3. O NAVIO QUE NÃO NAVEGA...
Júlia Rodrigues
Em 7 de maio de 2010, ao lado da sucessora que
escolhera e do governador pernambucano Eduardo
Campos, o presidente Lula estrelou no Porto de Suape
um comício convocado para festejar muito mais que o
lançamento de um navio: primeiro a ser construído no
país em 14 anos,
o petroleiro João Cândido
fora promovido a símbolo da ressurreição da indústria
naval brasileira.
4. Produzida pelo Estaleiro Atlântico Sul (EAS), incorporada ao
Programa de Modernização e Expansão de Frota da
Transpetro (Promef) e incluída no ranking das proezas
históricas do PAC, a embarcação com 274 metros de
comprimento e capacidade para carregar até um milhão de
barris de petróleo havia consumido a bolada de R$ 336
milhões – o dobro do valor orçado no mercado
internacional.
5. Destacavam-se na plateia
operários enfeitados com
adesivos que registravam sua
participação no parto de mais
uma façanha do Brasil Maravilha.
Seria uma festa perfeita se o colosso batizado em
homenagem ao marinheiro que liderou em 1910 a
Revolta da Chibata não tivesse colidido com a pressa
dos políticos e a incompetência dos técnicos. Assim
que o comício terminou, o petroleiro foi recolhido ao
estaleiro antes que afundasse e nunca mais tentou─
flutuar na superfície do Atlântico.
6. O vistoso casco do João Cândido camuflava soldas
defeituosas e tubulações que não se encaixavam, além de
um rombo cujas dimensões prenunciavam o desastre
iminente. Se permanecesse mais meia hora no mar, Lula
seria transformado no primeiro presidente a inaugurar um
naufrágio. Estacionado no litoral pernambucano desde o dia
do nascimento, nem por isso o navio deixou de percorrer o
país inteiro. Durante a campanha presidencial,transportado
pela imaginação da candidata Dilma Rousseff, fez escala
em todos os palanques e foi apresentado ao eleitorado
como maisuma realização da supergerente que Lula
inventou.
7. A assessoria de imprensa da Transpetro se limita a
informar que não sabe quando o João Cândido vai
navegar de verdade. O Estaleiro Atlântico Sul,
criado com dinheiro dos pagadores de
impostos, não tem nada a dizer. Nem sobre o
petroleiro avariado nem sobre os outros 21
encomendados pelo governo. No fim de 2011, o
EAS adiou pela terceira vez a entrega do navio. A
Petrobras, que controla a Transpetro, alegou que
os defeitos de fabricação só podem ser
consertados no exterior.
PODE
8. Quando o presidente era Nilo Peçanha, João
Cândido comandou uma rebelião que exigia a
abolição dos castigos físicos impostos aos
marinheiros.
Passados 102 anos, Dilma e
Lula resolveram castigá-lo
moralmente com a associação
de seu nome a outro espanto
da Era da Mediocridade: depois
do trem-bala invisível, o
governo inventou o navio que
não navega.