o espaço, Existe; o próprio Deus seria corporal. A diferença dos homens por relação
  • 10. aos outros seres está em ser o artífice de sua própria humanidade: isto exige que o homem saia do estado de natureza e encaminhe-se para o estado civil, fazendo do Estado e da Sociedade o horizonte de sua realização. E já é bem conhecida a relação entre: homem naturalmente violento, sociedade necessária, pacto de sociedade, alienação de parte da liberdade natural, Estado como monopólio da violênciaLeviatã). Na Inglaterra, o que vai se firmando é o Empirismo, sob a influência de Hobbes e Bacon e que será estruturado por Locke. Com Locke temos a estruturação do homem liberal ou do burguês, com seu credo otimista e naturalistana bondade natural do homem(contra Hobbes) e na sociabilidade natural e espontânea do homem a partir de um estado de natureza. Locke rejeita as idéias inatas: o homem já tem em si todas as disposições naturais para, com suas próprias capacidades, conhecer Deus, a natureza e a si mesmo como ser moral. Há a primazia do indivíduo sobre a sociedade, o que servirá de fundamento para todo o pensamento político liberal. 4. Século XVII e as Ciências Humanas:(ver ‘O Grau Zero do Conhecimento’) As ciências humanas nascem sob o paradigma do modelo mecanicista. os instrumentos desse modelo são a observação e a medida, articulados por uma nova idéia de método, com regras definidas para o ‘bem pensar’= bem conhecer. Por um lado, o racionalismo com a Dedução; por outro, o empirismo com a Indução. Há uma profunda transformação no espírito das ciências da vida, com a estruturação do modelo do animal-máquina. Nascem novos instrumentos de observação(anatomia microscópica com Malpighi), descoberta dos glóbulos vermelhos, bactérias(Leuvenhoek), reformulação da história botânica e zoológica. A antropologia empírica faz seus progressos em três domínios: - da anatomia do corpo humano: aparecimento da anatomia comparada; - da sistemática zoológica: inclusão do homem na classificação das espécies animais, noção de raça(etnologia), investigação empírica da origem do homem; - do estudo experimental do psiquismo, da pedagogia experimental(em especial a RatioStudiorum dos jesuítas). Na investigação empírica do homem, aparecem também as ciências da linguagem, tendo como objetivo o Texto, e uma hermenêutica crítica, mais profunda do que uma filologia humanista. Reaparece a filologia bíblica. Há uma forte preocupação com a própria linguagem, com uma gramática geral, com os mecanismos elementares da linguagem, com uma língua universal. Inicia-se propriamente a ciência histórica, nessa época com a historiografia eclesiástica, depois com a historiografia crítica, levando a uma nova consciência histórica e à crise da ‘consciência européia’. Também há uma preocupação científica com o Direito e com o Estado, como é o caso da aplicação do modelo mecanicista ao Estado em Hobbes e a elaboração da ‘ideologia do individualismo’ em Locke. 5. O Homem no Iluminismo: O iluminismo é um movimento de idéias e um ‘espírito’ que marcou toda uma época(+- 1680 - 1780), conferindo uma fisionomia própria a uma civilização. É com ele que se estrutura de vez o horizonte moderno da subjetividade, do homem no centro e como foco de todo sentido da natureza, da vida, do homem, da história. Como disse Kant, ‘O iluminismo é a saída do homem do estado de minoridade que ele deve imputar a si mesmo. Minoridade é a incapacidade de valer-se de seu próprio entendimento sem a guia de outro... Tem coragem de servir-te de tua própria inteligência! Esse é o lema do iluminismo”. O projeto histórico da Ilustração é um desafio proposto à filosofia, à ciência, à moral, à religião, à cultura ocidental, num caminho que se afasta decisivamente das concepções dos séculos cristãos e da civilização clássica. As influências provêm sobretudo de Locke, da mecãnica de Newton e do racionalismo, articulando-se na questão fundamental do Conhecimento, onde se conjugam o poder da Razão e o critério da possível Experiência. O método experimental-analítico-mecanicista torna-se o método; Experiência é o critério e o limite da possibilidade do conhecimento; a Razão é una e universal e seu intento é conquistar todos os campos da realidade, tornando-se norma da pedagogia que deve extender-se a toda a humanidade; a história é lida segundo os progressos da razão: o progresso técnico
  • 11. é o eixo epistemológico que orienta a direção da história; a idéia de progresso funda-se na certeza teórica da infalibilidade da razão, articulada com um desígnio poiético de levar a termo as obras da razão, começando pela própria sociedade; o progresso implica mudanças segundo ‘fins’ racionais medida pelo critério do melhor-útil. Como diria Voltaire, ‘Algum dia tudo será melhor - eis a nossa esperança’. Com isso, o programa ilumista, segundo Adorno e Horkheimer, ‘ ...era o de libertar o mundo da magia. ele se propunha dissolver os mitos e derrubar a imaginação com a ciência... perseguiu o objetivo de acabar com o medo dos homens e torná-los senhores’(A Dialética do Iluminismo). Sucintamente podemos dizer que as idéias fundamentais da Ilustração são: - Humanidade: este conceito assume um conceito secularizado e nào mais cristão. Há um otimismo, um movimento de re-apropriação do homem como matriz de inteligibilidade e de valor. A relação com o divino, quando afirmada, não tem mais aquela primazia anterior; Deus não é objeto de fé, mas de razão(deísmo); ele é o grande relojoeiro do universo e só isto. A primazia está na relação entre indivíduo e sociedade. O homem é o centro do sistema do saber. - Civilização: ela é um fato e um valor. designa um estágio avançado, verificável e mensurável, da história de um grupo humano no campo do pensamento e da atividade prático-técnica, uma atitude de otimismo e um ideal de progresso em face da história futura. É a verificação da passagem da Natureza à Cultura e desta à Civilização. - Tolerância: embora, por um lado, a razão exige a afirmação de Deus, por outro, Deus não é passível de conhecimento nos limites da experiência, do verificável. Assim, diz Voltaire, temos de ser tolerantes uns com os outros no campo das religiões, pois não há como decidir quem tem razão. Além do mais, a tolerância no campo moral e religioso é fundamental para o progresso. - Revolução: a instauração progressivade uma nova idade da humanidade, de progresso e bem- estar(promessa!). 6. O Homem em Kant: Kant representa as diversas correntes da Ilustração, aproveitando elementos das várias posições modernas, mas já apresenta traços do Idealismo, que marcará época. Apresenta traços também de influência pietista e de Rousseau que, para Voltaire, foi um herege. Em Kant aparecem duas linhas na concepção do homem: - Linha Crítica - Linha antropológica, submetida à primeira. Com isto são dois os panos epistemológicos de sua concepção de homem: * o plano de uma ciência da observação: utiliza o procedimento analítico para unificar dados da observação, por meio de uma teoria das faculdades em que o núcleo é Eu, expresso na consciência-de- si; * o plano de uma ciência a priori(ética e metafísica): determinação da essência do homem. Kant conserva o dualismo antropológico; na CRPu há o dualismo entre Sensibilidade(receptividade) e Entendimento(espontaneidade). Na CRPr, dualismo entre caráter empírico(necessidades, paixões) e caráter inteligível(domínio da liberdade). Traços do homem kantiano: - Estrutura sensitivo-racional, que acompanha o homem como ser cognoscente. Como ser da natureza, o homem situa-se no espaço e tempo do mundo; como ser racional, é capaz de formular as idéias de Alma, Mundo e Deus. - Estrutura físico-pragmática: acompanha o homem como ser natural mundano. Físico é o que a natureza opera no homem; pragmático é o que o homem faz de si mesmo e também a capacidade de responder à interrogação a respeito do agir moral. - Estrutura histórica: acompanha o homem em duas direções: religiosa, que aponta para o fim último do homem; pedagógico-política, que aponta para o ordenamento da liberdade no indivíduo e na comunidade, dentro da história(com a presença de uma teleologia que a habita). Kant ainda tentou a unificação dos dualismos mediante a hipótese de uma teleologia da natureza e uma teleologia da natureza, que num certo momento da história se encontrariam: dois caminhos de uma mesma Razão.
  • 12. D. As Concepções do Homem na Filosofia Contemporânea A filosofia contemporânea compreende as correntes emergentes nos séculos XIX e XX, dos tempos pós-kantianos ao nosso tempo. Duas razões para isto: * teórica: a maior parte dos problemasdo início daquele século continuam até hoje; * histórica: as condições para o exercício da filosofia, de lá para cá, continuam praticamente as mesmas(cultura universitária) 1. O Homem e o Idealismo Alemão: Esta vertente abre a filosofia contemporânea. É uma confluência de correntes: Aufklärung e Kant, o Romantismo, a Tologia protestante, o Direito Natural moderno, reencontro da Ética e Política clássicas. Na questão do homem influi mais o romantismo, um movimento de Sensibilidade que foi chamado o outro lado do século XVIII. Este possui dois traços essenciais: - resistência à Ilustração, ao mecanicismo, ao empirismo de Locke; - primazia do sentimento sobre a razão, do Eu Sensível sobre o Cogito, do senso íntimo sobre a universalidade lógica(contra o classicismo). A antropologia romântica valoriza no homem o Particular, como se exprime na sensibilidade, nas emoções, na paixão, que encaminham o homem para o Universal: integrar-se numa totalidade orgânica cuja mediação é a arte; pelo sentimento comunga-se com o todo. A filosofia da história não se baseia no progresso, mas na presença do Absoluto que se particulariza e se manifesta nos povos e culturas. Aí está a presença de Goethe, Schiller e o grande pedagogo Pestalozzi. Mas quem antecipa essa antropologia seria Rousseau e Herder, no século anterior. A idéia de homem é o centro da obra de Rousseau. Ela se liga à sua própria experiência existencial; o Sentimento é o centro, cuja séde é o coração ou a consciência moral; mas Rousseau trabalha isto com extremo rigor racional. O homem era naturalmente bom, a sociedade o corrompeu; é preciso um novo pacto. Suas grandes questões: qual o caminho que levou o homem do estado de natureza ao estado de sociedade? por que o estado de sociedade troxe ao homem a corrupção e a perda da bondade inata? Rousseau rejeita toda ideonomia(Platão) e toda teonomia medieval; defende a imanência absoluta da natureza, fonte de todo bem e valor. Daí viria a nova humanidade(seguir a natureza, cf O Emílio). Em Herder, o que define o homem é a Linguagem; tenta unir razão e sensibilidade; a linguagem é uma criação humana e não um dom divino, é a forma humana da racionalidade: por ela o homem tem um mundo propriamente humano. O idealismo elabora filosoficamente as idéias que alimentavam a visão romântica. No caso de Fichte e Schelling, eles se caracterizam como filósofos da liberdade, tentando colocar-se para além dos dualismos kantianos e sendo um referencial para a obra hegeliana. 2. A Concepção Hegeliana: Hegel constrói um sistema comparável ao de Aristóteles. Nele estão dialeticamente articulados os momentos da Natureza, do Espírito Subjetivo(individual), do Espírito Objetivo(o Espírito na História) e do Absoluto. A concepção de homem se expressa por sua relação aos diversos níveis da realidade: - Relação do homem com o mundo natural: este é o domínio da imediatidade, oposto ao mundo da mediação, que é o mundo humano, que suprassume a natureza em Espírito, seja pelo agir subjetivo, seja pelas obras objetivas. - Relação do homem com a cultura: o indivíduo só é humano quando participa no movimento constitutivo da história; tal processo prepara o indivíduo para o universal, a humanização(cultura). - Relação do homem com a história: a história é o ‘progresso na consciência da liberdade’, o ser do homem na progressiva manifestação; a história não é linear(fatos justapostos), mas dialética, um crescendo qualitativo do sentido realizado da vida humana e a sua consciência.
  • 13. - Relação com o Absoluto: a arte, a religião e a filosofia são as instâncias da manifestação do Absoluto; na arte a intuição, na religião a representação, na filosofia o conceito. É pela filosofia que o Absoluto se revela como Reconhecimento: A Razão na História é o progressivo Reconhecimento entre as liberdades, o inclui a luta entre senhor e escravo. 3. O Homem Pós-Hegeliano: Com a morte de Hegel, temos a direita e esquerda hegelianas. A esquerda utiliza Hegel para uma crítica social e política, acabando por voltar-se contra o próprio Hegel: Feuerbach e Marx principalmente. Feurbach critica sobretudo o Espírito Subjetivo de Hegel; Marx, o Espírito objetivo. Em Feuerbach temos um antropocentrismo radical: o mundo do homem é a projeção do homem natural dotado de sensibilidade e sentimento; é uma visão materialista do homem, o homem como ser- sensível. Trata-se de uma desmitologização da teologia: a idéia de Deus é apenas uma projeção da infinitude do homem; o homem é o único deus para o homem; a religião é a projeção da própria essência do homem, que deve assumir-se diante de si. O Homem define-se por suas carências e, ao relacionar-se com o mundo objetivo, é um ser genérico, aberto à relação com os outros. A relação essencial é Eu-Tu, o fundamento da ‘religião do homem’. Marx, na antropologia, se apoia significativamente em Feuerbach. A idéiamarxiana de homem aparece mais nos ‘escritos da juventude’(1839-1849) e de modo bastante fragmentário. A sua preocupação maior parece ser com a ação revolucionária, a análise econômica, a política... A concepção marxiana de homem se relaciona com os seguintes tópicos: o homem e a natureza, a natureza humana, as relações sociais, a filosofia da história. O homem tem um fundo de características comum com os animais; sobre esse fundo se destaca a sua especificidade. Homem e animal se definem pelo tipo de realção que os une à natureza, como vivem sua vida. O animal é sua própria vida; o homem precisa produzir a sua. Essa produção vai implicar a consciência-de-si, a linguagem, a fabricação de instrumentos, a cooperação gregária. As duas primeiras seriam exclusivas do homem e modelariam as outras. A questão da natureza humana está intimamente ligada à questão das necessidades humanas; estas são necessidades pluriformes: biológicas, psicossociais e culturais, sendo o fundamento de um desejo; a plena satisfação dessas necessidades, só numa sociedade comunista. junto com a questão das necessidades e da satisfação está o problema da alienação, espiritual e social. Espiritual: deficiência de ser por não alcançar a auto-realização; é a coisificação: haveria a possibilidade concreta dessa satisfação, mas ela não ocorre. Social: é o domínio do produto sobre o produtor. O homem como ser social tece a dialética entre necessidade e satisfação pelo Trabalho e na relação com os outros na sociedade. A situação histórica do nível da alienação se mede pela dialética entre forças produtivas e relações de produção. No capitalismo a inadequação é expressa pelo fenômeno da fetichização das relações sociais que aparecem como propriedades naturais das coisas. A alienação é um processo histórico, com seu auge no modo capitalista de produção, desdobrando-se em profunda alienação espiritual: econômica, política, cultural, religiosa(da primeira procedem as outras). O homem alienado produz entidades como se fossem reais(nas relações sociais) e imaginárias(religião) que adquirem existência independente e dominam seus produtores. A compreensão marxiana do homem se liga a uma filosofia da história. A história se divide em épocas relacionadas dialeticamente; é o modo de produção dominante que distingue as quatro épocas: modo asiático de produção, escravismo antigo, feudalismo, capitalismo moderno, que gera necessariamente o socialismo como transição para o comunismo. A história tem uma face escatológica: o fim necessário da história é o advento da sociedade sem classes; com isto, Marx estaria saindo do âmbito daquilo que a razão pode garantir e se adentrando na trilha do mito. 4. Ciências Humanas - Filosofia - Século XIX: No século XIX temos um rápido desenvolvimento das ciências humanas: da vida, da cultura, da sociedade, do psiquismo, da economia; essas ciências incidirão fortemente na reflexão antropológica. O espírito científico dessa época foi marcado pela idéia de Evolução, seguindo a esteira de Darwin. É nessa época que predomina o positivismo, que tenta compreender o âmbito humano segundo o modelo determinista-empírico das ciências naturais. É só nos lembrarmos da ‘física social’.
  • 14. A análise da sociedade tem primazia sobre o indivíduo. Spencer e Durkheim dão continuidade e Wundt leva adiante a psicologia experimental. 5. Origens da Antrop. Filosófica Contemporânea: Fundamentalmente, Kierkegaard e Nietzsche são os refenciais da AF contemporânea. Kierkegaard, o pensador protestante solitário legou vários conceitos que se tornaram referenciais, como é o caso de sua noção de ‘Existência’ ou indivíduo, irredutível ao sistema(contra Hegel). Em Nietzsche temos uma crítica radical à cultura ocidental e a proposição de uma nova visão da vida humana. Há nele três questões fundamentais: * o que foi o homem: sua aparição e sua aparição da natureza e da vida; * o que o homem não é, desdecque atingido pela doença da cultura e pelo ressentimento ou vingança contra a vida e o devir; * o que o homem pode e deve ser: o homem em transição para o super-homem. No plano metafísico, a idéia de homem se liga à Vontade de Poder e ao Eterno Retorno do Mesmo. No plano da cultura, o tema do homem se liga ao Niilismo, como diagnose da cultura ocidental, à genealogia da moral com a explicitação dos contravalores que estão em oposição à vida e com o anúncio do super-homem. O homem nietzscheano está em oposição ao zôonlogikón e ao imago Dei, rejeitando o conceito de alma espiritual. O Corpo é uma unidade superior, a totalidade do indivíduo inserido no eterno retorno(posição imanentista). As influências desse pensamento são enormes: em Bergson(filosofia da Vida), em M. Scheler(fenomenologia afetiva), em Gehlen(biologicismo) e assim por diante. 6. Modelos da Antrop. Fil. Contemporânea: Há diferentes modelos que servem de referente na composição da imagem do homem contemporâneo. a. Antropologia Existencial: a categoria central é a de ‘existência’. Em Kierkegaard, trata-se da existência cristã que manifesta a singularidade irredutível do indivíduo à explicação lógica, ao lançar sua liberdade no salto absurdo da fé. O principal herdeiro seria Karl Jaspers: este fala da situação- limite na qual a existência humana é lançada, devendo dar conta de sua existência. Heidegger também se situa nessa perpectiva, ao mesmo tempo que procura cavar no solo ontológico. O mais conhecido é Sartre: o homem vive a tensão entre o Em Si e o Para Si, tendo a tarefa de conseguir um em-si; o homem aparece como ser de projeto, ele é o seu próprio projeto. b. Antropologia Personalista: É por essa vertende que a categoria de Pessoa tornou-se central no discurso contemporâneo sobre o homem. A característica comum do personalismo cristão é a afirmação do Deus pessoal transcendente como paradigma e fim último da pessoa; os principais representantes são J. Maritain e E. Mounier. Há uma retomada do pensamento de Tomás e Agostinho. c. Antropologias Materialistas: no geral, tais concepções se caracterizam pelo uso do procedimento metodológico reducionista ou aquele que, ao interpretar o homem, prioriza o pólo da Natureza. Os fatores naturais teriam privilégio diante dos culturais e simbólicos como princípios explicativos(causantes ou condicionantes) na interpretação do homem. No geral, filiam-se ao ‘homem produtor’ da concepção de Marx(homo faber). Destaque para Ernst Bloch. Essas antropologias tomam como referência epistemológica uma certa ciência que passa a ser normativa; geralmente são enfatizadas as ciências das origens, a biologia humana, psicologias, língüística, etnologia e sobretudo as teorias da evolução. Estas também inspiraram antropologias espiritualistas, como a de Berson e T. de Chardin. 7. O Ser Pluriversal Atual: As diversas antropologias apontadas neste percurso têm como pressuposto o ‘homem como ser Universal, reflexo ou receptáculo intencional de toda a realidade. Na cultura clássica, o homem é o microcosmo dentro do macrocosmos, refletindo a este. Na modernidade, a universalidade do Cogito, o a priori de Kant, o Espírito hegeliano, o ser genérico de Feuerbach e assim por diante. As antropologias atuais preferem reconhecer a pluridimensionalidade do homem, dos sentidos que a
  • 15. experiência em seu ser revela ao homem. O ponto de partida é sempre uma perspectiva tida como privilegiada epor ela tentam construir um discurso englobante sobre a totalidade da experiência humana; e daí uma pluralidade de discursos sobre a totalidade humana. Segundo Vaz, aí se insere o pensamento de P. Ricoeur e André Jacob. 8. Alguns Problemas Atuais: Lima Vaz, na esteira de G. Reale,aponta alguns problemas dos mais significativos que envolvem o homem do nosso tempo, como problemas que exigem soluções e remédios. Segundo esses autores, a linha que une os passos desorientados dos homens de hoje é identificada como sendo o Niilismo, a atitude niilista que se estende, como premissa ou conseqüência, a todos os quadrantes da cultura contemporânea; para onde quer que volvamos nosso olhar encontramos uma das faces do niilismo. e daí a questão: o que seria uma sociedade do futuro construída sobre o vazio espiritual de valores e fins?(recomendam a leitura da obra de A. Huxley ‘Brave New World’ e a de G. Orwell ‘1984’). Nietzsche teria sido o profeta, o antecipador, o teórico da idade do niilismo: ‘O que narro é a história dos próximos dois séculos. Descrevo o que acontecerá... o advento do niilismo’(Fragmentos Póstumos). ‘niilismo: ausência de fim; ausência de resposta ao por quê? O que é o niilismo? A desvalorização dos valores supremos’: Deus, a verdade, o ser, o bem, o fim último. O niilismo seria ativo ou passivo. Ativo: força destrutiva dos valores nos quais até agora se acreditou; passivo: exaustão da força do espírito que v^dissolverem-se sem remédio os valores fundamentais da vida. E quando for abolido totalmente o supra-sensível, segundo Nietzsche, terá lugar o niilismo completo. Aí: ‘Deus está morto’. Estaríamos ainda num niilismo incompleto dominando o nosso tempo. Os autores dizem que as faces do niilismo incompleto seriam mais exatamente máscaras, pois seriam disfarces de valores perdidos, que a frágil memória histórica de uma cultura indiferente à tradição não consegue recuperar e mesmo identificar. Vejamos algumas dessas faces: 1. O Cientismo e a redefinição da razão humana em termos de eficácia tecnológica. O valor perdido seria aconcepção analógica da razão, faculdade do ser. 2. O Ideologismo e o esquecimento da verdade. A ideologia racionaliza os interesses particulares e está a serviço do poder enquanto instrumento eficaza ser utilizado, encobrindo o QUE É com um véu. O valor obscurecido é a verdade, aquilo que é patente à luz da razão, inclusive o interesse particular. 3. O praxismo e o produtivismo tecnológico. O fazer e o produzir são absolutizados em detrimento do agir e do contemplar. Daí o declínio da Moral e da Política, o seu mascaramento no hedonismo, utilitarismo e maquiavelismo de um lado e, de outro, na desligitimação do lazer contemplativo porque não teria utilidade social. Para o indivíduo o que importa é o que fazer e não o que Ser. Perdeu-se a consciência moral, a virtude e a contemplação geradora de ser. 4. O bem-estar material como substitutivo da felicidade. A equação mais usada éconsumo=felicidade. De modo que alguns sempre serão mais ‘felizes’, conseqüência direta do fazer, produzir, possuir. Perdeu-se a eudaimonia, obscureceu-se a justa medida e a hierarquia dos bens. 5. A inundação da violência. Segundo o próprio Nietzsche, o niilismo não apenas contempla o vazio das coisas e não é apenas a convicção de que tudo deva ser destruído: é um pôr mãos à obra e tudo destruir. Matar os seus semelhantes tornou-se para tantos o rito de passagemcapaz de marcar uma vida vazia e sem sentido(os jovens e o índio em Brasília). Habitantes do nada concluem com uma lógica irrefutável que a vida humana não vale nada. Lei do mais forte, complexo de Caim são norma e atitude indiscutíveis para a era do vazio. Perdeu-se o valor do outro, da justiça, o respeito pelo ser humano. 6. A perda do sentido da forma. Nietzsche recusava-se a buscar a felidade na contemplação da beleza, mesmo tendo suas raízes nela, pois segundo ele não é à felicidade que estamos destinados e sim à afirmação da vida na vontade de poder. Ele era um cultor do belo. Hoje, podemos ainda falar de uma função educadora da arte se na sua maior expressividade ela não nos eleva acima da banalidade do cotidiano? Segundo os autores, a arte tem prezado o in-forme e o de-forme. Perdeu-se o poder da arte de comunicação entre os seres, pela contemplação do ser expresso. 7. O esquecimento do amor. O niilismo existencialque mais adultera o humano resulta da identificação do amor com a atividade sexual. Vivemos numa ‘civilização afrodisíaca’(cf.Bergson). O afrodisismo desvairado e violento passou a ser a face mais agressiva de uma orgulhosa ‘civilização tecnológica’.
  • 16. Perdeu-se o Eros como a busca de alguma plenitude, como intermediário entre, Eros decaiu, foi condenado a abandonar-se ao mau infinito do desejo nunca satisfeito. 8. O individualismo nos limites do excesso. Este é um dos traços mais inconfundíveis do homem que vive no niilismo. Há os que buscam compreender o homem firmados sobre o individualismo e caem em contradição pela fragilidade da própria premissa e sua decorrência do niilismo. Matou-se, exclui-se de novo o outro, a comunidade, as utopias, os projetos comuns, a ética, a pessoa. 9. Perda do sentido do fim. Segundo Nietzsche, a lógica do niilismo deve levar à abolição de todo tipo de causa final, de toda representação de um universo ordenado. O niilista deve viver num mundo caótico. Perdeu-se a noção de sentido, do sensato, mesmos que estejamos referidos a ele prá percebermos que não há sentido. 10. Materialismo e esquecimento do ser. É um dos termos mais usados e suporta muitos sentidos. O niilismo exige o sepultamento de instâncias supra-sensíveis e sua face se mostra como exigência de materialismo. É o reino da imanência absoluta, do determinismo totalizante. Perdeu-se a liberdade, matou-se a esperança, matou-se o poder de transcender do homem, morrerá também o super-homem: no eterno retorno do mesmo(portanto também do niilismo) ou em algum tipo de lógica da Necessidade. Eis a sabedoria do tempo. II. OBJETO E MÉTODO DA ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA Da história que vimos, a concepção do homem atual integra traços, fundamentalmente, da tradição clássica e bíblico-cristã. Sinteticamente, o homem como portador de uma razão universal e dotado de liberdade de escolha, que fundamentam a Ética e a Metafísica. A Antropologia está entre as duas, interligando razão teórica e razão prática. “Hoje essa idéia do homem perdeu de modo aparentemente definitivo a sua unidade” . Problema: como recuperar uma certaidéia unitária do homem? Esta é uma das tarefas fundamentais, difíceis e atuais da Reflexão Antropológica. Para isto precisa definir com rigor o seu próprio método. Atualmente temos várias tentativas de definir tal método, seguindo diferentes inspirações epistemológicas, utilizando uma certa ciência como paradigmática: - método empírico-formal: sob o paradigma das ciências da natureza; - método dialético: sob o paradigma das ciências históricas; - método fenomenológico: sob o paradigma das ciências do psiquismo; - método hermenêutico: sob o paradigma das ciências da cultura; - método ontológico: sob o paradigma da ontologia clássica. ‘O discurso filosófico sobre o homem está sujeito ao risco permanente do reducionismo, na medida em que um dos pólos epistemológicos fundamentais que definem o espaço da compreensão do homem passa a imprimir uma direção privilegiada na ordem do discurso... esses polos são a Natureza, o Sujeito e a Forma...’. A Antropologia deve coordenar esses três polos de forma equilibrada. Ora, se o ‘objeto’ em questão é o homem, que também é sujeito, então precisamos levar em conta a compreensão espontânea e natural que o homem tem de si mesmo e pela qual ele faz uma imagem de si mesmo, segundo a tradiçãi cultural, com o estilo de vida por ele adotado, com os símbolos do seu grupo humano, muitas vezes não codificados explicitamente. Trata-se da pré- compreensão de si, anterior à compreensão fornecida pelas ciências humanas ou outros sistemas de conhecimento formalizado(filosofias, teologias...). A pré-compreensão se enraíza no ‘mundo da vida’(Lebenswelt - Husserl), com sua historicidade. Com isto aparecem três níveis de conhecimento do homem que a AF deve levar em conta em seu procedimento metódico para chegar a uma organização sistemática: * nível da pré-compreensão: aí está a imagem espontânea do homem, formada a partir da experiência natural da vida, expressa em representações, símbolos, crenças, etc; * nível da compreensão explicativa: aí se situam as ciências humanas, com seus métodos e resultados; * nível da compreensão filosófica ou transcendental: aí entra a busca das condições de possibilidade da pré-compreensão e da compreensão explicativa. Trata-se da tematização da experiência ‘original’que o homem faz de si mesmo ‘como ser capaz de dar razão do seu próprio ser, ou seja, capaz de formular uma resposta à pergunta: “o que é o homem?”’, expressa em categorias filosóficas. Tais categorias devem ter um conteúdo preciso e ser articuladas num discurso sistemático.
  • 17. 1. Categorias Antropológicas e seu Sistema: Na compreensão filosófica do homem Sujeito e objeto se entrecruzam(diferença do olhar da ciência, distânciamento) epistemologicamente pois o que é tematizado e ‘objetivado’ é justamente o conteúdo ontológico no qual está a resposta à pergunta sobre a possibilidade radical do Sujeito como Sujeito. Tal compreensão não é uma compreensão sobre o sujeito, mas do Sujeito, enquanto se conhece e se auto-compreende como Sujeito, que procura dar razão de si mesmo, o que o distingue dos doutros seres. A compreensão filosófica sistemática precisa exprimir a nível conceptual-filosófico o processo real e abrangente do auto-constituir-se como Ser-Homem do Sujeito. Nesse sentido o filósofo seria o intérprete da humanidade. 2. As Dimensões da Experiência Antropológica: A Antropologia Filosófica não busca o ser do homem como subjetividade abstrata do Eu Penso, alcançada pela suspensão entre parênteses do mundo-da-vida. Trata-se de buscar o homem na sua ‘experiência situada’, na sua finitude. As dimensões da experiência filosófica são as dimensões da situação humana. A experiência humana é uma interpenetração de presenças: o homem é uma presença-no mundo, um ser-com-os-outros, uma presença-a-si-mesmo. Natureza, Sociedade , EU constituem o espaço fundamental da experiência antropológica; mas o homem tem também a experiência de poder abrir-se ao Transcendente, como Presença ou como Ausência, diante do que o discurso filosófico experimenta sua limitação. 3. Itinerário Metodológico da AF: O itinerário proposto retoma Aristóteles e sua análise dos momentos do saber: do objeto, do conceito e do discurso, isto é, o que é dado empiricamente, sua expressão noética(intencional) e sua articulação discursiva. * Momento do Objeto: o homem-Objeto e o homem-Sujeito, sujeito produtor de saber sobre si mesmo, permanecendo sujeito ao objetivar-se pelo saber. É ao nível da compreensão filosófica que o sujeito é tematizado como sujeito e nela são integradas a pré-compreensão e a compreensão explicativa. * Momento do Conceito:a compreensão filosófica exprime o Objeto-Sujeito como Ser, na sua inteligibilidade e na concretude do homem, aproveitando a contribuição das duas outras formas de compreensão: uma praticamente empírica, a outra praticamente abstrata; aqui trata-se da concretude de Ser). * Momento do Discurso: as categorias que exprimem o Sujeito devem ser articuladas de modo a manifestar o movimento ‘lógico’ da constituição do sujeito Enquanto sujeito, movimento que traduz a experiência antropológica original. É uma articulação dialética na qual as categorias são suprassumidas em níveis sempre mais profundos de integração da unidade do sujeito, até atingir o sujeito enquanto Totalidade, que Vaz chama o ‘nível da pessoa’. 4. Estrutura do Sujeito na AF: ‘Desde o plano da pré-compreensão, o homem manifesta-se concretamente como movimento dialético de passagem do dado à expressão ou da Natureza à Forma: movimento no qual o momento mediador é, justamente, o homem como sujeito’(pp. 163). O sujeito estácomo mediação entre a pré- compreensão e a compreensão filosófica, procurando a lógica dialética do seu ser(eu sinto, eu desejo, eu penso, eu quero...). O Eu do sujeito não é uma forma estáticanem fechada em si mesma, mas sofre e executa em si mesmo um movimento de suprassunção do mundo das coisas no mundo do Sentido. A AF percorre as formas desse movimento no sujeito ao nível transcendental e as ordena no discurso respondendo à pergunta sobre o ser do homem. O discurso filosófico é fundamental para distinguir os três níveis de mediação da constituição do sujeito: * Mediação empírica: âmbito da experiência natural, do mundo-da-vida, da pré-compreensão expressa na linguagem ordinária onde aparece o pronome EU.
  • 18. * Mediação abstrata: âmbito da compreensão explicativa, resultado de procedimentos operatórios da observação metódica e da experimentação; os conceitos e o discurso da Ciência obedecem a regras formais próprias de constituição; o sujeito da mediação abstrata é o sujeito metodologicamente abstrato que está presente no conhecimento científico. * Mediação transcendental: âmbito da compreensão filosófica, da objetivização do sujeito enquanto sujeito(a sua manifestação como sujeito e sua experiência de sujeito). Isto é articulado nesta mediação com categorias próprias, como veremos adiante. Aqui o sujeito é visto na sua subjetividade absoluta, irredutível à Natureza e Sociedade, como consciência do mundo, do outro, de si e procurando dar ‘razão de’. É p âmbito da AF. 5. Estrutura da Conceptualização Filosófica: A constituição das categorias da AF é um processo com alguns passos: - o primeiro é o da determinação do objeto: ‘o que é’. Na AF o objeto é o próprio ser do homem; faz- se mister levar em conta a história do desenvolvimento das diferentes abordagens e a problemática atual, bem como o saber científico atual sobre o homem(é o momento aporético: aporética histórica e aporética crítica, i.é, rememoração e atualidade). - o segundo é da elaboração da categoria, cada qual exprimindo um aspecto fundamental do ser do sujeito, por ex., ‘corpo próprio’( a experiência do, Eu sou meu corpo próprio). Pela mediação do Eu transcendental, a aporética é suprassumida no concreto conceptual. - o terceiro é o da dialética, ou do discurso articulado sobre as categorias. O discurso dialético implica uma relação de oposição e de suprassunção progressiva dos termos, constituindo um discurso ordenado e sistemático na forma de um todo. 6. Linhas Fundamentais da AF.: ‘A Antropologia filosófica vê aberto diante de si todo o imenso campo do saber sobre si mesmo que o homem vem acumulando ao longo de sua história. Ao mesmo tempo esse saber lhe revela toda a complexidade estrutural e dinâmica do fenômeno humano’(pp. 167). A AF deve traçar as linhas ou direções do seu roteiro, acompanhando os esquemas básicos que organizam o saber do homem sobre si mesmo. Essas linhas definem o espaço conceptual onde se inscreve o ser-homem; neste caso, conceitos de Estrutura, Relação, Unidade. - A nível de estrutura, ou níveis ontológicos, distinção entre: estrutura somática(corpo próprio), estrutura psíquica(psiquismo), estrutura espiritual(espírito); - A nível de relação: relação com o mundo(objetividade), com o outro(intersubjetividade), com o Absoluto(transcendência); - A nível da unidade: como unificação(realização), como ser-uno(essência), culminando no conceito de Pessoa. Daí: “O ser que eu-sou não é um conjunto de fenômenos empíricos mas um ser dado a si mesmo, irredutível aos fenômenos da natureza, uma substância espiritual como espírito livre’ - C. Bruaire, L’Être et L’Esprit.