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UNIVERSIDADE DE BRASILIA
FACULDADE DE PLANALTINA
LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO
INSTITUTO TÉCNICO DE CAPACITAÇÃO E PESQUISA DA
REFORMA AGRÁRIA - ITERRA
TURMA PATATIVA DO ASSARÉ
A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL
DE ENSINO MÉDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES.
Ingrid Elisabete Pranke
Nome do orientador: Rafael Litvin Villas Bôas
Brasília-DF, abril de 2010
UNIVERSIDADE DE BRASILIA
FACULDADE DE PLANALTINA
LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO
INSTITUTO TÉCNICO DE CAPACITAÇÃO E PESQUISA DA
REFORMA AGRÁRIA - ITERRA
TURMA PATATIVA DO ASSARÉ
A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA
ESTADUAL DE ENSINO MEDIO JOCELI CORRÊA E SUAS
IMPLICAÇÕES.
Ingrid Elisabete Pranke
Monografia de final de curso submetida à
Faculdade UnB Planaltina, da Universidade
de Brasília, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do Grau de
Licenciado em Educação do Campo, com
habilitação na área de Linguagens.
Orientador: Rafael Litvin Villas Bôas
3
Brasília-DF, abril de 2010
RESUMO
Esta pesquisa foi elaborada a partir de observações, entrevistas e relatos de
educandos e educadores pertencentes a Escola Estadual de Ensino Médio Joceli
Corrêa de assentamento no município de Jóia, RS, com o objetivo de questionar e
diagnosticar a utilização do audiovisual durante as aulas. A maioria dos filmes
com os quais os educadores trabalham pertencem a produção industrial e não
dialogam com a forma com a qual o conteúdo se organiza. Normalmente o que
acontece é que os educadores pedem como trabalho relatórios enfatizando o que o
enredo do filme traz, não questionando de fato o que este trabalha. A pesquisa
tenta relacionar a consequência do uso dos filmes na formação dos educandos,
especialmente a formação estética, ou não dos educandos.
Palavras chave: educandos; audiovisual; filmes; imagem; educadores; indústria
cultural.
4
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................5
Capítulo 1: A vida permeada pelo sistema capitalista........................................................7
1.1 Escola e hegemonia..................................................................................................7
1.2 Escola, racionalidade técnica e indústria cultural...................................................16
1.3 Escola e emancipação x escola e precarização da vida...........................................19
2. Contextualização da realidade pesquisada...............................................................21
2.1 Início do assentamento .........................................................................................21
2.3 Educadores que atuaram e atuam nessa escola.....................................................30
2.4 Educandos que estudam nessa escola....................................................................33
Capítulo 2 – Utilização do audiovisual no contexto da Escola Estadual de Ensino Médio
Joceli Corrêa.....................................................................................................................35
2.1. Utilização do vídeo na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa.................35
Capítulo 3 - Análises de algumas obras trabalhadas na escola Joceli Corrêa...................47
3.1- Análise do filme Anjos e demônios.......................................................................47
3.2 Análise do filme Desafiando Gigantes....................................................................49
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................51
REFERÊNCIAS...................................................................................................................5
0
ANEXOS..............................................................................................................................5
1
5
1 INTRODUÇÃO
A referida pesquisa foi realizada num território de assentamento da
reforma agrária no município de Jóia RS. A localidade foi nomeada de
Assentamento Rondinha. O foco principal da pesquisa foram os sujeitos da Escola
Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa, com educandos e educadores dos anos
finais do ensino fundamental e ensino médio.
O fato de essa escola estar localizada dentro de um território de reforma
agrária, com famílias provenientes de um movimento social que é o MST e
consequentemente este continuar atuante foi um dos fatores que estimularam o
desenvolvimento do trabalho a respeito do audiovisual. Ou seja, com a utilização
dos filmes durante as aulas, tanto nos anos iniciais do ensino fundamental, anos
finais e ensino médio. Mesmo com essa atuação (do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra), sendo um contraponto a proposta hegemônica
de sociedade, os filmes utilizados constantemente e para diversas ocasiões, tanto
em aulas como em finalizações de trabalhos como, por exemplo, a Semana Paulo
Freire que acontece todos os anos na escola no mês de maio, são na sua maioria
filmes em que a forma apresentada é a mesma dos padrões estadunidense de
produção e, a maneira com a qual este sempre foi trabalhado na escola não se
traduzia diferente do que o todo do contexto escolar trabalha. Mesmo que a
história dessas pessoas tenha sido de lutas reais, tanto no período de acampados
como no período de assentamento, a forma importada de produção do audiovisual
é empregada na escola sem aprofundamentos.
Inicialmente foram realizadas observações das aulas, conversas informais
com educandos e educadores. Foi diagnosticado o descontentamento de parte dos
educandos em relação a quantidade de filmes que os educadores utilizavam,
algumas vezes no mesmo dia foram passados dois filmes, ou seja, o período todo
de quatro horas era preenchido com filmes (constatado através de entrevistas). A
maioria dos entrevistados (educandos) citou que pelo menos duas vezes ao mês os
filmes eram utilizados, com maior ênfase nas disciplinas de português, história,
espanhol, geografia. Importante também foi o fato de observar nos educadores
não determinarem outros trabalhos, como por exemplo, identificar e analisar os
sons, a movimentação das imagens, dos personagens, todo trabalho que há por
trás da produção desse audiovisual, enfim, realmente analisar o todo das obras. O
que se observou é de que provavelmente não tinham essa orientação de trabalho,
ou seja, não foram preparados para analisar e trabalharem com os educandos de
maneira diferente que apenas fazer a interpretação da história do filme que
6
assistiam, responder questões a respeito do assunto assistido ou desenhar sobre o
que assistiam.
A metodologia utilizada para diagnosticar e perceber o que se concretizava
a esse respeito foi de entrevistas com educandos, educadores, funcionários da
escola, observações de como aconteciam os procedimentos quanto ao uso dos
filmes, leitura de relatórios dos educandos, pesquisa nos documentos da escola a
fim de perceber qual o perfil de formação pretendido para os educandos, e a
contradição ou não do trabalho com filmes, ou seja, se existia contradição entre o
trabalho realizado com essa linguagem em relação ao pretendido como formação
para os educandos.
As entrevistas com educandos e educadores serviram para verificar o
quanto os filmes faziam parte da vida escolar e a importância ou não, dos mesmos
no aprendizado e formação da consciência sobre a sociedade da qual fazem parte.
Inicialmente foi realizada uma parte escrita em que são abordados aspectos
dessa realidade como os conceitos discutidos, uma contextualização do local de
pesquisa, dos sujeitos envolvidos nesse processo.
Nos passos seguintes da escrita são mencionadas falas dos sujeitos
pesquisados dentro do contexto, diálogo com o Projeto Político Pedagógico (PPP)
da escola, diálogo com alguns autores como Maria Rita Kehl, Theodor Adorno,
Antonio Candido. Também são acrescidas as percepções que ficaram,
questionamentos, considerações finais.
Vários passos foram dados para que o trabalho pudesse ser concluído,
entre eles a manutenção firme de que este foco era de real importância e daria
algumas pistas sobre o que é desenvolvido na escola, como é desenvolvido e qual
a dimensão que atinge entre os que assistem os filmes. E para além do recorte
local, a pesquisa também é focalizada para o universal, pensando que o local faz
parte do universal e vice-versa.
A hipótese inicial era de que os filmes na Escola Estadual de Ensino
Médio Joceli Corrêa eram passados com muita frequencia e de que os educandos
não conseguiam absorver tudo o que os educadores gostariam. A hipótese foi
comprovada.
7
Capítulo 1: A vida permeada pelo sistema capitalista
1.1 Escola e hegemonia
Questionar o formato escolar no modelo que ainda prevalece na atualidade
pressupõe que levemos em consideração todos os séculos ao qual este está submetido. A
organização deste não corresponde a algo atual, por mais que “enfeitem” os velhos
moldes com a parte física melhorada, por exemplo. Podemos perceber essa questão no
fato, principalmente, da relação professor aluno. Esta se constitui como forma de um
dominar o outro, colocado como regra de sobrevivência dentro desse sistema social que
é o capitalismo. Como cita Luiz Carlos de Freitas:
É preciso notar que a relação professor/aluno foi antagonizada a mando das
relações sociais que acirram esse processo no interior da sala de aula, como
meio de adaptar o aluno a uma forma de poder que é a forma que foi e será
valorizada no âmbito da sociedade capitalista. (2008, pg. 58)
Inicialmente adaptada e vinculada ao rigor da disciplina religiosa a escola
funcionava como uma espécie de continuidade da igreja, ou dos conhecimentos
8
adaptados por ela. A moralidade tratada nos diversos assuntos curriculares ainda
permanece atualmente, principalmente quando educadores tentam corrigir seus
educandos por alguma razão qualquer, uma briga, por exemplo: “isto não está correto”,
“você deve fazer assim”, “não deve bater em seu colega”. A noção do certo e do errado
se coloca como o centro dessa valoração moral. É como se o sentido do pecado
permanecesse nessas correções. A punição “divina” perpassava a escola, a obediência
passava por ela também. A reiteração do moralismo em relação ao que é certo ou
errado, que provém direta ou indiretamente da questão religiosa, ainda continua
acontecendo no meio escolar. Conforme o que o era pregado e ensinado na Idade Média
na escolástica, a moral religiosa era a “pedra fundamental” para todos os ensinamentos,
ou seja, a filosofia, a dialética, a literatura. Todas as formas de ensino passavam por
essas “medidas” da igreja católica que queria manter a dominação através de sua
doutrina.
Mesmo que o domínio da igreja hoje não seja o mesmo de outrora, ainda
permanecem incutidas nas pessoas, essas “sequelas” de forma inconsciente. Podemos
perceber isso nas atitudes diante dos problemas que se apresentam no dia a dia, como por
exemplo, os problemas comportamentais. Palavras como estas: “você não deve bater em
seu colega porque isso é feio, está errado”. Não se procura o verdadeiro motivo por tais
atitudes, tão pouco o questionamento para que a pessoa que cometeu a atitude pense
sobre o que fez. A solução seria resolvida em longo prazo e como estamos na sociedade
capitalista em que o imediatismo para resolução das questões está presente em todos os
aspectos da vida, não poderia deixar de sê-lo também na escola. Esse imediatismo faz
com que procuremos perceber diretamente no ato acontecido e não nas prováveis
convivências anteriores, ou problemas mais sérios de família, por exemplo. A família,
muitas vezes, é encarada como determinante de mais clientela para que a escola funcione.
A escola em questão E.E.E.Médio Joceli Corrêa, por sua vez, funciona como todas as
outras escolas dentro da burocracia que o Estado estabelece. Muitas vezes o que é
tomado como correto, condiz com as mesmas resoluções que dariam aqueles a quem
interessa que a sociedade permaneça dessa forma, ou mais especificamente, a
organização escolar permaneça como está. A parte burocrática está sempre em primeiro
plano (pode-se perceber esse aspecto até mesmo quanto a merenda, que para adquiri-la é
necessário que o responsável (diretor) faça várias tomadas de preço, licitações para então
comprá-la para os educandos), mesmo que não seja esta uma atitude consciente. Ou
melhor, é uma atitude consciente, no entanto, a formalidade em preencher documentos
9
muitas vezes poda o lado humano do trabalho, aquele que realmente daria resultados.
Quanto aos pais, aparentemente, possuem certo encantamento de que a escola será a
ponte entre a melhoria de vida de seus filhos no futuro aceitando de certa forma o que
esta trabalha sem questionamentos mais consistentes. Os pais identificam na escola um
espaço para que esse futuro melhor se concretize. Pode-se perceber isso quando os pais
colocam na escola a responsabilidade daquilo que os filhos precisam aprender para esse
avanço, além disso, depositam na escola e na pessoa do professor a confiança dizendo
que estes poderão até mesmo “puxar as orelhas se for o caso”. De certa maneira há um
condicionamento dos pais em relação à escola, a condição para melhorar de vida está em
passarem pelo processo escolar e nesse processo os professores são aqueles que irão dar
esta contribuição, ou até mesmo serem a ‘salvação’ de seus filhos. Esse condicionamento
está vinculado ao próprio valor que o sistema capitalista propõe a todos para discussões
sobre valores, ou discussões sobre determinados temas estudados. Como referencia
Eugenio Bucci e Maria Rita Kehl, de que a imagem se tornou para os seres humanos da
atualidade algo imprescindível, uma idolatria infinita daquilo que podemos chamar de
sedução ilimitada, em qualquer ponto que olhamos lá está ela pronta para alvejar quem
estiver pela frente.
(...) Vivemos uma era em que tudo concorre com a imagem, para a
visibilidade e para a composição de sentidos no plano do olhar. É nessa
perspectiva que falamos em videologia, ou seja, na perspectiva de que a
comunicação e mesmo a linguagem passam a necessitar do suporte das
imagens num grau que não se registrou em outro momento histórico. Os
mitos, hoje, são mitos olhados. (...) (Kehl, 200, pg. 16)
Quem estiver de acordo ou não com as situações impostas pelos meios
televisivos, está sujeito à banalização do que estes oferecem. Todos teriam direito a todas
as obras elaboradas até então, seja por meio da música, por meio do teatro, por meio da
linguagem visual. No entanto, o que é oferecido as classes menos privilegiadas em
termos de cultura, é o que a indústria cultural define como padrões a serem consumidos e
consequentemente o lucro revertido para aqueles que têm oportunidades de comprar para
si a cultura elaborada e negada a classe trabalhadora, por exemplo.1
Mesmo que outras
1
Não se pode negar que a cultura existe em qualquer situação que nos deparemos, até mesmo nas
escolas de samba ela se manifesta, no entanto, fica claro que a produção industrial não se deteve
somente as necessidades humanas em termos físicos, e sim, em termos de emoção, se sentimentos. Ela
não se contentou em ficar em um âmbito apenas, mas tomar parte do todo da vida.
10
elaborações existam, e existem, não fazem parte da veiculação por meio de propagandas.
Se as pessoas tivessem outras opções, mesmo seduzidas pela redundância dos sons, das
imagens que a indústria enfatiza, teriam escolhas, questionariam mais. Veiculando mais,
o lucro com a venda da imagem construída do herói e do bandido não teria o mesmo
efeito.
A estrutura escolar tomando-a como instituição, como todas as outras esferas da
sociedade está envolta do domínio econômico. O domínio religioso cedeu lugar ao
domínio econômico. Marx já previu isso nas teses de Feuerbach. A educação como um
todo não está livre do que os alicerces econômicos estabelecem. Por mais que a formação
de hoje não seja para mão de obra como foi para as antigas fábricas, o ensino continua
obedecendo a aspectos que direcionam a qualificação de mão de obra para futuros
empreendimentos, ou seja, para o que a economia ditar. Antes mesmo da necessidade
dessa mão de obra existir já são induzidos para essa formação. Esta já começa nos
primeiros anos, na alfabetização.
A economia estabelece os parâmetros para que o poder se instaure em diversos
setores, tornando possível dessa forma que estabeleça conexões entre todos eles. A lógica
da mercadoria é o “material” que conduz a essa apropriação do poder. Tudo o que é
rentável se torna mais rentável, e o que não é um dia será. Lembrando da discussão de
Marx quanto ao valor de troca e o valor de uso. Enquanto o valor de uso prevaleceu não
havia um equivalente que fosse trocado e sim como diz o próprio nome era o valor do
útil para determinados fins. Quando o valor de uso começou a ser dissipado e o valor de
troca tornou-se a principal fonte de organização um equivalente de troca, que hoje é o
dinheiro, entra a lógica da mercadoria que corresponde resumidamente naquilo que
presenciamos hoje: todos os bens transformados em algo vendável, trocados por um
valor equivalente que não é o valor de uso. O discernimento entre o que precisamos para
viver e o que é supérfluo deixou de existir. Aparentemente tudo é necessário, até mesmo
o que não usamos. O desejo do consumo tomou proporções assustadoras e sem limites de
intromissão na vida dos sujeitos. Como Guy Debord define:
A primeira fase da dominação da economia sobre a vida social
levou, na definição de toda a realização humana, a uma evidente degradação
do ser em ter. A fase presente da ocupação total da vida social em busca da
11
acumulação de resultados econômicos conduz a uma busca generalizada do
ter e do parecer, de forma que todo o «ter» efetivo perde o seu prestígio
imediato e a sua função última. Assim, toda a realidade individual se tornou
social e diretamente dependente do poderio social obtido. Somente naquilo
que ela não é, lhe é permitido aparecer. (2003, pg. 17).
As imagens entram com força total para que a manutenção desse poder
econômico prevaleça. A venda da imagem, sob qualquer pretexto (alimentos, roupas,
perfumes, pessoas) vale para a economia. A sensibilidade para discernir entre o que se
configura como real, existente, verdadeiro fica debilitada pelo fato de não existirem
opções, poderíamos chamar assim. As opções estão envoltas num emaranhado de
fantasias, de imagens. Talvez essas mesmas imagens, de um mundo ou, futuro melhor
para os filhos, esteja configurada no pensamento dos pais, por essa razão a entrega para a
escola de seus filhos. A venda das imagens, nos meios de comunicação diversos que
existem na atualidade, estimula não só a venda da mercadoria, mas a venda de um sonho.
O sonho de grandeza entra na vida das pessoas como alcançável para todos “só depende
de cada um”. Toda a parafernália que a sociedade se encontra, com meios de exclusão, de
ilusão descarada, não está ao alcance do entendimento da maioria das pessoas. Não se
pode dizer com isso que as pessoas são impossibilitadas por ignorância, ou algo do
gênero, no entanto, o “abrir dos olhos” não é de interesse para quem domina, pois nesse
caso, estariam colocando em jogo seus rendimentos.
No contexto escolar os filmes, em sua maioria, são trabalhados de maneira
alienada de todo procedimento de produção, trabalho envolvido, ideais repassados, e
principalmente o modelo de produção homogênea que passam a ideologia proveniente de
um país que detém o poder econômico e ideológico (Estados Unidos). Se trabalhados
com os estudantes como apenas objetos de entretenimento que conciliam mensagens de
valores, ou em parte alguma motivação para o aprendizado da disciplina estudada,
focando apenas o enredo, a ‘história emocionante, linda’, fica restrita e incapaz de
perceber o domínio instalado nessas imagens, que vão adentrando os pensamentos e
ações repetitivas sem a percepção propriamente delas. O questionamento, a percepção da
linguagem, dos movimentos, das ações e reações, tanto das imagens, quanto daqueles que
as assistem, seria uma atitude própria de quem está preocupado com a formação de
estudantes. Se o significado atribuído a mercadoria e sua imagem não dialogam com a
12
intensidade que esta envolve a vida das pessoas, quando o trabalho com filmes é
desenvolvido, este não entra na profundidade que o tema merece. Trabalhar apenas com
as imagens veiculadas na forma importada e com conteúdos estabelecidos anteriormente
(dentro dessas obras) não contribui para a compreensão do que estas tentam promover.
Como traz Eugênio Bucci e Maria Rita Kehl na introdução de Videologias:
A tirania da mercadoria se exponencia na tirania da imagem da mercadoria.
O capitalismo contemporâneo é um modo de produção de imagens. (...) a
questão é compreender e decifrar os mecanismos pelos quais toda política,
assim como toda religião e toda ciência, toda cultura e toda forma de
representação, convergem para a imagem, como partes do modo de produção
de imagens, e só circulam e só adquirem existência como imagem. (...) (2005,
pg. 23)
No entanto, quem trabalha com filmes na escola não está preparado nesse sentido,
do questionamento e da análise. A não ser que as imagens estejam estreitamente ligadas à
disciplina especificamente, como por exemplo, biologia estudando determinados animais,
plantas, doenças, não está dentro de um questionamento, ainda assim a abordagem fica
restrita ao conteúdo especifico da disciplina e não da relação entre forma e conteúdo. Isso
leva a crer que todos têm muito a aprender em relação a essa linguagem que possui sua
propriedade e não deveria ser considerada apenas com o propósito de justificar a
abordagem de algum conteúdo. Apesar da não formação dos educadores a respeito do
audiovisual para desenvolver os trabalhos em sala de aula, poderia existir a procura por
esse aperfeiçoamento no sentido de ter nessa linguagem algo próprio a ser trabalhado
sem a pretensão de esgotá-la apenas como início de um conteúdo. Daí acreditar que os
filmes são utilizados na maioria das vezes como pretexto para momentos de lazer na
escola, como pretexto para uma produção textual, como pretexto até mesmo de análise.2
Nos cursos de formação de educadores (não generalizando), normalmente os filmes são
encaixados como um recurso a ser utilizado no intuito de desenvolver trabalhos
posteriores, por exemplo, trabalhar sobre determinados temas como as estações do ano.
Pensando nisso, poderíamos afirmar que existe uma explicação para o descompromisso
2
A palavra análise aqui está determinando um momento em que foi presenciado em sala de aula, com
segunda série do ensino médio, em que foi sugerida a análise do filme “Anjos e demônios”. A análise
consistia em falar sobre a fumaça que saia da chaminé e saber qual o significado e, referência aos
iluminados da época.
13
quanto a linguagem audiovisual como linguagem específica: os educadores não são
treinados para olhar o filme na sua íntegra.
Remetendo-me a escola pesquisada Joceli Corrêa, chamou-me atenção quando
uma educadora em sua aula manifestou que iriam assistir a um filme e esta pediu que
escrevessem posteriormente uma resenha crítica. Um dos educandos questionou o que
seria uma resenha crítica. Não recebeu a explicação, apenas uma desculpa de que em
outro momento explicaria caso contrário não daria tempo de assistir o filme (é bom
lembrar que o período da maioria das disciplinas é de duas horas). O educando saiu com
dúvidas sobre o que observar no filme para escrever a resenha pedida pela educadora.
Aparentemente aceitou sem maiores problemas, já que em outras disciplinas aconteciam
situações semelhantes.3
Os filmes que são assistidos durante os períodos de aula, algumas vezes fazendo-
se necessário tempo de outra aula, ou negociação com outros educadores para que
concluam a visualização do mesmo, não são comentados no início e na maioria das vezes
nem mesmo no final deles, a não ser sobre o enredo do mesmo (não um roteiro do que
trabalhar depois de ter assistido o filme). Isso é sintoma de um despreparo não
meramente conjuntural, mas de ordem estrutural da escola brasileira. A preparação do
profissional em educação é voltada para que trabalhe bem didaticamente os conteúdos de
cada disciplina. Não é somente uma crítica para esse fato e sim as possibilidades de
alargamento dessa formação poderiam ser considerados. Não se pode condenar, mas
compreender e contribuir. De acordo com a realidade de escola do campo e com aspectos
específicos de tal realidade se observa que não são filmes que estão de acordo com ela.
No entanto, considerar apenas ela como aspecto fundamental para desenvolver o estudo,
não é o único material ou aspecto para a compreensão de todos os fenômenos que
deveriam ser colocados em pauta. Como defende Freitas a teoria é pressuposto básico
para estudar a realidade da qual os educandos fazem parte. Nesse caso então, a utilização
dos filmes poderia ser considerada um alicerce ou um embasamento para aprofundar
outros assuntos, poderia ser considerado como uma parte teórica. Compreender e analisar
a linguagem do audiovisual com as características estéticas que existem em tal
linguagem, com o aprofundamento que merecem, esta deveria ser tarefa para quem se
3
Não quero dizer com essa afirmação de que todos os educadores procedam da mesma maneira em
relação ao trabalho com os filmes, ou seja, utilizando os filmes de maneira aleatória e rotineira.
14
especializou no assunto, ou pelo menos que saiba o significado, as dissonâncias que esta
revela quando a usamos para determinar apenas o suporte para o salto a outros conteúdos.
Por outro lado justificar o fato de passar os filmes com boa intenção e, sabendo a maioria
dos educadores alheios a esse trabalho, não é argumento forte o suficiente para que este
permaneça com a mesma ênfase durante as aulas, lembrando que quando este é passado
para assistir toma todo tempo do período que normalmente é de duas horas. Percebe-se
nesse fato que não há tempo disponível para discussões posteriores e durante o filme isso
também não acontece.
Quanto aos filmes que assistem os educandos se manifestam de maneira pacífica
(a grande maioria) há aqueles que gostariam de discutir o porquê de passarem tantos
filmes, no entanto não são ouvidos. Outra oportunidade em que os educandos tiveram
essa manifestação de descontentamento foi quando o conjunto de educadores acordou
para que o início das atividades relacionadas com o projeto interdisciplinar do ensino
médio (na ocasião da Copa do Mundo de futebol masculino) seria um filme. Um dos
educandos expressou a seguinte frase: “vai ser uma matação”4
. O que ficou foi uma
indignação por parte da maioria dos educadores e decidiram pelo não trabalho com
filmes por um longo tempo para que se dessem conta de que não era apenas uma
“matação”. A conclusão a que chegaram não foi apenas de se indignar com o comentário
e sim, pelo fato de perceber o quanto os filmes eram banalizados, passados sob qualquer
pretexto e sem preparação e quando um filme foi discutido e verificado se era mesmo
esse o pontapé inicial dos trabalhos, não foi levado em consideração.
Pode-se perceber que nem todos aceitam pacificamente esse método de trabalho,
o que por um lado é bom. Porém, se apenas são compreendidos como questionadores
sem preocupação, e não forem devidamente pesquisados sobre o que os levam a se
manifestarem com disposição sobre o assunto, então, será em vão a revolta.
Pensando nas avaliações externas que dão a entender que seja necessário
desenvolver trabalhos em tempos determinados e sem a preocupação do tempo de cada
sujeito aprender, os conteúdos são ministrados aleatoriamente sem preocupação com a
realidade. Os filmes também entram nesse contexto de relativização do que é importante
aprender, considerando como são trabalhados.
4
O filme que assistiram para o trabalho interdisciplinar foi O poder de um Jovem, no período da copa do
mundo no ano de 2010. Este foi o ponto em comum com as quais todas as disciplinas dariam o pontapé
inicial para os trabalhos sobre a copa, como também, para o desenvolvimento de seus conteúdos.
15
Todos os trabalhos são direcionados para o fato de que os educandos se
dediquem a “apreenderem” os conteúdos trabalhados para participarem de olimpíadas,
de avaliações externas como SAERGS (Sistema de avaliação do rendimento escolar do
Rio Grande do Sul), prova Brasil, avaliações referentes aos projetos de alfabetização
(como, por exemplo, o projeto Alfa e Beto), enfim, são avaliados a todo o momento de
uma maneira ou de outra, o fato é que todos são avaliados. Essas avaliações são
repassadas pelos gestores do Estado e administrados pelos gestores e educadores das
escolas como fundamentação para desenvolver o projeto de acordo com os interesses
daqueles que estão no poder, ou seja, de acordo com a rapidez com que gostariam que
este seja colocado em prática. No entanto, o que se ouve desses projetos, mesmo
considerando a concepção dos educadores, é de que servem para prever o que os
educandos estão realmente aprendendo, não se colocam como continuadores desse
modelo de sociedade que projeta novos dominados. Involuntariamente ou não, aqueles
que trabalham diretamente com os educandos também têm sua parcela de
responsabilidade nessa questão, mesmo que pensem nessa responsabilidade de maneira
inconsciente. O professor por sua vez também é avaliado nessa perspectiva, se o
educando não correspondeu aquilo que estava sendo pedido nas avaliações considera-se
que os ministrantes das aulas são incompetentes. As escolas são colocadas no patamar
de competição já que tem seus nomes num informativo dizendo qual a classificação de
cada uma. A concorrência é brutal e bárbara. O que poderia justificar a reação dos
educadores por escolherem trabalhar de forma descontextualizada, com conteúdos que
não dizem respeito aquele público ou local. (Não quero dizer com isso que devam
somente estudar conteúdos específicos daquela realidade, mas considerar o contexto em
que trabalham).
A padronização dos conteúdos a serem trabalhados (estes serão cobrados nas
avaliações externas já citadas) no decorrer do ano letivo faz com que exista uma espécie
de coerção involuntária, ingênua (ou talvez não tão ingênua assim, ela pode ter sido
pensada com antecedência, por quem organiza os conteúdos e por quem os ministra
posteriormente). Os educandos são submetidos aos conteúdos que não fazem parte do
seu contexto e depois de algum tempo (anualmente) são avaliados com avaliações
externas que são corrigidas por outras pessoas, não aquelas com quem trabalharam.
Pensando no fato de que nestas colocações das escolas há competitividade entre
elas e de certo modo uma desqualificação dos educadores que nelas trabalham, podemos
entender que a avaliação não se restringe somente aos educandos e à “melhoria” do
16
sistema educacional, ou, a preocupação com essa melhoria. Está calcada também como
método de colocar no educador a “culpa” pelo baixo rendimento dos educandos. Pois
desde que a religião foi trocada pela economia, até mesmo da educação se espera
rendimento e não formação de seres humanos na sua integridade. Assim, mesmo que o
Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola esteja calcado na formação integral do ser
humano, esses tipos de avaliações e trabalhos desvirtuam o que é proposto.
Do mesmo modo que as avaliações externas vem organizadas por outras pessoas
sem levar em conta o contexto na qual serão aplicadas, avaliando os mesmos conteúdos
para todos, os filmes com sua forma estética importada, também não situados no
contexto, exprimem uma coerção inconsciente. Aqueles que assistem sofrem um
coerção permanente, sem mesmo perceberem.
1.2 Escola, racionalidade técnica e indústria cultural.
Resumindo o fato dessa maneira aparentemente designa algo simplificado: de
um lado o que a industrialização definiu e de outro os não aprendizados, cegueira
perante a realidade histórica que se apresentava reforço de que seres humanos
expropriados dos meios de produção e da terra, servirem como massa de manobra sem
sentimentos, sem desejos, sem necessidades, sem vida. De outro lado, a técnica sendo
assumida por poucos “capazes” de comandar os meios de produção e adequá-los a suas
exigências de padrão de vida e de poder.
A relação que se estabelece a partir de então, reforça a ideia da desumanização
em razão do “aproveitamento” dos seres humanos para a produção de coisas, de
mercadoria. O trabalho encarado no início como uma necessidade e como algo que
revelava o homem, sua construção, sua completude, agora designado com árdua tarefa
do apenas fazer e não do pensar o que fazer como fazer, por que fazer e para quem
fazer. O ser humano condicionado a realizar sem pensar no que realiza. Essa
relativização do trabalho trouxe a relativização das necessidades da vida. O supérfluo
passou a ser a “real” necessidade, o real passou para segundo plano e o ser, não encontra
a importância que deveria, pois a satisfação se resume ao que se vê, ao belo
17
convencionado. A barbárie instalada pelo sistema capitalista define essa desumanização.
O ser humano não possui as condições necessárias de sobrevivência: alimentação,
vestimenta, moradia, no entanto, prioriza através da necessidade instaurada pela lógica
do consumo, produtos que possivelmente não terá condições de adquirir, ou até faz um
esforço extremo de conseguir o que está a venda para se igualar a todos, mostrar que
está também acompanhando as últimas tendências da moda.
Quanto ao consumo de mercadorias as pessoas se sentem desejosas e culpadas
ao mesmo tempo. O desejo por algo é sempre alimentado pelas propagandas de toda
natureza, sentem-se culpadas antes de realizar o ato do consumo e depois que o
consumiram. A culpa vem pelo produto ser muito caro, pelo fato de ter consumido
muitas calorias, pelo fato de ter de corresponder ao que dita à moda, pelo simples prazer
de consumir. Religião e consumo determinam a mesma natureza de elementos: a culpa e
o prazer estão estreitamente ligados. Como cita Frei Betto no artigo A arte de seduzir:
Estamos todos sob o efeito hipnótico do consumismo. Não importa se o produto
é frágil ou de má qualidade. Seu design nos cativa. Sua publicidade nos faz
acreditar que estamos comprando a oitava maravilha do mundo! E,
ingenuamente, que se trata de um produto durável, mesmo conscientes de que o
capitalismo não se importa com o direito do consumidor, e sim com a margem
de lucro do produtor.(Betto,2011)
Assim como a economia e o consumo estão estreitamente ligados também o
estão o trabalho e a escola, considerando a escola a partir da organização da fábrica. A
necessidade de pessoas para o trabalho organizou o espaço escolar para suprir a
demanda de operários. A formação para esse fim sempre foi maior que a objetividade
declarava. Grandes multidões formadas alienadamente para servir ao capital. No
momento em que estão prontos para o ingresso no mercado de trabalho (pessoas
ingressando no mercado de trabalho sem deixarem de ser mercadoria, pois vendendo
sua força de trabalho que é uma mercadoria, se igualam a própria mercadoria
produzida), esse mercado já não tinha tais necessidades colocando outros empecilhos
para que esta entrada nele se efetivasse, exigindo mais formação, mais qualificação. A
escola em meio a essas exigências tem o papel de continuar o projeto inicial que é
formar mão de obra barata e em grande quantidade, ou seja, sempre produzindo a mais
do que o necessário. O trabalhador por sua vez fica sempre distante do sonho de
18
conseguir se estabelecer como essa mão de obra empregada em razão das exigências
cada vez maiores de qualificação. Esse método de escolha que o sistema possui
desumaniza na medida em que a disputa constante faz com que um ser humano meça
forças com outro constantemente, gerando um desequilíbrio no entendimento do que
realmente é necessidade ter, ou mesmo, não encontrando mais o sentido do ser
significativo nessa sociedade que escraviza um ao outro pelo desejo. O desejo por
qualquer objeto também ocorrendo na transformação da própria pessoa em objeto de
troca. Mesmo que a evolução da tecnologia tenha atingido índices elevados na
atualidade, ainda podemos perceber a procura por “qualificação” para entrar no mercado
de trabalho, ou seja, a escravidão acontece da mesma forma, mas se caracteriza em
outra forma de escravidão e dominação: por meio da “sedução”.
As relações que se estabelecem na sociedade consequentemente se manifestam
na escola ou em outro lugar qualquer basta fazer parte dessa mesma sociedade, não se
caracteriza uma novidade esse aspecto. O estímulo para o consumo exacerbado de
quaisquer produtos, não importando a origem, a utilidade, ou qual a consequência desse
ato para o meio em que vive ou tenta sobreviver.
(...) A violência da sociedade industrial instalou-se nos homens de
uma vez por todas. Os produtos da indústria cultural podem ter a
certeza de que até mesmo distraídos vão consumi-lo alertamente. Cada
qual é um modelo da gigantesca maquinaria econômica que, desde o
início, não dá folga a ninguém, tanto no trabalho quanto no descanso,
que tanto se assemelha ao trabalho(...) (Adorno, 1940 pg. 119)
A imagem está acima de todo o “bem” e de todo “mal”. O mundo atual se
resume na imagem. Qualquer natureza de produtos, incluindo o ser humano, tem na
imagem sua grande revelação. Juntamente com os produtos, que podemos considerar
produtos de fato, como um calçado, um perfume, uma jóia, uma roupa, está determinado
pelo modelo atual de barbárie, que à venda também está aquele ou aquela que utiliza
tais produtos, colocando-se a venda a imagem, o corpo que se estabelece através da
imagem ou, o corpo “perfeito” representado naquela imagem.
...o processo de esteticização da barbárie elevou, para uma escala
muito maior, a naturalização da violência cotidiana, sendo veiculado
cotidianamente por diversas mídias, de forma recorrente, de maneira que
19
esses valores são introjetados profundamente e servem mesmo a produção de
determinadas formas de subjetividade que não só não se espantam mais com
a violência como também já a aplaudem e a elogiam.... ( Campos e Lobo,
20..p. 201)
Estamos permeados, em todos os sentidos, pela organização estabelecida nessa
sociedade, capitalista até o último grau de compreensão. Estamos dentro dessa
sociedade, parte dela, sugados por ela. Questionar essa realidade e não cair no engodo
de defendê-la, mesmo que involuntariamente, seria o papel do educador. Para sair desse
mergulho capitalista se faz necessário uma dose elevada de entendimento do que
significa o “ser histórico”, o ser real, organizado, ativo (sem considerar aqui ativo
aquele que faz sem pensar), participante, emancipado, que interage, defende a vida.
Caso agissem sempre com a disposição de quem almeja de fato contribuir na formação
de sujeitos, os sujeitos seriam formados, bastaria que a metodologia de Paulo Freire
fosse compreendida e vivida: que propõem um educador mediador do conhecimento e
não um ditador do ensinamento, dono da verdade.
A escola poderia ser a estrutura capaz de formar o ser humano não apenas
cognitivamente, formá-lo como sujeito capaz de intervir no sistema tentando modificá-
lo nas
suas bases. Mas como a escola é apenas um apêndice do que existe por trás dela como
fazer para que a formação atinja o grau de compreensão que desejamos que cada ser
humano tenha de acordo com o entorno em que vive? Em que aspecto acreditar
primeiro, quais as possíveis “armas” para essa organização que se mantém há séculos
evoluir, e não evoluir apenas no sentido pejorativo da palavra, entendendo evolução
como progresso, mas como avanço, superação do velho, construção do novo.
1.3 Escola e emancipação x escola e precarização da vida
A base da escola não pode ser compreendida em termos físicos e educandos
como a clientela atendida por ela. A base são os educandos, mesmo que na maioria das
vezes estes sejam os últimos a serem motivos de preocupação. Temos que trabalhar com
20
a base da escola para que exista possibilidade de transformação da organização vigente
(organização escolar) e, por conseguinte a emancipação dos sujeitos que dela
participam. Iniciar essa emancipação pressupõe que tenhamos compreensão do que
significa esse termo. Para que os sujeitos se formem como sujeitos emancipados se faz
necessário não reduzi-lo. Emancipação não se realiza num período curto de tempo e sim
processualmente como consta nos documentos da escola, por exemplo, sobre a
avaliação: que será processual, que o acompanhamento será assíduo, constante, mas que
concretamente não se realiza nesses termos. Como consta no PPP da escola:
A avaliação será compreendida como processo de construção, cumulativo,
constante, investigativo, de acompanhamento da aprendizagem do/a
educando/a.A avaliação, por ser um processo contínuo e cumulativo, é
compreendida, numa perspectiva mediadora, como a análise do
desenvolvimento do processo educativo de cada educando/a, assim,
acompanha-se diariamente o desenvolvimento de cada um/a, nas mais
variadas situações de aprendizagem, visando compreender as hipóteses que
este/esta vem formulando a respeito de determinados assuntos e nas
diferentes áreas do conhecimento. (PPP, 2006 pg. 12)
As interpretações e compreensões a esse respeito poderiam ser inúmeras.
Poderíamos começar pelo fato de que a escola não está distante da burocracia, que
precisa ensinar certos conteúdos e nesse caso fica limitada no sentido de proporcionar
momentos de reflexão e entendimento sobre determinados fatos e ações. Poderíamos
questionar então qual o papel do filme nesse contexto da burocracia escolar que não se
restringe a esse contexto, pois, em todas as escolas este existe como recurso. Assim
como na avaliação, que não acontece na forma de acompanhamento do que os
educandos realmente estão compreendendo e aprendendo, os filmes são fonte de
disseminar o que já existe pronto e assim alienar aqueles que assistem de todo o
processo de produção.
Entre o que está escrito/descrito nos documentos e a realização do que está
conferido neles existe certa distância. A escola pesquisada não se dedica diretamente ao
educando preocupada com o crescimento intelectual e a formação humana integral
(mesmo considerando os projetos que estão desenvolvendo, como a exemplo do
interdisciplinar no ensino médio). A crítica a não preocupação com os educandos não
está relacionada a um educador em especifico, mas sim aos educadores enquanto classe
de trabalhadores. A falta de condições adequadas de trabalho em que se encontram esses
profissionais da educação faz com que seu trabalho não tenha a mesma proporção que
21
poderia ter. A dedicação ao educando não se estabelece, ou seja, como citou e trabalhou
Freitas: “a última preocupação que a escola considera são os educandos”. Essa não é
uma crítica exclusiva dessa escola, bem conhecemos que a realidade da educação
brasileira carece desses pressupostos. Devemos considerar a organização escolar que
inclui professores mal remunerados e por essa razão trabalhando a cada dia mais para
poder manter um padrão de vida digno. Poderíamos até questionar o fato de trabalharem
em mais de uma escola para aumentar a renda e, como gostam de dizer em todos os
relatos que escutamos dos estágios dos educandos da Licenciatura em Educação do
Campo: “vendem produtos da revista da Avon”. No entanto, devemos lembrar que estes
também são frutos dessa educação alienada de formação humana,.Por outro lado não
podemos justificar os erros e as marcas que estes deixam nas crianças, adolescentes e
jovens pautados por essa educação arbitrária. O que nos leva a crer que a maioria das
ações não corresponde às necessidades reais que as crianças apresentam. Ainda assim,
esta é uma boa justificativa. Mesmo que esta classe queira procurar por melhores
aprendizados enquanto professores, continuarem sua formação, esta não está ao alcance
com tamanha facilidade quanto poderia (as facilidades de acesso a formação na
atualidade são maiores do que há alguns anos, mesmo assim, esta somente acontece em
razão da necessidade que o governo exige para permanecerem no cargo de professores e
não necessariamente pelo motivo da procura de aperfeiçoamento e superação das
sequelas que a educação inicial deixou em cada um dos educadores dessas novas
gerações).
2. Contextualização da realidade pesquisada
2.1 Início do assentamento
O Assentamento Rondinha, território do município de Jóia que se localiza na
região noroeste do estado do Rio Grande do Sul, se constituiu a partir de três
realidades diferentes, ou seja, pessoas vindas de três acampamentos, apesar de que a
luta se constituía para a mesma finalidade, com os mesmos objetivos. Os
acampamentos que fizeram parte desse assentamento foram: Não Me Toque, São
22
Miguel das Missões e Lagoa Vermelha (Ao acampamento de Não Me Toque
juntaram-se pessoas provenientes da região de Bagé). Algumas dessas pessoas já
estavam acampadas há mais tempo que outras o que possibilitou que estas fossem
assentadas em primeiro lugar. Os que se reuniram era parte da luta pela terra
juntamente com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, dessa forma
como já foi citado tinham os mesmos objetivos. Anteriormente a essa luta por
assentamento não existia concretamente luta do MST considerando essa região
específica. No RS a luta iniciou com o acampamento da fazenda Anoni no ano de
1985. Na realidade, como foi descrito acima, a reunião em acampamentos não se
deu na região de Jóia propriamente e sim em outras regiões como Não Me Toque,
São Miguel das Missões e Lagoa Vermelha. A região de Jóia foi “escolhida” pelo
fato de oferecer territórios disponíveis para reforma agrária. Depois do Assentamento
Rondinha, aconteceram outros assentamentos nos arredores: Assentamento Barroca,
Assentamento Estrela que Brilha, Assentamento 25 de Novembro, também há um
Reassentamento com o nome de 31 de maio que está ligado ao movimento atingido
por barragens (MAB), como também o Reassentamento Novo Amanhecer. Mais
próximo a área urbana de Jóia também se formou outro assentamento: Simon
Bolívar.
O Assentamento Rondinha e outros dos arredores foram conquistados devido
a luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e essa luta no RS
já estava acontecendo desde a década de 80. Na região de Jóia propriamente não
existiam lutas dessa natureza, o território era tomada pelos grandes proprietários de
terra.
No ano de 1995 os trabalhadores acampados realizaram uma ocupação numa
fazenda pertencente à Companhia de Aviação Riograndense (VARIG) que estava
improdutiva e que mantinha oito trabalhadores em sua sede. Na primeira ocupação
foram despejados. Outras tentativas foram realizadas até que finalmente em maio de
1995, o assentamento foi conquistado. A empresa de aviação proprietária inicial
desse território tinha uma dívida com o governo federal o não pagamento do Instituto
de Previdência Social (INSS) e por essa razão a terra foi vendida em troca dessa
dívida.
O assentamento recém iniciado ficou com o nome de Rondinha que já possuía
uma história anterior ao assentamento. Antigamente era a paragem de tropeiros que
passavam por esse local e deixavam seu gado. À noite faziam a ronda, ou seja,
23
faziam a vigia do gado, por isso o local passou a ser denominado de ronda. Mais
tarde passou a ser chamado de Rondinha. Nesse local foram assentadas 232 famílias,
numa área de 4.200 hectares.
O município tem uma área total de 1.240 km² e aproximadamente 8.500
habitantes. Mais da metade dessa população reside no meio rural (76,16%) e o
restante no meio urbano (24,84%).
Nos primeiros anos de assentamento como não havia infraestrutura para que
todos os moradores se alojassem adequadamente foram se instalando conforme a
condição permitia. Nessa primeira etapa existiram grandes dificuldades.
Continuaram na sua maioria morando em barracos de lona preta, os recursos que
vinham inicialmente eram escassos mantendo somente o básico como a alimentação
e algum vestuário. Outro fator importante era o de que as famílias acampadas não
sendo dessa localidade levaram certo tempo para se adaptarem, tanto ao local
propriamente, quanto ao preconceito em relação aos assentados. Um exemplo disso é
o de que quando morria alguém era indicado que esta pessoa fosse enterrada na sua
base (o termo se refere ao local de onde provinham as pessoas, ou seja, local em que
residiam anteriormente ao assentamento) e não no assentamento, não considerando
este local como aquele ao qual pertenciam.
Quanto ao preconceito sofrido pelas famílias no início este estava diretamente
relacionado com o fato de serem sem terra, considerados como vagabundos
arruaceiros, preconceito esse não restrito a esse território. Este também se estendeu
durante os primeiros anos de assentamento e perpassou todos os aspectos da vida das
pessoas, tanto na convivência em festas, na relação comercial, escolar. Não se podia
esperar de uma região como esta em que a centralidade das terras estava nas mãos de
poucos proprietários e que estes por sua vez compreendessem a chegada e
permanência de pessoas provenientes de acampamento e de uma luta por terra, ou
seja, a reação era compreensível olhando sob esse aspecto, não quer dizer aceitável.
Ainda hoje, na atualidade ainda são percebidos comentários desagradáveis em tons
de brincadeira, principalmente quando pessoas do assentamento não estão em
condições de vida mais confortável, de que só poderiam ser dos sem terra. O que
continuam não compreendendo é de que os sem terra continuam fazendo parte da
mesma sociedade e por essa razão sujeitos aos mesmos problemas das demais
pessoas.
24
2.2 Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa
A Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa como é conhecida hoje
passou por vários processos até que sua existência atual se formasse.
Com a luta pela terra, além das lutas por recursos para que a produção
iniciasse e para a infraestrutura se efetivar, aconteceu também à luta por educação,
especificamente nesse caso a educação por escola em termos físicos. Essa luta por
escola aconteceu desde o momento que a necessidade por escola surgiu, a partir do
momento em que as pessoas vieram para o assentamento, no ano de 1995. As
primeiras providências tomadas foram de mandar os filhos para escolas mais
próximas do município, depois a luta por uma escola dentro do assentamento.
Antes que a escola existisse nesse local, como gostariam os novos munícipes
dessa localidade, os educandos tiveram de se sujeitar ao que estabeleceu o governo
daquele momento, ou seja, precisaram frequentar a escola do município localizada a
oito quilômetros do assentamento, de acordo com a localização de cada família nesse
mesmo assentamento a distância poderia aumentar. Nesse caso as crianças
precisavam de transporte escolar para se deslocar até ela, o que foi fornecido, no
entanto com a precariedade que se conhece no município: ônibus lotado, crianças
mal acomodadas, em dias de chuva a situação piorava em razão da situação das
estradas. Os educandos que frequentavam essa escola que era municipal e de ensino
fundamental incompleto. A escola em que cursavam existe ainda hoje e tem o nome
de uma antiga moradora daquela localidade Leonilda Zardin Nicolleti.
O fato de os educandos seguirem com transporte escolar até as escolas mais
próximas, que não eram tão próximas assim, houve um rendimento maior para o
município se considerarmos que os educandos são uma “fonte de renda”
indispensável. Não tomando mais o transporte para outras escolas, o município ficou
sem esta fonte de renda. Esse fato pode ser observado na dificuldade da implantação
do prédio da escola no assentamento, a demora no início da construção da obra, por
exemplo. A manutenção dos educandos de um local para outro através do transporte
escolar não deixa de ser um método de manutenção do sistema, a vida no campo se
distancia de certo modo, outra realidade que não é a deles entra no seu cotidiano.
25
Não quer dizer que sua realidade não seja permeada pelo meio externo, no entanto, o
deslocamento de um local para outro, além de esgotar os sujeitos fisicamente, esgota
também outras possibilidades que teriam de se arraigarem ao campo recém
conquistado.
No entanto, essa situação inicial teve de ser repensada pelo fato de serem
muitos os educandos de anos iniciais e o prédio em que funcionava a escola não ter
condições de acolher a todos. A prefeitura do município teve uma solução provisória
que foi a de concluir a construção de um prédio de madeira (que foi feito por uma
parte da comunidade do assentamento, para funcionar como igreja e salão de festas):
colocar o piso, construir banheiros, cozinha e colocar as divisórias para que as salas
de aula funcionassem. Porém, esse prédio também não atendia as necessidades dos
educandos em razão de não ter iluminação adequada, não existiam divisórias
adequadas atrapalhando a execução das atividades, pois quando um educador falava
o outro de outra sala escutava e vice-versa. Ou seja, as condições para o
desenvolvimento dos trabalhos eram prejudicadas no seu conjunto.
O outro grupo de educandos que cursavam os anos finais do ensino
fundamental foi matriculado na localidade de São José também no município de Jóia,
distante há doze quilômetros do assentamento, isso considerando a saída do
assentamento como referência. Essa escola, Escola Estadual Edmar Kruel, é uma
instituição de ensino fundamental completo, ou seja, atendia educandos de primeira a
oitava série. (Ainda hoje a escola funciona como escola de ensino fundamental
completo.)
Os educandos que frequentaram esse período nessa escola tiveram várias
dificuldades além das costumeiras. Enfrentaram diariamente o transporte escolar em
estrada de chão, aumentando o distanciamento de acordo com a localização das
moradias do assentamento. Houve nessa escola por parte dos educadores e
educandos da localidade de São José discriminação em relação aos educandos que
estavam se integrando aquela instituição. Foram separados em sala de aula
específica, não se misturando com os que já estavam cursando, os educandos os
discriminavam também pelo fato de serem provenientes de um assentamento e este
por sua vez ser proveniente da luta dos trabalhadores rurais sem terra. Essa mesma
discriminação se estendeu também a todos os assentados, também por serem sem
terra.
26
Em razão de todas essas dificuldades e por serem pessoas que vieram de uma
luta maior, os assentados, pais ou não das crianças, continuaram lutando para que
uma escola fosse construída de acordo com as necessidades desses educandos e desse
local.
Depois de várias tentativas em 1996 foi liberada pelo Estado a construção de
uma escola no assentamento. Mas como o município tinha interesse nessa escola,
gostaria que fosse municipalizada, e, o problema maior era de que existiam
complicações quanto às licitações das empresas construtoras, esse foi um dos
motivos pelos quais a construção demorou a ser iniciada. O prédio foi concluído no
ano de 1998 e no ano seguinte iniciaram as atividades escolares no local.
A escola estava dentro de uma área de assentamento de reforma agrária,
conquistada também pela luta das pessoas envolvidas no processo anterior. As
discussões de como funcionaria e de quais as pessoas que dariam continuidade
considerando o espaço pedagógico foram feitas também pela comunidade escolar
que envolvia pais, educandos, educadores que já atuavam e todos os interessados em
como esta seria pautada: como organizar, respeitando os princípios do Movimento,
enfim, não desconsiderando todo processo anterior.
Dentro dessa organização inicial, os educadores que já atuavam na escola
improvisada não eram suficientes para a continuidade dos trabalhos. Foi necessário
que outros se integrassem a esse contexto. Além dos educadores que já atuavam,
vieram educadores da área urbana do município de Jóia, outros provenientes dos
municípios de Santo Ângelo e Eugênio de Castro. Essa integração se deu em meio a
vários atritos, discordâncias entre ideias e jeitos de desenvolver os trabalhos. Os
momentos em que as discussões aconteciam normalmente eram de ênfase ao
processo de desenvolvimento de trabalhos com os educandos, dentro do que se
acreditava como essencial para a formação de sujeitos completos, formação essa
defendida no PPP da escola nas concepções de educação:
Educação voltada para as várias dimensões da pessoa humana.
Buscamos a Educação Omnilateral, ou seja, a educação deve trabalhar em
cada uma de suas práticas, as várias dimensões da pessoa humana e de um
modo unitário ou associativo, em que cada dimensão tenha sintonia com a
outra, tendo por base a realidade social em que ação humana vai acontecer”.
(2006, pg.6, PPP)
27
O trabalho estava pautado dentro dessa formação como essencial, do que
discordavam em parte alguns educadores, pois consideravam o conteúdo (das
disciplinas) mais apropriado do que quaisquer outros aprendizados. Como a proposta
pedagógica estava em seu início, muitos se aproveitaram do fato de a maioria não se
sentir segura quanto ao projeto defendido e distorcer o que pretendia, ou seja, era um
projeto a ser construído e não apenas tomar o que já estava pronto e aplicar, o que era
defendido por parte dos educadores, apenas aplicar o conteúdo das disciplinas por
exemplo. A primeira organização considerada nessa escola foi a de que o coletivo
deveria prevalecer. Foram organizados núcleos de base que funcionavam no
desenvolvimento do trabalho realizado na escola (essa organização em núcleos foi
uma continuidade da organização que existia no assentamento como um todo) e
considerado de fundamental importância no processo educativo, o trabalho era
considerado educativo. Esses núcleos e trabalhos realizados pelos educandos também
envolvia os educadores de toda escola. Essa organização de coletivos de trabalho foi
uma tentativa de organizá-la diferente da organização escolar existente e também
uma continuidade do que existia no acampamento, uma maneira de fazer prevalecer a
identidade sem terra. Essa organização poderia ser considerada contrária e eficaz
para combater o individualismo nas resoluções e planejamentos, especialmente
relacionados ao trabalho prático. Vale lembrar que apesar dos núcleos de base
(grupos de trabalho) se dedicarem ao trabalho prático, existia planejamentos e
avaliações de como este tinha sido feito, o que dava discussões que enriqueciam
maneiras de pensar, construindo sujeitos que necessitavam se posicionar e
argumentar sobre seus posicionamentos. No entanto, a escola não pode se manter
distante da organização já existente, organização esse que diz respeito a divisão por
disciplinas, carga horária, enfim, todo aparato organizativo já atuante há séculos. Ela
não pode se distanciar dessa previsão, pois é uma instituição que faz parte do sistema
vigente. O trabalho continuou por algum tempo, em torno de três anos com maior
ênfase, depois foi se diluindo, outras exigências como tempos para realizá-lo fizeram
com que não tivesse mais o mesmo espaço. A burocracia do que exige a organização
escolar foi deixando de lado a organização proposta no início. Cabe pensar sobre
isso: primeiramente o público foi mudando, não tinha mais a mesma força que os
primeiros participantes da escola; a comprovação do que estava sendo feito, as
papeladas a serem preenchidas eram demasiadamente limitadoras para que os
sujeitos da escola continuassem batendo de frente com as regras estabelecidas; era
28
mais fácil seguir o que já está previsto (como de fato é); os sujeitos educadores
sempre foram diferentes nas ações, nas atuações dentro e fora da escola também se
tornando um fato difícil de administrar pelo menos de acordo com os princípios
baseados em Paulo Freire, Roseli Salete Caldart, Pistrak, entre outros. As
justificativas são inúmeras e vem de um ponto de vista de quem atuou algum tempo
nessa escola, mas são válidos, tem um fundo de verdade. O fato de fazer do trabalho
um aparato importante e digno de pensar os outros projetos da escola foi relevante,
mas não surtiu o efeito esperado, talvez porque não tenha sido discutido e valorizado
mais juntamente com os educandos. Ele foi sendo deixado de lado, a importância do
ato de realizá-lo não se constitui mais em ato a ser pensado, o que prevalece é que se
um educando precisa realizar algo, sempre questiona e diz não precisar realizar tal
trabalho nem em casa, como terá de realizá-lo na escola? As oficinas pedagógicas
também foram um fator importante na aprendizagem dos educandos. Aconteciam em
todos os anos do ensino básico. Uma porcentagem de educandos se inscrevia em
determinada oficina ou, o educador direcionava o educando necessitado de
desenvolver tal atividade mais do que outros. Permanecia um trimestre, ou um
bimestre de acordo com a organização dos anos em questão (ensino fundamental ou
ensino médio). Quem coordenava cada oficina era um educador de acordo com
aquela que mais se sentia preparado. Existiam oficinas de artesanato, canto, culinária,
conto, reciclagem, entre outras.
Depois da construção do prédio, o desafio seguinte era o de construir um
projeto político pedagógico que levasse em consideração as movimentações
realizadas até então para a conquista da terra, da escola. O que foi proposto então era
de que a comunidade contribuísse nessa construção.
A comunidade, juntamente com o conjunto de educadores elaborou o Projeto
Político Pedagógico que seria o documento que estabelecia os parâmetros para a
educação desenvolvida a partir daquele momento. Essa elaboração teve maior ênfase
na oportunidade em que o governo do estado lançou a Constituinte Escolar, que
previa a discussão da organização escolar nos moldes em que se encontrava e a
proposição por parte de todos os integrantes do processo escolar (a comunidade
escolar) de mudanças que acreditavam necessárias para o melhor aproveitamento dos
29
educandos, mudanças de nomenclatura, como por exemplo, “delegacia de educação”
para “coordenadoria de educação”.
O Projeto Político Pedagógico e Planos de Estudo construídos a partir de
2000 enfatizam a formação de sujeitos críticos, que saibam como proceder diante das
situações que se apresentarem nessa sociedade. Como referenciado nesses
documentos, a importância da formação dos estudantes para que exerçam plenamente
a cidadania e nesta consta o fato de serem políticos em seus atos, é plenamente
reiterada. Nesse sentido os trabalhos realizados com estes precisariam de fato acolher
as necessidades que possuem também levando em conta seus estágios de
desenvolvimento, além desses, o grau de socialização que possuem entre os colegas e
professores e a tarefa fundamental que essa socialização propõe para o grau de
amadurecimento e entendimento tanto dos conteúdos quanto da convivência um com
outro, ou seja, compreender que somente com o outro é que a formação se torna
plena e cheia de sentidos. Como indica o Projeto Político Pedagógico da escola:
Contribuir na construção de sujeitos com capacidades da analisar, refletir
e interagir com a realidade local e geral, ensinando fazer pela prática,
preparando igualmente para o trabalho manual e intelectual, tornando-se
sujeito da história e da sociedade que almejamos. (P.P.P. da Escola Joceli
Corrêa, 200.., página...)5
Apesar dessa preocupação demonstrada no documento escolar e toda
movimentação para que os aprendizados não se tornem obsoletos, existe uma parcela
de despreocupação ao mesmo tempo. Não há como manter sob rigoroso
acompanhamento o que todos os educadores estão trabalhando com os educandos ou,
como estão trabalhando. Os conteúdos demonstrados nos livros didáticos, por
exemplo, possuem atrativos relevantes, já que com estes a aula já está “pronta” e o
processo de passar os conteúdos torna-se facilitado. Não se pode condenar por
completo o livro didático, não é essa a questão principal, o fato é que como os livros,
os filmes também se tornam artefatos facilitadores de uma aula, se essa linguagem
for vista como tal. Essa afirmação se constitui em algo difícil, no entanto, as
observações dos momentos em que os filmes são passados, fazem-na ser fiel aos
fatos que ocorrem. Os livros já vem com as ilustrações, com os textos, com os
conteúdos explicados e com as imagens para ilustrar; os filmes são imagens, sons e
5
P.P.P. significa Projeto Político Pedagógico. Este projeto foi está em reformulação, no entanto, ainda
permanece o mesmo embasamento, tem os mesmos objetivos.
30
palavras e podem proporcionar momentos de observação, sonhos e também
entretenimento, como mesmo fez referencia um dos estudantes da escola “as vezes
um filminho é bom para distrair”.
Porém, é preciso considerar que existem as pessoas que dão maior ênfase a
essa preocupação com o que e como os educandos aprendem. Estas fazem com que
estimulem momentos de preparação coletiva do que irá ser trabalhado. As tentativas
são várias como, por exemplo, a construção de projetos interdisciplinares para o
ensino médio acontecido durante esse ano de 2010. Atividades conjuntas foram
desenvolvidas de acordo com as especificidades de cada disciplina e houve um
momento final de socialização do que cada grupo de educandos conseguiu estudar,
de acordo com a turma em questão.
O trabalho interdisciplinar pode ser considerado como uma iniciativa
louvável, pois o planejamento para as ações coloca os educadores trabalhando em
conjunto, pelo menos os educadores da área de conhecimento afim. Porém, a forma
como o encaminhamento é feito, ou o que é cobrado depois dos educandos se
contradiz na medida em que não se estabelece nenhuma novidade quanto ao método:
passar um filme para a atividade inicial, pesquisa na internet, copias do quadro
negro, enfim, toda maneira de organizar esse aspecto da aprendizagem. Não se pode
considerar isso como uma crítica, ou intransigência da parte de quem observa, ou
trabalha com esses aspectos.
2.3 Educadores que atuaram e atuam nessa escola
Os educadores que iniciaram o trabalho na escola ainda extensão da Escola
Municipal Leonilda Zardin Nicolleti, faziam parte do quadro municipal de
educadores do município de Jóia como também alguns desses educadores faziam
parte diretamente do processo de luta pela terra e que por sua vez faziam parte dos
assentados dessa localidade.
Como a extensão era de uma escola municipal, parte dos educadores era do
município até mesmo pela exigência do poder executivo do território em questão. Os
31
outros vieram do processo, (início dele), da escola itinerante e também educadores e
formadores em outras frentes dos acampamentos a que pertenciam.
Pelo fato de parte desses educadores terem vindo de um processo de luta por
reforma agrária, tinham ainda o vigor da continuidade dessa luta, de manter a
identidade sem terra que construíram durante o acampamento. Essa questão
contribuiu para manter viva a identidade camponesa nas crianças que vieram também
do acampamento como naquelas que ainda nasceriam no assentamento.
Como já mencionado na primeira parte dessa contextualização, esses
educadores sofreram juntamente com os educandos os problemas que a escola tinha
naquele momento: problemas com a estrutura física do prédio, materiais necessários
para manter um ensino de boa qualidade, tinham apenas giz e quadro negro.
Com o passar dos anos, mais especificamente a partir de 1999 quando o novo
prédio da escola dessa comunidade foi construído, a maioria dos educadores que
estavam nessa primeira etapa de trabalho, foram junto dar continuidade ao que
iniciaram na escola improvisada.
Agora, porém, a escola recém construída era estadual se fazendo necessário
constituir um quadro maior de educadores já que nesse momento a escola ofereceria
os anos iniciais e anos finais do ensino fundamental. Foram contratados pelo estado
mais educadores nas áreas específicas: educadora de educação física, educadora de
língua portuguesa, educadora de geografia e assim sucessivamente. Alguns
profissionais que atuavam na primeira escola tinham habilitações específicas, ou
estavam cursando como, por exemplo: educadora de história, educadores de
matemática.
Os primeiros anos transcorreram em meio a grandes discussões de como
organizar essa escola com um prédio recém construído, mas com a estrutura interna a
ser desenvolvida pelas pessoas que agora faziam parte desse coletivo: educadores
específicos de sala de aula, educadores da comunidade (pais, mães e outras pessoas
que se sentiam responsáveis pela construção desse processo).
A primeira tarefa para a qual todos foram chamados foi a de escolher um
nome para essa escola. Como já era esperada essa não foi uma simples escolha já que
todos haviam se empenhado para que esse prédio fosse uma realidade concreta.
Existiram três nomes para a escolha defendidos naquela ocasião: Paulo Freire, Chico
Mendes e Joceli Corrêa. Os três foram defendidos com veemência pelos presentes,
no entanto, como Joceli Corrêa foi um dos companheiros que representava
32
diretamente a luta pela reforma agrária e este ter sido assassinado na época de
acampamento influenciou para que fosse o escolhido quase que por unanimidade.
Esse ato de escolha movimentou os educadores da escola e mais ainda o
sentimento de pertencer à classe trabalhadora.
Nos primeiros dois anos a escola não tinha uma pessoa que estivesse em
condições burocráticas de assumir o papel da direção, nesse caso uma pessoa que
estava vinculada diretamente ao assentamento assumiu o cargo mesmo que em
condições de total dependência da 36ª CRE (Coordenadoria Regional de Educação).
Essa dependência se caracterizava pelo fato de que em qualquer situação que
necessitasse de assinatura para compra de materiais, ou outra atividade burocrática a
diretora em questão tinha de ir até a localização da 36ª CRE para que o coordenador
de educação o fizesse, pois estava somente como uma representatividade nessa
atuação. As exigências para que fosse uma direção de acordo com a legislação seria
de que estivesse vinculada ao Estado através de concurso público, já com três anos
de trabalho (tempo do estágio probatório) e tivesse licenciatura plena concluída. A
pessoa que assumiu na época, ano de 1999, tinha apenas licenciatura curta e não se
encaixava em nenhuma das outras exigências. Esta realidade continuou no ano
seguinte em que outro educador assumiu a tarefa, mas nas mesmas condições que a
anterior.
No final do ano de 2000, chegou transferida de um município próximo, Cruz
Alta, uma educadora que tinha as condições exigidas pelo governo do Estado para
assumir o cargo de direção. Como a escola necessitava de uma pessoa para
desempenhar tal tarefa, esta foi bem vinda à instituição para se colocar nessa posição.
No primeiro ano assumiu sem eleição. No ano seguinte foi realizada eleição, se
candidatou e permaneceu no cargo por três anos.
A escola teve mudança do nome, ou, reorganização do mesmo de acordo com
a situação em que se apresentava na época. Antes do nome Joceli Corrêa, teve o
nome de Escola Estadual de Ensino Fundamental no Assentamento Rondinha (que se
referia ao nome da localidade em que estava situada), depois passou a ter o nome de
Escola Estadual de Ensino Fundamental Joceli Corrêa. Alguns anos mais tarde, com
a implantação do ensino médio, a escola passou a se chamar Escola Estadual de
Ensino Médio Joceli Corrêa.
No ano de 2004 o ensino médio começou a existir nessa escola também,
dando possibilidades dos trabalhadores que ainda não tinha cursado essa etapa da
33
escolaridade o fazerem. Antes de existir nessa escola, os educandos que quisessem
teriam que se deslocar até a área urbana do município de Jóia à noite, o que
aconteceu durante determinado período. Nessa nova fase em que se encontrava a
escola, foi proporcionado também que viessem outros educadores de outras
disciplinas para trabalhar com ensino médio.
Nesses 11 anos de escola muitos foram os educadores que passaram por ela,
mais de trinta no total, dos anos iniciais ao ensino médio. Outros permaneceram ao
longo desses anos tentando alicerçar o projeto de escola pensada a partir das
concepções defendidas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que
preserva as concepções de Paulo Freire, Pistrak.
Provavelmente por essas idas e vindas, o quadro de educadores não conseguiu
de fato estabelecer uma unidade a ponto de colocar em prática a educação
progressista a que se propunha a escola, permanecendo sempre na expectativa de
quem assumiria as tarefas no lugar de quem já não estava mais. Realidade que de
certa forma ainda permanece hoje.
O sentimento de pertença à classe trabalhadora sem terra foi diminuindo. O
modelo de escola que foi sendo construído nesse período não pôde se abster de
seguir normas burocráticas estabelecidas pelo Estado. Essa burocracia influenciou
diretamente em cada decisão tomada, influenciando a conduta de cada educador que
não se via mais tão instigado a participar de um coletivo que acompanhava todos os
passos das pessoas a sua volta e colocar esse novo aprendizado, essa nova construção
na organização exigida então.
A maioria dos educadores que hoje atua na escola são do assentamento, mais
da metade, outros vem do município de Ijui, Cruz Alta, Tupanciretã. No total são 23
educadores.
2.4 Educandos que estudam nessa escola
Os educandos que estudam na escola são provenientes dos Assentamentos:
Rondinha, 25 de novembro (mais conhecido como Tarumã por ser o nome da antiga
fazenda), Estrela que Brilha (que pertence ao município de Tupanciretã), Barroca e
Reassentamento 31 de maio.
34
A maioria dos que estudam na escola atualmente, não fez parte diretamente
do processo de luta do acampamento e das ações realizadas nessa época. Aqueles que
pertenciam a esse tempo foram saindo por diversas razões, a principal delas a
procura por trabalho, ou seja, a permanência no assentamento não lhes deu suporte
para continuidade da sobrevivência e consequentemente não prosseguiram pelo
mesmo caminho. Poucos seguiram os mesmos passos dos pais, no entanto há os que
também passaram por acampamentos.
Nos primeiros dois anos de escola, 1999 e 2000 os estudantes traziam consigo
enraizados a identidade camponesa estampada. Nos anos seguintes até a atualidade,
essa identidade foi se perdendo, ganhando menos força. Existem várias razões para
explicar esse fato, entre eles a permanência nos lotes para a produção. A disposição
para a luta, as saídas não era mais a mesma, pois precisavam se tornar mais presentes
nos lotes com seus pais e dessa forma não mantiveram a prática da participação
como se dava nos tempos de acampamento e início de assentamento. Vendo sob essa
ótica podemos perceber o quanto o sistema no qual estamos inseridos de certo modo
corrompe aqueles que tentam vivenciar valores diferentes, pois as necessidades
físicas se manifestam com maior ênfase e mesmo não concordando com o que está a
nossa volta, com a organização da sociedade e divisão dos meios de produção
acabamos por concordar com algumas situações, como continuar trabalhando
mensalmente para algum grande proprietário de terras.
Apesar de os jovens não permanecerem nos assentamentos, aqueles que
passam pela escola acredito que possuem um grau de consciência sobre essa
condição de vida pela qual seus pais passaram e pela qual eles mesmos passaram.
Estar consciente dessa condição significa dizer que mesmo trabalhando em outros
setores da indústria e recebendo um misero salário no final do mês, pensarão sobre
isso e discutirão alternativas em algum momento da vida. Isso parece folclórico, ou
sonhador demais, esperar que se manifestem pensando no que irão fazer ou dizer
quando estiverem em situações com as quais não concordam.
35
Capítulo 2 – Utilização do audiovisual no contexto da Escola Estadual de Ensino
Médio Joceli Corrêa
2.1. Utilização do vídeo na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa
O recurso didático vídeo vem sendo na atualidade cada vez mais utilizada
pelas escolas, tanto da rede estadual ou municipal.
Para que esse recurso tivesse ascensão, teve incentivos do governo (federal),
por exemplo, de oferecer os materiais necessários para que os estudantes e
educadores pudessem ter o acesso a ele. O fornecimento desses materiais se deu
através de programas, ou seja, cada escola recebeu em mãos DVD, TV e demais
equipamentos necessários para que se efetivasse a utilização do mesmo. Num
primeiro momento a escola recebeu como doação do município de Jóia, de Escola
Municipal Leonilda Nicolette, uma aparelho de vídeo cassete. Depois a escola
adquiriu um aparelho de DVD. Mais tarde, no ano de 2001, um projeto do governo
federal, que tinha o objetivo de aparelhar as escolas, proporcionou que outro
aparelho existisse na escola. Essas questões nunca foram discutidas pela escola.
Quanto a filmes, a escola recebeu vários que estão ligados a TV Escola sobre
disciplinas, todos com acesso aos professores. Esses filmes são para os professores,
como uma espécie de consulta que poderão fazer, um material a mais.
A escola em questão, E. E. E. Médio Joceli Corrêa tem hoje doze (12) anos de
existência e desde então o vídeo vem sendo utilizado pelos educadores em suas
aulas.
No decorrer desses anos a metodologia para realização dessa tarefa foi como
pretexto para conteúdos que seriam estudados posteriormente. Mesmo nas aulas de
história não havia uma programação anterior ou um estudo aprofundado sobre o
filme, apesar de que a educadora se colocava como questionadora e cada imagem do
filme de acordo com suas intenções parava e explicava o que queria daquela cena ou
o que esta representava em tal contexto histórico que estavam estudando do
conteúdo.
Em qualquer um dos anos nesta escola são utilizados filmes: anos iniciais,
anos finais e ensino médio. A princípio em todos os anos do ensino básico, nessa
36
escola, os filmes foram/são explorados na percepção da história que este traz,
fazendo com os educandos se manifestassem através da oralidade, da escrita ou
também algumas vezes através de desenhos sobre a compreensão que tiveram da
referida história que o filme trazia, não exatamente sobre os conteúdos trabalhados
nas disciplinas.
O aprendizado da linguagem audiovisual não é percebido no contexto escolar,
pelo menos, nesse contexto escolar. Com todos os educandos o trabalho com
audiovisual não reflete sobre a “alfabetização estética”, que como enfatiza Antonio
Candido no ensaio Literatura e Subdesenvolvimento
Na maioria dos nossos países [latinoamericanos] há grandes massas ainda
fora do alcance da literatura erudita, mergulhando numa etapa folclórica
de comunicação oral. Quando alfabetizadas e absorvidas pelo processo de
urbanização, passam para o domínio do rádio, da televisão, da história em
quadrinhos, constituindo a base de uma cultura de massa. Daí a
alfabetização não aumentar proporcionalmente o número de leitores da
literatura, como a concebemos aqui; mas atirar os alfabetizados, junto
com os analfabetos, diretamente da fase folclórica para essa espécie de
folclore urbano que é a cultura massificada. No tempo da catequese os
missionários coloniais escreviam autos e poemas, em língua indígena ou
em vernáculo, para tornar acessíveis ao catecúmeno os princípios da
religião e da civilização metropolitana, por meio de formas literárias
consagradas, equivalentes às que se destinavam ao homem culto de então.
Em nosso tempo, uma catequese às avessas converte rapidamente o
homem rural à sociedade urbana, por meio de recursos comunicativos que
vão até à inculcação subliminar, impondo-lhes valores duvidosos e bem
diferentes dos que o homem culto busca na arte e na literatura (1989, p.
144).
A alfabetização não se dá na proporção da necessidade que apresenta cada
sujeito. Não existiu quando foi iniciado o processo de colonização (nas missões
jesuíticas), nem existe hoje, pois somos alheios ao que se passa e, normalmente vai
além do que se vê. A naturalização desse modo de trabalho está impregnada como
está impregnado em cada um de nós a naturalização e disponibilidade para o
37
consumo. Agindo com esse método, ou seja, trabalhando os filmes como evocações
para administrar outros conteúdos ou para como refletiram alguns educandos em
entrevistas:“sabemos que na maioria das vezes os filmes não correspondem aos
conteúdos trabalhados, e às vezes é um passatempo necessário, porque somente
copiar não dá”.
Percebe-se que os educandos têm consciência do valor que se atribui a linguagem
fílmica, desconsiderando esta como algo importante, pois assim é tratada em diversas
ocasiões. Como argumentou uma educadora na explanação sobre a utilização dos
filmes na escola: “passar filmes é bom para o professor, bom para os educandos, e
bom para os pais, ou seja, todos ficam satisfeitos”.6
Com essa argumentação
podemos pensar que há muito essa linguagem está banalizada. A preocupação com a
alfabetização para a linguagem audiovisual não existe. As imagens são repassadas
como algo natural, ou melhor, como algo de que os educandos irão aproveitar no
momento em que se colocarão diante delas. A compreensão delas fica a cargo dos
educandos, algumas vezes com intervenção dos educadores, dependendo da
disciplina da qual estivermos falando. Se esta praticamente é inexistente, pode-se
dizer que é compreensível o fato de os educandos não levarem a sério o assistir os
filmes para desenvolver um trabalho, pensando que este não se constitui em algo
diferenciado, apenas a compreensão superficial do contexto do filme assistido.
Nos anos finais o que sempre prevaleceu foi à utilização do mesmo como
material para interpretação do enredo pelo enredo do filme, não havia e não há outra
modalidade de trabalho com esse tipo de material. Servia e serve como ilustração de
um momento da aula ou até mesmo como válvula de escape por não terem aula
preparada ou por não terem disposição para desenvolver outro tipo de trabalho.
Comentários a respeito dos filmes que vem dos educadores dessa escola:
“Esse ano ainda não passei nenhum filme para meus alunos, vou passar um hoje,
teria educação física, mas como está chovendo vou passar o filme”
Há que se considerar outro fator interessante: nem sempre os educadores vêm
com o material (filmes) em mãos daquilo que querem trabalhar, outros às vezes
passaram um filme para seus alunos e outros colegas educadores o aproveitam para
passar também.
6
A educadora fez essa fala durante uma das aulas no curso de Licenciatura em Educação do Campo,
convênio com UnB e ITERRA, 2010.
38
Nos anos finais não é diferente, os educandos já tiveram situações em que
assistiram dois filmes no mesmo dia, em disciplinas diferentes por falta de
comunicação entre os educadores. Numa dessas situações uma das educadoras que
seria aquela em que trabalharia o segundo tempo da aula (de duas horas) ficou
indignada com o fato de os educandos não se aterem ao que era passado, pois já
tinham assistido a um filme antes do intervalo. Esta não considerou o que já tinham
assistido anteriormente. Os educandos apenas assistiram aos filmes sem realizar
naquele dia algum trabalho a respeito do que assistiram. Apenas foram pedidos
relatos sobre o que viam para entregar na aula seguinte valendo como avaliação. Na
disciplina de língua portuguesa foram passados os filmes: Olga, 2012, Alvin e os
esquilos, Deu a louca na chapeuzinho, Harry Potter e a pedra filosofal, Anjos e
Demônios, Zorro, Dança comigo, entre outros; na disciplina de geografia foram
passados documentários que diziam respeito a disciplina e um filme: A corrente do
bem; na disciplina de história foram passados os filmes: Zorro, A guerrilha; na
disciplina de espanhol foram passados os filmes: Sempre ao meu lado, Alvin e os
esquilos, entre outros.
Entre os educadores entrevistados não existiu nenhum deles que se manifestou
contrário a utilização dos filmes. Por exemplo, quando uma das educadoras referiu-se
aos educandos como não preparados para escrever sobre o que assistiram e pedia que
fizessem desenhos, ou, como dizia “dependendo da turma é o que peço de trabalhos,
as vezes peço textos, as vezes desenhos”. Os filmes nessa questão eram da disciplina
de espanhol, mas não eram na língua espanhola, eram filmes com uma “história que
dizia algo para os educandos”, filmes produzidos pela indústria cultural e que não
eram aproveitados para o estudo da língua em questão (espanhol).
Alguns dos educadores se manifestaram quanto aos filmes como mais um
instrumento para facilitar a aprendizagem sobre determinados conteúdos que
estivessem estudando, como exemplo disso assistir desenhos animados como A
turma da Monica para produção de historias em quadrinhos, ou, quando estavam
estudando sobre narrativa de aventura, que por sua vez foi complementado com um
filme, no caso, o filme era “Harry Potter e a pedra filosofal”.
2.2 Relação do audiovisual com a formação da consciência
39
Quando falamos de audiovisual retratamos a imagem como central, o meio
pelo qual todos se mobilizam, pois trabalha com as emoções daqueles que o assistem.
Principalmente quando nos referenciamos às propagandas: estas são o fio condutor
para o consumo, atingem a grande maioria da população. Não existem ilesos, todos
estão impregnados pelo prazer e desprazer do consumo. Os filmes, produzidos no
formato para venda na indústria, também têm papel fundamental nesse consumo:
venda do prazer efêmero, do corpo perfeito, da magia dos roteiros com final feliz
dando a entender que os contos de fadas não se esgotam, venda da violência como
maneira de resolução dos problemas criados por esse sistema em que estamos na
atualidade, venda das mais diversas situações em que a vida cotidiana se mostra e
mais além, os problemas de qualquer natureza se resolvem, as relações sociais são
impregnadas pela ideologia que prega a classe que determina todo o aparato
econômico, político, jurídico, enfim, toda a superestrutura em que está montado o
capital. As relações se estabelecem no âmbito de que o que as pessoas vivem está
retratado na tela e riem da própria desgraça, não se compreendendo como a margem
do processo. A ideologia que as imagens vendem é “irrecusável” ao povo tão sofrido
e cheio de mazelas...
Quando um educador utiliza as imagens, agora referindo-me as produções
industriais, e não concebe nestas um direcionamento adequado, um objetivo claro,
aqueles que assistem podem não diferenciar o que veem aqui do que assistem em
casa ou em outro momento de lazer. Nas entrevistas e conversas com educandos, a
grande maioria deles, não sabia dizer o que seria trabalhado com o filme
posteriormente7
, o que transparecia é de que estavam somente assistindo por assistir,
muitos dos que assistiram não lembravam o nome nem do que se tratava.
A escola situada no município de Jóia começou a utilizar o recurso didático
vídeo desde o inicio de seu funcionamento. Logo que começaram os trabalhos já
existia o aparelho de televisão, vídeo cassete e várias fitas de vídeo para serem
utilizadas: filmes infantis (contos de fada), filmes de ação, entre outros. A escola
7
Essa situação acontecia com maior frequência no período final do ano letivo, em que segundo o dizer
de uma educadora “já tinha concluído todos os conteúdos e por essa razão estava passando filmes”. Os
educandos não manifestam contrariedade a esse respeito, no entanto, são conscientes de que os filmes
são apenas para passar o tempo das aulas e cumprir os dias letivos que ainda faltam, principalmente no
final do ano.
40
hoje tem cerca de 380 educandos que cursam da educação infantil ao ensino médio.
Este recurso é amplamente difundido, pelo menos em se tratando desta realidade,
entre os educadores. Tanto a educação infantil, quanto os anos iniciais e finais do
ensino fundamental e ensino médio, tem contato constante com esse recurso.
Normalmente o que pedem como trabalhos a respeito do que assistiram são
relatórios, resenhas críticas, ou apenas um relato do enredo do filme.8
Esses relatórios são exigidos principalmente nas disciplinas de língua portuguesa,
espanhol, história. Na disciplina de história, segundo o educador, os filmes são
utilizados para retratar aquilo que não consegue através das explicações de acordo
com determinados tempos históricos.9
No entanto devemos ser justos ao fazer essa
afirmação, pois, algumas disciplinas fazem uso dele com maior frequência que
outras, como por exemplo, língua portuguesa, história, espanhol, geografia. Essa
constatação foi feita através das observações realizadas na escola, como também
através das entrevistas com educandos. Os filmes começaram a ser utilizados nessa
escola desde o primeiro ano de funcionamento do prédio oficial (a partir de 1.999),
ou seja, desde o momento em que iniciou seu funcionamento há 12 anos. O fato de
ser uma escola do campo não impossibilitou que estes fossem introduzidos e que lá
tivessem permanecido. A impossibilidade aqui na significa dizer que não pudessem
ter acesso ao que existe em termos de tecnologias, está se referindo ao fato de não
conseguirmos nos desligar ou nos desvencilhar do que esta sociedade nos propõe
mesmo que não concordemos com seus feitos. Não há distinção entre quem utiliza ou
não os filmes para trabalhar, o fato é que algumas disciplinas o fazem mais vezes
entre as quais a disciplina de língua portuguesa, história, espanhol, geografia.
Os filmes trabalhados levam em conta somente o roteiro que este apresenta.
Na maioria das vezes os professores nem mesmo assistiram aos filmes antes de
serem trabalhados, ou, já passaram para várias turmas e já sabem do que irá tratar e
nem mesmo assistem novamente com os educandos. Os trabalhos que são solicitados
estão resumidos no ato de escreverem sobre os filmes, resumos, resenhas, a parte que
8
Tive acesso a alguns relatórios produzidos pelos educandos, no entanto, não são os mesmos dos filmes
analisados.
9
O educador de história demonstrou saber como poderia ser desenvolvido um trabalho utilizando
especificamente essa linguagem do audiovisual, ou seja, analisar as imagens, a forma com que foi feito
determinado do filme. Mas, o trabalho que realiza está direcionado para o conteúdo com que trabalha e
não exatamente com a linguagem do audiovisual. O educador realizou um comentário a respeito desse
trabalho que poderia ser realizado.
41
mais gostou ou desenhos. A linguagem do filme como sendo uma linguagem estética
própria não é considerada, mesmo porque a formação dos educadores não passou por
esta dimensão. Ser “alfabetizado esteticamente” significa dizer algo como
compreender todas as dimensões que podem ser trabalhadas numa determinada obra
e para que finalidade se queira trabalhar com ela. Mesmo um filme como Olga, que
poderia ser direcionado para o lado político da questão e do coletivo que a luta
daquele momento encerrava, quando análise escrita foi feita o que prevaleceu foi a
imagem soberana de Olga, principalmente no momento da tomada da filha de seus
braços. Os educandos não conseguiram ir além, por falta de uma intervenção mais
contundente.10
Além dos filmes trabalhados cotidianamente na escola Joceli Corrêa pelos
educadores nas disciplinas já mencionadas, filmes são utilizados na semana Paulo
Freire11
, que acontece todos os anos nessa escola. Durante esse ano de 2010, foi
utilizado um filme que não tinha a ver propriamente com o tema tratado que era
sobre a vida de Paulo Freire. As turmas da escola (anos finais do ensino fundamental
e ensino médio) realizaram pesquisas referentes a esse autor para apresentarem no
último dia da semana. As apresentações foram feitas e no término delas foi passado o
filme “Desafiando gigantes”. O caráter do filme não estava relacionado a expressão
que a semana tinha até então. A diferença entre os outros filmes é que neste foi
montada uma estrutura com data show para a apresentação, deixando com aspecto de
cinema o local em que foi assistido.
Os filmes trabalhados não são necessariamente trabalhados como linguagem
própria, pensando que este se encaixa no gênero multimodal. Um filme apresenta
linguagem da palavra, do som, da imagem, das posições em se coloca cada
personagem, da focalização para o individual ou o coletivo, imagens também
direcionadas à propaganda de mercadorias para vender o produto do filme além dos
produtos individuais: bebidas, roupas sempre etiquetadas com “marcas famosas”,
enfim, toda uma parafernália instituída para fins de consumo. Quando assistimos a
10
Vale lembrar que os filmes, normalmente assistidos pelos educandos, são produzidos pela grande
indústria e o conteúdo expresso neles não se diferencia do que conhecemos : um é o mocinho, outro é o
bandido e no final tudo acaba bem, ou seja, o final é feliz.
11
A semana Paulo Freire se refere a uma semana de atividades que acontece na Escola Estadual de
Ensino Médio Joceli Corrêa alusiva ao dia do livro. Existe uma programação nas turmas da escola
coordenada por alguns educadores que se disponibilizam para fazê-lo. Nessa semana há apresentações,
feira do livro e culmina normalmente com um filme.
42
filmes no âmbito privado estamos consumindo essas mercadorias e dentro delas
compramos a ideologia que a impregna, que por sua vez está vinculada ao círculo
vicioso da reprodução do sistema capitalista. Quando esse consumo perpassa o
âmbito escolar, a compra do produto continua acontecendo. No entanto, esse
consumo, além da compra da ideologia dominante há o reforço dessa dominação
através do professor e da estrutura escolar. Correndo o risco de colocar no professor
a responsabilidade de “introjetar” no educando, ou continuar o trajeto dessa
hegemonia capitalista, há que se considerar que ele tem boa parcela de contribuição
nesse processo. Ele pressupõe a finalização, ele está estreitamente ligado ao público
com quem se trabalha, ou seja, os educandos. E se isso acontece possivelmente ele
reitera a ideologia, principalmente se não teve contato formativo relacionado com a
“alfabetização estética”. O filme como outras linguagens do teatro, por exemplo, se
constituem como um adendo a mais, uma justificativa insignificante para permear,
preencher o “tempo vazio”, que reitera o tempo vazio de fato, pois se essa formação
não compreende uma preocupação constante em formar educandos conscientes de
suas atuações presentes e futuras, esta não se constitui numa educação que
corresponda as necessidades do desenvolvimento pleno do educando. Como o autor
Adorno definiu no texto Tempo Livre de que este nada mais é do que a continuidade
do tempo em que a pessoa dedica ao trabalho, um não se desvincula do outro. O
tempo livre não é livre ele é preenchido através do consumismo, pois a falsa
liberdade precisa de produtos para preencher o espaço que deixou de existir no
trabalho, o ser humano foi podado na sua criatividade.
A linguagem visual é apenas uma parte do processo de conscientização,
evidentemente não podemos colocar nesta toda a carga de responsabilidade para essa
formação, mas pensando que o visual é reincidente, acontece a todo o momento. A
imagem é reincidente, ela é insistente, ela encanta, envolve, suprime as
dores, evoca ilusões, dá continuidade ao processo de dominação. No entanto, quando
desdobrada desta maneira claro que diz respeito à imagem propagada pela produção
industrial de larga escala, não com o objetivo de fazer ver o que realmente existe de
contradição de cada realidade falada colocada em forma de imagem, apenas com a
pretensão de mercantilizar a produção, vender uma imagem que reitera o consumo, a
identificação com o “belo” que, por sua vez também é construído também pela
indústria. Não podemos desconsiderar produções que levam a construção de uma
43
consciência crítica. Como trabalha Maria Rita Kehl quanto à imagem e sua produção,
levando em conta a dimensão que esta possui na vida humana:
(...) Da indústria cultural à sociedade do espetáculo, o que houve foi um
extraordinário aperfeiçoamento técnico dos meios de se traduzir a vida em
imagem, até que fosse possível abarcar toda a extensão da vida social. (...)
(Kehl, 2004, pg. 44)
Se na vida social a imagem e o que esta quer representar têm proporções
gigantescas em todas as ações, podemos considerar que não estamos livres dessa
condição, ou seja, temos influência direta ou indiretamente dessa manipulação
propagada pela indústria, pois não vivemos fora dessa realidade. Não é uma
novidade esse fato, no entanto, da mesma forma que somos influenciados por ela não
temos consciência dessa influência, não percebemos quando as ideias ou ações estão
permeadas pela ditadura do capital ou, quando conseguimos essa atitude, do
questionamento, ainda assim estamos à mercê dessa influência.
Se os meios de comunicação estão aperfeiçoados a ponto de “entrar em
nossas vidas” deliberadamente, pressupõe-se que não temos escolha. Encontrar uma
forma contra hegemônica de luta e competente ao mesmo tempo (competente no
sentido de “convencer” do contrário propagado e para isso teria que ser
excepcionalmente bom), requer dos interessados na questão aprofundamento dos
meios já existentes para contrapor e serem bem firmes no que diz respeito à defesa
política, firmes também nas práticas que realizam cotidianamente, não apenas na
simbologia dos ideais.
Existem ações dessa natureza que compõe essa contra hegemonia. Um
exemplo que podemos citar é o filme “Quanto vale ou é por quilo”, que por sua vez
se trabalhado de forma alienada não difere dos outros que são produções
padronizadas.
Por mais que existam produções anti-sistêmicas, não há veículos apropriados,
ou seja, os meios de produção não estão dispostos para essa classe (trabalhadora)
efetivarem de fato o que produziram para fazerem pensar aqueles que estão mais
afundados no sistema, sem condição de questionamentos. Seria necessário que estes
meios fossem tomados como forma de também caracterizar a luta contrária. Também
A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES, INGRID ELISABETE PRANKE
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A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES, INGRID ELISABETE PRANKE

  • 1. UNIVERSIDADE DE BRASILIA FACULDADE DE PLANALTINA LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO INSTITUTO TÉCNICO DE CAPACITAÇÃO E PESQUISA DA REFORMA AGRÁRIA - ITERRA TURMA PATATIVA DO ASSARÉ A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES. Ingrid Elisabete Pranke Nome do orientador: Rafael Litvin Villas Bôas Brasília-DF, abril de 2010
  • 2. UNIVERSIDADE DE BRASILIA FACULDADE DE PLANALTINA LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO INSTITUTO TÉCNICO DE CAPACITAÇÃO E PESQUISA DA REFORMA AGRÁRIA - ITERRA TURMA PATATIVA DO ASSARÉ A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MEDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES. Ingrid Elisabete Pranke Monografia de final de curso submetida à Faculdade UnB Planaltina, da Universidade de Brasília, como parte dos requisitos necessários à obtenção do Grau de Licenciado em Educação do Campo, com habilitação na área de Linguagens. Orientador: Rafael Litvin Villas Bôas
  • 3. 3 Brasília-DF, abril de 2010 RESUMO Esta pesquisa foi elaborada a partir de observações, entrevistas e relatos de educandos e educadores pertencentes a Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa de assentamento no município de Jóia, RS, com o objetivo de questionar e diagnosticar a utilização do audiovisual durante as aulas. A maioria dos filmes com os quais os educadores trabalham pertencem a produção industrial e não dialogam com a forma com a qual o conteúdo se organiza. Normalmente o que acontece é que os educadores pedem como trabalho relatórios enfatizando o que o enredo do filme traz, não questionando de fato o que este trabalha. A pesquisa tenta relacionar a consequência do uso dos filmes na formação dos educandos, especialmente a formação estética, ou não dos educandos. Palavras chave: educandos; audiovisual; filmes; imagem; educadores; indústria cultural.
  • 4. 4 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................5 Capítulo 1: A vida permeada pelo sistema capitalista........................................................7 1.1 Escola e hegemonia..................................................................................................7 1.2 Escola, racionalidade técnica e indústria cultural...................................................16 1.3 Escola e emancipação x escola e precarização da vida...........................................19 2. Contextualização da realidade pesquisada...............................................................21 2.1 Início do assentamento .........................................................................................21 2.3 Educadores que atuaram e atuam nessa escola.....................................................30 2.4 Educandos que estudam nessa escola....................................................................33 Capítulo 2 – Utilização do audiovisual no contexto da Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa.....................................................................................................................35 2.1. Utilização do vídeo na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa.................35 Capítulo 3 - Análises de algumas obras trabalhadas na escola Joceli Corrêa...................47 3.1- Análise do filme Anjos e demônios.......................................................................47 3.2 Análise do filme Desafiando Gigantes....................................................................49 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................51 REFERÊNCIAS...................................................................................................................5 0 ANEXOS..............................................................................................................................5 1
  • 5. 5 1 INTRODUÇÃO A referida pesquisa foi realizada num território de assentamento da reforma agrária no município de Jóia RS. A localidade foi nomeada de Assentamento Rondinha. O foco principal da pesquisa foram os sujeitos da Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa, com educandos e educadores dos anos finais do ensino fundamental e ensino médio. O fato de essa escola estar localizada dentro de um território de reforma agrária, com famílias provenientes de um movimento social que é o MST e consequentemente este continuar atuante foi um dos fatores que estimularam o desenvolvimento do trabalho a respeito do audiovisual. Ou seja, com a utilização dos filmes durante as aulas, tanto nos anos iniciais do ensino fundamental, anos finais e ensino médio. Mesmo com essa atuação (do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), sendo um contraponto a proposta hegemônica de sociedade, os filmes utilizados constantemente e para diversas ocasiões, tanto em aulas como em finalizações de trabalhos como, por exemplo, a Semana Paulo Freire que acontece todos os anos na escola no mês de maio, são na sua maioria filmes em que a forma apresentada é a mesma dos padrões estadunidense de produção e, a maneira com a qual este sempre foi trabalhado na escola não se traduzia diferente do que o todo do contexto escolar trabalha. Mesmo que a história dessas pessoas tenha sido de lutas reais, tanto no período de acampados como no período de assentamento, a forma importada de produção do audiovisual é empregada na escola sem aprofundamentos. Inicialmente foram realizadas observações das aulas, conversas informais com educandos e educadores. Foi diagnosticado o descontentamento de parte dos educandos em relação a quantidade de filmes que os educadores utilizavam, algumas vezes no mesmo dia foram passados dois filmes, ou seja, o período todo de quatro horas era preenchido com filmes (constatado através de entrevistas). A maioria dos entrevistados (educandos) citou que pelo menos duas vezes ao mês os filmes eram utilizados, com maior ênfase nas disciplinas de português, história, espanhol, geografia. Importante também foi o fato de observar nos educadores não determinarem outros trabalhos, como por exemplo, identificar e analisar os sons, a movimentação das imagens, dos personagens, todo trabalho que há por trás da produção desse audiovisual, enfim, realmente analisar o todo das obras. O que se observou é de que provavelmente não tinham essa orientação de trabalho, ou seja, não foram preparados para analisar e trabalharem com os educandos de maneira diferente que apenas fazer a interpretação da história do filme que
  • 6. 6 assistiam, responder questões a respeito do assunto assistido ou desenhar sobre o que assistiam. A metodologia utilizada para diagnosticar e perceber o que se concretizava a esse respeito foi de entrevistas com educandos, educadores, funcionários da escola, observações de como aconteciam os procedimentos quanto ao uso dos filmes, leitura de relatórios dos educandos, pesquisa nos documentos da escola a fim de perceber qual o perfil de formação pretendido para os educandos, e a contradição ou não do trabalho com filmes, ou seja, se existia contradição entre o trabalho realizado com essa linguagem em relação ao pretendido como formação para os educandos. As entrevistas com educandos e educadores serviram para verificar o quanto os filmes faziam parte da vida escolar e a importância ou não, dos mesmos no aprendizado e formação da consciência sobre a sociedade da qual fazem parte. Inicialmente foi realizada uma parte escrita em que são abordados aspectos dessa realidade como os conceitos discutidos, uma contextualização do local de pesquisa, dos sujeitos envolvidos nesse processo. Nos passos seguintes da escrita são mencionadas falas dos sujeitos pesquisados dentro do contexto, diálogo com o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola, diálogo com alguns autores como Maria Rita Kehl, Theodor Adorno, Antonio Candido. Também são acrescidas as percepções que ficaram, questionamentos, considerações finais. Vários passos foram dados para que o trabalho pudesse ser concluído, entre eles a manutenção firme de que este foco era de real importância e daria algumas pistas sobre o que é desenvolvido na escola, como é desenvolvido e qual a dimensão que atinge entre os que assistem os filmes. E para além do recorte local, a pesquisa também é focalizada para o universal, pensando que o local faz parte do universal e vice-versa. A hipótese inicial era de que os filmes na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa eram passados com muita frequencia e de que os educandos não conseguiam absorver tudo o que os educadores gostariam. A hipótese foi comprovada.
  • 7. 7 Capítulo 1: A vida permeada pelo sistema capitalista 1.1 Escola e hegemonia Questionar o formato escolar no modelo que ainda prevalece na atualidade pressupõe que levemos em consideração todos os séculos ao qual este está submetido. A organização deste não corresponde a algo atual, por mais que “enfeitem” os velhos moldes com a parte física melhorada, por exemplo. Podemos perceber essa questão no fato, principalmente, da relação professor aluno. Esta se constitui como forma de um dominar o outro, colocado como regra de sobrevivência dentro desse sistema social que é o capitalismo. Como cita Luiz Carlos de Freitas: É preciso notar que a relação professor/aluno foi antagonizada a mando das relações sociais que acirram esse processo no interior da sala de aula, como meio de adaptar o aluno a uma forma de poder que é a forma que foi e será valorizada no âmbito da sociedade capitalista. (2008, pg. 58) Inicialmente adaptada e vinculada ao rigor da disciplina religiosa a escola funcionava como uma espécie de continuidade da igreja, ou dos conhecimentos
  • 8. 8 adaptados por ela. A moralidade tratada nos diversos assuntos curriculares ainda permanece atualmente, principalmente quando educadores tentam corrigir seus educandos por alguma razão qualquer, uma briga, por exemplo: “isto não está correto”, “você deve fazer assim”, “não deve bater em seu colega”. A noção do certo e do errado se coloca como o centro dessa valoração moral. É como se o sentido do pecado permanecesse nessas correções. A punição “divina” perpassava a escola, a obediência passava por ela também. A reiteração do moralismo em relação ao que é certo ou errado, que provém direta ou indiretamente da questão religiosa, ainda continua acontecendo no meio escolar. Conforme o que o era pregado e ensinado na Idade Média na escolástica, a moral religiosa era a “pedra fundamental” para todos os ensinamentos, ou seja, a filosofia, a dialética, a literatura. Todas as formas de ensino passavam por essas “medidas” da igreja católica que queria manter a dominação através de sua doutrina. Mesmo que o domínio da igreja hoje não seja o mesmo de outrora, ainda permanecem incutidas nas pessoas, essas “sequelas” de forma inconsciente. Podemos perceber isso nas atitudes diante dos problemas que se apresentam no dia a dia, como por exemplo, os problemas comportamentais. Palavras como estas: “você não deve bater em seu colega porque isso é feio, está errado”. Não se procura o verdadeiro motivo por tais atitudes, tão pouco o questionamento para que a pessoa que cometeu a atitude pense sobre o que fez. A solução seria resolvida em longo prazo e como estamos na sociedade capitalista em que o imediatismo para resolução das questões está presente em todos os aspectos da vida, não poderia deixar de sê-lo também na escola. Esse imediatismo faz com que procuremos perceber diretamente no ato acontecido e não nas prováveis convivências anteriores, ou problemas mais sérios de família, por exemplo. A família, muitas vezes, é encarada como determinante de mais clientela para que a escola funcione. A escola em questão E.E.E.Médio Joceli Corrêa, por sua vez, funciona como todas as outras escolas dentro da burocracia que o Estado estabelece. Muitas vezes o que é tomado como correto, condiz com as mesmas resoluções que dariam aqueles a quem interessa que a sociedade permaneça dessa forma, ou mais especificamente, a organização escolar permaneça como está. A parte burocrática está sempre em primeiro plano (pode-se perceber esse aspecto até mesmo quanto a merenda, que para adquiri-la é necessário que o responsável (diretor) faça várias tomadas de preço, licitações para então comprá-la para os educandos), mesmo que não seja esta uma atitude consciente. Ou melhor, é uma atitude consciente, no entanto, a formalidade em preencher documentos
  • 9. 9 muitas vezes poda o lado humano do trabalho, aquele que realmente daria resultados. Quanto aos pais, aparentemente, possuem certo encantamento de que a escola será a ponte entre a melhoria de vida de seus filhos no futuro aceitando de certa forma o que esta trabalha sem questionamentos mais consistentes. Os pais identificam na escola um espaço para que esse futuro melhor se concretize. Pode-se perceber isso quando os pais colocam na escola a responsabilidade daquilo que os filhos precisam aprender para esse avanço, além disso, depositam na escola e na pessoa do professor a confiança dizendo que estes poderão até mesmo “puxar as orelhas se for o caso”. De certa maneira há um condicionamento dos pais em relação à escola, a condição para melhorar de vida está em passarem pelo processo escolar e nesse processo os professores são aqueles que irão dar esta contribuição, ou até mesmo serem a ‘salvação’ de seus filhos. Esse condicionamento está vinculado ao próprio valor que o sistema capitalista propõe a todos para discussões sobre valores, ou discussões sobre determinados temas estudados. Como referencia Eugenio Bucci e Maria Rita Kehl, de que a imagem se tornou para os seres humanos da atualidade algo imprescindível, uma idolatria infinita daquilo que podemos chamar de sedução ilimitada, em qualquer ponto que olhamos lá está ela pronta para alvejar quem estiver pela frente. (...) Vivemos uma era em que tudo concorre com a imagem, para a visibilidade e para a composição de sentidos no plano do olhar. É nessa perspectiva que falamos em videologia, ou seja, na perspectiva de que a comunicação e mesmo a linguagem passam a necessitar do suporte das imagens num grau que não se registrou em outro momento histórico. Os mitos, hoje, são mitos olhados. (...) (Kehl, 200, pg. 16) Quem estiver de acordo ou não com as situações impostas pelos meios televisivos, está sujeito à banalização do que estes oferecem. Todos teriam direito a todas as obras elaboradas até então, seja por meio da música, por meio do teatro, por meio da linguagem visual. No entanto, o que é oferecido as classes menos privilegiadas em termos de cultura, é o que a indústria cultural define como padrões a serem consumidos e consequentemente o lucro revertido para aqueles que têm oportunidades de comprar para si a cultura elaborada e negada a classe trabalhadora, por exemplo.1 Mesmo que outras 1 Não se pode negar que a cultura existe em qualquer situação que nos deparemos, até mesmo nas escolas de samba ela se manifesta, no entanto, fica claro que a produção industrial não se deteve somente as necessidades humanas em termos físicos, e sim, em termos de emoção, se sentimentos. Ela não se contentou em ficar em um âmbito apenas, mas tomar parte do todo da vida.
  • 10. 10 elaborações existam, e existem, não fazem parte da veiculação por meio de propagandas. Se as pessoas tivessem outras opções, mesmo seduzidas pela redundância dos sons, das imagens que a indústria enfatiza, teriam escolhas, questionariam mais. Veiculando mais, o lucro com a venda da imagem construída do herói e do bandido não teria o mesmo efeito. A estrutura escolar tomando-a como instituição, como todas as outras esferas da sociedade está envolta do domínio econômico. O domínio religioso cedeu lugar ao domínio econômico. Marx já previu isso nas teses de Feuerbach. A educação como um todo não está livre do que os alicerces econômicos estabelecem. Por mais que a formação de hoje não seja para mão de obra como foi para as antigas fábricas, o ensino continua obedecendo a aspectos que direcionam a qualificação de mão de obra para futuros empreendimentos, ou seja, para o que a economia ditar. Antes mesmo da necessidade dessa mão de obra existir já são induzidos para essa formação. Esta já começa nos primeiros anos, na alfabetização. A economia estabelece os parâmetros para que o poder se instaure em diversos setores, tornando possível dessa forma que estabeleça conexões entre todos eles. A lógica da mercadoria é o “material” que conduz a essa apropriação do poder. Tudo o que é rentável se torna mais rentável, e o que não é um dia será. Lembrando da discussão de Marx quanto ao valor de troca e o valor de uso. Enquanto o valor de uso prevaleceu não havia um equivalente que fosse trocado e sim como diz o próprio nome era o valor do útil para determinados fins. Quando o valor de uso começou a ser dissipado e o valor de troca tornou-se a principal fonte de organização um equivalente de troca, que hoje é o dinheiro, entra a lógica da mercadoria que corresponde resumidamente naquilo que presenciamos hoje: todos os bens transformados em algo vendável, trocados por um valor equivalente que não é o valor de uso. O discernimento entre o que precisamos para viver e o que é supérfluo deixou de existir. Aparentemente tudo é necessário, até mesmo o que não usamos. O desejo do consumo tomou proporções assustadoras e sem limites de intromissão na vida dos sujeitos. Como Guy Debord define: A primeira fase da dominação da economia sobre a vida social levou, na definição de toda a realização humana, a uma evidente degradação do ser em ter. A fase presente da ocupação total da vida social em busca da
  • 11. 11 acumulação de resultados econômicos conduz a uma busca generalizada do ter e do parecer, de forma que todo o «ter» efetivo perde o seu prestígio imediato e a sua função última. Assim, toda a realidade individual se tornou social e diretamente dependente do poderio social obtido. Somente naquilo que ela não é, lhe é permitido aparecer. (2003, pg. 17). As imagens entram com força total para que a manutenção desse poder econômico prevaleça. A venda da imagem, sob qualquer pretexto (alimentos, roupas, perfumes, pessoas) vale para a economia. A sensibilidade para discernir entre o que se configura como real, existente, verdadeiro fica debilitada pelo fato de não existirem opções, poderíamos chamar assim. As opções estão envoltas num emaranhado de fantasias, de imagens. Talvez essas mesmas imagens, de um mundo ou, futuro melhor para os filhos, esteja configurada no pensamento dos pais, por essa razão a entrega para a escola de seus filhos. A venda das imagens, nos meios de comunicação diversos que existem na atualidade, estimula não só a venda da mercadoria, mas a venda de um sonho. O sonho de grandeza entra na vida das pessoas como alcançável para todos “só depende de cada um”. Toda a parafernália que a sociedade se encontra, com meios de exclusão, de ilusão descarada, não está ao alcance do entendimento da maioria das pessoas. Não se pode dizer com isso que as pessoas são impossibilitadas por ignorância, ou algo do gênero, no entanto, o “abrir dos olhos” não é de interesse para quem domina, pois nesse caso, estariam colocando em jogo seus rendimentos. No contexto escolar os filmes, em sua maioria, são trabalhados de maneira alienada de todo procedimento de produção, trabalho envolvido, ideais repassados, e principalmente o modelo de produção homogênea que passam a ideologia proveniente de um país que detém o poder econômico e ideológico (Estados Unidos). Se trabalhados com os estudantes como apenas objetos de entretenimento que conciliam mensagens de valores, ou em parte alguma motivação para o aprendizado da disciplina estudada, focando apenas o enredo, a ‘história emocionante, linda’, fica restrita e incapaz de perceber o domínio instalado nessas imagens, que vão adentrando os pensamentos e ações repetitivas sem a percepção propriamente delas. O questionamento, a percepção da linguagem, dos movimentos, das ações e reações, tanto das imagens, quanto daqueles que as assistem, seria uma atitude própria de quem está preocupado com a formação de estudantes. Se o significado atribuído a mercadoria e sua imagem não dialogam com a
  • 12. 12 intensidade que esta envolve a vida das pessoas, quando o trabalho com filmes é desenvolvido, este não entra na profundidade que o tema merece. Trabalhar apenas com as imagens veiculadas na forma importada e com conteúdos estabelecidos anteriormente (dentro dessas obras) não contribui para a compreensão do que estas tentam promover. Como traz Eugênio Bucci e Maria Rita Kehl na introdução de Videologias: A tirania da mercadoria se exponencia na tirania da imagem da mercadoria. O capitalismo contemporâneo é um modo de produção de imagens. (...) a questão é compreender e decifrar os mecanismos pelos quais toda política, assim como toda religião e toda ciência, toda cultura e toda forma de representação, convergem para a imagem, como partes do modo de produção de imagens, e só circulam e só adquirem existência como imagem. (...) (2005, pg. 23) No entanto, quem trabalha com filmes na escola não está preparado nesse sentido, do questionamento e da análise. A não ser que as imagens estejam estreitamente ligadas à disciplina especificamente, como por exemplo, biologia estudando determinados animais, plantas, doenças, não está dentro de um questionamento, ainda assim a abordagem fica restrita ao conteúdo especifico da disciplina e não da relação entre forma e conteúdo. Isso leva a crer que todos têm muito a aprender em relação a essa linguagem que possui sua propriedade e não deveria ser considerada apenas com o propósito de justificar a abordagem de algum conteúdo. Apesar da não formação dos educadores a respeito do audiovisual para desenvolver os trabalhos em sala de aula, poderia existir a procura por esse aperfeiçoamento no sentido de ter nessa linguagem algo próprio a ser trabalhado sem a pretensão de esgotá-la apenas como início de um conteúdo. Daí acreditar que os filmes são utilizados na maioria das vezes como pretexto para momentos de lazer na escola, como pretexto para uma produção textual, como pretexto até mesmo de análise.2 Nos cursos de formação de educadores (não generalizando), normalmente os filmes são encaixados como um recurso a ser utilizado no intuito de desenvolver trabalhos posteriores, por exemplo, trabalhar sobre determinados temas como as estações do ano. Pensando nisso, poderíamos afirmar que existe uma explicação para o descompromisso 2 A palavra análise aqui está determinando um momento em que foi presenciado em sala de aula, com segunda série do ensino médio, em que foi sugerida a análise do filme “Anjos e demônios”. A análise consistia em falar sobre a fumaça que saia da chaminé e saber qual o significado e, referência aos iluminados da época.
  • 13. 13 quanto a linguagem audiovisual como linguagem específica: os educadores não são treinados para olhar o filme na sua íntegra. Remetendo-me a escola pesquisada Joceli Corrêa, chamou-me atenção quando uma educadora em sua aula manifestou que iriam assistir a um filme e esta pediu que escrevessem posteriormente uma resenha crítica. Um dos educandos questionou o que seria uma resenha crítica. Não recebeu a explicação, apenas uma desculpa de que em outro momento explicaria caso contrário não daria tempo de assistir o filme (é bom lembrar que o período da maioria das disciplinas é de duas horas). O educando saiu com dúvidas sobre o que observar no filme para escrever a resenha pedida pela educadora. Aparentemente aceitou sem maiores problemas, já que em outras disciplinas aconteciam situações semelhantes.3 Os filmes que são assistidos durante os períodos de aula, algumas vezes fazendo- se necessário tempo de outra aula, ou negociação com outros educadores para que concluam a visualização do mesmo, não são comentados no início e na maioria das vezes nem mesmo no final deles, a não ser sobre o enredo do mesmo (não um roteiro do que trabalhar depois de ter assistido o filme). Isso é sintoma de um despreparo não meramente conjuntural, mas de ordem estrutural da escola brasileira. A preparação do profissional em educação é voltada para que trabalhe bem didaticamente os conteúdos de cada disciplina. Não é somente uma crítica para esse fato e sim as possibilidades de alargamento dessa formação poderiam ser considerados. Não se pode condenar, mas compreender e contribuir. De acordo com a realidade de escola do campo e com aspectos específicos de tal realidade se observa que não são filmes que estão de acordo com ela. No entanto, considerar apenas ela como aspecto fundamental para desenvolver o estudo, não é o único material ou aspecto para a compreensão de todos os fenômenos que deveriam ser colocados em pauta. Como defende Freitas a teoria é pressuposto básico para estudar a realidade da qual os educandos fazem parte. Nesse caso então, a utilização dos filmes poderia ser considerada um alicerce ou um embasamento para aprofundar outros assuntos, poderia ser considerado como uma parte teórica. Compreender e analisar a linguagem do audiovisual com as características estéticas que existem em tal linguagem, com o aprofundamento que merecem, esta deveria ser tarefa para quem se 3 Não quero dizer com essa afirmação de que todos os educadores procedam da mesma maneira em relação ao trabalho com os filmes, ou seja, utilizando os filmes de maneira aleatória e rotineira.
  • 14. 14 especializou no assunto, ou pelo menos que saiba o significado, as dissonâncias que esta revela quando a usamos para determinar apenas o suporte para o salto a outros conteúdos. Por outro lado justificar o fato de passar os filmes com boa intenção e, sabendo a maioria dos educadores alheios a esse trabalho, não é argumento forte o suficiente para que este permaneça com a mesma ênfase durante as aulas, lembrando que quando este é passado para assistir toma todo tempo do período que normalmente é de duas horas. Percebe-se nesse fato que não há tempo disponível para discussões posteriores e durante o filme isso também não acontece. Quanto aos filmes que assistem os educandos se manifestam de maneira pacífica (a grande maioria) há aqueles que gostariam de discutir o porquê de passarem tantos filmes, no entanto não são ouvidos. Outra oportunidade em que os educandos tiveram essa manifestação de descontentamento foi quando o conjunto de educadores acordou para que o início das atividades relacionadas com o projeto interdisciplinar do ensino médio (na ocasião da Copa do Mundo de futebol masculino) seria um filme. Um dos educandos expressou a seguinte frase: “vai ser uma matação”4 . O que ficou foi uma indignação por parte da maioria dos educadores e decidiram pelo não trabalho com filmes por um longo tempo para que se dessem conta de que não era apenas uma “matação”. A conclusão a que chegaram não foi apenas de se indignar com o comentário e sim, pelo fato de perceber o quanto os filmes eram banalizados, passados sob qualquer pretexto e sem preparação e quando um filme foi discutido e verificado se era mesmo esse o pontapé inicial dos trabalhos, não foi levado em consideração. Pode-se perceber que nem todos aceitam pacificamente esse método de trabalho, o que por um lado é bom. Porém, se apenas são compreendidos como questionadores sem preocupação, e não forem devidamente pesquisados sobre o que os levam a se manifestarem com disposição sobre o assunto, então, será em vão a revolta. Pensando nas avaliações externas que dão a entender que seja necessário desenvolver trabalhos em tempos determinados e sem a preocupação do tempo de cada sujeito aprender, os conteúdos são ministrados aleatoriamente sem preocupação com a realidade. Os filmes também entram nesse contexto de relativização do que é importante aprender, considerando como são trabalhados. 4 O filme que assistiram para o trabalho interdisciplinar foi O poder de um Jovem, no período da copa do mundo no ano de 2010. Este foi o ponto em comum com as quais todas as disciplinas dariam o pontapé inicial para os trabalhos sobre a copa, como também, para o desenvolvimento de seus conteúdos.
  • 15. 15 Todos os trabalhos são direcionados para o fato de que os educandos se dediquem a “apreenderem” os conteúdos trabalhados para participarem de olimpíadas, de avaliações externas como SAERGS (Sistema de avaliação do rendimento escolar do Rio Grande do Sul), prova Brasil, avaliações referentes aos projetos de alfabetização (como, por exemplo, o projeto Alfa e Beto), enfim, são avaliados a todo o momento de uma maneira ou de outra, o fato é que todos são avaliados. Essas avaliações são repassadas pelos gestores do Estado e administrados pelos gestores e educadores das escolas como fundamentação para desenvolver o projeto de acordo com os interesses daqueles que estão no poder, ou seja, de acordo com a rapidez com que gostariam que este seja colocado em prática. No entanto, o que se ouve desses projetos, mesmo considerando a concepção dos educadores, é de que servem para prever o que os educandos estão realmente aprendendo, não se colocam como continuadores desse modelo de sociedade que projeta novos dominados. Involuntariamente ou não, aqueles que trabalham diretamente com os educandos também têm sua parcela de responsabilidade nessa questão, mesmo que pensem nessa responsabilidade de maneira inconsciente. O professor por sua vez também é avaliado nessa perspectiva, se o educando não correspondeu aquilo que estava sendo pedido nas avaliações considera-se que os ministrantes das aulas são incompetentes. As escolas são colocadas no patamar de competição já que tem seus nomes num informativo dizendo qual a classificação de cada uma. A concorrência é brutal e bárbara. O que poderia justificar a reação dos educadores por escolherem trabalhar de forma descontextualizada, com conteúdos que não dizem respeito aquele público ou local. (Não quero dizer com isso que devam somente estudar conteúdos específicos daquela realidade, mas considerar o contexto em que trabalham). A padronização dos conteúdos a serem trabalhados (estes serão cobrados nas avaliações externas já citadas) no decorrer do ano letivo faz com que exista uma espécie de coerção involuntária, ingênua (ou talvez não tão ingênua assim, ela pode ter sido pensada com antecedência, por quem organiza os conteúdos e por quem os ministra posteriormente). Os educandos são submetidos aos conteúdos que não fazem parte do seu contexto e depois de algum tempo (anualmente) são avaliados com avaliações externas que são corrigidas por outras pessoas, não aquelas com quem trabalharam. Pensando no fato de que nestas colocações das escolas há competitividade entre elas e de certo modo uma desqualificação dos educadores que nelas trabalham, podemos entender que a avaliação não se restringe somente aos educandos e à “melhoria” do
  • 16. 16 sistema educacional, ou, a preocupação com essa melhoria. Está calcada também como método de colocar no educador a “culpa” pelo baixo rendimento dos educandos. Pois desde que a religião foi trocada pela economia, até mesmo da educação se espera rendimento e não formação de seres humanos na sua integridade. Assim, mesmo que o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola esteja calcado na formação integral do ser humano, esses tipos de avaliações e trabalhos desvirtuam o que é proposto. Do mesmo modo que as avaliações externas vem organizadas por outras pessoas sem levar em conta o contexto na qual serão aplicadas, avaliando os mesmos conteúdos para todos, os filmes com sua forma estética importada, também não situados no contexto, exprimem uma coerção inconsciente. Aqueles que assistem sofrem um coerção permanente, sem mesmo perceberem. 1.2 Escola, racionalidade técnica e indústria cultural. Resumindo o fato dessa maneira aparentemente designa algo simplificado: de um lado o que a industrialização definiu e de outro os não aprendizados, cegueira perante a realidade histórica que se apresentava reforço de que seres humanos expropriados dos meios de produção e da terra, servirem como massa de manobra sem sentimentos, sem desejos, sem necessidades, sem vida. De outro lado, a técnica sendo assumida por poucos “capazes” de comandar os meios de produção e adequá-los a suas exigências de padrão de vida e de poder. A relação que se estabelece a partir de então, reforça a ideia da desumanização em razão do “aproveitamento” dos seres humanos para a produção de coisas, de mercadoria. O trabalho encarado no início como uma necessidade e como algo que revelava o homem, sua construção, sua completude, agora designado com árdua tarefa do apenas fazer e não do pensar o que fazer como fazer, por que fazer e para quem fazer. O ser humano condicionado a realizar sem pensar no que realiza. Essa relativização do trabalho trouxe a relativização das necessidades da vida. O supérfluo passou a ser a “real” necessidade, o real passou para segundo plano e o ser, não encontra a importância que deveria, pois a satisfação se resume ao que se vê, ao belo
  • 17. 17 convencionado. A barbárie instalada pelo sistema capitalista define essa desumanização. O ser humano não possui as condições necessárias de sobrevivência: alimentação, vestimenta, moradia, no entanto, prioriza através da necessidade instaurada pela lógica do consumo, produtos que possivelmente não terá condições de adquirir, ou até faz um esforço extremo de conseguir o que está a venda para se igualar a todos, mostrar que está também acompanhando as últimas tendências da moda. Quanto ao consumo de mercadorias as pessoas se sentem desejosas e culpadas ao mesmo tempo. O desejo por algo é sempre alimentado pelas propagandas de toda natureza, sentem-se culpadas antes de realizar o ato do consumo e depois que o consumiram. A culpa vem pelo produto ser muito caro, pelo fato de ter consumido muitas calorias, pelo fato de ter de corresponder ao que dita à moda, pelo simples prazer de consumir. Religião e consumo determinam a mesma natureza de elementos: a culpa e o prazer estão estreitamente ligados. Como cita Frei Betto no artigo A arte de seduzir: Estamos todos sob o efeito hipnótico do consumismo. Não importa se o produto é frágil ou de má qualidade. Seu design nos cativa. Sua publicidade nos faz acreditar que estamos comprando a oitava maravilha do mundo! E, ingenuamente, que se trata de um produto durável, mesmo conscientes de que o capitalismo não se importa com o direito do consumidor, e sim com a margem de lucro do produtor.(Betto,2011) Assim como a economia e o consumo estão estreitamente ligados também o estão o trabalho e a escola, considerando a escola a partir da organização da fábrica. A necessidade de pessoas para o trabalho organizou o espaço escolar para suprir a demanda de operários. A formação para esse fim sempre foi maior que a objetividade declarava. Grandes multidões formadas alienadamente para servir ao capital. No momento em que estão prontos para o ingresso no mercado de trabalho (pessoas ingressando no mercado de trabalho sem deixarem de ser mercadoria, pois vendendo sua força de trabalho que é uma mercadoria, se igualam a própria mercadoria produzida), esse mercado já não tinha tais necessidades colocando outros empecilhos para que esta entrada nele se efetivasse, exigindo mais formação, mais qualificação. A escola em meio a essas exigências tem o papel de continuar o projeto inicial que é formar mão de obra barata e em grande quantidade, ou seja, sempre produzindo a mais do que o necessário. O trabalhador por sua vez fica sempre distante do sonho de
  • 18. 18 conseguir se estabelecer como essa mão de obra empregada em razão das exigências cada vez maiores de qualificação. Esse método de escolha que o sistema possui desumaniza na medida em que a disputa constante faz com que um ser humano meça forças com outro constantemente, gerando um desequilíbrio no entendimento do que realmente é necessidade ter, ou mesmo, não encontrando mais o sentido do ser significativo nessa sociedade que escraviza um ao outro pelo desejo. O desejo por qualquer objeto também ocorrendo na transformação da própria pessoa em objeto de troca. Mesmo que a evolução da tecnologia tenha atingido índices elevados na atualidade, ainda podemos perceber a procura por “qualificação” para entrar no mercado de trabalho, ou seja, a escravidão acontece da mesma forma, mas se caracteriza em outra forma de escravidão e dominação: por meio da “sedução”. As relações que se estabelecem na sociedade consequentemente se manifestam na escola ou em outro lugar qualquer basta fazer parte dessa mesma sociedade, não se caracteriza uma novidade esse aspecto. O estímulo para o consumo exacerbado de quaisquer produtos, não importando a origem, a utilidade, ou qual a consequência desse ato para o meio em que vive ou tenta sobreviver. (...) A violência da sociedade industrial instalou-se nos homens de uma vez por todas. Os produtos da indústria cultural podem ter a certeza de que até mesmo distraídos vão consumi-lo alertamente. Cada qual é um modelo da gigantesca maquinaria econômica que, desde o início, não dá folga a ninguém, tanto no trabalho quanto no descanso, que tanto se assemelha ao trabalho(...) (Adorno, 1940 pg. 119) A imagem está acima de todo o “bem” e de todo “mal”. O mundo atual se resume na imagem. Qualquer natureza de produtos, incluindo o ser humano, tem na imagem sua grande revelação. Juntamente com os produtos, que podemos considerar produtos de fato, como um calçado, um perfume, uma jóia, uma roupa, está determinado pelo modelo atual de barbárie, que à venda também está aquele ou aquela que utiliza tais produtos, colocando-se a venda a imagem, o corpo que se estabelece através da imagem ou, o corpo “perfeito” representado naquela imagem. ...o processo de esteticização da barbárie elevou, para uma escala muito maior, a naturalização da violência cotidiana, sendo veiculado cotidianamente por diversas mídias, de forma recorrente, de maneira que
  • 19. 19 esses valores são introjetados profundamente e servem mesmo a produção de determinadas formas de subjetividade que não só não se espantam mais com a violência como também já a aplaudem e a elogiam.... ( Campos e Lobo, 20..p. 201) Estamos permeados, em todos os sentidos, pela organização estabelecida nessa sociedade, capitalista até o último grau de compreensão. Estamos dentro dessa sociedade, parte dela, sugados por ela. Questionar essa realidade e não cair no engodo de defendê-la, mesmo que involuntariamente, seria o papel do educador. Para sair desse mergulho capitalista se faz necessário uma dose elevada de entendimento do que significa o “ser histórico”, o ser real, organizado, ativo (sem considerar aqui ativo aquele que faz sem pensar), participante, emancipado, que interage, defende a vida. Caso agissem sempre com a disposição de quem almeja de fato contribuir na formação de sujeitos, os sujeitos seriam formados, bastaria que a metodologia de Paulo Freire fosse compreendida e vivida: que propõem um educador mediador do conhecimento e não um ditador do ensinamento, dono da verdade. A escola poderia ser a estrutura capaz de formar o ser humano não apenas cognitivamente, formá-lo como sujeito capaz de intervir no sistema tentando modificá- lo nas suas bases. Mas como a escola é apenas um apêndice do que existe por trás dela como fazer para que a formação atinja o grau de compreensão que desejamos que cada ser humano tenha de acordo com o entorno em que vive? Em que aspecto acreditar primeiro, quais as possíveis “armas” para essa organização que se mantém há séculos evoluir, e não evoluir apenas no sentido pejorativo da palavra, entendendo evolução como progresso, mas como avanço, superação do velho, construção do novo. 1.3 Escola e emancipação x escola e precarização da vida A base da escola não pode ser compreendida em termos físicos e educandos como a clientela atendida por ela. A base são os educandos, mesmo que na maioria das vezes estes sejam os últimos a serem motivos de preocupação. Temos que trabalhar com
  • 20. 20 a base da escola para que exista possibilidade de transformação da organização vigente (organização escolar) e, por conseguinte a emancipação dos sujeitos que dela participam. Iniciar essa emancipação pressupõe que tenhamos compreensão do que significa esse termo. Para que os sujeitos se formem como sujeitos emancipados se faz necessário não reduzi-lo. Emancipação não se realiza num período curto de tempo e sim processualmente como consta nos documentos da escola, por exemplo, sobre a avaliação: que será processual, que o acompanhamento será assíduo, constante, mas que concretamente não se realiza nesses termos. Como consta no PPP da escola: A avaliação será compreendida como processo de construção, cumulativo, constante, investigativo, de acompanhamento da aprendizagem do/a educando/a.A avaliação, por ser um processo contínuo e cumulativo, é compreendida, numa perspectiva mediadora, como a análise do desenvolvimento do processo educativo de cada educando/a, assim, acompanha-se diariamente o desenvolvimento de cada um/a, nas mais variadas situações de aprendizagem, visando compreender as hipóteses que este/esta vem formulando a respeito de determinados assuntos e nas diferentes áreas do conhecimento. (PPP, 2006 pg. 12) As interpretações e compreensões a esse respeito poderiam ser inúmeras. Poderíamos começar pelo fato de que a escola não está distante da burocracia, que precisa ensinar certos conteúdos e nesse caso fica limitada no sentido de proporcionar momentos de reflexão e entendimento sobre determinados fatos e ações. Poderíamos questionar então qual o papel do filme nesse contexto da burocracia escolar que não se restringe a esse contexto, pois, em todas as escolas este existe como recurso. Assim como na avaliação, que não acontece na forma de acompanhamento do que os educandos realmente estão compreendendo e aprendendo, os filmes são fonte de disseminar o que já existe pronto e assim alienar aqueles que assistem de todo o processo de produção. Entre o que está escrito/descrito nos documentos e a realização do que está conferido neles existe certa distância. A escola pesquisada não se dedica diretamente ao educando preocupada com o crescimento intelectual e a formação humana integral (mesmo considerando os projetos que estão desenvolvendo, como a exemplo do interdisciplinar no ensino médio). A crítica a não preocupação com os educandos não está relacionada a um educador em especifico, mas sim aos educadores enquanto classe de trabalhadores. A falta de condições adequadas de trabalho em que se encontram esses profissionais da educação faz com que seu trabalho não tenha a mesma proporção que
  • 21. 21 poderia ter. A dedicação ao educando não se estabelece, ou seja, como citou e trabalhou Freitas: “a última preocupação que a escola considera são os educandos”. Essa não é uma crítica exclusiva dessa escola, bem conhecemos que a realidade da educação brasileira carece desses pressupostos. Devemos considerar a organização escolar que inclui professores mal remunerados e por essa razão trabalhando a cada dia mais para poder manter um padrão de vida digno. Poderíamos até questionar o fato de trabalharem em mais de uma escola para aumentar a renda e, como gostam de dizer em todos os relatos que escutamos dos estágios dos educandos da Licenciatura em Educação do Campo: “vendem produtos da revista da Avon”. No entanto, devemos lembrar que estes também são frutos dessa educação alienada de formação humana,.Por outro lado não podemos justificar os erros e as marcas que estes deixam nas crianças, adolescentes e jovens pautados por essa educação arbitrária. O que nos leva a crer que a maioria das ações não corresponde às necessidades reais que as crianças apresentam. Ainda assim, esta é uma boa justificativa. Mesmo que esta classe queira procurar por melhores aprendizados enquanto professores, continuarem sua formação, esta não está ao alcance com tamanha facilidade quanto poderia (as facilidades de acesso a formação na atualidade são maiores do que há alguns anos, mesmo assim, esta somente acontece em razão da necessidade que o governo exige para permanecerem no cargo de professores e não necessariamente pelo motivo da procura de aperfeiçoamento e superação das sequelas que a educação inicial deixou em cada um dos educadores dessas novas gerações). 2. Contextualização da realidade pesquisada 2.1 Início do assentamento O Assentamento Rondinha, território do município de Jóia que se localiza na região noroeste do estado do Rio Grande do Sul, se constituiu a partir de três realidades diferentes, ou seja, pessoas vindas de três acampamentos, apesar de que a luta se constituía para a mesma finalidade, com os mesmos objetivos. Os acampamentos que fizeram parte desse assentamento foram: Não Me Toque, São
  • 22. 22 Miguel das Missões e Lagoa Vermelha (Ao acampamento de Não Me Toque juntaram-se pessoas provenientes da região de Bagé). Algumas dessas pessoas já estavam acampadas há mais tempo que outras o que possibilitou que estas fossem assentadas em primeiro lugar. Os que se reuniram era parte da luta pela terra juntamente com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, dessa forma como já foi citado tinham os mesmos objetivos. Anteriormente a essa luta por assentamento não existia concretamente luta do MST considerando essa região específica. No RS a luta iniciou com o acampamento da fazenda Anoni no ano de 1985. Na realidade, como foi descrito acima, a reunião em acampamentos não se deu na região de Jóia propriamente e sim em outras regiões como Não Me Toque, São Miguel das Missões e Lagoa Vermelha. A região de Jóia foi “escolhida” pelo fato de oferecer territórios disponíveis para reforma agrária. Depois do Assentamento Rondinha, aconteceram outros assentamentos nos arredores: Assentamento Barroca, Assentamento Estrela que Brilha, Assentamento 25 de Novembro, também há um Reassentamento com o nome de 31 de maio que está ligado ao movimento atingido por barragens (MAB), como também o Reassentamento Novo Amanhecer. Mais próximo a área urbana de Jóia também se formou outro assentamento: Simon Bolívar. O Assentamento Rondinha e outros dos arredores foram conquistados devido a luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e essa luta no RS já estava acontecendo desde a década de 80. Na região de Jóia propriamente não existiam lutas dessa natureza, o território era tomada pelos grandes proprietários de terra. No ano de 1995 os trabalhadores acampados realizaram uma ocupação numa fazenda pertencente à Companhia de Aviação Riograndense (VARIG) que estava improdutiva e que mantinha oito trabalhadores em sua sede. Na primeira ocupação foram despejados. Outras tentativas foram realizadas até que finalmente em maio de 1995, o assentamento foi conquistado. A empresa de aviação proprietária inicial desse território tinha uma dívida com o governo federal o não pagamento do Instituto de Previdência Social (INSS) e por essa razão a terra foi vendida em troca dessa dívida. O assentamento recém iniciado ficou com o nome de Rondinha que já possuía uma história anterior ao assentamento. Antigamente era a paragem de tropeiros que passavam por esse local e deixavam seu gado. À noite faziam a ronda, ou seja,
  • 23. 23 faziam a vigia do gado, por isso o local passou a ser denominado de ronda. Mais tarde passou a ser chamado de Rondinha. Nesse local foram assentadas 232 famílias, numa área de 4.200 hectares. O município tem uma área total de 1.240 km² e aproximadamente 8.500 habitantes. Mais da metade dessa população reside no meio rural (76,16%) e o restante no meio urbano (24,84%). Nos primeiros anos de assentamento como não havia infraestrutura para que todos os moradores se alojassem adequadamente foram se instalando conforme a condição permitia. Nessa primeira etapa existiram grandes dificuldades. Continuaram na sua maioria morando em barracos de lona preta, os recursos que vinham inicialmente eram escassos mantendo somente o básico como a alimentação e algum vestuário. Outro fator importante era o de que as famílias acampadas não sendo dessa localidade levaram certo tempo para se adaptarem, tanto ao local propriamente, quanto ao preconceito em relação aos assentados. Um exemplo disso é o de que quando morria alguém era indicado que esta pessoa fosse enterrada na sua base (o termo se refere ao local de onde provinham as pessoas, ou seja, local em que residiam anteriormente ao assentamento) e não no assentamento, não considerando este local como aquele ao qual pertenciam. Quanto ao preconceito sofrido pelas famílias no início este estava diretamente relacionado com o fato de serem sem terra, considerados como vagabundos arruaceiros, preconceito esse não restrito a esse território. Este também se estendeu durante os primeiros anos de assentamento e perpassou todos os aspectos da vida das pessoas, tanto na convivência em festas, na relação comercial, escolar. Não se podia esperar de uma região como esta em que a centralidade das terras estava nas mãos de poucos proprietários e que estes por sua vez compreendessem a chegada e permanência de pessoas provenientes de acampamento e de uma luta por terra, ou seja, a reação era compreensível olhando sob esse aspecto, não quer dizer aceitável. Ainda hoje, na atualidade ainda são percebidos comentários desagradáveis em tons de brincadeira, principalmente quando pessoas do assentamento não estão em condições de vida mais confortável, de que só poderiam ser dos sem terra. O que continuam não compreendendo é de que os sem terra continuam fazendo parte da mesma sociedade e por essa razão sujeitos aos mesmos problemas das demais pessoas.
  • 24. 24 2.2 Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa A Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa como é conhecida hoje passou por vários processos até que sua existência atual se formasse. Com a luta pela terra, além das lutas por recursos para que a produção iniciasse e para a infraestrutura se efetivar, aconteceu também à luta por educação, especificamente nesse caso a educação por escola em termos físicos. Essa luta por escola aconteceu desde o momento que a necessidade por escola surgiu, a partir do momento em que as pessoas vieram para o assentamento, no ano de 1995. As primeiras providências tomadas foram de mandar os filhos para escolas mais próximas do município, depois a luta por uma escola dentro do assentamento. Antes que a escola existisse nesse local, como gostariam os novos munícipes dessa localidade, os educandos tiveram de se sujeitar ao que estabeleceu o governo daquele momento, ou seja, precisaram frequentar a escola do município localizada a oito quilômetros do assentamento, de acordo com a localização de cada família nesse mesmo assentamento a distância poderia aumentar. Nesse caso as crianças precisavam de transporte escolar para se deslocar até ela, o que foi fornecido, no entanto com a precariedade que se conhece no município: ônibus lotado, crianças mal acomodadas, em dias de chuva a situação piorava em razão da situação das estradas. Os educandos que frequentavam essa escola que era municipal e de ensino fundamental incompleto. A escola em que cursavam existe ainda hoje e tem o nome de uma antiga moradora daquela localidade Leonilda Zardin Nicolleti. O fato de os educandos seguirem com transporte escolar até as escolas mais próximas, que não eram tão próximas assim, houve um rendimento maior para o município se considerarmos que os educandos são uma “fonte de renda” indispensável. Não tomando mais o transporte para outras escolas, o município ficou sem esta fonte de renda. Esse fato pode ser observado na dificuldade da implantação do prédio da escola no assentamento, a demora no início da construção da obra, por exemplo. A manutenção dos educandos de um local para outro através do transporte escolar não deixa de ser um método de manutenção do sistema, a vida no campo se distancia de certo modo, outra realidade que não é a deles entra no seu cotidiano.
  • 25. 25 Não quer dizer que sua realidade não seja permeada pelo meio externo, no entanto, o deslocamento de um local para outro, além de esgotar os sujeitos fisicamente, esgota também outras possibilidades que teriam de se arraigarem ao campo recém conquistado. No entanto, essa situação inicial teve de ser repensada pelo fato de serem muitos os educandos de anos iniciais e o prédio em que funcionava a escola não ter condições de acolher a todos. A prefeitura do município teve uma solução provisória que foi a de concluir a construção de um prédio de madeira (que foi feito por uma parte da comunidade do assentamento, para funcionar como igreja e salão de festas): colocar o piso, construir banheiros, cozinha e colocar as divisórias para que as salas de aula funcionassem. Porém, esse prédio também não atendia as necessidades dos educandos em razão de não ter iluminação adequada, não existiam divisórias adequadas atrapalhando a execução das atividades, pois quando um educador falava o outro de outra sala escutava e vice-versa. Ou seja, as condições para o desenvolvimento dos trabalhos eram prejudicadas no seu conjunto. O outro grupo de educandos que cursavam os anos finais do ensino fundamental foi matriculado na localidade de São José também no município de Jóia, distante há doze quilômetros do assentamento, isso considerando a saída do assentamento como referência. Essa escola, Escola Estadual Edmar Kruel, é uma instituição de ensino fundamental completo, ou seja, atendia educandos de primeira a oitava série. (Ainda hoje a escola funciona como escola de ensino fundamental completo.) Os educandos que frequentaram esse período nessa escola tiveram várias dificuldades além das costumeiras. Enfrentaram diariamente o transporte escolar em estrada de chão, aumentando o distanciamento de acordo com a localização das moradias do assentamento. Houve nessa escola por parte dos educadores e educandos da localidade de São José discriminação em relação aos educandos que estavam se integrando aquela instituição. Foram separados em sala de aula específica, não se misturando com os que já estavam cursando, os educandos os discriminavam também pelo fato de serem provenientes de um assentamento e este por sua vez ser proveniente da luta dos trabalhadores rurais sem terra. Essa mesma discriminação se estendeu também a todos os assentados, também por serem sem terra.
  • 26. 26 Em razão de todas essas dificuldades e por serem pessoas que vieram de uma luta maior, os assentados, pais ou não das crianças, continuaram lutando para que uma escola fosse construída de acordo com as necessidades desses educandos e desse local. Depois de várias tentativas em 1996 foi liberada pelo Estado a construção de uma escola no assentamento. Mas como o município tinha interesse nessa escola, gostaria que fosse municipalizada, e, o problema maior era de que existiam complicações quanto às licitações das empresas construtoras, esse foi um dos motivos pelos quais a construção demorou a ser iniciada. O prédio foi concluído no ano de 1998 e no ano seguinte iniciaram as atividades escolares no local. A escola estava dentro de uma área de assentamento de reforma agrária, conquistada também pela luta das pessoas envolvidas no processo anterior. As discussões de como funcionaria e de quais as pessoas que dariam continuidade considerando o espaço pedagógico foram feitas também pela comunidade escolar que envolvia pais, educandos, educadores que já atuavam e todos os interessados em como esta seria pautada: como organizar, respeitando os princípios do Movimento, enfim, não desconsiderando todo processo anterior. Dentro dessa organização inicial, os educadores que já atuavam na escola improvisada não eram suficientes para a continuidade dos trabalhos. Foi necessário que outros se integrassem a esse contexto. Além dos educadores que já atuavam, vieram educadores da área urbana do município de Jóia, outros provenientes dos municípios de Santo Ângelo e Eugênio de Castro. Essa integração se deu em meio a vários atritos, discordâncias entre ideias e jeitos de desenvolver os trabalhos. Os momentos em que as discussões aconteciam normalmente eram de ênfase ao processo de desenvolvimento de trabalhos com os educandos, dentro do que se acreditava como essencial para a formação de sujeitos completos, formação essa defendida no PPP da escola nas concepções de educação: Educação voltada para as várias dimensões da pessoa humana. Buscamos a Educação Omnilateral, ou seja, a educação deve trabalhar em cada uma de suas práticas, as várias dimensões da pessoa humana e de um modo unitário ou associativo, em que cada dimensão tenha sintonia com a outra, tendo por base a realidade social em que ação humana vai acontecer”. (2006, pg.6, PPP)
  • 27. 27 O trabalho estava pautado dentro dessa formação como essencial, do que discordavam em parte alguns educadores, pois consideravam o conteúdo (das disciplinas) mais apropriado do que quaisquer outros aprendizados. Como a proposta pedagógica estava em seu início, muitos se aproveitaram do fato de a maioria não se sentir segura quanto ao projeto defendido e distorcer o que pretendia, ou seja, era um projeto a ser construído e não apenas tomar o que já estava pronto e aplicar, o que era defendido por parte dos educadores, apenas aplicar o conteúdo das disciplinas por exemplo. A primeira organização considerada nessa escola foi a de que o coletivo deveria prevalecer. Foram organizados núcleos de base que funcionavam no desenvolvimento do trabalho realizado na escola (essa organização em núcleos foi uma continuidade da organização que existia no assentamento como um todo) e considerado de fundamental importância no processo educativo, o trabalho era considerado educativo. Esses núcleos e trabalhos realizados pelos educandos também envolvia os educadores de toda escola. Essa organização de coletivos de trabalho foi uma tentativa de organizá-la diferente da organização escolar existente e também uma continuidade do que existia no acampamento, uma maneira de fazer prevalecer a identidade sem terra. Essa organização poderia ser considerada contrária e eficaz para combater o individualismo nas resoluções e planejamentos, especialmente relacionados ao trabalho prático. Vale lembrar que apesar dos núcleos de base (grupos de trabalho) se dedicarem ao trabalho prático, existia planejamentos e avaliações de como este tinha sido feito, o que dava discussões que enriqueciam maneiras de pensar, construindo sujeitos que necessitavam se posicionar e argumentar sobre seus posicionamentos. No entanto, a escola não pode se manter distante da organização já existente, organização esse que diz respeito a divisão por disciplinas, carga horária, enfim, todo aparato organizativo já atuante há séculos. Ela não pode se distanciar dessa previsão, pois é uma instituição que faz parte do sistema vigente. O trabalho continuou por algum tempo, em torno de três anos com maior ênfase, depois foi se diluindo, outras exigências como tempos para realizá-lo fizeram com que não tivesse mais o mesmo espaço. A burocracia do que exige a organização escolar foi deixando de lado a organização proposta no início. Cabe pensar sobre isso: primeiramente o público foi mudando, não tinha mais a mesma força que os primeiros participantes da escola; a comprovação do que estava sendo feito, as papeladas a serem preenchidas eram demasiadamente limitadoras para que os sujeitos da escola continuassem batendo de frente com as regras estabelecidas; era
  • 28. 28 mais fácil seguir o que já está previsto (como de fato é); os sujeitos educadores sempre foram diferentes nas ações, nas atuações dentro e fora da escola também se tornando um fato difícil de administrar pelo menos de acordo com os princípios baseados em Paulo Freire, Roseli Salete Caldart, Pistrak, entre outros. As justificativas são inúmeras e vem de um ponto de vista de quem atuou algum tempo nessa escola, mas são válidos, tem um fundo de verdade. O fato de fazer do trabalho um aparato importante e digno de pensar os outros projetos da escola foi relevante, mas não surtiu o efeito esperado, talvez porque não tenha sido discutido e valorizado mais juntamente com os educandos. Ele foi sendo deixado de lado, a importância do ato de realizá-lo não se constitui mais em ato a ser pensado, o que prevalece é que se um educando precisa realizar algo, sempre questiona e diz não precisar realizar tal trabalho nem em casa, como terá de realizá-lo na escola? As oficinas pedagógicas também foram um fator importante na aprendizagem dos educandos. Aconteciam em todos os anos do ensino básico. Uma porcentagem de educandos se inscrevia em determinada oficina ou, o educador direcionava o educando necessitado de desenvolver tal atividade mais do que outros. Permanecia um trimestre, ou um bimestre de acordo com a organização dos anos em questão (ensino fundamental ou ensino médio). Quem coordenava cada oficina era um educador de acordo com aquela que mais se sentia preparado. Existiam oficinas de artesanato, canto, culinária, conto, reciclagem, entre outras. Depois da construção do prédio, o desafio seguinte era o de construir um projeto político pedagógico que levasse em consideração as movimentações realizadas até então para a conquista da terra, da escola. O que foi proposto então era de que a comunidade contribuísse nessa construção. A comunidade, juntamente com o conjunto de educadores elaborou o Projeto Político Pedagógico que seria o documento que estabelecia os parâmetros para a educação desenvolvida a partir daquele momento. Essa elaboração teve maior ênfase na oportunidade em que o governo do estado lançou a Constituinte Escolar, que previa a discussão da organização escolar nos moldes em que se encontrava e a proposição por parte de todos os integrantes do processo escolar (a comunidade escolar) de mudanças que acreditavam necessárias para o melhor aproveitamento dos
  • 29. 29 educandos, mudanças de nomenclatura, como por exemplo, “delegacia de educação” para “coordenadoria de educação”. O Projeto Político Pedagógico e Planos de Estudo construídos a partir de 2000 enfatizam a formação de sujeitos críticos, que saibam como proceder diante das situações que se apresentarem nessa sociedade. Como referenciado nesses documentos, a importância da formação dos estudantes para que exerçam plenamente a cidadania e nesta consta o fato de serem políticos em seus atos, é plenamente reiterada. Nesse sentido os trabalhos realizados com estes precisariam de fato acolher as necessidades que possuem também levando em conta seus estágios de desenvolvimento, além desses, o grau de socialização que possuem entre os colegas e professores e a tarefa fundamental que essa socialização propõe para o grau de amadurecimento e entendimento tanto dos conteúdos quanto da convivência um com outro, ou seja, compreender que somente com o outro é que a formação se torna plena e cheia de sentidos. Como indica o Projeto Político Pedagógico da escola: Contribuir na construção de sujeitos com capacidades da analisar, refletir e interagir com a realidade local e geral, ensinando fazer pela prática, preparando igualmente para o trabalho manual e intelectual, tornando-se sujeito da história e da sociedade que almejamos. (P.P.P. da Escola Joceli Corrêa, 200.., página...)5 Apesar dessa preocupação demonstrada no documento escolar e toda movimentação para que os aprendizados não se tornem obsoletos, existe uma parcela de despreocupação ao mesmo tempo. Não há como manter sob rigoroso acompanhamento o que todos os educadores estão trabalhando com os educandos ou, como estão trabalhando. Os conteúdos demonstrados nos livros didáticos, por exemplo, possuem atrativos relevantes, já que com estes a aula já está “pronta” e o processo de passar os conteúdos torna-se facilitado. Não se pode condenar por completo o livro didático, não é essa a questão principal, o fato é que como os livros, os filmes também se tornam artefatos facilitadores de uma aula, se essa linguagem for vista como tal. Essa afirmação se constitui em algo difícil, no entanto, as observações dos momentos em que os filmes são passados, fazem-na ser fiel aos fatos que ocorrem. Os livros já vem com as ilustrações, com os textos, com os conteúdos explicados e com as imagens para ilustrar; os filmes são imagens, sons e 5 P.P.P. significa Projeto Político Pedagógico. Este projeto foi está em reformulação, no entanto, ainda permanece o mesmo embasamento, tem os mesmos objetivos.
  • 30. 30 palavras e podem proporcionar momentos de observação, sonhos e também entretenimento, como mesmo fez referencia um dos estudantes da escola “as vezes um filminho é bom para distrair”. Porém, é preciso considerar que existem as pessoas que dão maior ênfase a essa preocupação com o que e como os educandos aprendem. Estas fazem com que estimulem momentos de preparação coletiva do que irá ser trabalhado. As tentativas são várias como, por exemplo, a construção de projetos interdisciplinares para o ensino médio acontecido durante esse ano de 2010. Atividades conjuntas foram desenvolvidas de acordo com as especificidades de cada disciplina e houve um momento final de socialização do que cada grupo de educandos conseguiu estudar, de acordo com a turma em questão. O trabalho interdisciplinar pode ser considerado como uma iniciativa louvável, pois o planejamento para as ações coloca os educadores trabalhando em conjunto, pelo menos os educadores da área de conhecimento afim. Porém, a forma como o encaminhamento é feito, ou o que é cobrado depois dos educandos se contradiz na medida em que não se estabelece nenhuma novidade quanto ao método: passar um filme para a atividade inicial, pesquisa na internet, copias do quadro negro, enfim, toda maneira de organizar esse aspecto da aprendizagem. Não se pode considerar isso como uma crítica, ou intransigência da parte de quem observa, ou trabalha com esses aspectos. 2.3 Educadores que atuaram e atuam nessa escola Os educadores que iniciaram o trabalho na escola ainda extensão da Escola Municipal Leonilda Zardin Nicolleti, faziam parte do quadro municipal de educadores do município de Jóia como também alguns desses educadores faziam parte diretamente do processo de luta pela terra e que por sua vez faziam parte dos assentados dessa localidade. Como a extensão era de uma escola municipal, parte dos educadores era do município até mesmo pela exigência do poder executivo do território em questão. Os
  • 31. 31 outros vieram do processo, (início dele), da escola itinerante e também educadores e formadores em outras frentes dos acampamentos a que pertenciam. Pelo fato de parte desses educadores terem vindo de um processo de luta por reforma agrária, tinham ainda o vigor da continuidade dessa luta, de manter a identidade sem terra que construíram durante o acampamento. Essa questão contribuiu para manter viva a identidade camponesa nas crianças que vieram também do acampamento como naquelas que ainda nasceriam no assentamento. Como já mencionado na primeira parte dessa contextualização, esses educadores sofreram juntamente com os educandos os problemas que a escola tinha naquele momento: problemas com a estrutura física do prédio, materiais necessários para manter um ensino de boa qualidade, tinham apenas giz e quadro negro. Com o passar dos anos, mais especificamente a partir de 1999 quando o novo prédio da escola dessa comunidade foi construído, a maioria dos educadores que estavam nessa primeira etapa de trabalho, foram junto dar continuidade ao que iniciaram na escola improvisada. Agora, porém, a escola recém construída era estadual se fazendo necessário constituir um quadro maior de educadores já que nesse momento a escola ofereceria os anos iniciais e anos finais do ensino fundamental. Foram contratados pelo estado mais educadores nas áreas específicas: educadora de educação física, educadora de língua portuguesa, educadora de geografia e assim sucessivamente. Alguns profissionais que atuavam na primeira escola tinham habilitações específicas, ou estavam cursando como, por exemplo: educadora de história, educadores de matemática. Os primeiros anos transcorreram em meio a grandes discussões de como organizar essa escola com um prédio recém construído, mas com a estrutura interna a ser desenvolvida pelas pessoas que agora faziam parte desse coletivo: educadores específicos de sala de aula, educadores da comunidade (pais, mães e outras pessoas que se sentiam responsáveis pela construção desse processo). A primeira tarefa para a qual todos foram chamados foi a de escolher um nome para essa escola. Como já era esperada essa não foi uma simples escolha já que todos haviam se empenhado para que esse prédio fosse uma realidade concreta. Existiram três nomes para a escolha defendidos naquela ocasião: Paulo Freire, Chico Mendes e Joceli Corrêa. Os três foram defendidos com veemência pelos presentes, no entanto, como Joceli Corrêa foi um dos companheiros que representava
  • 32. 32 diretamente a luta pela reforma agrária e este ter sido assassinado na época de acampamento influenciou para que fosse o escolhido quase que por unanimidade. Esse ato de escolha movimentou os educadores da escola e mais ainda o sentimento de pertencer à classe trabalhadora. Nos primeiros dois anos a escola não tinha uma pessoa que estivesse em condições burocráticas de assumir o papel da direção, nesse caso uma pessoa que estava vinculada diretamente ao assentamento assumiu o cargo mesmo que em condições de total dependência da 36ª CRE (Coordenadoria Regional de Educação). Essa dependência se caracterizava pelo fato de que em qualquer situação que necessitasse de assinatura para compra de materiais, ou outra atividade burocrática a diretora em questão tinha de ir até a localização da 36ª CRE para que o coordenador de educação o fizesse, pois estava somente como uma representatividade nessa atuação. As exigências para que fosse uma direção de acordo com a legislação seria de que estivesse vinculada ao Estado através de concurso público, já com três anos de trabalho (tempo do estágio probatório) e tivesse licenciatura plena concluída. A pessoa que assumiu na época, ano de 1999, tinha apenas licenciatura curta e não se encaixava em nenhuma das outras exigências. Esta realidade continuou no ano seguinte em que outro educador assumiu a tarefa, mas nas mesmas condições que a anterior. No final do ano de 2000, chegou transferida de um município próximo, Cruz Alta, uma educadora que tinha as condições exigidas pelo governo do Estado para assumir o cargo de direção. Como a escola necessitava de uma pessoa para desempenhar tal tarefa, esta foi bem vinda à instituição para se colocar nessa posição. No primeiro ano assumiu sem eleição. No ano seguinte foi realizada eleição, se candidatou e permaneceu no cargo por três anos. A escola teve mudança do nome, ou, reorganização do mesmo de acordo com a situação em que se apresentava na época. Antes do nome Joceli Corrêa, teve o nome de Escola Estadual de Ensino Fundamental no Assentamento Rondinha (que se referia ao nome da localidade em que estava situada), depois passou a ter o nome de Escola Estadual de Ensino Fundamental Joceli Corrêa. Alguns anos mais tarde, com a implantação do ensino médio, a escola passou a se chamar Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa. No ano de 2004 o ensino médio começou a existir nessa escola também, dando possibilidades dos trabalhadores que ainda não tinha cursado essa etapa da
  • 33. 33 escolaridade o fazerem. Antes de existir nessa escola, os educandos que quisessem teriam que se deslocar até a área urbana do município de Jóia à noite, o que aconteceu durante determinado período. Nessa nova fase em que se encontrava a escola, foi proporcionado também que viessem outros educadores de outras disciplinas para trabalhar com ensino médio. Nesses 11 anos de escola muitos foram os educadores que passaram por ela, mais de trinta no total, dos anos iniciais ao ensino médio. Outros permaneceram ao longo desses anos tentando alicerçar o projeto de escola pensada a partir das concepções defendidas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que preserva as concepções de Paulo Freire, Pistrak. Provavelmente por essas idas e vindas, o quadro de educadores não conseguiu de fato estabelecer uma unidade a ponto de colocar em prática a educação progressista a que se propunha a escola, permanecendo sempre na expectativa de quem assumiria as tarefas no lugar de quem já não estava mais. Realidade que de certa forma ainda permanece hoje. O sentimento de pertença à classe trabalhadora sem terra foi diminuindo. O modelo de escola que foi sendo construído nesse período não pôde se abster de seguir normas burocráticas estabelecidas pelo Estado. Essa burocracia influenciou diretamente em cada decisão tomada, influenciando a conduta de cada educador que não se via mais tão instigado a participar de um coletivo que acompanhava todos os passos das pessoas a sua volta e colocar esse novo aprendizado, essa nova construção na organização exigida então. A maioria dos educadores que hoje atua na escola são do assentamento, mais da metade, outros vem do município de Ijui, Cruz Alta, Tupanciretã. No total são 23 educadores. 2.4 Educandos que estudam nessa escola Os educandos que estudam na escola são provenientes dos Assentamentos: Rondinha, 25 de novembro (mais conhecido como Tarumã por ser o nome da antiga fazenda), Estrela que Brilha (que pertence ao município de Tupanciretã), Barroca e Reassentamento 31 de maio.
  • 34. 34 A maioria dos que estudam na escola atualmente, não fez parte diretamente do processo de luta do acampamento e das ações realizadas nessa época. Aqueles que pertenciam a esse tempo foram saindo por diversas razões, a principal delas a procura por trabalho, ou seja, a permanência no assentamento não lhes deu suporte para continuidade da sobrevivência e consequentemente não prosseguiram pelo mesmo caminho. Poucos seguiram os mesmos passos dos pais, no entanto há os que também passaram por acampamentos. Nos primeiros dois anos de escola, 1999 e 2000 os estudantes traziam consigo enraizados a identidade camponesa estampada. Nos anos seguintes até a atualidade, essa identidade foi se perdendo, ganhando menos força. Existem várias razões para explicar esse fato, entre eles a permanência nos lotes para a produção. A disposição para a luta, as saídas não era mais a mesma, pois precisavam se tornar mais presentes nos lotes com seus pais e dessa forma não mantiveram a prática da participação como se dava nos tempos de acampamento e início de assentamento. Vendo sob essa ótica podemos perceber o quanto o sistema no qual estamos inseridos de certo modo corrompe aqueles que tentam vivenciar valores diferentes, pois as necessidades físicas se manifestam com maior ênfase e mesmo não concordando com o que está a nossa volta, com a organização da sociedade e divisão dos meios de produção acabamos por concordar com algumas situações, como continuar trabalhando mensalmente para algum grande proprietário de terras. Apesar de os jovens não permanecerem nos assentamentos, aqueles que passam pela escola acredito que possuem um grau de consciência sobre essa condição de vida pela qual seus pais passaram e pela qual eles mesmos passaram. Estar consciente dessa condição significa dizer que mesmo trabalhando em outros setores da indústria e recebendo um misero salário no final do mês, pensarão sobre isso e discutirão alternativas em algum momento da vida. Isso parece folclórico, ou sonhador demais, esperar que se manifestem pensando no que irão fazer ou dizer quando estiverem em situações com as quais não concordam.
  • 35. 35 Capítulo 2 – Utilização do audiovisual no contexto da Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa 2.1. Utilização do vídeo na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa O recurso didático vídeo vem sendo na atualidade cada vez mais utilizada pelas escolas, tanto da rede estadual ou municipal. Para que esse recurso tivesse ascensão, teve incentivos do governo (federal), por exemplo, de oferecer os materiais necessários para que os estudantes e educadores pudessem ter o acesso a ele. O fornecimento desses materiais se deu através de programas, ou seja, cada escola recebeu em mãos DVD, TV e demais equipamentos necessários para que se efetivasse a utilização do mesmo. Num primeiro momento a escola recebeu como doação do município de Jóia, de Escola Municipal Leonilda Nicolette, uma aparelho de vídeo cassete. Depois a escola adquiriu um aparelho de DVD. Mais tarde, no ano de 2001, um projeto do governo federal, que tinha o objetivo de aparelhar as escolas, proporcionou que outro aparelho existisse na escola. Essas questões nunca foram discutidas pela escola. Quanto a filmes, a escola recebeu vários que estão ligados a TV Escola sobre disciplinas, todos com acesso aos professores. Esses filmes são para os professores, como uma espécie de consulta que poderão fazer, um material a mais. A escola em questão, E. E. E. Médio Joceli Corrêa tem hoje doze (12) anos de existência e desde então o vídeo vem sendo utilizado pelos educadores em suas aulas. No decorrer desses anos a metodologia para realização dessa tarefa foi como pretexto para conteúdos que seriam estudados posteriormente. Mesmo nas aulas de história não havia uma programação anterior ou um estudo aprofundado sobre o filme, apesar de que a educadora se colocava como questionadora e cada imagem do filme de acordo com suas intenções parava e explicava o que queria daquela cena ou o que esta representava em tal contexto histórico que estavam estudando do conteúdo. Em qualquer um dos anos nesta escola são utilizados filmes: anos iniciais, anos finais e ensino médio. A princípio em todos os anos do ensino básico, nessa
  • 36. 36 escola, os filmes foram/são explorados na percepção da história que este traz, fazendo com os educandos se manifestassem através da oralidade, da escrita ou também algumas vezes através de desenhos sobre a compreensão que tiveram da referida história que o filme trazia, não exatamente sobre os conteúdos trabalhados nas disciplinas. O aprendizado da linguagem audiovisual não é percebido no contexto escolar, pelo menos, nesse contexto escolar. Com todos os educandos o trabalho com audiovisual não reflete sobre a “alfabetização estética”, que como enfatiza Antonio Candido no ensaio Literatura e Subdesenvolvimento Na maioria dos nossos países [latinoamericanos] há grandes massas ainda fora do alcance da literatura erudita, mergulhando numa etapa folclórica de comunicação oral. Quando alfabetizadas e absorvidas pelo processo de urbanização, passam para o domínio do rádio, da televisão, da história em quadrinhos, constituindo a base de uma cultura de massa. Daí a alfabetização não aumentar proporcionalmente o número de leitores da literatura, como a concebemos aqui; mas atirar os alfabetizados, junto com os analfabetos, diretamente da fase folclórica para essa espécie de folclore urbano que é a cultura massificada. No tempo da catequese os missionários coloniais escreviam autos e poemas, em língua indígena ou em vernáculo, para tornar acessíveis ao catecúmeno os princípios da religião e da civilização metropolitana, por meio de formas literárias consagradas, equivalentes às que se destinavam ao homem culto de então. Em nosso tempo, uma catequese às avessas converte rapidamente o homem rural à sociedade urbana, por meio de recursos comunicativos que vão até à inculcação subliminar, impondo-lhes valores duvidosos e bem diferentes dos que o homem culto busca na arte e na literatura (1989, p. 144). A alfabetização não se dá na proporção da necessidade que apresenta cada sujeito. Não existiu quando foi iniciado o processo de colonização (nas missões jesuíticas), nem existe hoje, pois somos alheios ao que se passa e, normalmente vai além do que se vê. A naturalização desse modo de trabalho está impregnada como está impregnado em cada um de nós a naturalização e disponibilidade para o
  • 37. 37 consumo. Agindo com esse método, ou seja, trabalhando os filmes como evocações para administrar outros conteúdos ou para como refletiram alguns educandos em entrevistas:“sabemos que na maioria das vezes os filmes não correspondem aos conteúdos trabalhados, e às vezes é um passatempo necessário, porque somente copiar não dá”. Percebe-se que os educandos têm consciência do valor que se atribui a linguagem fílmica, desconsiderando esta como algo importante, pois assim é tratada em diversas ocasiões. Como argumentou uma educadora na explanação sobre a utilização dos filmes na escola: “passar filmes é bom para o professor, bom para os educandos, e bom para os pais, ou seja, todos ficam satisfeitos”.6 Com essa argumentação podemos pensar que há muito essa linguagem está banalizada. A preocupação com a alfabetização para a linguagem audiovisual não existe. As imagens são repassadas como algo natural, ou melhor, como algo de que os educandos irão aproveitar no momento em que se colocarão diante delas. A compreensão delas fica a cargo dos educandos, algumas vezes com intervenção dos educadores, dependendo da disciplina da qual estivermos falando. Se esta praticamente é inexistente, pode-se dizer que é compreensível o fato de os educandos não levarem a sério o assistir os filmes para desenvolver um trabalho, pensando que este não se constitui em algo diferenciado, apenas a compreensão superficial do contexto do filme assistido. Nos anos finais o que sempre prevaleceu foi à utilização do mesmo como material para interpretação do enredo pelo enredo do filme, não havia e não há outra modalidade de trabalho com esse tipo de material. Servia e serve como ilustração de um momento da aula ou até mesmo como válvula de escape por não terem aula preparada ou por não terem disposição para desenvolver outro tipo de trabalho. Comentários a respeito dos filmes que vem dos educadores dessa escola: “Esse ano ainda não passei nenhum filme para meus alunos, vou passar um hoje, teria educação física, mas como está chovendo vou passar o filme” Há que se considerar outro fator interessante: nem sempre os educadores vêm com o material (filmes) em mãos daquilo que querem trabalhar, outros às vezes passaram um filme para seus alunos e outros colegas educadores o aproveitam para passar também. 6 A educadora fez essa fala durante uma das aulas no curso de Licenciatura em Educação do Campo, convênio com UnB e ITERRA, 2010.
  • 38. 38 Nos anos finais não é diferente, os educandos já tiveram situações em que assistiram dois filmes no mesmo dia, em disciplinas diferentes por falta de comunicação entre os educadores. Numa dessas situações uma das educadoras que seria aquela em que trabalharia o segundo tempo da aula (de duas horas) ficou indignada com o fato de os educandos não se aterem ao que era passado, pois já tinham assistido a um filme antes do intervalo. Esta não considerou o que já tinham assistido anteriormente. Os educandos apenas assistiram aos filmes sem realizar naquele dia algum trabalho a respeito do que assistiram. Apenas foram pedidos relatos sobre o que viam para entregar na aula seguinte valendo como avaliação. Na disciplina de língua portuguesa foram passados os filmes: Olga, 2012, Alvin e os esquilos, Deu a louca na chapeuzinho, Harry Potter e a pedra filosofal, Anjos e Demônios, Zorro, Dança comigo, entre outros; na disciplina de geografia foram passados documentários que diziam respeito a disciplina e um filme: A corrente do bem; na disciplina de história foram passados os filmes: Zorro, A guerrilha; na disciplina de espanhol foram passados os filmes: Sempre ao meu lado, Alvin e os esquilos, entre outros. Entre os educadores entrevistados não existiu nenhum deles que se manifestou contrário a utilização dos filmes. Por exemplo, quando uma das educadoras referiu-se aos educandos como não preparados para escrever sobre o que assistiram e pedia que fizessem desenhos, ou, como dizia “dependendo da turma é o que peço de trabalhos, as vezes peço textos, as vezes desenhos”. Os filmes nessa questão eram da disciplina de espanhol, mas não eram na língua espanhola, eram filmes com uma “história que dizia algo para os educandos”, filmes produzidos pela indústria cultural e que não eram aproveitados para o estudo da língua em questão (espanhol). Alguns dos educadores se manifestaram quanto aos filmes como mais um instrumento para facilitar a aprendizagem sobre determinados conteúdos que estivessem estudando, como exemplo disso assistir desenhos animados como A turma da Monica para produção de historias em quadrinhos, ou, quando estavam estudando sobre narrativa de aventura, que por sua vez foi complementado com um filme, no caso, o filme era “Harry Potter e a pedra filosofal”. 2.2 Relação do audiovisual com a formação da consciência
  • 39. 39 Quando falamos de audiovisual retratamos a imagem como central, o meio pelo qual todos se mobilizam, pois trabalha com as emoções daqueles que o assistem. Principalmente quando nos referenciamos às propagandas: estas são o fio condutor para o consumo, atingem a grande maioria da população. Não existem ilesos, todos estão impregnados pelo prazer e desprazer do consumo. Os filmes, produzidos no formato para venda na indústria, também têm papel fundamental nesse consumo: venda do prazer efêmero, do corpo perfeito, da magia dos roteiros com final feliz dando a entender que os contos de fadas não se esgotam, venda da violência como maneira de resolução dos problemas criados por esse sistema em que estamos na atualidade, venda das mais diversas situações em que a vida cotidiana se mostra e mais além, os problemas de qualquer natureza se resolvem, as relações sociais são impregnadas pela ideologia que prega a classe que determina todo o aparato econômico, político, jurídico, enfim, toda a superestrutura em que está montado o capital. As relações se estabelecem no âmbito de que o que as pessoas vivem está retratado na tela e riem da própria desgraça, não se compreendendo como a margem do processo. A ideologia que as imagens vendem é “irrecusável” ao povo tão sofrido e cheio de mazelas... Quando um educador utiliza as imagens, agora referindo-me as produções industriais, e não concebe nestas um direcionamento adequado, um objetivo claro, aqueles que assistem podem não diferenciar o que veem aqui do que assistem em casa ou em outro momento de lazer. Nas entrevistas e conversas com educandos, a grande maioria deles, não sabia dizer o que seria trabalhado com o filme posteriormente7 , o que transparecia é de que estavam somente assistindo por assistir, muitos dos que assistiram não lembravam o nome nem do que se tratava. A escola situada no município de Jóia começou a utilizar o recurso didático vídeo desde o inicio de seu funcionamento. Logo que começaram os trabalhos já existia o aparelho de televisão, vídeo cassete e várias fitas de vídeo para serem utilizadas: filmes infantis (contos de fada), filmes de ação, entre outros. A escola 7 Essa situação acontecia com maior frequência no período final do ano letivo, em que segundo o dizer de uma educadora “já tinha concluído todos os conteúdos e por essa razão estava passando filmes”. Os educandos não manifestam contrariedade a esse respeito, no entanto, são conscientes de que os filmes são apenas para passar o tempo das aulas e cumprir os dias letivos que ainda faltam, principalmente no final do ano.
  • 40. 40 hoje tem cerca de 380 educandos que cursam da educação infantil ao ensino médio. Este recurso é amplamente difundido, pelo menos em se tratando desta realidade, entre os educadores. Tanto a educação infantil, quanto os anos iniciais e finais do ensino fundamental e ensino médio, tem contato constante com esse recurso. Normalmente o que pedem como trabalhos a respeito do que assistiram são relatórios, resenhas críticas, ou apenas um relato do enredo do filme.8 Esses relatórios são exigidos principalmente nas disciplinas de língua portuguesa, espanhol, história. Na disciplina de história, segundo o educador, os filmes são utilizados para retratar aquilo que não consegue através das explicações de acordo com determinados tempos históricos.9 No entanto devemos ser justos ao fazer essa afirmação, pois, algumas disciplinas fazem uso dele com maior frequência que outras, como por exemplo, língua portuguesa, história, espanhol, geografia. Essa constatação foi feita através das observações realizadas na escola, como também através das entrevistas com educandos. Os filmes começaram a ser utilizados nessa escola desde o primeiro ano de funcionamento do prédio oficial (a partir de 1.999), ou seja, desde o momento em que iniciou seu funcionamento há 12 anos. O fato de ser uma escola do campo não impossibilitou que estes fossem introduzidos e que lá tivessem permanecido. A impossibilidade aqui na significa dizer que não pudessem ter acesso ao que existe em termos de tecnologias, está se referindo ao fato de não conseguirmos nos desligar ou nos desvencilhar do que esta sociedade nos propõe mesmo que não concordemos com seus feitos. Não há distinção entre quem utiliza ou não os filmes para trabalhar, o fato é que algumas disciplinas o fazem mais vezes entre as quais a disciplina de língua portuguesa, história, espanhol, geografia. Os filmes trabalhados levam em conta somente o roteiro que este apresenta. Na maioria das vezes os professores nem mesmo assistiram aos filmes antes de serem trabalhados, ou, já passaram para várias turmas e já sabem do que irá tratar e nem mesmo assistem novamente com os educandos. Os trabalhos que são solicitados estão resumidos no ato de escreverem sobre os filmes, resumos, resenhas, a parte que 8 Tive acesso a alguns relatórios produzidos pelos educandos, no entanto, não são os mesmos dos filmes analisados. 9 O educador de história demonstrou saber como poderia ser desenvolvido um trabalho utilizando especificamente essa linguagem do audiovisual, ou seja, analisar as imagens, a forma com que foi feito determinado do filme. Mas, o trabalho que realiza está direcionado para o conteúdo com que trabalha e não exatamente com a linguagem do audiovisual. O educador realizou um comentário a respeito desse trabalho que poderia ser realizado.
  • 41. 41 mais gostou ou desenhos. A linguagem do filme como sendo uma linguagem estética própria não é considerada, mesmo porque a formação dos educadores não passou por esta dimensão. Ser “alfabetizado esteticamente” significa dizer algo como compreender todas as dimensões que podem ser trabalhadas numa determinada obra e para que finalidade se queira trabalhar com ela. Mesmo um filme como Olga, que poderia ser direcionado para o lado político da questão e do coletivo que a luta daquele momento encerrava, quando análise escrita foi feita o que prevaleceu foi a imagem soberana de Olga, principalmente no momento da tomada da filha de seus braços. Os educandos não conseguiram ir além, por falta de uma intervenção mais contundente.10 Além dos filmes trabalhados cotidianamente na escola Joceli Corrêa pelos educadores nas disciplinas já mencionadas, filmes são utilizados na semana Paulo Freire11 , que acontece todos os anos nessa escola. Durante esse ano de 2010, foi utilizado um filme que não tinha a ver propriamente com o tema tratado que era sobre a vida de Paulo Freire. As turmas da escola (anos finais do ensino fundamental e ensino médio) realizaram pesquisas referentes a esse autor para apresentarem no último dia da semana. As apresentações foram feitas e no término delas foi passado o filme “Desafiando gigantes”. O caráter do filme não estava relacionado a expressão que a semana tinha até então. A diferença entre os outros filmes é que neste foi montada uma estrutura com data show para a apresentação, deixando com aspecto de cinema o local em que foi assistido. Os filmes trabalhados não são necessariamente trabalhados como linguagem própria, pensando que este se encaixa no gênero multimodal. Um filme apresenta linguagem da palavra, do som, da imagem, das posições em se coloca cada personagem, da focalização para o individual ou o coletivo, imagens também direcionadas à propaganda de mercadorias para vender o produto do filme além dos produtos individuais: bebidas, roupas sempre etiquetadas com “marcas famosas”, enfim, toda uma parafernália instituída para fins de consumo. Quando assistimos a 10 Vale lembrar que os filmes, normalmente assistidos pelos educandos, são produzidos pela grande indústria e o conteúdo expresso neles não se diferencia do que conhecemos : um é o mocinho, outro é o bandido e no final tudo acaba bem, ou seja, o final é feliz. 11 A semana Paulo Freire se refere a uma semana de atividades que acontece na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa alusiva ao dia do livro. Existe uma programação nas turmas da escola coordenada por alguns educadores que se disponibilizam para fazê-lo. Nessa semana há apresentações, feira do livro e culmina normalmente com um filme.
  • 42. 42 filmes no âmbito privado estamos consumindo essas mercadorias e dentro delas compramos a ideologia que a impregna, que por sua vez está vinculada ao círculo vicioso da reprodução do sistema capitalista. Quando esse consumo perpassa o âmbito escolar, a compra do produto continua acontecendo. No entanto, esse consumo, além da compra da ideologia dominante há o reforço dessa dominação através do professor e da estrutura escolar. Correndo o risco de colocar no professor a responsabilidade de “introjetar” no educando, ou continuar o trajeto dessa hegemonia capitalista, há que se considerar que ele tem boa parcela de contribuição nesse processo. Ele pressupõe a finalização, ele está estreitamente ligado ao público com quem se trabalha, ou seja, os educandos. E se isso acontece possivelmente ele reitera a ideologia, principalmente se não teve contato formativo relacionado com a “alfabetização estética”. O filme como outras linguagens do teatro, por exemplo, se constituem como um adendo a mais, uma justificativa insignificante para permear, preencher o “tempo vazio”, que reitera o tempo vazio de fato, pois se essa formação não compreende uma preocupação constante em formar educandos conscientes de suas atuações presentes e futuras, esta não se constitui numa educação que corresponda as necessidades do desenvolvimento pleno do educando. Como o autor Adorno definiu no texto Tempo Livre de que este nada mais é do que a continuidade do tempo em que a pessoa dedica ao trabalho, um não se desvincula do outro. O tempo livre não é livre ele é preenchido através do consumismo, pois a falsa liberdade precisa de produtos para preencher o espaço que deixou de existir no trabalho, o ser humano foi podado na sua criatividade. A linguagem visual é apenas uma parte do processo de conscientização, evidentemente não podemos colocar nesta toda a carga de responsabilidade para essa formação, mas pensando que o visual é reincidente, acontece a todo o momento. A imagem é reincidente, ela é insistente, ela encanta, envolve, suprime as dores, evoca ilusões, dá continuidade ao processo de dominação. No entanto, quando desdobrada desta maneira claro que diz respeito à imagem propagada pela produção industrial de larga escala, não com o objetivo de fazer ver o que realmente existe de contradição de cada realidade falada colocada em forma de imagem, apenas com a pretensão de mercantilizar a produção, vender uma imagem que reitera o consumo, a identificação com o “belo” que, por sua vez também é construído também pela indústria. Não podemos desconsiderar produções que levam a construção de uma
  • 43. 43 consciência crítica. Como trabalha Maria Rita Kehl quanto à imagem e sua produção, levando em conta a dimensão que esta possui na vida humana: (...) Da indústria cultural à sociedade do espetáculo, o que houve foi um extraordinário aperfeiçoamento técnico dos meios de se traduzir a vida em imagem, até que fosse possível abarcar toda a extensão da vida social. (...) (Kehl, 2004, pg. 44) Se na vida social a imagem e o que esta quer representar têm proporções gigantescas em todas as ações, podemos considerar que não estamos livres dessa condição, ou seja, temos influência direta ou indiretamente dessa manipulação propagada pela indústria, pois não vivemos fora dessa realidade. Não é uma novidade esse fato, no entanto, da mesma forma que somos influenciados por ela não temos consciência dessa influência, não percebemos quando as ideias ou ações estão permeadas pela ditadura do capital ou, quando conseguimos essa atitude, do questionamento, ainda assim estamos à mercê dessa influência. Se os meios de comunicação estão aperfeiçoados a ponto de “entrar em nossas vidas” deliberadamente, pressupõe-se que não temos escolha. Encontrar uma forma contra hegemônica de luta e competente ao mesmo tempo (competente no sentido de “convencer” do contrário propagado e para isso teria que ser excepcionalmente bom), requer dos interessados na questão aprofundamento dos meios já existentes para contrapor e serem bem firmes no que diz respeito à defesa política, firmes também nas práticas que realizam cotidianamente, não apenas na simbologia dos ideais. Existem ações dessa natureza que compõe essa contra hegemonia. Um exemplo que podemos citar é o filme “Quanto vale ou é por quilo”, que por sua vez se trabalhado de forma alienada não difere dos outros que são produções padronizadas. Por mais que existam produções anti-sistêmicas, não há veículos apropriados, ou seja, os meios de produção não estão dispostos para essa classe (trabalhadora) efetivarem de fato o que produziram para fazerem pensar aqueles que estão mais afundados no sistema, sem condição de questionamentos. Seria necessário que estes meios fossem tomados como forma de também caracterizar a luta contrária. Também